Herança escrita por Janus


Capítulo 75
Capítulo 75




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     Conteve um grito de dor quando usou seu antebraço para bloquear o cotovelo da sailor, e novamente ela notou a aura ao redor do cotovelo ficar mais intensa quando ela foi dar o golpe. Girou o corpo para acertar-lhe um chute, que ela prontamente desviou com a perna e dando um salto usou o joelho da outra perna para tentar acertar seu rosto. Esse joelho também ficou com a aura mais intensa. Passou de raspão por seu rosto, mas sentiu o efeito da aura dela, da sailor atingir a sua própria aura.
     Piscava os olhos impressionada sobre como o destino podia gostar de fazer brincadeiras. Fazia eras... milênios que não pensava na vida que tinha antes, antes de perder sua semente estelar, antes de perder a própria alma, antes de desistir de tudo o que ela acreditava.
     Olhar aquela menina lutando contra ela – e sentindo os golpes da mesma – despertou estas lembranças.
     Mestiça sombria. A frase lhe voltou a mente depois de muito tempo. Era como as crianças a chamavam. Doía aquilo. Muito. Não era culpada do que os habitantes de Nêmeses fizeram. Eram seus compatriotas, mas ela nem era nascida quando aquilo aconteceu. Quando nasceu, a guerra entre Metallia e Serenity já tinha começado, e era uma adolescente quando seu pai a levou para morar na capital do novo reino, o Reino da Lua, ou melhor, o Milênio de Prata.
     Deu um salto para trás e novamente reuniu sua negra aura em torno de seu punho. Não acreditava ainda totalmente que aquela adolescente tinha um escudo natural daquele tipo. Saltou para frente mirando o seu rosto, mas no ultimo segundo desviou para o peito. Quase sem surpresa, viu ela primeiro usar a mão esquerda para bloquear o punho que ia ao rosto, e a direita quando desviou para o peito. Ela bloqueou o soco, recebendo todo o impacto da aura negra. Viu a densa aura esverdeada dela dissipar-se na área atingida, e como das outras vezes rapidamente se refez.
     Aquela mercuriana... agora tinha certeza. Não só possuía um escudo anti psíquico ao redor do corpo como ela também era uma empata! Como sua mãe, como ela própria alias. Irônico... o destino parecia ter selecionado a guerreira perfeita para enfrentá-la. Incluindo ai o fato de ser a nova sailor Ariel.
     Sua mãe tinha morrido naquela guerra, mas tinha lhe ensinado a controlar a habilidade natural de seu povo. Pelo menos, da ascensão de sua mãe. Do seu pai aprendeu a ser tolerante com o racismo que enfrentava na Lua. Ser uma mestiça nemesiana e selenita não era fácil. Bom, não era muito fácil para nenhum mestiço naquela época.
     Serenity tinha acabado de fundar o novo reino, estava definindo as leis, os exércitos e tudo o mais que era necessário pra gerir um novo reino, ou melhor, um novo sonho. O sonho dela. E este sonho cativou a todos. Por isso seu pai foi morar na lua. Entre outras coisas lá o racismo era menor.
     Esquivando-se daquela seqüência de golpes – essa menina era mesmo uma adolescente que tinha virado sailor há apenas dois anos? – ela notou que tinha voltado para a estrada, onde tinha deixado a sailor Urano como isca. Felizmente ela tinha ficado quieta, provavelmente impressionada com a habilidade de luta da menina ali. Não agüentava ela ficar gritando para a sailor fugir, para chamar ajuda, para tomar cuidado. Oras... ela estava impressionada! E muito. Tinha tentado primeiro tocar a sailor e usar suas habilidades mentais para criar uma ilusão. Uma grande surpresa ela ser imune devido ao escudo anti psíquico que tinha ao redor do corpo. Depois usou seu poder oriundo dos nemesianos para golpear a aura dela.
     Podia ver claramente que a aura dela era incrivelmente densa e colada rente ao corpo, ao passo que a aura de todos os seres era mais como uma neblina que fica mais tênue afastando-se do corpo. Mas não imaginou que aquela densidade seria um escudo perfeito.
     Claro, ela sem duvida sentia quando golpeava a sua aura, mas sentia tanto quanto um golpe físico normal. Não a debilitava como faria com qualquer outra criatura. E para piorar, ela não só sabia lutar muito bem como parecia ter olhos nas costas. Sabia exatamente onde cada um de seus golpes ia, fazia movimentos que não podia ter planejado previamente.
     E apesar de tudo isso, apesar de poder realmente perder para uma criança, ela... ela estava sorrindo.
     Naquela época, um pouco depois de seu pai morrer, a nova rainha tinha criado um tipo de torneio para selecionar os melhores guerreiros de cada nação. O objetivo era um tanto obscuro, mas parecia que estes seres selecionados iriam ser usados para treinar uma elite de combate que estava sendo formada. A elite iria ser chamada de Sailors Senshi.
     O nome era um tanto estranho, mas com um certo impulso de amigos – especialmente por falarem que ela poderia se vingar de muitos dos que a perturbaram quando criança – ela acabou aceitando. Conseguiu ser uma das selecionadas e logo estava lutando com algumas daquelas sailors. Na pratica ela era uma partner para elas treinarem e se aprimorarem, porem algo interessante aconteceu.
     Deu dois passos e girou o corpo, ela se abaixou escapando da perna e ao se erguer seu punho vinha para o seu queixo. Desviou o punho com sua mão e recebeu uma joelhada no rim. Aquela sailor parecia ter um contra golpe para cada coisa que fazia. Seu corpo já estava doendo e notou que não estava adiantando muito acertá-la. Ela movia a parte do corpo que ia ser atingida para trás, reduzindo o impacto. Se estivesse em uma arena o publico iria estar torcendo pela menina que estava surpreendendo uma veterana com milênios de pratica. Se bem que esta veterana estava lutando naquele momento como da primeira vez.
     Naquelas lutas contra as sailors a titulo de treinamento, algumas daquelas parceiras de luta estavam se destacando e muito, chegando a vencer as sailors muitas vezes. Devido a isso e também pela maioria das que faziam isso serem mestiças – o que estava causando certo incômodo para as sailors que eram de "raça pura" – a rainha chamou todas aquelas que estavam muito destacadas com uma proposta.
     Seu principal poder era nemesiano. Ela podia manipular emoções e a aura, da mesma forma que os venusianos. Podia usar sua aura para atacar seu oponente. Tinha um poder adicional que era psíquico, podia criar ilusões facilmente. Mas sua oponente de agora era imune a poderes psíquicos, tinha uma aura muito densa que a deixava com um escudo natural e era uma empata! Não podia manipular suas emoções.
     Só tinha suas habilidades físicas e sua força – quase tão grande quanto das irmãs da sailor Terra – mas esta força adicional não adiantava muito quando a oponente conseguia manobrar os membros para reduzir o impacto.
     Parou um pouco de pensar no passado e concentrou-se na sailor Ariel parada há uns cinco metros em posição de defesa e aguardando. Ela sabia que enfrentava alguém muito mais experiente e por isso não se arriscava. Mas essa menina estava começando a prever mais facilmente os seus golpes. Hora de tentar algo diferente.
     Ela dá um grande salto para trás e corre rapidamente na direção dela. Quando a sailor vai atacá-la, ela se transforma em um borrão e aparece nas costas dela. Outra habilidade inerente a venusianos e nemesianos é a habilidade de ser muito rápido. Mas para a sua surpresa a menina bloqueou o seu golpe que ia para a sua nuca. Mais que isso, conseguiu lhe passar uma rasteira ao mesmo tempo em que estava desviando sua mão.
     Atônita com aquele movimente veloz – ela parecia uma malviana se movendo agora – e caindo ao chão, ela conseguiu dar um giro completo e acertou sua barriga a impulsionando a distância, e isso antes que tocasse o solo devido à primeira rasteira.
     Ela rola no chão para ter uma posição para ficar ereta, mas assim que está a meio caminho de ficar de pé, as duas pernas dela acertaram o seu peito a jogando para trás novamente, caindo de costas. Ela tenta usar as mãos acima da cabeça para tentar transformar aquela queda em um salto mortal de costas, mas mal sua mão tocou o chão, ela sofreu mais um impacto – este nas costas – arremessando-a um pouco mais distante e de cabeça para baixo.
     Nunca tinha enfrentando alguém que conseguia aproveitar tantas oportunidades assim. Ainda estava tentando se erguer e mal pôde cruzar os braços na frente do peito para bloquear mais um golpe dela feito com os pés. A questão foi que as mãos dela também vinham para a sua cabeça. Ou seja, ela previu que se tentasse bloquear as pernas não poderia fazer nada contra as mãos. E estava certa.
     Sentiu seus dentes doerem naquele impacto. Foi muito maior que os outros. E notou uma coisa diferente desta vez. O brilho esverdeado de sua aura estava começando a acompanhar os músculos que ela movia. Isso indicava apenas uma coisa: Ela estava usando sua aura para amplificar seus golpes, conseguindo uma força adicional com isto. E também uma maior velocidade.
     Uma mercuriana que podia manipular a aura... isso sim era uma total novidade. Talvez fosse algo instintivo para ela, decorrente de sua habilidade empática, algo que não se desse conta. Mas esse fator a deixava mais poderosa, e conforme ela lutava, mais evidente ficava essa habilidade.
     Ser derrotada pela sailor Ariel... sorriu intimamente. Muitos diriam que seria irônico ou até justiça poética. Já estava se questionando novamente sobre o porquê de ter acompanhado os outros até ali, até o sistema natal dela. Dentre todos, ela era a única que duvidava que encontrasse o que estavam procurando.
     Quando conseguiu novamente firmar os pés no chão, acelerou em direção a ela e desta vez esquivou-se de seus punhos, atingindo-a na têmpora direita, apenas para receber uma cotovelada no ombro tirando o seu equilíbrio e iniciando outra sessão de espancamento enquanto estivesse em movimento. Levou pelo menos seis golpes até tomar distancia suficientemente grande para a sailor considerar que era arriscado continuar a atacar.
     Os golpes doeram bem mais desta vez. Podia notar que ela estava suando e tentando controlar a respiração, mas sem duvida estava longe de estar no limite. Com o canto dos olhos observou a sailor Urano no chão há certa distancia. Seus olhos estavam arregalados e sua boca levemente aberta. E não era para menos. Estava vendo uma adolescente enfrentar uma general de Klarta de igual para igual. Ou melhor... ela estava demonstrando superioridade.
     Não adiantava ser rápida se apenas conseguia um ou dois golpes antes de sua oponente iniciar uma seqüência enorme de contra ataques. Pensou varias vezes em abrir um portal para seus zangões virem e atrapalharem a sailor, mas...
     Ela não queria. Enfrentar a sailor Ariel tinha sido uma ironia. Enfrentar uma sailor Ariel que a lembrava daquilo que tinha sido forçada a abandonar já era outra coisa.
     Se fosse para derrotar aquela sailor, teria de ser sozinha, apenas ela sem nenhum recurso adicional. Nada para atrapalhar. Uma luta justa.
     Da mesma forma que tinha sido no milênio de prata. Conseguira o seu titulo justamente. Se iria conseguir matar esta sailor, teria de ser também de forma justa. Dane-se o que os outros queriam, dane-se o plano deles. Não lhe interessava mais. Mais nada interessava agora. Durante aquela luta ela recuperou uma parte de sua essência, daquilo que acreditava antes. Daquilo que a definiu. Sua determinação.
     Concetrou-se em sua aura e novamente usou de grande velocidade contra a sailor. Ela estava aparentemente de forma intuitiva usando a aura dela para lhe dar força extra, não? Vamos ver qual era o limite dela agora.
     Moveu o braço para frente e agachou-se tentando enganar a sailor. Logo em seguida saltou com o punho em riste, atingindo diretamente o queixo dela, fazendo-a sem dúvida ver estrelas. No meio do salto girou o corpo e acertou ela na barriga e...
     Não acreditou!
     Não tinha atingido a barriga dela. Ela segurou com a mão direita o seu tornozelo. Enquanto estava ainda sob efeito do impacto que tinha dado, a sailor moveu a mão para a posição certa não só para interceptar, mas para agarrar sua perna e com isso...
     Sentiu perder todo o controle do movimento do seu corpo. Foi puxada pela mão dela e recebeu uma cotovelada na nuca. Logo em seguida um outro impacto perto da orelha. Mas conseguiu no fim das contas cair em pé.
     Foi quando percebeu algo diferente... a aura dela...
     Mas...
     Ela tinha começado a fazer um giro com o corpo e partes de seu corpo começaram a ter a aura com mais intensidade. Ou melhor... estavam brilhando com grande potência. Não era como antes. Ela estava usando literalmente tudo o que podia naqueles músculos.
     Era isso! A aura dela ficava intensa conforme utilizava seus músculos. Um efeito colateral na verdade, mas de grande impacto para outros seres. Especialmente para uma empata espiritual como ela era. Mas o brilho que a aura estava tendo agora era assombroso. Se era um reflexo do esforço que ela colocava nos músculos, então estes estavam muito alem do limite.
     Primeiro foi o tornozelo, em seguida a perna e a coxa, passando para os quadris – estava quase que hipnotizada observando aquilo – logo depois o brilho seguiu para a outra perna dela que estava no ar, e que vinha na sua direção.
     Na mesma hora ela juntou os braços para a defesa e algo chamou sua atenção no rosto da sailor. Seus olhos tinham se fixado em um ponto nos seus braços. Até então quando ela atacava não fixava os olhos em parte alguma, outra das razões pela qual era difícil se defender dela.
     Mas não podia fazer nada. Ia receber um potente golpe pelo visto, mas isso deveria lhe dar a chance de lançar um forte e rápido contra ataque.
     Mesmo antes de perder a sua semente estelar ela tinha enfrentado seres poderosos, seres habilidosos e até aqueles que surpreendiam. Esta sailor Ariel simplesmente encaixava-se nas três categorias.
     O impacto que recebeu nos braços foi tão poderoso que uma onda de choque absurda ecoou pelo local, levantando uma grande nuvem de poeira em forma de circulo, atingindo a sailor que estava relativamente afastada e a lançando dezenas de metros para trás.
     Foi um golpe quase igual ao que Primsey podia fazer. Como aquela sailor conseguiu fazer isso? Não conseguia sentir os braços, nem as mãos. Na verdade não sabia se podia mover os dedos destas pois não sentia nada do cotovelo em diante em ambos os braços.
     Caiu de costas e rolou sem controle pelo chão, e antes de parar já estava sentindo algo muito estranho. Algo ecoando pelo seu corpo, como que vibrando e estalando por dentro.
     Quando parou de rolar tentou se erguer mas caiu de novo. Sua mão esquerda não obedecia. Ao olhar para esta notou duas coisas: A primeira era que pela posição seu braço estava quebrado. A segunda foi que não viu o bracelete que mantinha seu corpo coeso. Olhou para seu outro braço. Este estava começando a doer cada vez mais. Não parecia estar quebrado, mas era difícil mover os dedos. Havia ainda um bracelete neste, mas estava partido. Uma parte do mesmo estava faltando e o que sobrou mal se mantinha ao redor do pulso. Bastaria qualquer pancada e este iria terminar de se partir.
     Foi isso que a sailor tinha olhado quando ela tentou se defender. Seus braceletes. Ela mirou neles e usou tudo o que tinha.
     Estava olhando para o vazio. Por pura sorte um dos braceletes ainda estava ao redor de seu pulso. Por isso sentia aquela sensação de que seu corpo estava estalando. A sailor tinha vencido!
     Levantou-se devagar usando apenas as pernas, e começou a andar lentamente em direção a onde a sailor deveria estar. Achou estranho a mesma não ter vindo ainda para terminar o serviço.
     Durante a caminhada voltou a cruzar a estrada – o golpe da sailor a arremessou bem longe – onde a sailor Urano ainda estava tentando se libertar. Andou mais alguns passos e a encontrou entre grama alta e alguns arbustos.
     Ela estava estirada no chão. Sua perna dobrada de forma que deixava evidente que estava quebrada. Suas mãos caídas no chão e seus olhos fixos nos dela. Ela estava consciente e esperando que voltasse. Qualquer ação que tentasse agora faria seu outro bracelete se partir, o que destruiria seu corpo em seguida. A sailor não podia fazer muita coisa também.
     Fechou os olhos e lembrou-se da época em que estava no Milênio de Prata e tinha encontrado a sua vocação de vida. Tinha sido feliz fazendo o que acreditava, com muitas amigas verdadeiras que confiavam nela. E enquanto estava viva ela correspondeu àquela confiança.
     Olhou para a sailor estendida no chão e sorriu. Tinha feito o mesmo que ela. Lutou até o fim pelo que acreditava, não se importando no quanto isto poderia custar. Será que...
     Esticou a sua mão boa em direção a sailor e se concentrou. Um brilho se formou nesta e concentrou-se em um pequeno ponto, que seguiu em sua direção. Um brilho que se materializou como um pingente ao redor de seus dedos.
     A sailor ficou impressionada com aquilo, mas ela própria ficou impressionada. Mas não muito no fim das contas.
     - Criança – disse ela em uma voz cansada e demonstrando algumas de suas dores. Pelo jeito suas costelas também estavam quebradas – acho que tem algo que eu preciso te dar...
     Ela ergueu o pingente para cima e olhou para o céu. Logo este brilhou e todo o seu corpo brilhou em ressonância. Já fazia tanto tempo... como foi capaz de esquecer daquela sensação? Quando abriu os olhos, estava vestida como uma sailor. Mas não qualquer sailor.
     A sailor Ariel.
     - Você deve ter milhões de perguntas, minha cara – disse para a impressionada e incrédula sailor ali deitada – mas infelizmente não poderá fazê-las, apenas se contentar com as respostas que irei lhe dar.
     Ela esticou novamente a mão e outro brilho surgiu nesta. Uma vara de um metro se materializou ali entre seus dedos. Ela fechou a mão ao redor desta e a pos no chão.
     - Bem minha cara – fechou os olhos sentindo seu corpo se contorcer. O bracelete permaneceu com ela quando se transformou, mas não iria durar muito – não tenho muito tempo. Eu sou uma sailor Ariel... mas não qualquer uma...
     Olhou para cima novamente, um sorriso nos seus lábios. Um sorriso quando se recordou da proposta de Serenity para que ela e aquelas outras que tanto se destacaram treinando as sailors senshi se tornassem uma segunda milícia, também de sailors. Teve alguém que sugeriu adotarem os nomes das luas do sistema Solar. No fim acabaram criando as sailors lunares.
     - Eu fui a primeira sailor Ariel – disse ela olhando-a nos olhos – e pelo jeito ainda sou... – olhou para a vara na sua mão – isto é para você. Me foi dado pela rainha Serenety. Eu tinha decidido deixar com minha sucessora. Mas nunca tive chance de escolher nenhuma...
     A sailor estava prestando atenção, mas parecia não entender muito bem o que estava acontecendo.
     - Como.. – murmurou ela com clara expressão de dor no rosto.
     - Não perca tempo falando, pois só direi o que estou disposta agora. Eu e os outros generais viemos até aqui procurar nossas sementes estelares, que nos foram tomadas por Kaos. No meu caso, foi a sailor galáxia quem o fez – soltou um grunhido – minha ultima missão tinha sido descobrir o que tinha ocorrido com o cavaleiro do Sol. Acabei encontrando Galáxia e você pode imaginar o resultado... Ela me tornou sua serva.
     - Como uma sailor pôde fazer o que voce...
     - Você não sabe como é – ela fechou os olhos e suspirou – não sabe o que é ficar sem sua semente estelar. Não sabe o que é ficar sem alma, ou ter as emoções alteradas. Mas eu lhe garanto que a sailor Ariel que enfrentou Galáxia morreu pelo que acreditava. Sou apenas a casca sem alma dela. Duvido que minha semente esteja por aqui. Quando Galáxia morreu, minha semente não pôde recriar meu corpo, pois ele não tinha se dissipado, e nem pôde alcançá-lo onde eu estava. Ela deve ter se dissipado com o tempo. Mas pelo menos, posso fazer novamente algo... por muito tempo, enquanto eu era a sailor Ariel, meu maior sonho era defender o que eu acreditava até o fim. E se tivesse de morrer lutando, que fosse como sailor Ariel – ela sorriu olhando para a atual representante de seu titulo – não é todo mundo que pode realizar o sonho de uma vida por duas vezes...
     Dito isso, ela cravou a vara ao lado da sailor caída e se afastou. Com um sorriso sereno ergueu a mão que tinha o bracelete danificado e a contraiu, fazendo o bracelete se partir e cair ao chão. Sentiu um calor invadindo-a, e seu corpo sendo partido em pedaços. Mas não houve dor.
     Não houve remorso, nem arrependimento pelo que fizera desde que perdera sua semente estelar. Em vida tinha lutado pelo que acreditava, na "morte", fizera o que Galáxia incutiu na sua alma. Ter recuperado o que era antes de abraçar a inexistência foi a melhor redenção que podia esperar.
     Pelo menos morreu como queria. Vestida como Sailor Ariel.
     De novo.

 

-x-

 

     Seus braços iriam acabar se partindo daquele jeito, mas tinha que haver uma forma de se libertar. Vira Suzie lutar como nunca tinha imaginado antes. Viu ela jogar a general longe, quase sentindo uma alegria incrível de ver aquela maldita apanhar daquela forma. Impressionante foi perceber que ela tinha utilizado o golpe perfeito de Nicholas. Mas quando Ariel não voltou dos arbustos onde o golpe a tinha lançado e viu a general cruzar a rodovia em direção onde ela estava, entrou em pânico.
     Poucos momentos depois, houve um brilho onde ela tinha entrado, deste então o silencio. Por isso tentava forçar suas mãos para fora daquelas faixas de luz. Tinha que escapar e ver o que tinha ocorrido com ela.
     Ela parou de se mover quando ouviu um som de algo se movendo no mato. Olhou na direção de onde este vinha e viu sailor Ariel cambaleante, se apoiando em um bastão mancar na sua direção.
     Sailor Ariel... ela tinha vencido a general?
     - Suzie... – disse ela quando a mesma se arrastou para ficar ou seu lado e tinha começado a mexer no dispositivo que estava preso o seu pescoço – você está bem?
     Considerando como ela contorcia o rosto de dor, não devia estar.
     - Onde esta a mulher? Ela fugiu? Ela... – olhava assustada para o estado da menina. Sua perna estava dobrada de uma forma impossível, devia estar quebrada. Seu quadril estava dobrado de uma forma estranha também. Devia ter se machucado muito na luta – como você está?
     - Urano – murmurou ela demonstrando uma grande dor na voz – cala essa boca... e deixe eu me concentrar... essa coisa... – soltou um grunhido de dor – deve ter um código de base de cores...
     Mais alguns segundos e ela conseguiu se mover. Suzette a tinha libertado. Imediatamente ela se deixou cair e desabar no chão. Mas Urano foi mais rápida e a segurou antes disto. Usando seus conhecimentos de primeiros socorros avaliou como ela estava e ficou muito mais impressionada.
     Estava com os ossos da perna direita quebrados, o quadril aparentemente com desvio e algumas costelas também quebradas, mas nada realmente letal.
     - Ela não existe mais - murmurou nos seus braços – eu quebrei os braceletes dela...
     Quebrou os braceletes? Mas para fazer isso era preciso uma força enorme. Olhou para ela deitada em seus braços e ficou pensando no quanto a tinha subestimado. Não só ela, mas talvez todas as crianças. Suzette usou o golpe perfeito de Nicholas... quando ele a teria ensinado isso?
     - Descanse, senshi da lua Ariel – disse com um sorriso e uma certa admiração – você fez algo impressionante hoje. Pelo menos para mim foi impressionante.
     Colocou-a no chão com cuidado e lentamente moveu seus ossos de volta ao lugar correto. Sendo uma sailor iria se recuperar rápido. Em poucas horas iria poder caminhar de novo, a menos que sailor Moon ou sua filha a curassem e acelerassem o processo.
     Sua filha! Onde será que estava? Ariel tinha perguntado se ela tinha estado ali antes. O que teria ocorrido?
     Por um momento, toda a sua preocupação e desespero pela saúde da filha voltaram, mas logo em seguida tudo desapareceu. Se Ariel tinha enfrentado – e derrotado – um dos generais sozinha, sua filha sem dúvida não faria menos.
     E se fizesse... a colocaria de castigo!
     Acionou o seu visor e tentou obter contato com alguém Sua primeira opção foi sailor Venus. Como esta não respondeu, tentou sua companheira.
     "- Haruka – respondeu ela quase gritando de alegria – como você está?"
     - Estou bem graças a Suzie – disse ela com um sorriso e também aliviada – Como estão as coisas?
     "- As criaturas das sombras estavam aparecendo na cidade inteira, o que mobilizou toda a nossa defesa. Mas estão aparecendo em menor quantidade agora. O palácio foi atacado e estou a caminho para ver o que está ocorrendo. O que sabe de Anne?"
     "- Não sei de nada – sentiu um aperto no coração novamente – mas sinto que ela está bem. Vou deixar Ariel em um hospital para que possam solidificar seus ossos e vou me juntar a vocês assim que possível."
     "- Solidificar os ossos? O que houve com ela?"
     - Ela derrotou um general. E sozinha! Depois nos falamos mais.
     Desligou o visor e pegou Ariel com cuidado. Sabia que pulando iria causar dor nela, mas era uma sailor, iria agüentar sem grandes problemas. Começou a pular em direção a cidade. Se o castelo estava sendo atacado era uma medida muito desesperada. A rainha podia não atuar diretamente fazia séculos, mas não devia ser subestimada. Quando era uma cabecinha de vento já conseguia enfrentar qualquer coisa. Agora que era rainha... bem...
     Tinha de ser um idiota para a enfrentar assim diretamente.
    

-x-

 

     Piscou os olhos varias vezes, não acreditando. Parecia ter acordado de um sonho. Olhou para seu corpo e viu que estava transformada novamente.
     Sua mãe! Quanto tempo tinha ficado "fora"? Acionou o seu visor e viu surpresa que apenas uns dez minutos tinham se passado. Sentia sua mãe e Suzie próximas dela. E estavam lado a lado pelo jeito. Mais que isso, estavam se movendo! Ia dar um salto para ir na direção delas quando parou subitamente e olhou para trás.
     A imagem dela ainda estava lá. A imagem de Neya, ou sua essência – ou seja lá qual o nome correto para isso.
     - Tem mais alguma coisa para me mostrar? – perguntou olhando para ela.
     Não – ecoou a voz na sua mente.
     Fechou os olhos por algum tempo e suspirou. Não sabia bem onde esteve, mas teve a impressão que muito tempo se passou desde que tinha aceitado a oferta de sua antecessora. Mas na verdade foram só alguns minutos. Talvez tudo tenho ocorrido em sua mente.
     Olhou para os seus dedos e os flexionou. Se tivesse sido apenas em sua mente como seus dedos estavam perfeitamente adaptados agora para aquelas técnicas que tinha aprendido? Olhou novamente para trás mas nada viu ali. Olhou em direção onde estavam Suzie e sua mãe e começou a correr para lá.
     Agora tinha uma melhor compreensão do que ela era, e especialmente do que significava ser uma sailor. Nunca teria imaginado aquilo que tinha aprendido. Realmente se tivesse ido em frente e perdido aquela chance, nunca poderia aprender.
     Mas... se o preço fosse a vida de sua mãe... teria valido a pena?
     Mais dois saltos e viu sailor Urano carregando Ariel nos braços. Acabou esquecendo tudo o que se passava na sua cabeça.
     - Mãe! – gritou ela ao se aproximar. Sailor Urano pousou com Ariel nos braços e a colocou no chão.
     Ao pousar, ficou olhando para ela, pensando no que fazer. Sentia-se uma tola por isso. Passara a noite em claro, tinha ficado desesperada pelo fato de sua mãe ter sido seqüestrada, e agora estava com vergonha – na verdade não queria mostrar fraqueza para ela – de deixar isto transparecer.
     Mas aparentemente isso não ocorria com ela. Em uma ação impensada, ela deu um passo e a agarrou com força, dando um abraço que estava estalando suas costelas. Sabia que sua mãe era forte, mas sentir-se sendo comprimida daquela forma lhe mostrou o quão pouco conhecia sobre a extensão daquela força.
     - Mãe... – grunhiu ela sentindo-se um pouco ruborizada por aquela súbita demonstração de carinho e de força que fazia suas costelas implorarem por escapatória.
     - Fiquei com medo filha... medo que algo lhe acontecesse, medo...
     Não disse mais nada, mas sentiu suas lagrimas escorrendo pela face e atingindo o seu ombro. Assim, comovida – e esmagada – pelo ato, retribuiu o abraço. Ou tentou retribuir pois não era nada fácil mover os braços dentro daquela prensa hidráulica em que se sentia presa.
     - Mãe... deixa alguma coisa para os inimigos esmagarem... por... favor!
     - Desculpe – ela riu – é que estou feliz de ver você ilesa... filha.
     Um grunhido de dor e de atenção foi proferido por sailor Ariel. Seus olhos indicavam claramente que queria uma certa ajuda.
     - O que houve com ela?
     - Quebrou alguns ossos e acho que rompeu alguns músculos lutando contra uma general. Estava levando-a para um hospital, mas acho que você pode cuidar dela agora, não pode?
     Ela olhou para a irmã de criação deitada e com evidente dor na face. Estendeu a mão sobre o seu corpo e se concentrou. Um anel surgiu há alguns centímetros de seus dedos abertos. Um anel branco brilhante. Deste anel um facho de luz iluminou a senshi ferida e esta imediatamente relaxou.
     Ela sorriu intimamente ao perceber como era fácil agora. Seu poder não era algo mágico que tinha que ser invocado sempre. Era parte dela, de seu corpo, de sua alma. Era algo que podia dosar e controlar. Mas precisava aceitar isso. Ela não era humana apesar de sua aparência. Era uma urano-netuniana, e quando compreendesse isso seria mais fácil sentir como usar o acesso aos elementos.
     Claro, havia outro detalhe a seu respeito, mas isso não interessava agora.
     - Era assim que seu poder funcionava? – questionou sua mãe um pouco confusa.
     - Não... antes eu tinha de invocar o anel de cura. Mas consumia uma grande energia e ele iria continuar me exaurindo até terminar de curar a pessoa que fosse envolvida por ele.
     - E quanto você aprendeu a fazer isso de forma mais... sutil?
     - Faz uns cinco minutos – riu-se ela.
     Ariel sentou-se sentindo o seu corpo mais inteiro e com menos dores.
     - Ainda não, Suzie, sua perna esta um cristal partido! O que você fez? Chutou a cabeça da general até quebrar a perna?
     - Quase isso – murmurou a sua mãe – consegue saber os ferimentos que ela têm?
     - Agora eu consigo – respondeu concentrando o facho de luz na perna dela – entre outras coisas. Mãe... a senhora está perdendo tempo aqui. Eu e Ariel iremos segui-la assim que possível – olhou para ela diretamente e com um certo sorriso sapeca nos lábios.
     Ela não disse nada. Apenas sorriu de volta e se aproximou para dar um beijo na sua testa, fato que a deixou literalmente vermelha feito um tomate, e partiu seguindo em direção ao castelo.
     - Sua mãe esta bem amorosa – disse ela rindo.
     - Espero que seja só uma fase... – comentou tentando se recompor – agora me diga o que você realmente fez. Sua perna ficou em muitos pedaços!
     Ela olhou para baixo com um sorriso encabulado. Mas não chegou a responder a pergunta, apenas disse algo que deixou a resposta no ar.
     - Bom, me diga como aprendeu esse controle sobre seu poder que eu lhe explico sobre como encarei a general.
     Pensou um pouco a respeito. Melhor deixar isso para depois. Iria demorar mais tempo que o normal para curar a perna dela. Realmente tinha ficado em muitos pedaços, quase como se um carro a tivesse esmagado.


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