Seeking Shelter escrita por MrsHepburn, loliveira


Capítulo 10
Conexão




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Então eu andei pensando em uma coisa. Algo que Connor me falou, quando eu cheguei em casa depois de jantar com Harvey e Fletcher, exausta, mas me obriguei a conversar com Connor antes de ir pra cama.

-Você está bravo comigo por causa do lance da maconha? -Perguntei.

-Não.

-De verdade?

-De verdade. -Depois de uma pausa, eu fiz a pergunta que estava me incomodando desde o momento que ele me perguntou se eu fumava.

-Você acha que... eles sabiam? -Meu irmão sabe quem são "eles", já que é a forma mais fácil de se referir aos nossos pais. Depois de uma pausa, ele disse:

-Eles sabiam.

-Eles ficavam... magoados? -Não adianta perguntar se eles tinham raiva, já que isso era óbvio, mas ficar magoado é pior.

-Não.

-Fala sério.

-Carter, eles te conheciam. -E isso me deixou confusa.

-Como assim?

-Eles te conheciam de um jeito que nem eu entendia. Nunca ficaram bravos, nem tristes, só um pouco decepcionados, claro, mas eles levavam tudo numa boa. -Isso fez soar como se eles fossem maus pais, mas eles SEMPRE brigavam comigo, e sempre me diziam o que era certo e errado. Disse isso a Connor. -Não, não é isso. Não sei se você vai entender. Eles brigavam porque é isso que pais tem que fazer, instruir o que é certo, mas eles entendiam a sua necessidade de ser festeira e divertida e toda aquela porcaria. Eu perguntei uma vez pra eles, porque eu estava meio puto da vida com você, e papai só sorriu e disse que você tinha uma "alma turbulenta". Vai entender.

Euentendia.Euentendo.

-Sério? -Estava quase a ponto de chorar. Connor parecia meio irritado.

-E... agora, eu entendo o que ele quis dizer, em parte. Mas ainda é meio sem sentido. De qualquer forma, eles sabiam. Eles não estavam lá pra te apoiar nisso, claro, mas mamãe disse que você nasceu pra ser uma estrela, e estrelas são incontroláveis.

A conversa me levou de volta no tempo para quando Max e eu ainda estávamos juntos. E tivemos nossa primeira briga, porque eu estava bêbada.

-Você tem uma talento digno de uma estrela, Carter. Um nome de estrela. Mas você não precisa ter os problemas que as estrelas tem.

E tudo isso me deixou muito... confusa.

O que é o motivo por eu estar pensando tanto nisso: pra tentar entender bem mais do que a referência a uma "alma turbulenta". Essa parte eu entendo de coração. Toda agitação, a instabilidade que eu sentia quando tinha quinze anos, todo aquelebarulho,e caos. Mas o que eu não entendo é meus pais serem tão... legais com relação a isso. Eu sempre achei que eles queriam uma boa filha, mas eles nunca reclamaram, a não ser no dia do acidente, mas... o que É ser uma boa filha?

Como vocês querem que eu seja? Sem vocês aqui?A voz, a minha voz, grita na minha mente, enquanto eu ando pelas ruas, em um sábado de manhã, sem nem saber pra onde ir.

Eu podia dar nome pra isso e chamar de crise de identidade, mas é bem maior que isso. É uma crise de vida mesmo. Ou crise de morte, se você olhar por outro modo.

O dia está lindo. Os pássaros cantam, o sol está começando a aparecer, o frio está desaparecendo e não tem mais nada de neve, enquanto eu caminho pela calçada, com meus fones de ouvido. Não preciso de mapas nem GPS, embora não dirija mais nenhum carro, para poder me localizar. Vivi aqui por tanto tempo que memorizei tudo. Olho pro sol, absorvendo vitamina D, e se eu fechar os olhos, parar de pensar por um segundo, dá pra acreditar que não existe tragédia no mundo. Ou pelo menos quase, porque ninguém fica muito tempo sem pensar.

-Carter? -Olho para o lado e vejo Jill, a irmã mais nova de Max, sorrindo para mim enquanto segura a mão do irmão mais novo dela, Tedd, que não parece mais tão novo assim, já que ele tem sete anos, agora, pelos meus cálculos.

Jill faz um movimento com a mão, que meus anos na clínica, aprendendo linguagens de sinais, me dizem que significa "você lembra dela?" e Tedd, me encarando, responde com as mãos que não.

Faço meus próprios movimentos e digo: Meu nome é Carter.

Tedd é surdo. E Max não gostava muito de falar sobre o assunto, mas ele me contou sobre a história. A mãe dos três teve depressão pós-parto quando Tedd nasceu, porque o dinheiro estava meio apertado naquela época. Então, em uma das piores fases, ela tentou afogar Tedd quando ele ainda era um bebê, e mudou de ideia alguns segundos depois; mas já era tarde demais, porque uma parte do cérebro de Tedd já havia sido comprometida e ele acabou perdendo a audição por causa disso. A mãe deles foi mandada para uma clínica, bem longe, e quatro anos depois ela voltou, totalmente curada, arrependida, mas melhor, e dava pra ver nas minhas visitas a casa de Max, quando eu almoçava ou jantava lá, que ela ama Tedd mais do que tudo, e que aquela fase obscura já passou.

A mãe deles vem andando até nós agora, parecendo surpresa e contente em me ver, e eu me viro para Tedd para dizer, em sua linguagem, que eu era amiga do seu irmão. Minha mãe vivia me dizendo que é feio dizer para uma criança pequena que você era "namorada" de alguém, porque elas nunca vão entender do jeito certo, ou vão ficar curiosas, então é melhor dizer que você foi amiga, o que não deixa de ser verdade.

-Carter? -A voz familiar de Ingrid enche meus ouvidos e memórias dela em vários encontros nossos enchem a minha mente, e eu tenho que me segurar para não chorar.

-Ingrid! -Sim. Eu já tinha passado da fase de chamar minha sogra pelo sobrenome quando Max e eu namorávamos. Ela me abraça, cheirando a baunilha, como sempre, e depois mexe nos meus cabelos.

-Querida! Quando Jill contou que você tinha voltado eu quase não acreditei! E quando ela disse que você tinha mudado, nunca imaginei como estaria. Seu cabelo está maravilhoso.

-É natural. -Sorrio, porque ver ela, Jill e Tedd me deixam mesmo feliz. Tedd fica brincando com a minha perna, de alguma forma, enquanto Jill e Ingrid se revezam para falar comigo.

-Esses cachos são tão lindos.

-A cor também. -Jill adiciona.

-Tedd, pare com isso. Sim, a cor também. O que você tem feito, querida?

-Hm, voltei para a escola.

-E a música?

-Mais ou menos.

-Mãe, não acredito que você esqueceu! Eu te disse que ela era a mentora do clube de música! -Pelo visto, Jill falou bastante coisa sobre mim para Ingrid. Me pergunto se Max teve que ouvir, também.

-Filha, é muita coisa na minha cabeça. Acabei esquecendo, mas agora lembrei. -Ela dá um beijo na testa de Jill, e meu foco vai para a irmã de Max e minha preocupação com ela, como tive no auditório. Fora da escola, ela parece... melhor. Seja lá o que isso signifique. -Bom saber que você voltou com tudo. Você TEM que ir nos visitar uma hora dessas. -Tenho certeza que Max ia adorar.

-Claro. -Sorrio outra vez, fazendo a promessa vazia. As mulheres me abraçam, e eu sinalizo um tchau para Tedd, que responde, meio distraído, então observo eles descerem a rua. Eu fico um tempo, plantada lá, sem saber o que fazer, tentando fazer minha mente voltar para a realidade e processar que eu estava falando com minha ex-sogra dois anos depois do que aconteceu, não um encontro em uma dia qualquer.

Me acostumar com essas coisas é a pior parte.

Continuo a andar, mas eu sinto a necessidade de fazer outra coisa, e andar sem rumo não ajuda em nada. Pego meu celular, incerta do que fazer. Quero ir pra algum lugar, mas não sei onde. E eu disco o número.

Não sei se vai ser a decisão mais inteligente que eu já fiz, provavelmente não. E Connor vai me matar. Mas eu sinto que é a coisa mais certa, mesmo que idiota, que eu fiz hoje.

Eu ligo pra Ashley.


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