Seeking Shelter escrita por MrsHepburn, loliveira


Capítulo 9
Família


Notas iniciais do capítulo

sinto que não ta legal



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A hora do almoço não é mais tão brutal como era na primeira semana, porque, como diz Cyrus, "liguei meu foda-se" e percebi que se eu não prestasse atenção as conversas, não ia me sentir afetada por nada. E é muito melhor agora que a surpresa e os encontros sem jeito entre mim e meus antigos colegas passaram. Escaneio as mesas, procurando a de Cyrus, e no caminho consigo encontrar minhas antigas "amigas" (que viram a cara), a banda lanchando com Jill, e por fim, Cyrus com Alana. O resto do grupo está na aula de computação então perde o almoço, mas tenho a impressão de que Cyrus e Alana estão tão apaixonados que não ligam.

Sento na frente deles.

-Oi. -Digo, e Cyrus dá um soquinho no meu punho, enquanto Alana, tímida, que ainda não superou a alma fangirl por mim, acena vermelha. Olho para Cyrus e tenho uma conversa silenciosa com ele, por olhares:

Eu: ela está tão na sua.

Ele: Pare de olhar pra ela! Ela vai perceber!

Eu: chame ela pra sair!

Ele: vou jogar a maçã em você.

Eu: Que seja. Respondo, enquanto reviro os olhos e como meu sanduíche. Ashley, surpreendentemente, não veio falar comigo hoje, apesar de ter sim dormido no nosso apartamento na noite passada depois de duas horas de aulas de trigonometria, que ela me ensinou, e depois de praticarmos cinquenta palavras que eu tenho que decorar para as provas do SAT. Estão tão confusa quanto a relação dela e de Connor quanto eles mesmos, e não tinha percebido o quanto isso me influencia. Afinal, eles eram o mais perto que eu jamais ia conseguir chegar de ter uma família de novo, de verdade. E mesmo que a ideia de Connor virar de repente um pai me assusta, a verdade cruel é que desde que nossos pais morreram, eles tomaram esse lugar, substituindo, cuidando de mim.

Estou um pouco abalada agora, pensando em coisas assim na hora do almoço, e por estar abalada, fico mais sensível e começo a ouvir comentários sobre a antiga Carter que estão sendo feitos uma mesa atrás da nossa e começo a falar com os dois sentados a minha frente de novo.

-Então, o que tem de interessante nessa escola?

-Além do clube de música? -Cyrus replica, ácido. Ele não gosta muito do clube de música porque não gosta da banda, e sou amiga deles quando estamos no auditório.

-Além do clube de música. -Respondo, sem me abalar.

-E-estamos abrindo um clu-b-b-e do livro. -Alana diz.

-Tem o jogo de basquete, claro.

-Você joga? -Cyrus tem o corpo malhado mesmo, então não duvidaria de nada. Ele fica meio vermelho.

-Não, não é minha coisa.

-Qual é a sua coisa? -Passei tanto tempo fora que estou redescobrindo meu melhor amigo, então ele já está bem acostumado com as minhas perguntas incessantes.

-É música. -Já imaginei. -Mas não cantar. Eu gosto de falar sobre música. A parte técnica da coisa. -Um dia, quando estávamos no primeiro ano, Cyrus me disse que eu e ele fazíamos parte de um pacote só. Um pacote musical: eu, na prática. Ele, na teoria. Acho que as coisas ainda não mudaram, embora eu tenha ido pro lado da teoria mais do que pro da prática recentemente.

-Entendi.

-Eu ajudava a senhorita Birkin quando a gente ia pra escola Buff dar aula de música para as criancinhas.

-Escola Buff? A... escola do meu irmão? -A escola dos garotinhos cantando Moon River. Ele me olha como se soubesse que disse algo errado, mas não posso culpá-lo. As coisas que aconteceram com a minha família só são complicadas pra mim mesma.

-É...

-Que legal. -Tento dizer, leve, mas eles param de falar, então sei que estamos todos contaminados com o espírito triste dos acontecimentos de dois anos atrás. Por sorte, o sinal toca, e como não tenho clube de música hoje, vou direto pra casa, fazer alguma coisa.

Me despeço dos dois, e saio pela porta de entrada, encontrando Naomi, Clark e Max. Clark está fumando, mas Naomi e Max então sem nada na mão. Aceno com a cabeça, e Clark diz:

-Ei, quer ir a uma festa com a gente hoje?

-Não, obrigada.

-Qual é, hoje é sexta! Vamos nos divertir. -Penso em ficar com raiva de Clark, mas novamente, sei que as coisas só mudaram para mim, então não posso esperar comportamentos diferentes de todo mundo.

-Não, mas obrigada.

-O que você vai fazer? -Naomi pergunta. Connor buzina.

-Ficar em casa, estudando para os SATs.

-Inacreditável. -Ela comenta. -Se quiser, só ligar.

-Tá, claro. -Digo, sem fazer contato visual com Max e saio correndo, através da chuva fina, entrando no carro.

-Aquele é o Max? -Connor pergunta, como sempre. Reviro os olhos e ele liga o motor.

-É.

-Fumando? -Pessoa errada.

-Não, aquele é o Clark. Max não fuma. -Até onde eu sei, Max continua a mesma pessoa correta de sempre.

-Posso fazer uma pergunta honesta? -Connor questiona, com um tom... curioso. Fico nervosa, mas digo que sim. -Você já fumou? -A essa altura, estamos fora da escola.

-Não, nunca.

-Não minta.

-Não estou mentindo. Nunca fumei... cigarro. -Ele me olha de lado.

-Mas? -Merda.

-Maconha.

-Já tinha imaginado. -Ele não parece furioso, como meu pai ficaria. Ele parece... normal. O Connor de sempre. Talvez ele já tivesse mesmo descoberto. O resto da viagem é silencioso, tão silencioso que sinto que as janelas vão explodir por causa disso, mas simplesmente não tenho nada para falar ao meu irmão. Nem ele, aparentemente. Subindo as escadas do apartamento, encontro Fletcher, o vizinho, com uma garota, que suponho ser a namorada que ele comentou aquele dia. Os olhos dela estão vermelhos, como se estivesse chorando, mas quando Fletcher, no meio da escada, nos apresenta, ela sorri, de verdade.

-É um prazer conhecê-la, Carter. Meu nome é Harvey.

-Igualmente. Estão chegando ou saindo?

-Chegando, quer visitar nosso apartamento?

-Não quero incomodar... -Respondo, porque seria... esquisito.

-Não, vem, preciso de uma ajudinha. -Ela me guia, e Fletcher segue atrás, sorrindo quando encaro ele confusa com toda a hospitalidade. -Trabalho para um jornal. Não é nada oficial, sabe? Porque ainda não terminei a faculdade, mas eu tenho um emprego garantido. E... pode-se dizer que aconteceram algumas coisas recentemente que fizeram meus artigos ficarem um pouco sentimentais demais, sabe? E Fletcher, não ajuda, já que ele apoia tudo que eu escrevo.

-É demais. -Ele se defende, mas ela revira os olhos e a atenção para com seus olhos vermelhos volta, mas resolvo não perguntar nada, porque não é da minha conta. Fletcher senta no sofá, liga a tevê e Harvey me leva até a cozinha.

-Sei que isso é meio estranho, mas preciso de uma opinião crítica e minha melhor amiga se recusa a dar, porque... somos amigas. É mais fácil aceitar críticas de alguém que você não conhece muito bem, então, será que você não podia ler pra mim e dizer que está bom? -Ela me entrega... três páginas.

-Três... páginas? -Ela me olha, arrependida.

-Eu tenho que resumir, é claro, mas são as ideias principais. Preciso clarear a mente e focar nas ideias... -Ela parece perdida nas próprias ideias, nervosa e com remorso. Na necessidade de acalmá-la, aviso que vou ler. Ela agradece e pergunto se posso ir pra casa e depois voltar, com a minha opinião.

-Claro! -Então vou pra casa, onde, assim como Fletcher, Connor está sentado no sofá. Vou até meu quarto e começo a ler, concentrada. O artigo fala sobre a exploração de cachorros no ramo das maquiagens, e é super, super detalhados. Mas é um bom exercício pra manter minha mente longe desse lugar, do apartamento claustrofóbico. Termino, um tempo depois, e fico com Connor vendo tevê, até a hora que ele avisa que tem que voltar ao trabalho.

-Te vejo mais tarde. -Ele avisa, depois sai e o silêncio cai de novo no apartamento.

Então, troco de roupas e vou para o apartamento vizinho, com medo do meu próprio apartamento. Harvey abre a porta com um sorriso, sem olhos vermelhos, e o cheiro de comida me atinge.

-Entra. -Ela me diz, abrindo espaço e indo pra cozinha. Fletcher não está a vista. -Você leu? -Entrego para ela o papel.

-Sim.

-O que achou? -Sento na bancada da cozinha.

-É muito bom...

-Mas? -Sempre tem um mas em tudo.

-Mas acho que você está se concentrando mais nos donos dos cachorros do que nas empresas. Faz sentido? -Ela assente profissionalmente.

-O.K. O que mais?

-Os nomes que você usou são trocados?

-Sim.

-O.K. Então era só isso mesmo. -Sorrio, contente por ter ajudado. Por ter feito algo bom pela humanidade, pela primeira vez na vida.

-Muito obrigada, Carter. Quantos anos você tem? -Ela pergunta, jogando tempero em uma panela.

-Dezessete. -Respondo.

-Ah, lembro de quanto eu tinha dezessete. Foi quando conheci Fletcher.

-Oh. -O amor deles, que durou o ensino médio, me faz pensar em Max... uma ideia não tão boa.

-E por falar em Fletcher... FLETCHER, A COMIDA ESTÁ PRONTA! -Ela grita. Saio da bancada, me preparando para ir embora, mas ela me olha confusa. -Vamos, você vai comer com a gente.

-Não precisa, eu...

-Você está sozinha, não está?

-Como sabe disso?

-Seu irmão conversou com a gente. -Me sinto repelida. Como se eles só estivessem falando comigo porque meu irmão obrigou. Mas Harvey logo explica. -Ele disse que costuma sair a essa hora. Só isso. Senta. -Educada demais para dizer não, sento na pequena mesa e Fletcher aparece.

-Olá, Carter.

-Oi.

Harvey senta, botando as panelas na mesa e logo eles começam uma conversa comigo, escutando atentamente, o que me faz falar mais. Não falo sobre meus pais nem nada assim, mas coisas supérfluas como música e filmes e livros, e eu percebo que na minha frente, estão Ashley e Connor 2.0. Uma família, pequena, mas ainda assim. E isso me deixa confortável o bastante para ficar até para a sobremesa.


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