Reckless escrita por Moony, Bela Barbosa


Capítulo 17
Capítulo 18 - Primeiro Primeiro Encontro


Notas iniciais do capítulo

GEEEENTE! Reckless voltou, quem tá feliz o/// então, esse é o maior capítulo que já tivemos aqui na fic e ele vai contar pelo menos 80% do encontrinho lindo do Daniel e da Lizzie ♥ espero mesmo que vocês gostem e peço POR FAVORZINHO, pra vocês lerem as notas finais que tem coisas beeeeem importantes sobre a fic!
Boa leitura, beijinhos!
A musiquinha do capítulo: https://www.youtube.com/watch?v=qDVW81bXo0s&list=PLjOLZVat-eRA6oZ8N5KfbfWvMjURJht2B&index=16



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/442729/chapter/17

POV Eliza Peters

— Mãe? É você? - Perguntei cheia de esperança assim que a atendente do asilo redirecionou para o quarto de Sally Dawson.

— Oh, Lizzie!— A voz da minha mãe, do outro lado da linha, soou tão aliviada que eu praticamente enxerguei seu sorriso - Como é bom ouvir sua voz, meu amor!

Sorri também ao percebê-la tão feliz. Até mesmo a voz dela estava mais leve, mesmo com tão pouco tempo em tratamento.

— Que saudade, mãe! Ainda bem que consegui te achar. Como você tá? Eles estão te tratando direito? - Comecei o interrogatório.

Meu maior medo era que o meu pai a tivesse enfiado num lugar em que ela fosse destratada.

— Felizmente, sim. A equipe médica daqui é bem mais atenciosa do que a de Birmingham. E depois desses dias todos aqui, percebi que eu realmente precisava desse descanso... precisava de um tempo pra cuidar da minha saúde.

— Você não sabe o quanto é bom ouvir isso - Suspirei, levando a mão ao meu coração - Eu te amo muito.

— Também amo você, Lizzie. Obrigada por ter me feito vir pra cá. Algumas vezes, aquele traste do seu pai não está totalmente errado... — Disse, bem humorada.

Soltei uma gargalhada quando ela chamou meu pai de traste.

— Você o viu depois daquele dia?

— Não - Respondi, ríspida, rolando os olhos apenas por pensar nele - Para o meu próprio bem e dos dentes dele.

Ouvi os risos de mamãe do outro lado.

— Você é a melhor, Lizzie. Só quero que continue se cuidando até eu voltar, ok? Se precisar de alguma coisa, peça pra tia Maisie, todos os meus cartões estão com ela.

Assenti com a cabeça, como se ela pudesse me ver naquele momento.

— Tudo bem, mãe. Eu me cuido direitinho, pode deixar.

— Ótimo.

Missão número 1 do dia concluída: assegurar que minha mãe estava bem cuidada e feliz sob os olhares médicos da clínica Shady Oaks. Eu sabia que um tempo lá faria bem pra ela, um tempo longe de todo o stress do divórcio, de um trabalho novo, mudança, caixas... ela merecia tudo isso. E apesar da minha ideia maluca de deixá-la ir embora tivesse a chance de dar errado, só Deus sabe o quanto eu estava grata por isso não ter acontecido.

Agora, era partir pra outra ligação do dia e me certificar se outra pessoa com a qual eu me importava um bocado também estava bem.

— Mãe, eu tenho que dar outro telefonema agora, se você não se importar. Ligo amanhã, tudo bem?

— Claro, filha. Até amanhã, então. Beijos - Ela respondeu com ternura.

— Beijos.

Desliguei.

Enquanto discava os outros números, fiz menção de me sair da cama para, finalmente, abrir a janela, que ficava em cima do criado mudo do lado esquerdo. Enquanto rolava de um lado para o outro para levantar de uma vez por todas, pude sentir o remanescente cheiro de Daniel impregnado naqueles lençóis e travesseiros. Era uma sensação muito boa, por sinal. Sua essência nunca cheirava tão forte para chamar atenção, mas era agradável o suficiente para estabelecer uma conexão sensorial intensa com o dono daquele perfume. Em outras palavras, eu poderia sentir aquele odor em Tóquio, Roma, Havana, Nairóbi, em qualquer lugar que fosse, mas só seria capaz de associá-lo a uma única pessoa: Daniel Woods. O perfume tinha a cara dele mais do que suas jaquetas de couro ou seus carros caros e esportivos.

Grudei meu nariz à fronha do lado em que ele tinha dormido e senti como se estivesse inalando o próprio Daniel, apenas numa forma mais volátil e amadeirada, com um leve toque cítrico.

Engraçado que eu podia jurar ter sido beijada por ele assim que se levantou. A sensação de ter seus lábios pregados à minha testa era muito presente, mas eu tinha consciência de que minha mente era fértil o suficiente para ter fantasiado tudo aquilo em forma de sonho.

Por isso, afastei essa memória da cabeça junto ao abrir de cortinas da janela mais próxima. Fechei os olhos assim que a claridade se chocou com eles, causando uma sensação incômoda de imediato, mas que aos poucos foi se normalizando. Só assim, olhei para baixo e enxerguei uma vizinhança aparentemente feliz e bem humorada. Algumas crianças brincando na calçada, adultos vendendo algodão doce e pipoca do outro lado da rua e alguns adolescentes indo para a escola. Parecia uma boa vizinhança, mas principalmente, um bom dia. Temperatura um tanto fria, mas o sol estava ali para lembrar que um pouco de alegria sempre faz bem. Sorri ao admirar a paisagem e escutar os toques do celular enquanto chamava o outro telefone.

— Alô?— Uma voz masculina indagou.

— Claire? - Estranhei, considerando que tinha ligado para uma loira magrela, e não um cara que eu podia jurar ter 1,8m e ao menos três dias semanais na academia.

— Não, é o Jason— Ele falou, um pouco embaraçado.

— Oh... - Sibilei, admitindo que tudo fazia sentido agora.

— Qual é, ficou tão desapontada assim por saber que sou eu?— Jason perguntou com sua típica dose de bom humor.

— Jay, claro que não! É só que... fiquei surpresa - Expliquei - A Claire está bem?

— Muito melhor do que antes. Aviso a ela que você ligou, é que eu tive de pegar o celular da Claire e usar meus enferrujados talentos de hacker pra ver se consigo descobrir quem veio atrás dela... ou de você. - Enquanto falava, Jason parecia concentrado em outra coisa, como se estivesse mexendo num computador muito empenhado em seu trabalho.

Se ele realmente esperava achar alguma pista entre os contatos da Claire ou as últimas ligações, poderia procurar até o fim dos dias dele e não encontraria ninguém. Por outro lado, eu também não podia demonstrar total conhecimento sobre o que havia acontecido, ou ele teria certeza absoluta do envolvimento de Daniel na história.

— É, quem sabe você descobre - Incentivei, como se realmente houvesse alguma chance.

— E você, como está?— Pareceu, pela primeira vez na conversa, desviar sua atenção totalmente para mim - Ainda tá com aquele marginal?

Bufei. Não deixaria ninguém falar daquele jeito sobre Daniel.

— Jason, Daniel é meu amigo. Se não se importa, gostaria que se referisse a ele pelo nome - Chamei sua atenção da forma mais educada que consegui.

— Erro meu— De imediato, ele admitiu, demonstrando sinceridade no tom de voz - Desculpa. Aliás, eu tenho que me desculpar pelo outro dia... não quis parecer um babaca machista te tratando como objeto, nem nada assim.

— Imagina, nós dois estávamos a mil por causa do acidente com a Claire. Já passou.

— Eu sei, mas...— Ele hesitava como se estivesse nervoso - queria saber se a nossa saída ainda está de pé. Quer dizer, eu não gostei nem um pouco da ideia de te ver com outro cara. Foi por isso que fiz aquela idiotice. Mas quero ter certeza de que você ainda não me descartou de vez.

Suspirei um tanto relutante em lhe dizer a verdade. Não era uma questão de ter descartado ele de vez, e sim o ponto em que você não sabe se tá dispensando um cara por não poder sair com ele, ou simplesmente por não querer.

Eu sabia que tinha o direito de recusar, mas me sentia mal em portar essas notícias. Jay não merecia. Decidi explicar para ele meu dilema.

— Jason, você é um cara muito legal e...

— Tá tudo bem. Não precisa terminar a frase, eu já entendi.— Fui impedida de completar o discurso por um Jason que soava cansado e até um pouco triste - A gente fica melhor como amigos.

— Não é o que eu ia dizer - Falei logo após um longo suspiro. Não gostava da ideia de entristecer alguém tão bom quanto ele, nem de longe.

— Lizzie, eu entendo.— Mais uma vez, me interrompeu - Daniel é o bad boy, o cara misterioso, durão, que adora uma adrenalina e eu sou só o cara que, no máximo, vai te proporcionar umas voltas de Harley pela cidade. Eu sou o cara legal e seguro. Eu realmente entendo.

Jason parecia profundamente magoado, ao menos por sua voz. O pior de tudo é que, mesmo soando ferido, ele parecia querer soar conformado, como se não quisesse que eu me preocupasse.

— Jay... - Apelei, mas pelo visto Jason não me deu o direito de réplica.

Tu, tu, tu...

Bufei, insatisfeita. Não queria deixá-lo tão triste. Não era justo, até porque ele era primo da minha única amiga na cidade, então nossos encontros deveriam ser constantes. Não me agradava a ideia de conviver com ele naquele clima chato.

Com raiva, agarrei o celular e o lancei contra a parede mais próxima, ouvindo o barulho da colisão e, em seguida, das peças se desmontando no chão.

— Lizzie? - Uma voz infantil e preocupada me surpreendeu.

Assustada, olhei para a porta praticamente num pulo, onde um Tom quase tão perplexo quanto eu me encarava de volta. Seus cabelos encaracolados estavam mais bagunçados do que ontem, o que, se somado aos olhinhos pequenos e azulados cheios de remela, me davam uma boa base para acreditar que ele havia acordado há pouco tempo.

— Hey, Tom! Não sabia que você já tinha acordado, garotão - Tentei soar com naturalidade, vestindo um sorriso amarelo e mexendo no cabelo.

— Não se preocupe, eu sempre levanto antes do Daniel e venho aqui acordar ele - Tom respondeu com um sorriso, sem parecer se importar muito com meu pequeno surto.

Soltei um suspiro em alívio. Em seguida, sorri, imaginando como ele deveria acordar Daniel. Provavelmente, as manhãs daquela casa eram mais animadas e divertidas do que eu imaginava. Os dois deviam se dar muito bem mesmo...

— Parece um despertador bem mais legal - Comentei.

— Você parece triste - Tom afirmou, parecendo ignorar o que eu havia dito.

Respirei fundo e forcei um sorriso. Ele era realmente bom com emoções.

— Eu não tô, é que... - Tentei explicar, mas meu olhar baixo acabou encontrando justamente as peças espalhadas do celular perto do pé da cama - Bem, digamos que eu tenho amigos complicados.

— Te entendo - O pequenino falou, em tom sério - Meus amigos também são muito complicados.

Eu ri da última parte. Pelo visto, nossas definições de complicado deveriam ser diferentes.

— Ah, é? E por quê? - Demonstrei interesse, aproximando-me dele e finalmente me distraindo um pouco depois da ligação tensa com Jason.

— Porque a gente quase nunca se vê. Eles moram na rua lá embaixo, mas o Daniel nunca me deixa descer - Explicou, fazendo um biquinho e franzindo as sobrancelhas ao fim.

Me esforcei para não rir da sua cara de coitado, o que foi realmente difícil, já que Tom era um excelente ator.

— Hm, então é uma pena que o Daniel não esteja aqui pra impedir a gente de ir lá pra baixo, né?

Imediatamente, seus olhinhos se encontraram com os meus num brilho estonteante e um sorriso tão grande que fazia seus dentes, um pouco salientes, parecerem normais.

— Você tá falando sério? - Perguntou com a maior alegria do mundo.

— Aham. Eu sou uma adulta, então ele não pode brigar comigo, né? - Respondi bagunçando seu cabelo com uma das duas mãos, o que provocou um aumento no sorriso dele.

— Lizzie, você é muito maneira! - Exclamou.

Ri com suas observações e me abaixei até ficar do seu tamanho.

— As outras garotas que o Daniel traz pra casa não descem com você?

Talvez minha intenção não fosse exatamente perguntar isso. Mas saiu tão involuntariamente que quando percebi, o pequeno já estava elaborando sua resposta.

— Que outras garotas? A Sophie é a única garota que já veio aqui além de você - Contou-me, com sinceridade.

Não que o passado de Daniel me importasse muito, ou sua vida amorosa antes de me conhecer, afinal, já havia ficado tudo para trás mesmo, e para ser mais exata, esse assunto não era da minha conta... mas ouvir aquelas simples palavras da boca de seu irmão me geraram um sorriso automático que acompanhou aquela doce e rara sensação de ser especial para alguém. Parecia até um pouco de loucura acreditar nisso, mas, por alguns segundos, eu gostei da ideia de ser especial para o Daniel.

******(parte contada no capítulo do boymagia)******

Daniel estava estranho. Definitivamente, estranho. Não conseguia pensar em outra palavra para caracterizá-lo no momento. Considerando que o saldo do dia já continha dois beijos, eu me sentia no direito de afirmar essa estranheza toda.

De alguma forma, eu também não conseguiria imaginar a sequência do dia acontecendo tão naturalmente quanto havia acontecido com aqueles dois beijos, uma proposta de encontro e vários sorrisos bobos e olhares muito sugestivos durante o almoço. Parecia tudo sincronizado, perfeito. Tão perfeito que eu não soube sequer dizer não aos beijos, ao encontro ou mesmo desviar o olhar e não sorrir de volta para ele. Pelo contrário, eu não só permiti que ele houvesse feito tudo aquilo, como também gostei que fizesse.

Mas parecia errado. Tinha que estar errado. Como naquele ditado que diz algo sobre o santo desconfiar quando a oferta é muito alta. Não fazia sentido, ao menos na minha cabeça, ter um dia ao lado de Daniel sem ter que brigar com ele para que o dia fosse ao menos suportável. No entanto, era exatamente o que estava acontecendo.

E eu queria perguntar a ele, perguntar o motivo de tudo aquilo, por que estava me tratando tão bem e tornando aquele dia tão diferente dos outros do jeito mais maravilhoso possível. Por um segundo, cheguei a pensar que ele tivesse descoberto um câncer e, assim, tivesse tomado a decisão de tornar nossa convivência mais fácil. Para ser ainda mais sincera, eu tinha medo de perguntar e essa ser justamente a resposta.

Por isso, preferi apenas levar o dia com a maior naturalidade e calma possível, gravando na cabeça cada momento com ele e o pequeno Tom. Eu não podia, em nenhuma hipótese, esquecer de como tudo estava se desenrolando de uma forma tão rápida, contudo, tão espontânea, como se estivesse escrito há séculos que deveria acontecer exatamente daquela maneira.

Sinceramente, era como eu queria pensar. Relevar a razão que fazia Daniel agir daquela maneira e simplesmente aproveitar que aquilo estivesse acontecendo.

Cada olhar trocado, que já me provavam que seus olhos agora eram muito mais azuis do que cinzas, pois eu já podia olhar para eles e saber, lá no fundo, o que se passava na cabeça de Daniel, como se ele tivesse se transformado em alguém mais acessível, mais expressivo perto de mim. Os toques em suas mãos sujas de gordura enquanto devorávamos os hambúrgueres que ele havia trazido e gargalhávamos com as descobertas científicas engraçadas que Tom contava durante a refeição, como o toque simples e despretensioso que dois amigos de infância trocam apenas para sentirem-se um mais perto do outro.

E o mais inquietante de tudo era olhar para ele e não enxergar um pingo sequer de hesitação ou segundos pensamentos passando por sua mente, mas, do contrário, eu sabia que ele estava sendo o mais puro e verdadeiro que podia. Aparentemente, minhas primeiras impressões sobre ele ser um cubo mágico ambulante eram bem precisas. Aquele rapaz de olhos azuis quase transparentes, cabelo escuro e com iminentes madeixas cacheadas, que lhe davam um tom desleixado, mas muito sexy e um par de covinhas divertidas era o maior paradoxo ambulante que eu já havia visto em toda a minha vida.

— Daí eu consegui terminar, finalmente, meu livro de explorador dos animais! - Tom completou, animado, alguma história aleatória que estava contando sem que eu prestasse a mínima atenção.

De fato, estava tão absorta em Daniel e seu comportamento mais atencioso e espontâneo do que em qualquer outro dia, que não fazia a menor questão de ao menos fingir me ater às conversas de Tom.

— Uau, parabéns, maninho! - Daniel exclamou, em seguida, trocando um high five com seu irmão.

O mais velho olhou para mim e pareceu sentir minha curiosidade e inquietude em relação a tudo que estava acontecendo. Virou-se novamente para Tom e sugeriu, com carinho:

— Por que não vai lá pegar o álbum pra gente dar uma olhada?

Tom assentiu e virou sua pequena cadeira de rodas para a direção dos quartos, seguindo-a com a maior rapidez que podia.

— Mas não se esqueça de lavar as mãos antes de pegar no livro; você acabou de comer! - Alertou seu irmão mais velho em tom paterno.

À essa altura, eu mais ouvia do que prestava atenção aos fatos.

Daniel riu assim que me encarou e percebeu o quão alheia eu estava.

— Finalmente sós... - Falou tão baixo que mais parecia um sussurro.

Eu ainda o encarava apenas com um sorriso, sem uma palavra sequer.

Daniel pôs sua mão em cima da mesa e, com calma, traçou o caminho até segurar a minha pela ponta dos meus dedos.

— Escuta, Lizzie, eu preciso te fazer umas perguntas antes do Tom voltar.

Minha boca se abriu num perfeito '0'. Ele não podia estar falando sério.

— Você me beija, diz que temos um encontro, me beija de novo, sorri pra mim o almoço inteiro, segura minha mão, me alimenta com o melhor hambúrguer que eu já comi na vida e ainda acha que você que faz as perguntas por aqui? - Falei com bom humor, mas ainda um pouco de perplexidade na voz.

Daniel riu e jogou a cabeça para trás, brincalhão.

— Tudo bem, é só uma pergunta. Pode ser? Só uma? Depois você pode perguntar o que quiser...

Enquanto falava, seus dedos gelados acariciavam os meus e se aproximavam lentamente do meu pulso.

Assenti com a cabeça para que ele fosse em frente.

— Garota... - Começou, em tom sério pela primeira vez no dia - Eu realmente preciso saber só uma coisa de você - Outra pausa, dessa vez, para respirar fundo e desviar o olhar algumas vezes - Por que veio comigo até aqui?

Ele apertava meus dedos, como se procurasse as melhores palavras para se expressar.

— Por que não me deixou morrer quando viu que os russos estavam comigo, por que me ajudou e por que ficou comigo até agora? Quer dizer, você podia ter desistido de mim em qualquer momento, mas... - Seus pés, inquietos, se balançavam na parte de baixo da mesa, eu podia sentir - Por que escolheu ficar, Lizzie?

Agora, seu olhar profundo me encarava como se Daniel esperasse a resposta do século. A resposta de um milhão de dólares. Aquela que, quando parei para pensar, percebi que não havia uma frase pronta para definir, talvez até porque eu jamais tivesse pensado naquilo com tanta seriedade quanto ele pareceu enfatizar naquele momento.

Segurei seus dedos com a mesma força que ele acariciava os meus, para que se sentisse seguro e tivesse a certeza de que eu também dava importância àquele assunto. O assunto nós.

— Bem... - Tentei começar, procurando as palavras que pareciam sumir - Eu nunca pensei nisso, para ser sincera.

Seus olhos azuis não demonstravam nenhum tipo de desapontamento com a minha resposta, mas claramente ele queria ouvir mais. O tipo de coisa que eu não sabia se estava realmente pronta para falar.

Então, simplesmente fechei os olhos e apertei sua mão, como se aquilo fosse suficiente para me guiar numa resposta à sua pergunta de um milhão de dólares.

— Honestamente, Daniel, eu não conseguia acreditar que um cara tão prepotente e ridiculamente arrogante, o que você realmente é, mas de um jeito bom, pudesse me ajudar quando o Brian me agarrou na festa. No início, eu só estava curiosa mesmo. Você era intrigante, um mistério com pernas e covinhas, na melhor definição possível. Tinha me mostrado o primeiro ato de gentileza quando cheguei na cidade, então eu segui meus instintos. Te ajudei, confiei em você... Não acreditava que você pudesse ser tão ruim. Pura curiosidade e instinto. Depois, se transformou em algo que eu não sei bem dizer. Ir atrás de você quando tava bêbado chamando meu nome, passar um dia bancando o casal de turistas na cidade em que você cresceu, visitar seu teatro preferido, tudo isso eu não sei bem por que aconteceu - Falei, naturalmente.

Me sentia tão exposta dizendo toda a verdade que não conseguia abrir os olhos desde que começara a falar. Tomei uma boa quantia de ar antes de retomar a fala.

— Foi como se eu visse além do que todo mundo via. O Ben, o Jason, a Claire, todos eles te enxergam como o traficante que você é, um cara que não pode ser boa companhia pra ninguém e mantém distância de todos, mas eu não consigo ver assim - Lentamente, abri os olhos com uma expressão tímida, deparando-me com um Daniel de olhar angelical e boca entreaberta - Eu não consigo ver nenhum rótulo em você, nenhum julgamento, tudo o que eu vejo é... o Daniel. O cara que recita Shakespeare, levou quase um mês pra aprender meu nome, que sempre entorta o nariz quando se irrita, tem um perspicácia de dar inveja e come torradas nojentas afundadas no iogurte.

Ambos demos uma pausa para rir nesse momento, até que o silêncio pairou e Daniel fitava meus olhos verdes sem ter uma reação sólida.

— Eu não sei, Daniel - Iniciei uma conclusão tão precisa quanto o olhar dele - Tudo o que eu sei é que começou apenas como curiosidade, dúvida, mas já não é mais isso. Eu vi uma luz em você. Uma luz que mais ninguém podia ver, só eu. Por isso eu nunca fui embora, porque eu sentia, desde o começo, que você valia a pena. E se eu não lutasse para provar isso pra mim mesma e até para você, ninguém mais faria.

Abaixei o olhar ao passo que minha mão também afrouxava a força com que segurava a dele. Esperava ter sido o mais clara possível, porque não me lembrava a última vez que fui tão sincera com alguém como acabara de ser com Daniel naquele instante.

— Lizzie, isso é... - Ele balbuciou com as pupilas dilatadas, parecendo ter dificuldade para articular as palavras.

Parecia muito feliz, para dizer a verdade. Sorri para ele e brinquei com seus dedos um pouco. Queria que ele sentisse o quanto eu havia me aberto e valorizasse aquilo.

Puxei uma lufada de ar para dizer mais alguma coisa, mas fomos ambos surpreendidos por um Tom alegre e esperto que adentrou a cozinha com um enorme livro amarelo em seu colo.

Daniel olhou para ele e em seguida para mim. Entendi que continuaríamos a conversa depois, mas, felizmente, só por ter dito aquilo tudo eu já me sentia uns quinze quilos mais leve. Por causa disso, o resto do dia seguiu exatamente como havia começado: inesperadamente bom e natural.

**********************************

Teatro Mayflower.

Foi a primeira coisa que li ao levantar os olhos ainda dentro da luxuosa limousine que Daniel havia contratado para me conduzir até nosso destino final, assim que esta parou perto do meio fio. Sorri ao notar que ele tinha planejado aquela noite tão cuidadosamente a ponto de escolher com cautela até mesmo o local em que seria nosso primeiro encontro.

Quando tomei ar para perguntar ao motorista se era ali mesmo que eu deveria ficar, ouço a porta do carro se abrir e o homem de meia idade e pele morena que me conduzira até lá sair pela mesma e caminhar até a porta de trás que estava mais perto de mim.

— Srta. Peters - Falou ele assim que a abriu e estendeu uma de suas mãos para me ajudar a sair do carro.

Quanta gentileza! O tipo de coisa que geralmente não constava na minha rotina, primeiramente por não comparecer a muitas ocasiões chiques e em segundo lugar por não ter dinheiro para pagar por esse tipo de tratamento.

Peguei sua mão e logo desci do automóvel, sentindo uma leve dificuldade para ajeitar o vestido e sua calda fora do carro.

LINK DO VESTIDO DA LIZZIE NAS NOTAS FINAIS

O sapato também estava de matar, é claro, afinal, o que são 15 centímetros pra quem nunca tira o all star do pé, não é mesmo? Ainda assim, eu não queria tirar aquele par de saltos maravilhosos que estava usando e um dos motivos era por estar me sentindo extremamente linda e poderosa. O outro, era que eu provavelmente nunca tinha usado peças tão caras em toda a minha vida. Então, tinha de fazer questão que todos aqueles segundos usando uma roupa estilosa e um sapato de marca iriam valer à pena.

Dispensei o motorista com um sorriso e um singelo agradecimento e respirei fundo ao vê-lo partir. É agora, Eliza. Você está sozinha. Mas vai ser uma ótima noite. Tem que ser.

Sorri para mim mesma depois de soltar o fôlego e relaxei. Com algumas pessoas olhando para mim, todas bem vestidas assim como eu estava, senti que era a hora de entrar. Iria facilitar muito se um pianista estivesse lá para tocar a marcha imperial do Darth Vader só pra dar aquele ar triunfal à minha entrada, mas aí seria pedir demais.

Apenas dei alguns passos para a frente - meio desajeitados devido à falta de costume, confesso - e fui saudada por dois monstros de porte Arnold Schwarzenegger parados um de cada lado do portão do teatro. Sorri para eles e entrei em seguida, me deparando com um saguão em tons amarelados de mármore repleto de homens - em sua maioria, na casa dos 30 ou 40 -, todos de gravata e com rostos cansados, como se tivessem as vidas mais comuns, monótonas e intelectuais da Inglaterra. As mulheres usavam vestidos de dar inveja que pareciam ter sido desenhados pelos anjos, ostentando olhares mesquinhos e elitistas que pairavam uns 10 ou 15 centímetros mais altos por causa dos saltos que usavam. A maioria usava cabelos presos, como eu, mas ao contrário de mim, que nunca gostei de coques e penteados muito 'apertados', elas pareciam ter todas as células de colágeno do rosto esticadas para trás junto com o cabelo. Segurei o riso ao ter esse pensamento.

Não era de praxe para mim pertencer a um evento que só a elite inglesa tinha acesso. Imaginei o quanto Daniel deveria ter pago pelos ingressos, especialmente por ter ido atrás deles sem nenhuma antecedência.

O saguão do teatro era, deveras, muito lindo. Me culpei por não ter dado a mínima para ele da primeira vez que havia passado por ali. As enormes colunas altas, também de mármore, me davam a sensação de estar visitando a Grécia Antiga, o que as paredes de tom envelhecido ajudavam a imaginar. Já o teto tinha uma daquelas pinturas belíssimas com mulheres nuas no céu tocando harpas e pequenos anjos bebês com seus respectivos bumbuns à mostra.

Até os anjinhos eu tinha encontrado, mas nada de Daniel. Suspirei e olhei para cada um dos lados, sem enxergar nem sombra dele. No entanto, achei um pequeno balcão que servia bebidas para os convidados e não estava muito afastado de mim.

Por algum instinto, pensei que fosse encontrá-lo ali. Então, dei os primeiros passos naquela direção. Ao caminhar, sentia que estava atraindo alguns olhares tanto de homens quanto de mulheres. Não sabia ao certo se era por causa do vestido estonteante, do penteado um tanto desleixado, dos passos meio tortos, da ausência de maquiagem numa noite de gala, o olhar inseguro ou simplesmente porque todos esses fatores formavam uma combinação interessante de uma Eliza que eu não estava acostumada a ver, mas gostava muito de interpretar.

Ao caminhar um pouquinho mais, pude visualizar bem três homens de pé ao lado do balcão do bar, com uma enorme adega de vinhos suspensa sobre ambos. O primeiro, um baixinho com uns quilos a mais e uma massa capilar ruiva, mas escassa. Ele batia os pés como se tivesse pressa. O segundo, um homem negro que parecia um jogador de basquete por ter mais de 2 metros e porte atlético. Sua careca brilhava e ele dedilhava o balcão como se fosse um piano. Já o terceiro e último, um homem cuja altura se estabilizava entre as dos outros dois, esperava sua bebida com uma postura torta, apoiando uma perna na outra de modo irreverente como se tivesse a noite toda para ficar ali. Seus cabelos castanhos que antes tiveram leves cachos se formando, agora apresentavam um estilo mais curto, um corte quase militar, bem baixinho, no entanto muito elegante. Daniel.

LINKS DO CABELO DO DANNY NAS NOTAS FINAIS

Sorrindo, caminhei até ele, que não havia me visto ainda, e fiquei parada por alguns segundos, separada de seu elegante smoking azul marinho por alguns centímetros. Esperei o bartender lhe atender, um martini duplo que Daniel havia pedido há poucos segundos, e assim que o funcionário pôs a bebida na mesa, deslizei o braço com delicadeza à frente do meu acompanhante segurando seu dry martini com uma das mãos.

Imediatamente, ele se virou para mim com uma expressão confusa, mas que se desfez quando me analisou de cima à baixo e me identificou. Seus olhos, arregalados, mostravam que de alguma forma, eu o havia surpreendido, enquanto seus lábios que se abriam lentamente me davam a certeza de que a surpresa havia sido agradável.

Sorri de um jeito sexy para Daniel e com o mesmo impulso, toquei com carinho em seu queixo a fim de fechar sua boca entreaberta.

— Smoking azul e grava borboleta preta. Minha favorita - Comentei analisando cautelosamente cada detalhe de seu traje. Ele estava lindo como nunca - Você é, de fato, um homem muito estiloso, sr. Woods - Atestei, mexendo em sua adorável gravata negra.

(Look do boy: http://americasuits.com/image/cache/data/Ryan%20Gosling%20Blue%20Tuxedo/Ryan%20Gosling%20Blue%20Tuxedo%2001-800x800.jpg)

Mais uma vez, vê-lo numa roupa azul me fez perceber o quanto ele tinha olhos lindos. Adorava quando Daniel decidia ressaltar isso por meio de suas vestes. Mas, no momento, tanto os olhos quanto o corte militar de seu cabelo, a barba feita e o belo e ousado smoking que ele vestia pareciam se transformar numa pintura completamente hipnotizante. O tipo de cena que faz com que você se sinta envolvida por um homem simplesmente por olhar para ele. Especialmente quando seus lábios se desenham num sorriso apaixonado, o que acabara de acontecer.

— E você, srta. Peters, está me tentando a não lhe colocar agora mesmo num carro e fazer coisas terríveis com a senhorita - Falou ele com uma ousadia sobrecomum que, somada à sua incrível mordida de lábios, me fizeram corar, mas principalmente me sentir desejada.

— Sr. Woods, você está permitido a guardar seus instintos e hormônios apenas para si mesmo - Sorri, tentando soar natural com uma dose de humor.

Não estava acostumada com aquele tipo de olhar vindo de um homem, especialmente por ser um homem com a cara e o corpo do Daniel.

— Ok, srta. Politicamente correta - Disse jogando as mãos para o alto em rendição - Só gostaria de ressaltar que me arrependo de não ter feito coisas terríveis à senhorita quando estávamos os dois deitados numa cama de motel.

Ri da situação. Incrivelmente, estava adorando aquele joguinho com uma certa tensão sexual em jogo.

— Sabe de uma coisa, sr. Woods, eu até poderia lhe deixar fazer coisas terríveis a mim se o sr. não fosse um completo idiota. Às vezes.

Ele riu com o nariz em resposta, conservando o tom sensual do diálogo.

— Quem vê a srta. falando assim, até pode pensar que não era você quem estava ontem na banheira implorando para fazermos coisas obscenas.

Cheque mate. Não que a noite passada houvesse sido assim tão vergonhosa, mas eu não me orgulhava de ter me jogado para cima de Daniel completamente bêbada. Minhas bochechas ruborizaram violentamente quando me recordei, aos poucos, dessa e de mais outras cenas da noite anterior. Uma delas, a bela visão de Daniel vestindo apenas uma camisa e uma cueca box.

— Então você se lembra?! - Exclamou, soltando uma gargalhada elegante e contida ao observar minha reação.

— Vergonhosamente, sim. - Confessei, frustrada.

— Não precisa se envergonhar, garota. Apenas lembre-se de fazer a mesma coisa quando estiver sóbria, ok? - Piscou um dos olhos para mim e se inclinou para mais perto de um jeito dominante.

Ele conseguia ser muito sexy quando queria. E, enxergava o mesmo em mim, a julgar pelo olhar que me lançava por saber que eu compartilhava dos mesmos desejos.

Eu sabia exatamente o que ele queria fazer comigo, até porque eu também queria. Tinha vontade de experimentar o Daniel na forma mais ampla que essa frase possa ser interpretada. Eu queria sentir como era ter alguém se entregando para você enquanto a entrega também se dá do seu lado da história, mas eu não poderia fazer isso com ninguém menos do que Daniel Woods.

Suspirei por desejar que essa ideia fosse mútua.

— Eu acho que um de nós já bebeu martinis o suficiente por hoje - Atestei, obtendo uma risada sem humor em resposta.

Poucos segundos depois, Daniel retomou o diálogo já sem tanta sexualidade em seus gestos.

— Lizzie?

Olhei para ele, garantindo-lhe toda a minha atenção.

— Toda aquela história que você me contou hoje à tarde, sobre ter visto uma luz em mim e tudo mais... aquilo tudo era verdade? - Indagou com as mãos demonstrando extremo nervosismo.

Sorri com ternura. Ele realmente não estava acostumado com alguém falando coisas boas sobre si. Por isso, toquei em seu braço e fiz um pouco de carinho, para que ele sentisse que aquilo tudo era real para mim. Em seguida, assenti positivamente com a cabeça.

— Eu só quero que saiba que foi uma das coisas mais bonitas que alguém já disse sobre mim. Obrigado.

— Todo esse tempo, você tem me provado que não é quem eu realmente achei que era. De um jeito bom - Tomei mais fôlego - Eu só quero estar certa de que você é o homem que está aqui comigo hoje à noite, e não o cara que eu ouvi quando cheguei aqui.
De imediato, Daniel tomou minha mão e começou a beijou, num gesto que, subjetivamente, me dizia que ele não queria de forma alguma que eu o visse como o cara mau que todos diziam que ele era. Em seguida, ele começou a acariciar minha mão com delicadeza. Eu não sabia até aquela noite, mas gostava muito daquele tipo de carinho.

— E você está certa. Eu vou provar isso, eu prometo, Lizzie.
Abri o sorriso, dando total crédito às palavras dele. Eu soube, naquele instante exatamente, que se ele pudesse girar o mundo de ponta-cabeça apenas para que eu tivesse certeza de que ele era bom, ele o faria.
Mas eu sentia que também precisava passar uma certa impressão para ele, só que não da mesma forma. Enquanto ele queria que eu o visse como o bom homem que eu tinha certeza que ele era, eu queria que ele me visse como mulher também. Simplesmente mulher. Não uma adolescente mal saída do ensino médio que só sabia o nome de duas bebidas antes de conhecê-lo. Eu queria sentir que podia provocá-lo e que podia fazê-lo olhar para mim de uma forma, no mínimo, diferente.
Por isso, num ímpeto desse desejo, tomei um generoso gole do martini que ainda estava segurando.
Poucos segundos depois, me arrependi amargamente.
— Meu Deus, isso é terrível! - Praguejei, esforçando-me para não cuspir tudo em cima de Daniel.
O drink era tão forte que começou a arder no segundo que minha língua o encostou. Senti tudo o hambúrguer do almoço se remexer no meu estômago e podia jurar que ele sairia a qualquer segundo pela saída mais próxima.
Meu rosto, que agora apresentava uma Lizzie completamente enojada e praticamente passando mal, demonstrava o quanto minhas intenções haviam sido reversamente correspondidas.

— Você saberia se conhecesse o mínimo de bebidas, garota - Daniel reclamou num tom completamente insatisfeito e de censura. Aparentemente, havia reprovado em último grau minha atitude - Martini é só para veteranos - Concluiu, tomando um gole no mínimo três vezes maior do que eu havia tomado sem que suas linhas de expressão mostrassem qualquer incômodo.
Definitivamente, ele era um veterano e não eu. E sabia como encarar uma bebida daquelas, diferente de mim.
Frustrada, bufei e cruzei os braços. Queria tanto provocá-lo que havia, no máximo, conseguido deixá-lo chateado comigo e alterar minha imagem para algo ainda mais infantil do que antes.
Enquanto bebericava seu drink, Daniel me olhar com certa curiosidade a julgar pelas sobrancelhas tortas.
— Você não fez isso só pra me... - Então seus olhos passaram de extremamente confusos para simplificados em questão de segundos. Ele havia entendido a situação do meu ponto de vista - Lizzie, eu gosto de você exatamente do jeito que é! - Exclamou, como se eu houvesse agido de maneira completamente repugnante - Eu não quero que você faça nada pra me agradar, eu só quero que seja você. Não precisa fingir nada pra mim... - Terminou, um pouco mais calmo.
Completamente frustrada, tomei ar e decidi me recompor como se aquilo não houvesse acontecido. Era vergonhoso demais...
— Bem, já que eu não sei absolutamente nada sobre bebidas - Desconversei -, que tal a gente falar de algum assunto que eu realmente entenda?
— Tipo...? - Indagou ele, bebericando o martini aparentemente disposto a esquecer o que quer que eu houvesse feito.
Levantei os olhos e pensei por alguns segundos, até retornar o olhar para Daniel em minha típica vivacidade e brilho no olhar. Animada, sugeri o primeiro assunto que me passou pela cabeça.
— Tipo política.
Ele franziu a testa e riu um tanto desconsertado, um tanto assustado, pelo visto.
— Está falando sério?
Suspirei no mesmo segundo em que rolei os olhos.
— Por que você acha que eu não tenho amigos? - Retruquei mesclando um tom trágico e cômico - Em Birmingham, eu era tão solitária que gastava todo o meu tempo lendo sobre coisas que ninguém no mundo se interessa. Tipo política - Expliquei.
Daniel arqueou as sobrancelhas em resposta. Parecia surpreso num bom sentido.
— Eu curto política.
Sorri para ele, que dava mais um ou dois goles em sua bebida.
— Esquerda ou direita? - Perguntei, em seguida.
Daniel não hesitou em responder:
— Muito binário - Disparou - Não gosto de me definir em sistemas pré estabelecidos, acredito que... posso ter minhas próprias convicções sozinho. Sem precisar me filiar a nenhum sistema ou modelo que alguém criou antes de mim.
As palavras que ele havia usado eram praticamente as mesmas que eu usaria para responder a mesma pergunta. Estava começando a gostar dos novos rumos do nosso diálogo.
— Definição perfeita - Comentei.
— Assistencialismo? - Ele perguntou, com um sorriso convencido no rosto.
— Muitos acham uma praga, mas não enxergam o quanto é necessário. Quer dizer, ninguém percebe que o assistencialismo existe, justamente, para que não precise mais existir um dia. É um modo desigual de gerar igualdade, digamos assim. - Explanei meu ponto de vista.
Daniel levantou uma das sobrancelhas.
— Uau... Estou saindo com a garota mais inteligente da casa - Piscou um dos olhos de maneira incrivelmente sedutora para mim, com a boca já encostada em sua taça de martini.
Sorri em resposta. Eu gostava tanto de conversar sobre assuntos relevantes como política, esportes e sociedade que o simples fato de estar conversando com Daniel sobre isso me gerava faíscas. E ser reconhecida por ele de uma maneira intelectual, mas ao mesmo tempo galanteadora, me fazia sentir como se eu estivesse brilhando naquele salão.
— Que sorte a minha - Atestou mo moreno de atraente corte de cabelo militar.
— Estamos na Europa... O berço de Locke, Hobbes, Rousseau, Montesquieu, Churchill, Durkheim, Francis Bacon... - Me perdia citando tantos pensadores incríveis, alguns do meu próprio país e outros de terras próximas - Eu seria idiota se não gostasse de política - Respondi com modéstia.
— Que bom que citou Locke. Às vezes eu penso nele e lhe imagino como um completo infeliz - Ele falou e eu o encarei um tanto confusa, esperando uma boa justificativa - O cara era tão intelectual que devia falar com palavreado técnico até na cama - Brincou com uma pitada de humor ácido, me provocando severas risadas.
— Você é terrível - Exclamei dando-lhe um tapa no ombro.
— A vida é terrível - Replicou, tomando o último gole do seu drink e me encarando com seus fascinantes olhos cor de céu em seguida - Só que às vezes melhora quando você vai ao teatro com uma bela mulher.
Lisonjeada, eu sorri. Estava me sentindo completamente especial naquela noite. Mas depois da piada que Daniel havia feito sobre Locke e sua trágica vida sexual, eu só conseguia pensar em quantas vezes ele poderia ter contado aquela piada para várias garotas diferentes. Ainda mais, porque ele tinha uma vida sexual e eu não sabia nem por onde isso começava. Eu era nova com as bebidas, com a sexualidade, até mesmo com o meu número de anos, mas Daniel parecia ter todas as respostas para perguntas que eu nem havia começado a perguntar sobre a vida.
Tentei, o mais rápido possível, espantar essas ideias para não estragar a noite.
— E o que exatamente viemos fazer no teatro, sr. Woods? - Indaguei, admitindo que já estávamos ali com umas 300 pessoas no saguão há um bom tempo.
— Shakespeare, Noite de Reis. Uma das minhas peças preferidas.
Um sorriso brotou no meu rosto com a notícia. Noite de Reis também era uma das obras shakespearianas que eu mais gostava. Além de cair perfeitamente para a noite. Só me chateava um pouco a ideia de que a peça ainda fosse demorar para começar.
— E o que a gente faz enquanto não começa? - Perguntei.
Observei que, ao nosso lado esquerdo, alguns casais juntavam-se para dançar ao som da música ambiente do salão. Felizmente, Daniel parecia não ter visto a mesma cena. Odiaria que ele sugerisse uma dança, algo que eu não teria como negar. Por isso, esperava que ele tivesse qualquer outra ideia para passarmos nosso tempo.
E, a julgar por seu olhar maroto, ele tinha o plano perfeito.
— Me espera aqui - Pediu.
Estranhei e, com as mãos na cintura, observei ele girar o corpo, pegar um guardanapo em cima do balcão do bar e começar a dobrar o papel com uma maestria fora do comum. Curiosa, esperei atenciosamente que ele terminasse sua obra que eu ainda não fazia ideia do que podia ser. Mais alguns segundos e suas dobraduras haviam ganhado volume, formato e textura. Ele olhava para a peça de papel em sua mão e depois para mim, como se tomasse inspiração no meu rosto e a usasse para terminar o origami. Ri com essa possibilidade.
Menos de um minuto depois, ele estendeu sua mão com uma rosa perfeitamente encorpada feita com um guardanapo barato, mas que tinha a aparência de uma obra de arte.
— Essa aí você pode cheirar à vontade, garota - Brincou.
Um sorriso de ponta a ponta se estendeu no meu rosto quando vi que ele fazia menção de dar a rosa para mim. Eu a segurei e levei a mesma até o nariz, como se ela tivesse algum odor natural e nós dois rimos.
Como ele era capaz de me fazer sentir a garota mais especial da Inglaterra com apenas um pedaço de papel era um mistério que eu ainda ia resolver.
— Então é assim? Você leva todas para uma peça do Shakespeare, faz um origami e elas se derretem? - Brinquei deixando transparecer um pouco da minha insegurança, mas que já não afetava tanto meu humor. Ao contrário de Daniel, que pareceu sentir-se ofendido com a brincadeira e não parecia interpretá-la como tal.
— Não costumo sair muito, se foi isso que quis insinuar - Retrucou com rispidez.
Respirei fundo e olhei para o chão. Não queria que ele interpretasse meu comentário como maldoso acerca de sua vida pessoal
— Desculpe - Pedi, sinceramente, tomando o ar necessário para resumir o que estava sentindo - É que... este é o primeiro primeiro encontro de toda a minha vida. Não gosto de pensar que estou saindo com alguém que já fez isso com todas as outras garotas da cidade.
Se isso parecia ridículo enquanto eu pensava, soava trinta vezes pior quando eu falava. Parecia uma preocupação infantil, mas que me assolava especialmente por eu não saber nada sobre a vida. E era agravado pelo fato de eu não ser nem mesmo uma parceira em potencial para Daniel. Mas ele não pareceu se irritar ou chatear em momento algum.
— Na verdade, só saí com metade da cidade. - Brincou.
Com um "isso não tem graça" escrito bem grande na minha testa, cruzei os braços e o encarei sem um pingo de humor.
Daniel fechou suas feições e procurou pela minha mão, que acariciou com uma ternura descomunal. Com seu toque, ele deixou bem claro que entendia o que eu estava sentindo e não queria fazer graça com isso.
— Desculpe. Se for te deixar melhor, eu acredito que esse é o terceiro ou quarto encontro em que eu vou. Mas é o primeiro em que penso em algo além de me divertir por apenas uma noite - Contou, sinceramente.
De certa forma, saber que ele não estava mentindo para mim era reconfortante. E ouvir sua versão havia me agradado bem mais do que minhas ideias sobre seu passado.
— Caso você não saiba - Ele começou, percebendo que eu ainda estava muito acanhada para iniciar um outro assunto -, a lei dos primeiros encontros diz que temos que dançar pelo menos uma vez na noite.
Arregalei os olhos em espanto.
— O quê? Dançar ali no meio? - Apontei para a pista - Na frente de todo mundo? Eu e você? - Minhas perguntas consecutivas mostravam o quão atônita eu estava, como se considerasse a ideia da dança um absurdo.
De fato, era assim que eu enxergava a situação.
— Claro. O que tem de errado nisso? - Daniel, que via a hipótese com naturalidade, agora me encarava com seu típico sorriso maroto e cheio de planos.
— Daniel, eu não sei dançar! - Protestei batendo o salto no chão - Eu tenho provavelmente 7 pés esquerdos e a coordenação motora de um bêbado! - Pus as mãos na cintura, irredutível.
— Eu tenho certeza de que você é melhor dançando do que cantando - Caçoou das minhas incríveis habilidades vocais - Vamos lá, não pode ser tão ruim! - Insistiu.
Eu olhei para os casais na pista e contei 8 pares. Tá, talvez não fosse mesmo tão ruim, não tinha tanta gente dançando. Mas isso não alterava o fato de eu ser tão boa na dança quanto no canto. O problema é que Daniel ainda não conhecia as proezas que eu poderia fazer com minha coordenação motora deficiente.
— Tá, eu vou - Cedi com um rolar de olhos extremamente desdenhoso -, mas não me culpe se todos ficarem nos olhando pelo resto da noite.
Estrategicamente, Daniel tratou de por em seu rosto um sorriso galanteador e hipnotizado, como se eu fosse a única mulher da noite e me ver dançar fosse praticamente a realização de um sonho seu.
— Garota - Iniciou sua fala com uma tendência muito sensual em seus gestos -, você está tão maravilhosa que todos iam olhar de qualquer jeito.
Ruborizei ao ouvir seu elogio. E também sorri. Não era a melhor para reagir, mas queria que ele soubesse o quanto me deixava feliz de ouvir aquilo.
Logo, Daniel tomou a minha mão ainda com seus olhos arrebatadores focados apenas em mim e fez menção de me levar para o centro da pista. No instante em que nossas mãos se tocaram, mãos que talvez só fossem iguais na cor, já que eu costumava ter a temperatura mais elevada, pele mais macia além de bem menor, notei que a música ambiente havia cessado e uma nova tinha acabado de começar. Sirens, do Pearl Jam, provavelmente minha música preferida de uma banda americana. O toque suave do violão no início da música me convencia que dançar não seria uma ideia tão ruim.
No entanto, por uma coincidência ou ironia do destino, assim que começamos a caminhar para dançar ao som daquela canção, eu pude jurar que ouvi sirenes reais tocarem do lado de fora do teatro. Provavelmente, o som estridente daquele aparelho odioso deveria ter sido apenas na minha cabeça. Contudo, por algum tipo de sétimo ou oitavo sentido, minha espinha dorsal se congelou quando ouvi aquele barulho, como se eu tivesse captado um mau - péssimo - pressentimento. (Nota da autora: gente, é uma situação meio irônica porque SIRENS em inglês significa SIRENES)
Bruscamente, eu parei no meio do caminho fazendo com que Daniel também parasse. Ele me fitou e antes que pudesse perguntar qualquer coisa, eu mesma fiz questão de abrir a boca e, mesmo com aquela má premonição, perguntar:
— Daniel, você tem certeza que tudo está ok?
O moreno deu um sorriso meigo, como se estivesse tentando me acalmar, e agora a mão que ele usava para me guiar até a pista, fazia um suave carinho na parte de trás da minha mão.
— Nada poderia estar melhor, garota - Confirmou, transmitindo para mim toda a segurança que eu precisava para seguir com a primeira dança do primeiro primeiro encontro com o primeiro cara que eu realmente queria dançar na minha vida.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

(LINK DO VESTIDO DA Lizzie: http://i.f1g.fr/media/ext/1900x/madame.lefigaro.fr/sites/default/files/img/2011/03/diaporamaphoto-elie-saab-rf11-3102.jpg)

(GENTEEE, ABAIXA QUE ESSE CORTE DO DANIEL É TIRO, VIU? https://metrouk2.files.wordpress.com/2013/08/ay_115856305.jpg &&&&&&&&& http://41.media.tumblr.com/bdb697f62d0ed4aaddb63d145bc3fd55/tumblr_inline_nsn17kL2tY1safd2x_1280.jpg)


****************************

E aí, meus amores? O que vocês acharam? Porque eu sinceramente adoro esse desenrolar dos dois, eu amo eles demais DEUS ME AJUDA eu só me apaixono por esses dois ♥ hahaha mas sem demorar, vamos pras coisas importantes:
1 - estamos com uma média muuuito legal de leitores, ganhamos 8 a cada capítulo, e eu fico MUITO grata e feliz por isso, logo, obrigada ♥
2 - chegamos a mais ou menos 40% da fic, mas não quero tristeza porque reckless já tem até a segunda temporada CONFIRMADA, e talvez tenha até terceira u.u
3 - o próximo capítulo vai ser menor que o normal, mas ele é SUPER especial, e vai ter POV do Danny de novo, EEEEEEEEEEEEEBA!
4 - sobre o que eu disse dos leitores, infelizmente, muita gente está acompanhando a fic mas não deixa um comentário sequer... por favor, vamos mudar essa realidade, gente, vocês não tem ideia do quanto um comentário de duas linhas já me motiva a escrever milhares e milhares de palavras pra vocês!
Beijos, aguardo as opiniões e até o próximo capítulo que sai em no máximo alguns dias! ♥



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Reckless" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.