Ébano escrita por Ferana


Capítulo 5
A voz que emana na Floresta


Notas iniciais do capítulo

Lucien segue botando mais lenha na fogueira enquanto algumas verdades vem à tona.

Boa Leitura! ^^

Ps: OMG, spoilers everywhere nessa fic e.e to até vendo que algumas coisas vão perder totalmente o impacto futuramente =/



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Royena encarou cada um dos guardiões diante dela, sentindo o peso dos olhares de traição que lhe lançavam. Sua vontade foi de simplesmente virar cabra e sair correndo dali o mais rápido possível, mas sabia que estaria dando as costas à sua missão e, pior ainda, dando brecha para seus medos há muito enterrados ressurgirem. Porém, mesmo diante de toda atmosfera de julgamento que se formou ao seu redor, uma coisa levou um pouco de calma de espírito à ela, uma coisa que provavelmente jamais seria esperada: o olhar de Breu. Pela primeira vez ela não sentia desprezo ou traição nos olhos de alguém ao ter sua verdadeira identidade revelada. Foi o pouco que ela precisava para se manter ali e começar a falar.

- Certo, sobre a primeira coisa que ele falou... Eu de fato era uma ladra.

- Isso não importa. Eu mesmo fui um larápio antes de ser um Guardião. – disse calmamente Norte, alisando a barba – E não era qualquer ladrãozinho de pães, eu era conhecido como Príncipe dos Ladrões por toda as Russias*. Mas isso é história para outra hora, o que realmente queremos saber é: você e Lucien realmente tiveram uma aliança?

- Sim. – ela respondeu automaticamente. – Nosso trato era eu levar viajantes para ele, que se divertia fazendo-os se perderem floresta à dentro, e em troca eu e meus pais podíamos andar pela floresta sem sermos enganados e ficar com todas as riquezas materiais que os viajantes perdessem por entre as árvores.

- E você tem coragem de falar isso tão tranquilamente? – o olhar de Coelhão carregava cada vez mais desgosto.

- Sim, jamais tive peso na consciência por isso, pois meu objetivo era nobre: meus pais eram farmacêuticos e estudavam as propriedades curativas das plantas dessa floresta, por isso tínhamos a necessidade de morar aqui. Porém, os habitantes da vila próxima achavam que nós éramos praticantes de bruxaria, que mexíamos com alquimia e coisas afim, e começaram a nos proibir de entrar na cidade ou mesmo nos aproximar dela... Éramos caçados quando o sol se punha e tínhamos de ficar alertas sempre... Por isso a necessidade do pacto com Hinkypunk, pois além de nos livrarmos dos caçadores quando eles se perdiam, podíamos pegar o ouro que perdiam durante a perseguição, e com isso nos sustentávamos viajando até cidades vizinhas uma vez por mês para comprar suprimentos. O resto, a floresta nos cedia.

- Certo, é uma resposta digna e verdadeira. – disse a fada, amolecendo aos poucos ao escutar a história da garota. – Agora, o mais importante de tudo: o que é você? Um Hinkypunk ou um Espírito da Floresta?

- Bem... Os dois. – a garota suspirou ao ver os olhares de dúvida se estreitarem em sua direção. – Eu também não entendo como isso é possível, ok? Simplesmente aconteceu. Eu... Eu acredito que tenha sido por conta do modo como eu morri.

Sandy se pôs à frente e fez um símbolo de uma caveira com ossos cruzados sobre a cabeça.

- Sim, foi uma morte violenta, Sandy. – ela parou com uma expressão de reflexão por alguns segundos, em direção às chamas de Lucien agora em brasas que ainda ardiam no chão, e voltou a falar. – Isso foi há muito tempo, uma memória que tentei de todo modo esquecer. Os caçadores aparentemente descobriram meu trato com Hinkypunk e montaram uma emboscada. Atacaram durante o dia, em um grupo grande; Felizmente, exatamente na data escolhida por eles, meus pais haviam viajado para comprar suprimentos e eu estava só na floresta. Eles me encontraram colhendo plantas e me atacaram imediatamente com flechas. Fui atingida por 2 delas nas costas, mas em áreas não vitais, e consegui fugir correndo... Porém, prevendo que algo poderia dar errado, à minha frente, alguns metros adiante do local onde fui atacada, havia um batedor, que me flechou exatamente na base da garganta.

Royena parou novamente de falar, passando a mão no pescoço, como se estivesse revivendo tudo novamente. Sandy tinha uma expressão de certo arrependimento pela pergunta ter despertado essa reação na garota, mas sabia que era necessário. Breu continuava neutro, apenas a escutando. A guardiã da floresta pigarreou e voltou a falar, ainda encarando as brasas ardentes que estalavam no chão.

- Eu caí e comecei a agonizar, me engasgando com meu próprio sangue que jorrava. Eles apenas me olharam com sorrisos maliciosos e me deixaram ali para morrer, como um aviso aos meus pais de que seriam os próximos... Nessa hora, tudo que eu sentia era apenas ódio e medo, queria exterminar todos daquela vila, todos que ousaram destruir os sonhos de minha família de conciliar a vida humana com a floresta, respeitando-a e retirando ela apenas o necessário... Então comecei a sentir a palma da minha mão direita arder. Com o pouco movimento que conseguia ter com a cabeça, virei e vi uma chama emanando dela. Sabia que estava me tornando um Hinkypunk e estava mais do que gostando da idéia, pois sabia que poderia me vingar de todos dessa forma, de uma maneira lenta e dolorosa – a expressão da garota foi tomando ares malignos que os guardiões não esperavam, até que Sandy puxou a capa dela e ela voltou ao normal. – Ah, me perdoem... Como podem ver, meu lado Hinkypunk ainda está bem vivo, lá no fundo da minha consciência.

- Mas como conseguiu reverter a transformação? – Fada parecia confusa e triste.

- Esse é a parte que eu não entendo muito bem... Eu estava quase perdendo a consciência, quando ouvi uma voz se dirigindo à mim. Não era bondosa ou delicada, mas equilibrada, e me trouxe paz naquele momento. Senti uma mão envolver a chama que crescia em minha palma e a empurrar de volta para minha pele, fazendo-a arder como queimada. “Não se desespere. Esta não deve ser sua escolha final.”, foi o que ela disse antes de eu sentir a terra começando a me envolver lentamente... Era macia e fria, aliviava minhas dores e minha consciência se esvaía. Só puder ver uma silhueta feminina, com longos cabelos negros me encarando calmamente antes de fechar os olhos pela última vez como humana.

- Uma silhueta feminina?! – Breu deixou escapar com uma expressão de surpresa, fazendo todos o encararem.

- Sim, com longos cabelos negros ondulados... Sabe quem pode ser? – indagou Royena, com esperança.

- Não, não... Foi só um reflexo irracional que eu tive, por favor, prossiga. – pigarreou ele, limpando a expressão de surpresa para a de aparente tédio novamente.

- Isso é tudo o que lembro. – falou olhando para os guardiões, triste – Depois, apenas acordei no fundo de uma caverna e, por algum motivo sem explicação, sabia que deveria defender a floresta e seus transeuntes... De fato eu ainda possuo os poderes de um Hinkypunk, mas como não consigo controla-los bem, prefiro mantê-los adormecidos.

- Mas mesmo lembrando de todo os eu passado, preferiu simplesmente seguir o que a pessoa que você nem conhece te disse? – perguntou Norte, espantado.

- Não exatamente. Era algo muito mais como seguir meu instinto do que seguir as palavras de um estranho. Os animais atingem um nível altíssimo de conexão com a natureza usando apenas seus instintos, e foi dessa forma que me senti naquele momento. Além da minha missão de vida, que era justamente encontrar esse equilíbrio harmonioso entre homem e natureza.

Os guardiões se entreolharam e, sem palavra alguma, concordaram que as explicações da garota eram mais do que convincentes. Porém ainda havia algo que os incomodava.

- E quais são as chances do seu lado Hinkypunk aflorar? – perguntou Coelhão, bem menos sério.

- Baixíssimas... Nesses séculos de vida que tenho, apenas em uma oportunidade fui tomada pelos poderes de Hinkypunk, mas pude manter minha consciência e foi em uma situação de vida ou morte, literalmente... Na batalha contra o próprio Lucien. – ela engasgou brevemente, mas arranjou forças e continuou – Não vou mentir... Meus poderes de Hinkypunk atualmente seriam de muito maior utilidade na captura de Lucien, por que... Bem, eu também posso me alimentar do medo que ele está gerando.

- Não. – retumbou Norte sem demora – Isto nem pensar. Podemos aceitar que você seja em parte um espírito maligno, mas usar esses poderes em nosso nome, jamais. Se, e apenas se, estivermos em uma situação de vida ou morte, vamos aceitar esta conduta de sua parte.

- Entendido. – falou Royena, séria. – Tem a minha palavra de que não vou usá-los, a não ser nas emergências extremas.

- Então estamos de acordo. – disse o Coelho, voltando a ter um sorriso no focinho para Royena. – Agora vamos ver se aquela peste saiu bagunçando as coisas por aí.

Coelhão mal terminou a frase e saiu aos enormes saltos na direção que Lucien havia fugido, porém, ao cruzar a linha de brasas deixadas para trás pelo Espírito Maligno apenas ouviu Royena gritar ‘NÃO!’ repentinamente e empurrá-lo com um golpe do ombro esquerdo na direção da floresta novamente. Ele se levantava pronto para esbravejar quando todos viram uma enorme labareda subindo de novo das brasas e engolir Royena. A garota soltou um urro de dor e começou a rolar na terra, tentando apagar o fogo que a consumia por completo. Coelhão não demorou à correr para o monte de neve mais próximo e jogar uma enorme quantidade sobre a garota, mas o fogo nem sequer fraquejou soba a neve, agora transformada em água. Sandy rapidamente balançou as mãos em movimentos circulares e um enorme pano de areia dourada se formou e caiu sobre Royena, porém em segundos a areia foi consumida pelas chamas insaciáveis.

- Saiam da frente! – gritou Breu indo na direção de todos.

O Rei dos Pesadelos, num movimento rápido, colocou o pé direito á sua frente e impulsionou o tronco e os braços num único movimento semicircular na direção de Royena, que estava caída no chão. Uma onda de sombras a engoliu e ficou sobre ela. O instinto dos guardiões os fez se voltarem contra Breu, achando que ele estava terminando o trabalho de Hinkypunk, mas em um segundo as sombras sumiram junto com o fogo, deixando apenas Royena caída no chão.

- Contra a luz, apenas sombras tem poder. – Breu disse calmamente aos guardiões, com um ar de superioridade.

Eles guardaram suas armas e correram para perto da garota.

- Por todos os Molares! – exclamou Fada, espantada. – Ela está inteira queimada!

- Eu estou bem. – disse ela, tentando se levantar com dificuldade. – Estou acostumada com esse tipo de truque do Lucien, aquele canalha... Tomem cuidado sempre que ele estiver por perto e ainda mais quando ele não estiver... Aquela praga adora espalhar armadilhas por aí.

- Vamos cuidar dos seus ferimentos, venha conosco para minha Toca, cuidaremos de tudo lá. – Disse Coelhão, preocupado e com uma ponta de culpa na voz pelo seu ato impensado.

- Relaxe, Coelho! – ela riu, fazendo uma cara de dor em seguida. – Posso cuidar disso... Podem retornar aos seus lares, por hora não podemos fazer nenhum avanço mais... E obrigada, Breu.

Breu apenas moveu a cabeça em sinal de um simples ‘Por nada.’ e mergulhou nas sombras, se volta à seu covil. Os guardiões  esperaram a garota tomar a forma de cabra e sair correndo – desajeitadamente e com uma velocidade muito menor, devido á dor que sentia. Então cada um seguiu seu rumo, exceto Sandy, que seguiu a garota por alguns metros jogando sua areia sobre os pelos da cabra, garantindo-lhe bons sonhos em seu repouso e recuperação. Como resposta, o vento lhe levou uma pequena florzinha dourada, pousando-a delicadamente sobre o colo de Sandy, que sorriu e foi levar aos dorminhocos seus doces sonhos.


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Notas finais do capítulo

* Quando ainda era humano, Norte realmente foi um ladrão, porém recebeu um sonho do Homem da Lua que mudaria todo seu destino.
Não vou explicar muito pois seria spoiler do livro. Caso alguém se interesse, o título é "Nicolau São Norte e a Batalha contra o Rei dos Pesadelos" ;)

Obrigada por lerem! ^^ Comentem caso queiram que algo seja melhorado ou mais bem explicado! =D

Ps: A partir do próximo capítulo, vou ver se posto imagens da aparência da Royena e do Lucien =P



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