Estou perdida. Completa e incondicionalmente perdida. Não sei onde estou, o que estou fazendo aqui ou como vim parar nesse lugar. Não estou mais em Aurora, disso eu sei. Acho que aqui é uma floresta, daquelas que estudamos nas aulas, há muitas árvores, e é bem escuro também. Ando sem rumo por caminhos idênticos, adentrando cada vez na floresta desconhecida. Me canso de andar, meus pés doem. Droga, estou realmente perdida. Olho em volta em busca de algo que possa me salvar dessa enrascada, mas não. Nada. Só há verde. Árvores verdes. Mato verde. Olhos verdes. Sim, olhos que me olham intensamente de volta.

Acordo no meio da noite com a garganta seca e o corpo suado. Estava sonhando. Caramba, isso foi tão real. Malditos olhos verdes. Tento voltar a dormir, mas sem sucesso. Conheci Victor a poucos dias, não faz sentido nenhum eu já sonhar com ele. "É melhor parar agora Rebecca, você não precisa ficar se auto iludindo. É uma total perda de tempo." minha consciência me diz imediatamente. Ok, parar de se auto iludir é o que eu vou fazer a partir de agora, eu só preciso encontrar um modo de fazer isso. Minha imaginação ferra comigo. Me levanto da cama e caminho até a janela do quarto. Paro e respiro o mais fundo que meus pulmões permitem. Inspiro pela boca. Olho pela janela e fico nas pontas dos pés, assim daqui consigo ver o gigantesco jardim de Lótus. Maldito jardim e as lembranças que o acompanham. Fico de costas para a janela, colocando minhas mãos no seu para-peito. Olho para Isadora e Melissa que dormem tranquilamente a poucos metros daqui. Não lhes contei sobre o meu encontro com Victor e nem pretendo contar. Isadora já iria vir com pedras nas mãos me dizendo como é errado eu ficar saindo com um garoto depois do toque de recolher, e como é inaceitável eu ficar quebrando as regras de Aurora a toa. Já Melissa iria me dizer como tudo isso é romântico e proibido ao mesmo tempo, afinal eu ainda tenho o Eros e nós ficaremos juntos para todo o sempre. Sim, ela diria essa última frase exatamente assim. Eu não tenho paciência para nenhuma das duas agora.

Voltando para cama eu me enfio debaixo da coberta e me enrolo nela. Fico ali, quietinha e aquecida esperando o sono vir. Em algum momento da noite consigo voltar a dormir, um sono sem mais sonhos.

Acordo mais uma vez, só que agora já é de manhã. Levanto com o bipe matinal, e percebo que as meninas ainda estão deitadas. Abro um sorriso maldoso. Corro para a cama de Melissa e me jogo em cima dela. Ela grita e se debate em busca de ar. Satisfeita por já ter acordado uma, vou em direção a cama de Isadora que ainda dorme, cutuco-a levemente e olho para Melissa. Ela já está de pé do meu lado. Pelo visto, acordamos com o humor para brincadeiras hoje.

– No três? - pergunta sorrindo para mim com cara de sono. Balanço a cabeça dizendo que sim. - Um... - Melissa começa a contar baixinho. - Dois... Três! - Juntas nós duas pulamos em cima de Isadora que acorda sobressaltada. Eu e Mel nos jogamos no chão de tanto rir.

– Vocês ficaram loucas?! - Isadora grita brava, nos olhando como se fosse nos matar. Sua expressão que era para amedrontar dura poucos segundos, porque quando olho para ela de novo, Dora está sorrindo e se levantando da cama. - Não sei o que faço com vocês. - ela diz rindo enquanto entra no banheiro. Eu e Melissa continuamos no chão olhando uma para a cara da outra, e logo já estamos rindo mais uma vez.

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Depois de todas prontas, nós três vamos apressadas para o CEL (Complexo Educacional de Lótus), a nossa brincadeirinha matinal tinha nos atrasado um pouco. Já no prédio, tratamos logo de entrar e ir para nossa sala sem mais demora, não havia muitas pessoas ainda fora das salas, mais um sinal de que estamos atrasadas. Oops, parece que alguém está quebrando uma das regras. Sorrio internamente. Isadora está quase tendo uma crise nervosa. Já no corredor do segundo andar escuto alguém me chamar baixinho.

– Rebecca! - me viro e vejo Eros em frente a única sala nesse corredor que fica sempre vazia. Levanto as sobrancelhas enquanto ele inclina sua cabeça em direção a sala. Ele quer conversar, ou não conversar. Isso não vai acabar bem.

– Você vem? - Isadora me pergunta percebendo Eros me esperando a alguns metros. Ela sabe que vou me meter em encrenca se eu for. Eu também sei.

– Podem ir. Eu já entro, é só um segundinho. - digo me afastando e indo em direção a Eros. Ele abre a porta, e eu entro seguida por ele. - Espero que seja importante. Se nos pegarem aqui estamos ferrados.

– É importante. - ele diz me olhando sério. - É muito importante. - Oh não... Isso vai dar merda. Percebendo que ele ainda está calado apenas me olhando, quebro o silêncio.

– Tudo bem, então, pode falar. Seja lá o que for.

– Eu acho que eu amo você.– Eros diz simplesmente. Fico boquiaberta. Como assim ama? - Nós já nos conhecemos a muito tempo e estamos juntos a muito tempo também, e eu estava pensando que podemos dar certo. De verdade. Eu quero ficar com você agora e continuar com você para sempre. Antes e depois da Intervenção, juntos. Imagine. Se a gente quiser tudo pode dar certo. - ele termina de dizer me olhando sincero, enquanto espera que eu diga algo. Não sei o que dizer. Eu sei o que ele quer que eu diga, mas não consigo encontrar as palavras. Não posso encontrar as palavras. Um Victor está lá fora em algum lugar me esperando com seus olhos verdes. Mas talvez não seja um Victor real, apenas o da minha iludida imaginação. "Não. Você tem que parar com isso Rebecca. Você o viu apenas uma vez. Ele provavelmente já esqueceu que você existe. Esqueça ele também." agora quem diz isso para mim sou eu mesma. Pára de ser boba. O Eros está aqui na minha frente dizendo que me ama e que podemos dar certo. Ele está me oferecendo estabilidade e uma chance de ser feliz. É só disso que eu preciso.

– Acho que te amo também. - digo e sorrio para ele. Eros abre um gigante sorriso e me beija, enquanto eu desejo internamente que isso se torne verdade e que dure para sempre.