Capítulo V

Fuck My Feelings!

Ele me lançou um olhar indignado e saiu com as mãos nos bolsos do casaco.Quando o vi a uma distância considerável,eu peguei o celular e sem nem mesmo ver quem era,o atendi.

Estava um barulho do cão do outro lado da linha:pessoas rindo e falando alto,barulho de panelas e umas coisas assim.Meu Pai!O que estava acontecendo?

–Alô?

–Ah!Alô,Hermione!Como vai?É a Gina,estava morrendo de saudades!-Respondeu uma voz animada do outro lado da linha.

–Gina!Estou mais ou menos,e você?-Eu disse com um leve sorriso.

Não que fizesse tempo que eu não falasse com ela,na verdade,tínhamos nos falado à apenas dois dias atrás mas é claro que era tempo demais para Gina e não posso reclamar,eu gostava de falar com ela,afinal Gina era minha melhor amiga.

–Estou ótima!-Mais barulho vindo de onde Gina estava.

–Gina,você está em casa?Está fazendo muito barulho!

–Estou sim,é que...-Uma interrupção e mais risadas,Gina suspirou pesado antes de voltar a falar.-Mione,você espera um momento?-Ela parecia nervosa.

–Claro...

Pelo barulho que se seguiu eu achei que o telefone tinha sido depositado com um baque em algum lugar.Comecei a batucar os dedos no capô do carro enquanto esperava Gina voltar a falar e então ouvi um grito ensurdecedor do outro lado da linha,que supus ser de Gina:

–FRED!GEORGE!SEUS DOIS IDIOTAS!É MELHOR COLOCAREM ISSO NO CHÃO AGORA!-Ah,claro,reunião de família.Os gêmeos devem estar fazendo alguma cagada outra vez.Isso ia demorar...-NÃO,NÃO,NÃO E NÃO!COM CUIDADO, SEUS RETARDADOS MENTAIS!

Segurei o riso enquanto ouvia o ataque de Gina sem conseguir conter o pensamento do que os gêmeos estavam aprontando dessa vez.

–AGORA SUMAM DA MINHA FRENTE!-Gina continuou berrando.-AGORA!

Momentos depois eu ouvi os murmúrios de descontentamento de Gina,agora provavelmente já com o celular na mão.

–Oi.Voltei.Me desculpe.-Ela disse respirando fundo.

–O que eles aprontaram agora?

–Eles pegaram o meu espelho enorme,sabe?Aquele que...

–Sei,Gina,sei.O que é que eles queriam com o espelho?-Cortei logo que eu lembrei de que espelho ela estava falando.Era um espelho enorme,que ocupava um bom espaço do quarto dela.É sério,Gina tinha um caso de amor com aquela coisa com moldura dourada.

–E eu vou saber?Alguma idiotice,com certeza.

–Ah,okay.Então,o que você queria mesmo?-Eu perguntei querendo pular direto para o assunto.

–Espere,me esqueci.-Eu revirei os olhos enquanto esperava que a ruiva lembrasse.-Ah,claro.A família toda está aqui em casa por causa do Natal,então eu pensei se você não gostaria de vir também.Minha mãe e Fleur estão arrumando o almoço e à noite temos uma festa para ir.

–Temos?Eu não sabia.-Eu respondi debochada.-Que festa?

–Eu te explico quando você chegar aqui.Vai vir ou não?-Ela insistiu impaciente.

–Vou,vou sim.Só tenho que passar em casa e trocar de roupa.

–Você não está em casa?Então aonde...Esquece,conversamos sobre isso depois.

–Até logo.

–Não demore!Tchau.-Mal ela terminou de falar,eu já podia ouvir o tututu da linha,avisando que a ligação tinha sido encerrada.

O que eu poderia dizer?Era Gina,afinal.O que aquela ruiva iria aprontar dessa vez?Pensar nas possibilidades me deixava até com medo.

Antes que eu pudesse sair para procurar minha mãe e sair logo dali avistei ela – minha mãe – caminhando com certa dificuldade por causa da neve até o lugar onde eu estava.

–Mas como esfriou.-Ela reclamou enquanto esfregava as mãos uma na outra.

–Mas é claro.Está nevando.-Eu observei e logo entrei no carro me sentando no lugar do motorista.

–Dirija com cuidado.Como você mesma disse,está nevando.-Ela avisou enquanto colocava o cinto se acomodando no banco do carona.

– Claro,claro.

Liguei a ignição e tratei de me colocar logo no caminho de casa.

–Posso ligar o aquecedor?-Minha mãe se pronunciou.

Eu dei de ombros e voltei minha atenção para a pista.Desde quando ela precisava da minha autorização para ligar o aquecedor?

Será que era certo ir para a casa de Gina em pleno Natal?Tudo bem que eu não gosto de passar muito tempo cm a minha mãe,mas de certa forma eu me sentia mal às vezes por ser tão ruim para ela.Decidi perguntar então.Modo sentimental:on.

–Mãe,-eu comecei falando com a voz mais amistosa possível.-Vai precisar trabalhar hoje?

Ela me olhou meio desconfiada mas acho que decidiu responder mesmo assim:

–Bem,vou.Ainda temos que dar um jeito na festa de ontem à noite.-Ela concluiu com um longo suspiro.-Mas por que você quer saber?

–Gina me chamou para ir na casa dela e se eu for,provavelmente vou passar a noite lá.Tudo bem para você?-Perguntei enquanto mordia o lábio.

–Claro.-Ela respondeu surpresa.

–O que foi?-Perguntei depois de um tempo.

–Você,me pedindo permissão para sair...O que aconteceu?

–Nada.Só estou tentando ser ... amigável.-Conclui por fim com um dar de ombros.

–Isso é bom.-Ela disse sorrindo.

Que droga!Por que eu me sentia tão culpada?Minha mãe parecia tão feliz a cada vez que eu a tratava bem...Talvez eu pegasse leve com ela dali para a frente.Não é nehuma promessa mas eu poderia tentar.

Assim que chegamos em casa,subi direto para o meu quarto para tirar aquela roupa e colocar uma outra qualquer.Optei por uma calça jeans meio surrada,um coturno preto e dourado não tão pesado,uma t-shirt simples,um suéter roxo e um pesado casaco preto por cima.Enfiei meus documentos dentro de um bolso qualquer e peguei o celular,que estava no bolso do outro casaco, e quando já ia descendo vi os dois embrulhos de presentes ao pé da minha cama.Decidi dar um tempo para poder ver o que era.

Sentei em cima da cama com as pernas cruzadas e abri o primeiro que estava embrulhado num papel vermelho.Antes que eu pudesse abrir o embrulho,um bilhete escorregou de dentro do pacote para as minhas mãos.Era um cartão da minha mãe.

“Querida Hermione,

Primeiramente,Feliz Natal!

Espero que goste do presente,eu sinceramente não sabia o que dar para você,mesmo sendo sua mãe.Você tem estado tão distante,minha filha!

Desejo que nesse ano você possa mudar e talvez quem sabe,deixar as coisas ruins de lado para seguir em frente.Seja qual for sua decisão,estarei aqui para apoiá-la e ajudá-la.

Com amor,

Mãe.”

Senti algumas lágrimas rolarem pelo meu rosto,mesmo eu sustentando um sorriso.Tratei de enxugá-las logo e peguei o que quer que estivesse dentro do embrulho.Era uma caixinha de veludo preto e macio.A abri sem mais delongas e me deparei com um medalhão de aparência muito antiga,repousado no forro de cetim.

Sua corrente era fina e intricadamente trançada.O medalhão em si era grande e muito bonito,com floreios dourados em sua abertura.Tirei-o da caixinha e o coloquei na palma da mão,abrindo-o logo em seguida.Em seu interior havia uma foto da nossa família:Minha mãe,meu pai e eu.Ela havia sido tirada à muito tempo,eu devia ter entre oito e nove anos,meu cabelos eram cheios e compridos e meu sorriso dava de orelha à orelha.Minha mãe parecia mais jovem e sorridente do jeito que eu sempre me lembrava dela,como se o próprio sol irradiasse de sua pele.Me pai parecia estar igualmente feliz e satisfeito.Por algum motivo eu não conseguia me lembrar do dia em que tiramos essa foto e nem porque parecíamos tão felizes.

Fechei o medalhão com força e o guardei dentro da caixinha,sem querer dar um ataque outra vez.Deixaria aquilo enfiado no fundo de alguma gaveta.

Parti para o segundo embrulho,o prateado que parecia uma caixa.Nele havia um bilhete também.O arranquei do laço e comecei a lê-lo:

“Mione,

Não sei se você se lembra,mas até três anos atrás,tínhamos uma tradição no Natal:Passávamos o ano inteiro tirando fotos de qualquer coisa inusitada que nos acontecesse e no final do ano,colocávamos em um álbum.

Dentro dessa caixa você encontrará todos os álbuns que fizemos ao longo dos anos e um mais recente que fiz com algumas poucas fotos que consegui,já que você desistiu da nossa “tradição”.Tudo bem,não fiquei chateada -Mentira,fiquei muito chateada.- mas você não teve culpa e eu te entendo.

Bem...é isso.

Ah!Já ia quase me esquecendo!Feliz Natal!

Com amor,

Gina.”

Abri a caixa e como Gina havia me prometido,todos os álbuns estava lá.Mas que merda!Todos estavam querendo me fazer chorar nesse Natal?Pois conseguiram!

Sem nem mesmo folhear os álbuns,guardei a caixa debaixo da cama com o intuito de deixar o mimimi para depois.

Saí do quarto batendo a porta com força e num rompante voei escada abaixo.

–Vou usar o carro!-Anunciei enquanto pegava as chaves de cima da bancada da cozinha.

–Cuidado para d...

–Já sei.Tchau.-Eu disse já abrindo a porta que dava para a garagem,só parando para pegar minhas luvas e meu cachecol que estavam em cima da mesa.

Não esperei por uma resposta,não estava com muita paciência.É,parece que todo o meu surto de sentimentalismo para com minha mãe - e para com todo o mundo -tinha ido por água abaixo.