A Canção Permanece A Mesma escrita por Bella P


Capítulo 17
Capítulo 16




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PURGATÓRIO – 2 dias antes

Dean estava chocado com a quantidade de coisas que ele não sabia sobre o mundo sobrenatural. Havia lobisomens que não eram simplesmente animais sanguinários, fantasmas que não se tornaram espíritos vingativos após se recusarem a seguir em frente, bicho-papão que podia ser repelido com apenas um feitiço. E, claro, os bruxos.

Quanto Astoria havia lhe contado sobre os bruxos no segundo que a conheceu, ficou mais do receoso em tê-la como companhia. Mas o fato dela ser da família pesou mais do que ela ser uma bruxa. Além do mais, ela já estava morta e no Purgatório, embora planejasse sair dali, portanto não seria vantagem nenhuma atacar Dean. E então, nos últimos dias de viagem, ela lhe contou sobre a sua mãe Sophia e as histórias dela sobre Mary. Sobre os ideais das duas primas e em como Sophia acreditava que nem tudo precisava ser caçado sem piedade.

Dean ouviu cada palavra saída da boca de Astoria com ávida atenção. A mulher sabia mais sobre a sua mãe do que ele mesmo, pois existiam cartas de Mary para Sophia contando sobre a sua vida desde que se casou com John até o nascimento dos filhos. Cartas essas que agora estavam sob o poder de sua prima Daphne.

– Acho que a última carta dela foi uns dois meses antes dela morrer. - Astoria havia explicado.

O tio que fora responsável por construir um memorial para Mary, o tio que ele nunca conheceu, era o avô de Astoria. Avô este que não fazia nem ideia de que as netas eram aquilo que ele fazia questão de caçar.

– Minha mãe achava que ele não compreenderia. Então, nas reuniões de família, o meu pai ficava na Inglaterra sob o pretexto de estar ministrando aulas de verão para os alunos da universidade e nós, como éramos menores de idade e pelas leis mágicas não podíamos executar magia fora da escola, evitávamos qualquer atitude estranha que levantasse suspeitas. Robert era tão desconfiado quanto o irmão dele.

E isso era outra coisa que tinha chocado Dean: comunidade mágica.

Bruxos possuíam uma sociedade estruturada, escondida da sociedade que ele conhecia, com sistema de polícia, saúde, educação, governo e etc. Escondida há séculos daqueles que eles chamavam de trouxas. E nesta mesma sociedade se refugiava boa parte dos monstros que ele costumava caçar. Monstros esses que os bruxos estudavam, registravam, controlavam e possuíam literatura completa sobre o assunto.

O mundo sobrenatural não deveria ter nada de desconhecido para um bruxo.

Sam com certeza iria a loucura quando descobrisse isto. Do jeito que era nerd, iria querer colocar as mãos em todos os livros que dita comunidade poderia oferecer. Quando vocalizou isso para Astoria, ela somente riu.

– Igual a minha irmã. Quando ela saiu de Hogwarts fugida da guerra, logo que essa terminou ela conseguiu entrar em Cambridge e formou-se em teologia e mitologia. Hoje leciona.

A guerra no mundo mágico era outra coisa que Astoria havia contado à Dean.

Quando se conheceram e ela explicou quem era, o que era, a mulher tinha dado uma pincelada de leve no assunto. Agora, viajando junto há dias com Benny sendo uma companhia silenciosa, ela tagarelava de tudo e mais um pouco sobre o que lhe viesse à mente. Sobre as caçadas que fez com a família e sobre os seus anos em Hogwarts, na escola de magia.

– Aposto que você iria adorar! É um castelo enorme, milenar. Fascina qualquer um que o vê. Mesmo depois de anos vivendo dentro dele, o lugar continuava me fascinando. - ela disse quando ambos os primos descobriram terem uma certa queda pela cultura pop e Astoria falou que a própria história de Hogwarts e os acontecimentos que ocorreram dentro do castelo serviriam como inspiração para muitos contos sobrenaturais.

Astoria também havia contado sobre Draco e os filhos, outra coisa que surpreendeu Dean.

Ela tinha filhos e o caçador percebeu, com uma dor que lhe comprimiu o peito, em como as histórias deles eram parecidas. Com a diferença de que Astoria era Mary e os filhos dela seriam Dean e Sam.

– E você não pensou neles quando decidiu se explodir com a casa? Ou bloquear os poderes deles? - foi uma das poucas intromissões de Benny na conversa entre os primos. Quando Astoria contou como ela resolveu se arriscar e brincar com a burocracia do Inferno, acreditando que suicidas iam para um lugar diferente daqueles que vendiam a sua alma, ela fez isso no maior estilo dramático. Mandou a antiga casa da família do marido, que estava nessa há gerações, pelos ares.

Quanto à pergunta de Benny, Astoria apenas o olhou longamente com uma expressão fechada. Embora tivesse sido educada dentro da filosofia de que caçaria apenas aquilo que os caçava, ela ainda era uma caçadora como qualquer outra. Uma Campbell. Portanto, eternamente desconfiada. Benny poderia ser um aliado no momento, mas ainda era um vampiro. E esses sempre eram pouco confiáveis.

– Era a única forma de quebrar os feitiços que prendiam Draco à propriedade. - ela disse. - Além do mais, sobrenatural tem radar para o sobrenatural. Eu tinha certeza de que o demônio com quem fiz o acordo não iria gostar do que eu fiz e iria atrás da minha família, principalmente dos meus filhos. Tirar os poderes de Nico e Scorpius... - nisso ela pausou. - Não, eles não são mais Nico e Scorpius, são Drew e Ben. Tirar os poderes deles foi uma maneira de protegê-los.

E ela explicou sobre o Departamento de Registro Mágico, sobre assinaturas mágicas e como as dos filhos foram extintas na mesma noite em que ela morreu. Como Daphne havia realizado o ritual bloqueando os poderes deles, tudo de maneira cronometrada com a explosão da mansão, os declarando mortos, e como a irmã havia forjado novas identidades, identidades de cidadãos americanos, para os meninos.

– Tenho que dizer irmã, isto é macabro. Esperto, mas macabro. - Dean comentou enquanto os seus olhos percorriam as árvores a sua volta. Anoitecia no Purgatório e era durante a noite que as coisas ficavam mais tensas. Com Astoria juntando-se ao grupo tinham mais alguém para montar vigília e, assim como tinha prometido a Benny levá-lo de volta, faria o mesmo com ela.

A mulher lutava com todas as forças para retornar a família, acreditando piamente que o marido fazia o mesmo do outro lado. Dean não tinha tanta fé nesse tal de Draco Malfoy como Astoria. Pelas histórias que ela contou, o homem foi durante toda a infância e adolescência uma criatura covarde e de caráter fraco e não parecia o tipo de sujeito que se arriscaria tanto por alguém. E como Sam antes havia dito que a boca de Dean não possuía filtro, o caçador deixou bem claro o que achava do marido da recém-descoberta prima.

Astoria apenas o mirou com fúria e trincou os dentes em resposta ao comentário dele e Dean esperou o sermão que estava prestes a vir. Esperou ela defender o homem em quem acreditava cegamente que viria salvá-la, mas tudo o que ela disse foi:

– Você não conhece Draco como eu. Eu não acredito que ele virá, eu sei que ele virá. - e ela havia falado isto com tanta convicção, tanta certeza, que Dean passou a acreditar também.

Continuaram caminhando à medida em que a noite caía e logo Astoria parou de contar as suas histórias, preferindo o silêncio no momento.

– Uma coisa que não entendo. - Dean perguntou após um tempo. - Se Draco era um Comensal, lutando pelo lado nazista bruxo, por que se aproximou dele? Por que se interessou por ele? Estava entediada com a vida? Precisava de um bad boy nela? - a mulher ficou quieta por mais um tempo, sem dizer nada, até finalmente dar uma resposta.

– A primeira vez foi por pura curiosidade. Depois disso... - Astoria não sabia explicar o que realmente aconteceu. Depois do primeiro encontro com Draco, na noite em que passaram a madrugada sentados em um meio fio em Spinne's End, conversando como se ele não fosse um Comensal e ela uma garota abaixo do status social dele, havia acontecido algo. Uma ligação havia surgido entre eles.

Uma ligação que a incitava a procurar Draco, obter a companhia dele, e que fazia o mesmo com ele. Porque Draco não tinha razão para ir aos encontros que ela planejava durante a madrugada em Hogwarts, mas ele sempre estava lá. Religiosamente na mesma hora, quando ela chegava na torre, ele já estava lá, o que a fazia crer que o rapaz também sentia aquele elo que parecia puxá-los na direção um do outro.

– Eu não sei. Parece que surgiu... - o que ela fosse dizer foi interrompido por Dean fazendo um “shush” sob a respiração e erguendo a mão com a palma virada para Benny e ela, os pedindo para parar.

Astoria compreendeu rapidamente o porquê da parada quando sentiu uma presença sobrenatural que ia além de Benny ao seu lado. Prontamente o trio ergueu as armas que carregavam e puseram-se de costas um para o outro, montando um círculo de proteção enquanto os seus olhares percorriam as árvores ao seu redor a procura da propensa ameaça.

Uma brisa soprou na noite, o que era um mau sinal. Brisas não sopravam a não ser que houvessem monstros por perto, e então veio o silêncio. Na mente dos três passava a mesma coisa: todos torciam para que não fossem leviatãs. Mas então algo estalou à esquerda deles, um galho provavelmente, o que mostrava que era outro tipo de monstro. Leviatãs eram animais sedentos de sangue, mas animais extremamente inteligentes. Não dariam a pista de sua localização assim tão facilmente.

Um vulto surgiu de entre as árvores na direção de Dean que travou os joelhos para preparar-se para o impacto que não veio. Algo pareceu chocar-se com o monstro em pleno ar e arremessá-lo contra um tronco, e quando ele olhou por cima do ombro viu que Astoria tinha uma das mãos erguidas.

– Vejo que os seus poderes voltaram. - falou com as sobrancelhas arqueadas.

– Talvez. - veio a resposta contida dela, e Dean pôde perceber que a breve demonstração de magia havia a deixado exausta. A caçadora explicara que havia usado um feitiço dias atrás para projetar-se ao mundo humano e entrar em contato com uma vidente, pedir a ela que avisasse a Draco sobre o seu paradeiro. A brincadeira a deixara com as reservas mágicas baixas e exausta, o que a fez baixar a guarda e ser perseguida por leviatãs. Perseguição que resultou no encontro dos primos.

– Dean! - o chamado de Benny vez o homem se virar rapidamente quando o rugaru ergueu-se do chão, usando o tronco como apoio, e preparou-se para outro ataque. Astoria novamente ergueu a mão, pronta para fazer o que fosse necessário para livrar-se de mais aquele inconveniente, quando Dean a interrompeu, segurando em seu pulso com força.

– Eu preciso dele. - decretou e ela rapidamente entendeu. Achar o tal anjo que o primo procurava com tanto desespero não estava sendo fácil e a única maneira de obter informações era dos monstros que eles caçavam ou que os caçava.

Quando o rugaru posicionou-se e deu outro salto, Astoria soltou o seu pulso de entre os dedos de Dean e apontou a mão para a criatura.

Incarcerous! - as correntes surgiram no ar como se tivessem sido cuspidas de um portal, chocando-se com o peito do rugaru e o arremessando de novo contra o tronco grosso, envolvendo-se no mesmo e aprisionando o monstro de modo que por mais que esse rosnasse e se debatesse, não iria muito longe.

Benny foi o primeiro a se aproximar do novo prisioneiro, agachando-se em frente à ele para verificar a firmeza das correntes.

– Está duvidando das minhas habilidades? - Astoria questionou em um leve tom ofendido. O vampiro havia surpreendido os primos ao informar-lhes que possuía um certo conhecimento da comunidade mágica e que, até onde se lembrava, bruxos de verdade usavam varinhas para executarem feitiços. Dean havia rido da ideia de existir varinhas de condão e então a mulher explicou que o surgimento das varinhas era um fator histórico.

Quando os bruxos executavam magia na época de Merlin, essa possuía uma manifestação física que era caracterizada pelas íris brilharem em um tom dourado quando o feitiço era proferido. Com a invasão romana, a queda do reino de Arthur e a perseguição aos druidas, os bruxos precisaram arrumar uma outra maneira de manifestar magia sem que os mortais percebessem. Assim vieram as varinhas que nada mais eram do que uma maneira de se canalizar os poderes e simplificar os feitiços que antes eram encantos que solicitavam longas entoações para surtirem efeito.

Com o tempo, bruxos ficaram dependentes das varinhas e esqueceram que elas não eram o único modo de manifestar magia e que agora com a existência de um mundo somente mágico, não havendo mais a mistura entre as sociedades, era seguro desapegar-se delas. O problema era que aprender a fazer feitiços como na época de seus ancestrais druidas tornou-se tão complicado quanto aprender a fazer um feitiço de alta complexidade usando uma varinha.

Astoria levou uns trinta anos no Inferno para controlar os seus poderes que insistiam em não obedecê-la quando ela executava um feitiço. Mas, em compensação, os tiros pela culatra que esses davam eram tão devastadores que surtiam o mesmo efeito que ela pretendia: o de eliminar o demônio da vez que a perseguia.

Dean parou de prestar atenção na história dela no momento em que ela confirmou que o lendário Rei Arthur existiu, e o geek escondido dentro dele ficou fantasiado por minutos sobre essa nova informação antes de voltar a terra quando viu que Astoria e Benny o olhavam estranho. Com certeza ele deveria estar com a cara de paspalho que Sam o acusava de fazer quando sonhava acordado.

– Claro que não. - Benny sorriu sarcástico para ela e Dean rolou os olhos enquanto o vampiro se afastava do rugaru. - Não creio que ele vá dizer alguma coisa. - declarou. A criatura mais parecia uma besta sedenta e os olhos não demonstravam muita inteligência. Afinal, ele tinha atacado sozinho três pessoas armadas, sem ter nenhum conhecimento prévio do adversário ou se a batalha seria vantajosa.

– Ah, ele vai. - Dean aproximou-se do monstro com um brilho determinado no olhar que fez Astoria recuar um passo.

Conhecia aquela expressão, vira no rosto da irmã várias vezes durante uma caçada. Era a expressão de alguém que estava disposto a ir além dos limites para obter o que queria. A expressão que Daphne ostentou quando disparou diversas vezes contra Fenrir Greyback na batalha de Hogwarts. A expressão responsável por ter colocado a sua irmã sabe-tudo na Sonserina ao invés da Corvinal.

E então Dean começou a interrogar o rugaru a respeito do anjo que procurava com tanto afinco. Astoria recuou mais alguns passos, parando ao lado de Benny, observando quieta o primo fazer as perguntas a criatura acorrentada.

Ela realmente estava doida para conhecer esse tal de Castiel. Dean contara algumas histórias para ela durante os dias de viagem juntos. Como Castiel deixou o Céu para lutar ao lado dele e de Sam contra Lúcifer e Miguel, para impedir o Apocalipse, entre outras coisas. E o tom que Dean usava, sinceramente, era quase uma reverência. A admiração que ele tinha pelo anjo era impressionante e o amor também. Porque Castiel, pelas histórias, havia feito muita besteira e Dean tinha praticamente perdoado todos os erros dele em todas as vezes. Era a relação mais codependente que ela já tinha visto. E o primo ainda tinha a ousadia de questionar o relacionamento dela com Draco?

Ao seu ver, a relação Dean e Castiel era praticamente no mesmo nível da relação dela com Draco. A diferença era que a do primo com o anjo ainda não tinha chegado ao nível carnal.

Astoria voltou a atenção para Dean quando o rugaru finalmente disse alguma coisa de útil ao homem e encontrou a sua morte ao ter uma faca cravada em seu queixo.

– Esqueça o acampamento, vamos seguir viagem.

– Dean... - Astoria tentou argumentar. Mesmo morta ela se cansava, não tanto quanto quando era viva, mas ainda sim precisava de uma pausa vez ou outra. Dean, esse estava bem vivo, com a roupa puída, feridas mal cicatrizadas e um ar de quem precisava de uma cama para dormir pela próxima década, e mesmo assim queria prosseguir viagem.

– Cas pode estar seguindo a nossa mesma linha de pensamento de continuar em movimento. Não sei quanto tempo ele vai ficar no mesmo lugar. - disse isso e prontamente apressou os passos, sumindo entre as árvores.

Astoria lançou um olhar a Benny que deu de ombros. Sabia a opinião do vampiro sobre essa ideia fixa do primo de encontrar o anjo. Benny considerava Castiel um covarde por ter sumido na batalha e abandonado Dean e não acreditava que ele estivesse o procurando. Ela apenas estava curiosa em conhecer o sujeito que fazia o mais velho dos Winchester ir além da exaustão para encontrá-lo.

Com um suspiro exasperado, pôs-se a seguir o outro homem, sabendo que a teimosia era uma característica dos Campbell e nada do que dissesse iria dissuadir Dean de sua missão agora que obtivera uma pista concreta do paradeiro do anjo.

Permanecerem caminhando por toda a noite, com Astoria e Benny mantendo os olhos bem abertos e alertas a tudo ao seu redor e vez ou outra cravando os olhos em Dean a procura de qualquer sinal de cansaço no caçador. Mas como dito antes, teimosia era uma característica dos Campbell e o homem estava disposto a andar dormindo se precisasse, ou se arrastar entre a mata caso as suas pernas não mais aguentassem carregá-lo, mas ele encontraria o anjo, o que a deixava extremamente intrigada.

Agora estava louca para conhecer Castiel.

O amanhecer no Purgatório não era algo digno de declamar poemas. Era mais como se alguém tivesse virado a chave de um interruptor e ligado a luz. Uma hora estava escuro, na outra estava claro, e as árvores continuavam a serem as mesmas, o que dava a sensação de não estarem indo a lugar algum.

O som de água correndo chegou aos ouvidos deles e Dean apressou os passos. Segundo o rugaru, essa era a localização do anjo. Passaram entre moitas, quebrando alguns galhos, os tirando do caminho, e desceram cuidadosamente um barranco que levava a uma pequena praia a beira de um rio. Um rio onde na margem havia uma figura agachada.

Astoria viu o rosto de Dean iluminar-se em pura felicidade quando os seus olhos caíram sobre o homem de costas que usava um sobretudo surrado e imundo e o ouviu gritar:

– Cas! - e uma voz rouca responder com surpresa:

– Dean?

Castiel se levantou, virando-se para o trio que se aproximava e a ex-Corvinal agora percebia o que o primo via no anjo. Castiel estava tão sujo quanto eles, usando roupas de hospital imundas, um sobretudo igualmente encardido e possuía uma barba por fazer. Tinha cabelos negros despenteados e mesmo entre os tons de cores apagadas do Purgatório, os seus olhos azuis era o que mais se destacava em seu rosto.

Era um sujeito bonito... Para um anjo.

Dean prontamente o abraçou quando se aproximou o suficiente, o seu rosto ainda iluminado em um largo sorriso. Benny não parecia feliz de estar na presença do anjo e Astoria só estava curiosa.

E então Benny começou a fazer perguntas, querendo saber o que tinha acontecido com ele, por que ele sumiu no meio da batalha e deixou Dean sozinho. Dean pôs-se a defender Castiel até que este o interrompeu e assumiu que tinha fugido deliberadamente, deixando o caçador para trás de propósito.

O sorriso no rosto do homem morreu instantaneamente e o temperamento explosivo também característico dos Campbell deu as caras.

Astoria engoliu uma risada. Dean repreendia Castiel como um amante desapontado e o anjo mirava o seu primo com a maior expressão culpada existente, a fazendo lembrar de um cão sem dono. Era de dar pena, porque ela via no rosto do ser divino a mesma devoção que Dean nutria por ele. Esses dois eram simplesmente patéticos.

E foi quando Castiel disse que era para Dean ir embora e deixá-lo para trás e a resposta do primo foi:

– Acho que você não entendeu Cas: eu não vou embora sem você. - Astoria gargalhou, atraindo a atenção dos três homens para ela. - Qual é a graça? - Dean perguntou em um tom azedo, mas o olhar de Benny sobre ela mostrava que o vampiro compreendia do que ela ria.

Castiel inclinou a cabeça para o lado como um cachorrinho confuso e isso a fez rir mais ainda.

– Dean... Ela é sua prima. Vejo a ligação genética em sua essência. - isso fez Astoria engolir a risada de pronto e mirar o anjo com divertimento.

– Notícia velha, Cas. Eu sei que ela é minha prima.

– E é uma bruxa. - continuou o anjo.

– Também sei disso Cas. - Dean soltou em um suspiro exasperado.

– E possui a marca do Cupido. - essa era nova.

– Como é? - Astoria soltou chocada.

– Vejo a marca do Cupido em você. - Castiel repetiu como se isso fosse o óbvio.

– Eu... Cupido? - Astoria balbuciou. Anjos eram uma novidade para ela. Sempre soube da existência dos demônios, do Inferno, e acreditava que se eles existiam, o oposto também, mas acreditar e ver eram duas coisas diferentes. Agora, Cupido? Achava que isso era fruto da mitologia. Mas era lutando contra seres que existiam em lendas e mitologia que ela fazia a vida. Então por que o Cupido não poderia existir como qualquer outra criatura sobrenatural?

– Os casais abençoados pelo Cupido são casais predestinados, cuja união é necessária para a realização de grandes feitos. Foi assim com John e Mary Winchester. A união deles trouxe ao mundo Sam e Dean. - Castiel explicou no mesmo tom de enfado em que o professor Binns explicava a guerra dos Goblins, e Dean fez uma expressão de desprezo. Com certeza essa história do Cupido interferindo na vida amorosa dos seus pais não era algo que o agradava.

– Certo. Que tal deixarmos essa conversa para quando não estivermos mais aqui, huh? - Dean declarou. - Encontramos Cas, agora está na hora de encontrar o portal e darmos o fora daqui.

– Que portal? - Castiel perguntou com curiosidade.

– O portal que Deus colocou no Purgatório como saída de emergência para caso de humanos ficarem presos aqui por acidente. - Benny explicou quando eles voltaram a caminhar com mais uma adição no grupo.

Não foram muito longe antes do primeiro ataque ocorrer e Astoria se surpreender quando viu Castiel simplesmente ir na direção do monstro, espalmar a mão no rosto dele e esse emitir um brilho pelos olhos, nariz e boca, antes de cair sem vida no chão. E então começou uma discussão entre Benny e Castiel sobre o fato do anjo ser um chamariz maior para os monstros do que a humanidade de Dean e Astoria.

O vampiro realmente não ia muito com a cara do anjo.

E então Benny teorizou sobre o portal e sobre como não podia afirmar que Castiel seria capaz de cruzá-lo por não ser exatamente humano. Dean novamente falou que ou todos saíam dali ou morriam tentando.

– Creio que não há maneira de matar a sua prima uma segunda vez, ou que ela tenha chances de voltar. - Astoria, se ainda tivesse sangue correndo nas veias, sentiria esse gelar diante do comentário de Castiel.

– Como é?

– A alma dela tem a marca de um demônio da encruzilhada. Ela a vendeu por alguma razão e por alguma razão não está cumprindo a sua penitência no Inferno. Por quê? - os olhos azuis a miraram com uma intensidade enervante e ela recuou um passo, na esperança de fugir deles. - Entendo. Mesmo que seja possível você voltar, a marca permaneceria, o demônio viria atrás de você de novo. - declarou e Dean entrou na conversa de supetão.

– Espera, espera! Como assim “possível”?

– Astoria destruiu o seu corpo terreno ao explodir a mansão. Logo, a alma dela não possui corpo para retornar. - e se Astoria ainda possuísse um coração batendo, esse teria parado naquele momento.

Um silêncio sepulcral caiu sobre o grupo diante da declaração de Castiel.

– Não interessa! - Dean soltou em um tom determinado. - Ela volta conosco e depois veremos o que fazemos.

Astoria admirava a convicção do primo, mas as notícias de Castiel a deixaram deprimida. O anjo tinha razão: não possuía um corpo para voltar e não havia levado isso em consideração quando explodiu a casa. Os feitiços só puderam ser ativados internamente e por ela. Logo, não haveria como fugir dos cães infernais, destruir a mansão e depois se matar. Teve que fazer tudo ao mesmo tempo pois a explosão também matara os cães, o que lhe deu tempo de sobra de evitar que o demônio viesse recolher a sua alma e ela mesma desceu ao Inferno na companhia de um Ceifador.

E ainda havia o fato de que retornar a vida não adiantaria de nada, pois ainda seria uma criatura condenada. Então, de que valeu todo o seu esforço?

– Astoria?! - Dean tocando-lhe o braço a fez piscar os olhos e mirá-lo, saindo de seus devaneios depressivos. - Nós vamos dar um jeito, confie em mim. - ela sorriu fracamente para ele. Ele era Dean Winchester, o cara que acabou com o Apocalipse. Claro que ele daria um jeito. Era superconfiante dessa maneira, assim como ela sempre foi. Isso também era de família.

Continuaram a viagem, com mais desentendimentos pelo caminho. Astoria grunhiu. Quando Dean e Benny não estavam sendo BFF, estavam testando o nível de testosterona entre eles. Castiel ou ficava confuso, ou apoiava Dean ou dava opiniões que faziam todos perceberem que ele não entendia metade das ironias que os outros dois homens estavam soltando um para o outro.

– E nós dois sabemos qual é a espécie que mais mata humanos. - Benny falou em meio a mais uma discussão.

– Estaticamente falando, essa seria a humana. - foi resposta precisa de Castiel, o que fez Dean e Astoria rolarem os olhos.

E então Benny começou a contar a sua história de vida, em como ele não era como os outros vampiros, que não sugava mais sangue humano diretamente de humanos, mas sim sangue doado.

– Se ele me disser que também só suga sangue animal e brilha no sol, eu me mato de novo. - Astoria murmurou sob a respiração e Dean gargalhou, compreendendo rapidamente a piada que deixou Castiel e Benny completamente confusos.

E então Castiel afastou-se da dupla que ainda discutia sobre a dieta diferenciada do vampiro, olhando ao seu redor com uma expressão nada animadora. A discussão entre Dean e Benny começou a elevar o tom, com acusações sendo trocadas e Astoria quis muito lançar um feitiço cala boca nos dois. Ao invés disso passou por entre eles, deixando as duas “crianças” discutindo, e aproximou-se de Castiel.

– A sua cara não é boa. O que foi? - perguntou baixinho, apenas para o anjo ouvir. Ele não respondeu, apenas lançou à ela um olhar de canto de olho e voltou a mirar as árvores ao seu redor.

– Ele vai acabar nos matando! - veio o grito de Benny e Castiel virou-se para os dois homens atrás dele.

– Acho que vamos testar essa teoria agora. - declarou.

– Mais monstros? - perguntou Dean.

– Leviatãs. - foi a resposta de Castiel.

– Por que não nos leva para longe daqui?

– Não posso, eles estão muito perto. Corram! - foi somente Castiel terminar de dar a ordem que eles desataram a correr entre as árvores.

Cometas negros vieram do céu cinzento, chocando-se contra o chão e abrindo buracos onde bolas de gosma parecendo piche remexiam-se de modo a formar em poucos segundos um ser humano que vestia-se extremamente bem para criaturas letais.

Astoria viu uma das bolas tomar forma na frente de Benny, sorrir da maneira cruel para o vampiro e depois virar na direção de Dean com o rosto dando lugar a uma boca enorme com fileiras de dentes e língua bifurcada, pronta para arrancar fora a cabeça do caçador.

Castiel virou-se na direção oposta para fugir e outra bola caiu na frente dele, impedindo a sua passagem. Uma terceira estourou atrás de Astoria, que recuou um passo e ergueu a sua espada de lâmina curta, pronta para a batalha.

Ela viu de rabo de olho Dean lutar com o leviatã até corta-lhe fora a cabeça, antes dela mesma ter o seu próprio leviatã para enfrentar. A criatura correu em sua direção com o maxilar já estendido, pronto para se transformar em uma enorme boca. O monstro desviou com precisão do primeiro golpe que ela deu, segurando-lhe o pulso com força e esmagando os ossos, a obrigando a soltar a sua arma.

A outra mão fechou-se como uma garra em seu pescoço e a arremessou no chão, a comprimindo contra a terra. Astoria espalmou a própria mão no pescoço do leviatã, mantendo com dificuldades a boca enorme e cheia de dentes longe de si. Tentava com as pernas alguma maneira de se soltar daquela prisão, mas a criatura era forte e ainda prendia uma de suas mãos de maneira dolorosa.

– Astoria! - ouviu Dean gritar e esperava sinceramente que o primo viesse ao seu socorro e ficou aliviada quando isso aconteceu.

Uma lâmina havia atravessado o peito do leviatã que a atacava, erguendo através dessa a criatura de cima dela. Uma outra cortou o ar com um sibilo e arrancou a cabeça dele fora. Astoria ofegou, aliviada, diante desse resgate em cima da hora. A arma saiu do peito do leviatã morto e o corpo caiu mole sobre o chão. Mas o que esse revelou ao sair do seu campo de visão não foi a expressão preocupada de Dean, mas outra, uma mais querida e bem mais familiar.

– Draco... - ela ofegou, com os olhos largos.

Era Draco, ali na sua frente, empunhando dois facões manchados com sangue negro e a mirando como se tivesse acabado de descobrir todas as respostas do Universo.

– Olá Astoria. - a voz grave e rouca dele a fez reagir de pronto e com um pulo ela pôs-se de pé, ignorando o seu corpo dolorido, e arremessou-se contra ele, o envolvendo em um abraço.

Ouviu o som abafado das facas caindo na terra e sentiu braços fortes a envolverem pela cintura, a apertando mais contra o corpo dele. Astoria soluçou, com as lágrimas já correndo pelo seu rosto deliberadamente.

– Eu vim. - Draco sussurrou em seu ouvido. - Como prometi.

E ela riu.

Draco sempre foi bom em manter as suas promessas. Sempre!


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