90 Dias escrita por Gaby Molina


Capítulo 8
Capítulo 8 - Jem e Tori


Notas iniciais do capítulo

I'm back o/



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Jem

And as I looked around,

I began to notice

That we were nothing like the rest.

— Mountain Sound, Of Monsters And Men

Angie Brooks era a garota mais fascinante do universo. Seus olhos azul-escuros contornados com lápis de olho se cravaram em mim. Ela usava um vestido lindo azul-marinho que combinava com seus olhos; seu cabelo louro estava solto, colocado para frente de um lado só.

— Você está... Uou — aproximei-me dela, gritando por causa da música.

— Você também está bem uou — ela sorriu levemente. — Cassie disse que ninguém da escola estaria aqui.

— Eu não sou ninguém!

— Ainda assim, está frustrando os planos dela.

— E quanto aos seus? — sentei-me ao lado dela.

— Quem disse que eu tenho planos?

Foi quando começou a tocar No Light No Light, da Florence and The Machine. Era uma das melhores bandas de todas.

— Me concede essa dança? — estendi-lhe a mão.

— Que música estranha para uma dança. — comentou, mas me acompanhou até a sala de estar.

Era uma música bem animada, e nenhum dos dois fazia ideia do que estava fazendo, então apenas ficamos rodando e balançando como dois idiotas felizes.

'Cause it's so easy

To say it to a crowd

But it's so hard, my love

To say it to you out loud...

Nem me fale.

— Você é incrível — soltei de repente. — Sabe disso, não sabe?

Angie pareceu surpresa, mas se aproximou de mim e sorriu.

— Já está se apaixonando por mim, James? — eu podia sentir seu hálito de cerveja e menta.

— Não seja tão cheia de si, Brooks. Meu único amor continua sendo eu mesmo. E a Tori, mas ela não conta, porque é impossível não amar aquela maldita, e... — fitei os olhos dela por um momento. — Merda, a quem estou tentando enganar?

Inclinei-me e a beijei nos lábios. Empurrei-a até uma das paredes e grudei nossos corpos. Eu já podia sentir o tapa que provavelmente levaria.

Não, espere... Ela não me afastou. Ela retribuiu o beijo.

Ela retribuiu o beijo! Angie colocou os braços em volta de meu pescoço e aprofundou o beijo, acariciando meu cabelo já bagunçado. Separamo-nos por tempo o suficiente para recuperar o fôlego e olhar nos olhos um dos outros, e depois voltamos aos beijos.

Aquilo não soava real. Garotas como Angie Brooks não existiam. Bem, eu não estava nada certo sobre aquele plural. Porque não havia mais ninguém no mundo como ela, e eu não queria que houvesse. O gosto de cerveja invadiu minha boca. Teria de pegar carona com minha irmã, mesmo que tivesse sido apenas um pouco mais do que um copo.

Mas eu não queria pensar nisso agora, porque Angie estava em meus braços e ir para casa parecia extremamente irrelevante.

Tori

And these fingertips

Will never run through your skin

And those bright blue eyes

Can only meet mine...

— Love Love Love, Of Monsters And Men

Eu passara o dia com a maior das dores de cabeça. Estava indo até o banheiro tomar uma aspirina quando ele apareceu. Quem era o cara? Não faço ideia.

Mas não tomava "não" como resposta. Ele me prensou na parede, com um sorriso nos lábios.

— Calma aí, colega — falei, me soltando.

— Vai fazer o que hoje à noite?

— Você é que não vai ser.

— Isso é o que vamos ver — ele segurou minha cintura.

— Estou falando sério, me solte!

— Só um beijinho.

— Certo, como se eu fosse acreditar nisso — revirei os olhos.

Céus, eu tinha 1,67m de altura. Não tinha força o suficiente para me soltar. Então chutei a virilha dele e saí correndo no meio da multidão.

— Vadia! Agora você vai ver só!

Corri com apenas um pensamento na cabeça: Merda, merda, merda. Tranquei-me no banheiro e passei um tempo apenas tentando recuperar o fôlego. Eu não podia sair dali. Aquele cara me encontraria, eu não conseguiria me soltar, e...

Eu nunca tivera uma crise de pânico, mas acho que aquilo se parecia um pouco. Liguei para a Cassie. Ela era a forte do grupo, ninguém mexeria com ela — ou comigo, se estivesse com ela. Mas é claro que ela não atendeu.

Da última vez que chequei, ela estava beijando o cara que lhe convidara para dividir a Jack Daniels. Ligar para a Angie também foi inútil. Angie e Cassie eram duronas. Eu era o ponto fraco. E eu estava perdida.

Liguei para Jem. Sem resposta. Filho da puta! Sentei-me na pia e fiquei tentando engolir meu orgulho durante dez minutos e ligar para Gabriel.

A voz dele assumiu um tom de preocupação quando contei o que tinha acontecido e onde estava, e ele prometeu que chegaria logo. Ouvi uma batida na porta — a sétima nos últimos vinte minutos.

— Está ocupado!

— Victoria?! — reconhecer a voz foi como ter um peso enorme tirado de minhas costas.

Abri a porta lentamente e, ao ver aquele par de olhos azuis, apenas abracei-o. Ele pareceu surpreso, mas me abraçou.

— Está tudo bem — suspirou. — Me aponte o cara.

— O que você vai fazer?

Pergunta estúpida.

— O que acha?! Vou arrebentar a cara daquele infeliz!

— Gabriel. Não. Vamos logo, temos que dar o fora daqui.

Sob protestos, ele me seguiu. Estávamos quase saindo da casa quando ouvi uma voz bem perto de minha orelha.

— Trouxe seu namorado também? Que ótimo.

Gabriel não fez perguntas. Acho que meu olhar denunciou tudo, e ele apenas meteu um soco no nariz do cara.

— Gabriel! — gritei.

— Você é tão pacífica. É bonitinho, sério — ele sorriu. — Não aguentei. Agora sim temos que dar o fora daqui — e me puxou para fora.

Fomos em silêncio até seu carro. Sentei-me no banco do passageiro e ficamos em silêncio por um minuto.

— Fiquei feliz por você ter me ligado — confessou ele. — Só quero que saiba. Não ligo para nada do que aconteceu, você pode sempre contar comigo.

Assenti, orgulhosa demais para agradecer. Foi como sentir o gosto dos lábios dele de novo e de novo. Chegamos tão perto. Uma semana antes da volta às aulas, ele me beijou e foi perfeito. Ele me disse que seria professor, mas que podíamos nos ver nos fins de semana. Claro que tudo mudou quando ele entrou na sala para trabalhar e me encontrou lá.

E cá estamos, quase um ano depois, na mesma situação.

— Eu não tinha opção — falei baixinho, e Gabriel apenas assentiu e deu partida no carro.

Mandei uma mensagem para Angie e Cassie dizendo que tinha ido para casa e que estava bem. Passamos a viagem toda em silêncio, mas ele me conhecia bem demais. Quando paramos no semáforo vermelho, Gabriel me fitou.

— Tem alguma coisa te incomodando. E não sou eu.

— Estou bem.

Ele assentiu, deixando claro que não acreditava em mim, e acelerou. Chegamos à minha casa rapidamente. Toquei a campainha, mas meu irmão não atendeu.

— Jem! — gritei, socando a porta.

Depois de cinco minutos, Gabriel disse:

— Já liguei mais de cinco vezes, Victoria, ele não atende. Você não tem chave?

— Tenho, mas está lá dentro. Jem deve ter saído. Certo, eu me viro.

— Está tarde. Sem chance de eu largar você sozinha do lado de fora.

— Vai fazer o quê? Arrombar a porta?

— Não. Vou esperar seu irmão com você.

Gabriel sentou-se ao meu lado no degrau.

— Suponho que mandar você embora não vai adiantar?

— Não.

— Tudo bem, então — bufei e fiquei observando a rua vazia.

Depois de uns quinze minutos, ele perguntou novamente:

— Você está bem mesmo?

— Não. Sabe, passei minha vida inteira ouvindo as pessoas falarem sobre como eu sou indefesa e fofa, e dizendo a elas que estavam erradas. Mas é verdade. Não imponho relutância como a Cassie, nem sou perspicaz como a Angie. Sou um alvo fácil. Um peso-pena.

— Perspicaz — ele repetiu, pensativo. — Nunca ouvi você dizer isso.

— Aprendi naquele livro lá — sorri levemente. — Mas, além disso, eu bato e corro, sabe? Faço coisas corajosas e depois me escondo morrendo de medo. Quando aquele cara tentou me agarrar, eu chutei a virilha dele. Mas depois me tranquei no banheiro por uma hora com medo do que ele poderia fazer. Tanto medo que até liguei para você.

— Você não é medrosa, Victoria. É durona, sim. Não consigo nem imaginar o que seria de mim se eu tivesse de passar por tudo o que você e Jem passaram no ano passado... — a voz dele falhou. — E o jeito que você lidou com tudo? Foi surpreendente. No final do dia, você estava cuidando da sua família, e não o contrário.

Gabriel entrelaçou os dedos nos meus e me fitou por um longo minuto. A sinceridade era visível em seus olhos.

— Valeu — desviei o olhar, mas ele não. — Por dizer essas coisas, e por me escutar, e por atender o telefone quando ninguém mais atendeu, e por me dar uma carona, e por esperar aqui comigo.

Eu estava segurando todos aqueles agradecimentos desde que ouvira a voz dele no telefone.

— Só estou sendo um professor legal.

— Acho que eu meio que arruinei a coisa de você ser meu professor — soltei um riso. — Ou todas as suas alunas têm seu celular?

— Nem pensar. E eu certamente não atenderia se me ligassem. Talvez atendesse se fosse a Cassie, mas só porque poderia ter algo a ver com você.

Sorri levemente, ainda fitando nossas mãos entrelaçadas.

— Eu realmente não deveria ter te ligado.

— Por quê?

— Porque vou acabar fazendo algo de que me arrependerei.

— Tipo o quê?

— Tipo isso — e o beijei nos lábios.

Gabriel hesitou, surpreso, mas me beijou de volta. Puxou-me para perto e, quando o fôlego acabou, abrimos os olhos e ele sussurrou:

— Já está arrependida?

— Ainda não — e o beijei novamente.

Nada poderia ser melhor do que abrir os olhos e me deparar com aqueles orbes azuis e aquele sorriso de canto.

— Já está se sentindo inspirado o bastante para ler meu trabalho do Sherlock agora? — zombei, numa tentativa fracassada de lembrar a mim mesma de que ele não era mais simplesmente o Gabriel.

— Cale a boca, Victoria — ele riu, me empurrando de leve, e por um momento foi quase como os velhos tempos.

— Você seria um excelente biomédico.

— Não, não seria.

— Tem razão. Você é lesado demais para ser médico.

— Ei! — ele protestou e eu ri.

Encostei minha cabeça no ombro dele e ficamos observando alguns carros passarem.

— Eu queria que você não fosse um professor tão bom, mas você é.

— Que comentário perspicaz da sua parte. Você se esqueceu de que eu também sou extremamente atraente, engraçado, pontual, praticamente um herói e beijo muito bem.

— E tem um excelente soco de esquerda, pelo o que observei.

— Não me arrependo.

Fitei-o.

— De nada?

Foi quando um táxi parou em frente à casa e aquela figura alta e morena que eu conhecia muito bem pulou para fora do carro.

— Tori, sua maldita! — Jem resmungou, batendo a porta do táxi. — Você nos matou de preocupação! Além do mais, você era a motorista!

— Vocês não atendiam o telefone, filhos da mãe! Eu estava em pânico e ninguém atendeu!

— Eu atendi — lembrou Gabriel.

— Certo, tem isso também. Onde diabos você estava, James Richards Lightbody?!

— Eu... Hm...

— Se você estava com uma garota, pode dizer — falei. — Se estava com um garoto, pode dizer também.

— Continuo sendo hétero, ok, Tori?

— Sei lá, você gosta de Christina Aguilera.

— Eu não gosto das músicas dela. Acho que ela canta para caralho, porque ela canta para caralho. E é gostosa. Só isso.

— Certo, onde você estava? Porque eu fiquei trancada para fora! E a mamãe só volta de madrugada!

— Eu deveria... ir — Gabriel se levantou, um pouco desconfortável. — Tchau, Victoria — acenou para mim. — Tchau, James.

— Tchau. E você — Jem me encarou. — Para dentro, mocinha.


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