Os Últimos Morgenstern escrita por Luna MM


Capítulo 27
É nobre ser bom


Notas iniciais do capítulo

"Seja como for, me parece,
É nobre ser bom.
Corações generosos são mais que coroas,
E a simples fé é mais do que o sangue normando."
– Alfred, Lord Tennyson, "Lady Clara Vere de Vere"



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Passaram-se alguns minutos, horas ou talvez tenha sido apenas um segundo. Egoísta e fria, a noite seguia em frente, agora tomada pela escuridão e por correntes fracas de ar gélido que passeavam pelo lugar, enviando calafrios pelos braços despidos de Clary. A noite seguia em frente, enquanto Clary não conseguia sair do mesmo lugar, incapaz de sentir qualquer coisa que não fosse dor. Naquele momento, o frio não a incomodava nem um pouco; parecia, até mesmo, que a frieza agora também fazia parte dela.

O corpo morto de Sebastian ainda jazia no colo de Clary, pesado e imóvel. Frio. A pele havia ficado mais pálida que o normal e os cabelos claros bagunçados, grandes demais. Ela desejava ao menos ter tido a chance de cortá-los um pouco, mas de algum jeito, aquele visual quase o fazia parecer um menino mundano perdido, inocente e comum. E ela gostava dessa visão. Clary abriu um sorriso fraco ao imaginar ele levantando-se subitamente e afastando as mechas com impaciência, resmungando nos próprios pensamentos, até olhar para ela e sorrir. Ela havia aprendido a gostar daqueles pequenos gestos que antes mal pareciam ter importância, mas que agora, ela daria o mundo para ter de volta. O toque delicado dele na sua pele, acariciando os cachos do cabelo dela, o sorriso torto e os olhos negros a observando como se ela fosse uma relíquia de outro mundo. Como se ele ainda não pudesse acreditar que ela era dele, mesmo depois de tudo.

Sebastian não iria levantar, ela sabia disso. Não iria pegar os cachos ruivos dela na mão, acariciá-los com o polegar e abrir um sorriso torto, como se isso fosse o suficiente para que ela perdoasse todos os erros que ele pudesse ter cometido. Não iria chamá-la de irmãzinha e tentar convencê-la de que os Morgenstern deveriam comandar todos os mundos, seja do bem ou do mal. Sebastian simplesmente não iria viver mais um dia sequer para planejar a destruição do mundo ou a extinção dos Caçadores de Sombras, mas também não viveria mais uma hora para que Clary tivesse a chance de ensiná-lo a ser melhor. Estava acabado.

Mesmo depois da noite ter caído e o céu ter sido iluminado pela chegada das estrelas, Clary não havia tido coragem de se mexer um centímetro sequer. As palavras de Sebastian em seus últimos instantes de vida ainda rondavam pela mente dela, cada vez mais difíceis de apagar, e a simples ideia de separar-se dele, mesmo morto, era inimaginável. Não mereço o Céu, irmãzinha, mas acho que já conheci o Paraíso, ele havia dito. Ela se perguntou, mentalmente, se havia alguma chance de ele ter encontrado o caminho certo.

Devagar, Clary tocou o rosto dele delicadamente com a mão livre, acariciando a pele com o polegar, como ele costumava fazer com ela. Enrolou os dedos nos cabelos louro-prateados, ainda manchados com o sangue escuro dele, e soluçou baixinho. Silenciosamente, Clary permitiu que as lágrimas presas em seus olhos caíssem, enquanto ela apertava a mão de Sebastian contra o próprio peito, como se em algum instante o corpo dele pudesse desaparecer também.

O peso morto do corpo de Sebastian era a prova real de que Clary havia falhado consigo mesma; falhado em salvá-lo do destino que esperava por ele, falhado em dar a ele a chance que ele nunca havia tido. Mais do que isso, ela havia falhado em provar para seus amigos e para o próprio Sebastian que ele realmente podia ser bom, que ainda podia mudar o que Valentim havia feito. Queria ter conseguido mostrar que nem tudo estava perdido. Queria ao menos ter feito Sebastian acreditar na própria humanidade do jeito que ela passou a acreditar nele.

Clary soluçou mais uma vez, baixinho. Ela não lembrava há quanto tempo estava chorando, mas de certa forma, as lágrimas pareciam nunca chegar ao fim. Ainda sem tirar as mãos do corpo do irmão, ela ergueu a cabeça corajosamente e olhou ao redor, encarando as dezenas de guerreiros que também não haviam se movido, de nenhum dos lados. Caçadores de Sombras e até mesmo alguns dos Crepusculares de seu irmão observavam a cena como se ela tivesse perdido a razão por estar chorando pelo causador da guerra. Centenas de mortes e perdas foram causadas por Sebastian; a morte dele deveria ser motivo de comemoração para o mundo Nephilim.

E naquele instante, manter a cabeça abaixada e deixar as lágrimas caírem até se esgotarem pareceu uma atitude estúpida para Clary. Ela estava triste, sim, é claro que estava. Mas também estava furiosa; cada veia pulsante dentro de seu corpo ardia de raiva por tudo que havia acontecido com Sebastian, e não apenas pela sua morte. Ele merecia ter tido uma vida melhor. Merecia também um velório decente e pessoas lamentando sua partida. E incapaz de se controlar por mais um segundo sequer, Clary fechou os olhos com força e deixou os gritos presos em sua garganta escaparem pelo céu escuro. Sentindo o buraco vazio dentro de si aumentar cada vez mais, como se tivesse esmagando os ossos de seu corpo dolorosamente, ela gritou e gritou até sentir sua voz enfraquecer. Injusto, injusto, era tudo tão injusto.

Na frente da multidão, a poucos metros dela, Clary encontrou o olhar de Jace. Indecifrável, inexpressível. Ao lado dele, Isabelle, Alec, Magnus e Simon haviam se juntado e observavam, calados, apesar de ela quase poder enxergar o julgamento no olhar deles. Alec segurava uma estela e Clary notou que os ferimentos de Jace causados pela luta com Sebastian já haviam se curado quase que completamente, mas ele não parecia estar preocupado com a própria recuperação. Por alguma razão, ele não parecia exatamente feliz ou ao menos satisfeito com a morte de seu maior inimigo; pelo contrário, a expressão em seu rosto demonstrava tristeza. Ele olhava para Clary como se finalmente estivesse enxergando-a novamente, depois de tudo que havia acontecido com os dois. Naquele momento, Jace quase parecia entender o que ela estava sentindo e, de uma maneira boa, isso deu algum conforto para ela.

Clary abaixou a cabeça e respirou fundo, fechando os olhos com força mais uma vez. Não podia mais olhar para o corpo imóvel de Sebastian e o buraco sangrento no meio do seu peito, que não se movimentava mais com o ritmo da respiração. No fundo, ela sabia que devia deixá-lo ir e seguir em frente, mas sentia que seu coração ainda não estava pronto. Clary nem ao menos entendia porque estava sentindo todo aquele desespero e tristeza dentro de si por alguém que ela odiava há menos de um ano e que havia provocado tanto mal para as pessoas que ela sempre amou, porém, o sentimento que havia desenvolvido por Sebastian era diferente de qualquer coisa que ela pudesse ter sentido antes; era complicado e intenso. E consumia tudo, como fogo.

Por favor, abra os olhos, ela pediu, silenciosamente. Ainda com os olhos fechados, Clary fez uma prece silenciosa para o Anjo, o último a quem ela podia recorrer. Por favor, por favor, por favor. Ela apertou a mão fria de Sebastian contra o próprio peito de novo, ao mesmo tempo que as últimas lágrimas caíam por seu rosto. Abra os olhos, por favor. E volte para mim.

Mas então, quando Clary abriu os olhos, a última faísca de esperança dentro dela se apagou subitamente. Sebastian ainda estava morto; os olhos ainda fechados, o peito imóvel e o coração parado. No entanto, ainda assim algo estava diferente. Devagar, Clary ergueu a cabeça e voltou a encarar os Caçadores de Sombras ao redor dos dois, mas alguma coisa estranha havia acontecido com eles. Alguns mantinham expressões esquisitas no rosto, com bocas abertas e sobrancelhas franzidas, quase como se tivessem sido petrificados no meio de uma conversa.

Clary soltou o corpo de Sebastian por um instante, delicadamente, e se levantou. Deu um giro, assustada, encarando as centenas de pessoas que haviam, de repente, ficado imóveis, paradas. Congeladas no tempo.

Você não está morta, disse uma voz que ecoou pelo lugar, calma e suave. Gentil. Caso seja isso que esteja se perguntando.

Dando mais algumas voltas, Clary procurou pela origem da voz, até que uma luz dourada forte e incandescente desceu aos poucos do céu e parou a poucos centímetros do chão, como se estivesse flutuando. Ela assistiu, boquiaberta, enquanto uma figura se materializou a poucos metros dela e ela rapidamente entendeu que a voz não havia ecoado pela clareira, mas dentro da mente dela. A criatura podia facilmente se passar como um ser humano comum, se não fosse por sua forma imensa e pelas grandes asas douradas que surgiam em suas costas. Clary piscou, os olhos hipnotizados pela beleza divina do anjo; ele tinha cabelos dourados cacheados e a luz dourada acompanhava toda sua forma, brilhando com fogo sagrado. Ela não precisou de muito tempo para reconhecê-lo; era o seu anjo. Ithuriel.

– Não achei que estivesse – ela respondeu estupidamente, atônita. Então, dando de ombros, acrescentou: – A não ser que seja possível morrer de tristeza.

Sinto muito por sua perda, Ithuriel falou e parecia ser sincero. E, de certa forma, ouvi-lo dizer aquilo foi o suficiente para que a ideia de Sebastian morto se concretizasse dentro da mente dela. Sei o quanto Jonathan tornou-se importante para você.

– Não era para ter sido assim – Clary disse, divagando. Focou seu olhar no corpo de Sebastian ainda no chão e sentiu mais um pedaço do seu coração partir. – Era para ele ter tido uma vida diferente.

Seria mesmo possível que ele tivesse uma vida diferente? Ithuriel perguntou, mostrando certa curiosidade no tom de voz. Você acredita que seria possível Jonathan mudar?

– Não é isso em que devemos acreditar? – Clary perguntou de volta, sorrindo fracamente. – Que as pessoas podem mudar suas atitudes e realmente merecer uma segunda chance?

Você tem razão, Clarissa. E ao dizer isso, Clary achou ter visto um pequeno resquício de sorriso no rosto do anjo, embora provavelmente não tenha passado de uma impressão rápida. Mas o que estou lhe perguntando é se, mesmo tendo provocado a guerra e causado centenas de mortes, ainda seria possível que Jonathan mudasse suas ações e seus pensamentos? Você, agora, é a única que o conhecia bem o bastante para responder isso.

Clary demorou um instante para pensar no que Ithuriel estava realmente perguntando. Aquela sensação que atormentava a mente dela havia reaparecido; a sensação de que tudo que ela fez havia sido em vão, de que ela estava o tempo todo lutando por uma causa perdida. Ela pensou em Sebastian Transformando aquela Caçadora de Sombras e ordenando que ela matasse alguém que era especial para ela. Assistir aquilo foi o suficiente para que Clary voltasse a temer o irmão, nem que tenha sido apenas por um instante. Mas então, no meio das imagens da guerra que rondavam a cabeça de Clary, uma cena se sobressaltou: Sebastian colocando-se na frente dela, de maneira protetora, e levando o golpe de espada em seu lugar.

– Ele mudou – Clary disse, inconscientemente colocando força e certeza no tom de voz. Ao notar o súbito interesse de Ithuriel na conversa, ela continuou, determinada. – Ele seguiu em frente com a guerra e as lutas contra o Instituto, mas no final, ele me salvou. Ele deu a vida dele por mim.

Era isso que eu estava tentando te fazer enxergar, Clarissa, há um bom tempo, Ithuriel murmurou, parecendo satisfeito, como um pai orgulhoso. No fundo de sua mente, Clary buscou as palavras ditas por ele num sonho distante. Jonathan nunca teve ninguém com quem pudesse se importar, ninguém para ele amar e que pudesse amá-lo de volta. E agora ele tem.

– Eu não entendo – sussurrou Clary, desviando o olhar, frustrada. – Mesmo que tenha sido a coisa certa a se fazer, de que adiantou todo o esforço? Sebastian está morto! Existe ao menos alguma chance de ele ter ido para o Céu?

Infelizmente, não, Ithuriel respondeu, fazendo Clary perder toda a força que ainda restava em seu corpo. Ele estava falando a verdade quando disse que não havia bondade nele o suficiente para prevalecer. Jonathan está no Inferno nesse exato instante.

– Isso não é justo! – Clary gritou, esquecendo-se completamente que estava diante de uma criatura divina. Só o que ela conseguia pensar era no seu irmão sozinho num lugar escuro e quente, sofrendo enquanto seus pecados o queimavam por dentro. – Leve-me no lugar dele, então! Suponho que possa fazer isso e eu realmente não me importo.

Não se importa em ir para o Inferno no lugar de Jonathan? O anjo perguntou, entortando levemente a cabeça, e fazendo com que Clary assimilasse o que havia acabado de propor. Posso saber por quê? Estou curioso.

– Já fiz tudo o que precisava nessa vida. Já amei e tive quem me amar de volta... – Clary parou de falar quando seu pensamento se focou em Jace. Devagar, ela virou a cabeça apenas o suficiente para que pudesse ver a estátua de Jace parada, no mesmo lugar. Os olhos dourados dele ainda pareciam capazes de enxergá-la e o que ela estava fazendo. Ela tornou a olhar para o anjo. – Eu lembro das suas palavras no meu sonho. Você também sabe que Sebastian nunca teve alguém para amar e que pudesse amá-lo de volta. Ele merece ter isso! Todas as pessoas deveriam conhecer o amor, mesmo que seus crimes as acorrentem ao Inferno.

É muito bonito da sua parte, Clarissa, oferecer seu sacrifício por Jonathan. Ithuriel respondeu, e ela pensou ter visto a luz dourada em suas asas incandescer por um instante. Mas eu não sou um Demônio para fazer trocas desse tipo entre a Terra e o Inferno, menina.

Clary suspirou e voltou a sentar-se no chão, ao lado do corpo de Sebastian, exausta. Enroscou os dedos nos cabelos brancos dele, numa tentativa de impedir que suas mãos tremessem. Só o que ela queria era acordar daquele pesadelo.

– Você havia dito que salvar somente uma alma às vezes era o suficiente para um ato heroico – disse Clary, erguendo os olhos, lacrimejados, para olhar para o anjo. – Mas eu não quero a glória de um herói. Eu só queria salvá-lo, mas falhei. No final de tudo, não ajudei ninguém.

Tente enxergar com clareza, Clarissa. Tente pensar em quem Jonathan era antes de você fazer seu acordo com ele e pense em quem ele se tornou até o dia de hoje. Ele pode não ter desistido de seus planos, mas a incerteza tomou conta dele em algum momento. Do seu lado, ele aprendeu a sorrir com sinceridade e realmente se importar e gostar de alguém além dele mesmo, e por conta disso, aprendeu a fazer sacrifícios. Ele deu a vida por você, como você disse, Ithuriel disse, gentil, quase como um mestre dando conselhos ao seu aprendiz. Se parar para notar esses pequenos e significativos gestos, você saberá que Jonathan mudou.

Clary assentiu, devagar. Sabia que Ithuriel tinha razão; Sebastian havia realmente mudado boa parte de suas atitudes, mas apenas quando se tratava dela. Ela temia que isso não era nem de longe o suficiente.

– Isso não foi o bastante, não é? – Clary perguntou, engolindo em seco. Ela se levantou e aproximou-se do anjo novamente. – Mesmo com tudo isso para se levar em conta, não foi o bastante para apagar os crimes que ele cometeu e que o mandaram para o Inferno.

Tenha um pouco de esperança, menina, Ithuriel respondeu, calmo e misterioso, como se estivesse prestes a contar uma história. É difícil acreditar que segundas chances podem fazer milagres, mas o que é uma segunda chance para alguém que nem ao menos teve a primeira?

– O que isso quer dizer? – Clary perguntou estupidamente, de repente sentindo seu coração acelerar.

Uma vez, o Anjo Raziel devolveu a vida de Jace Herondale porque foi tudo o que você pediu, Clarissa. Bem, eu sou o Anjo do Sacrifício e valorizo os grandes sacrifícios, quando são feitos pelo bem maior. Ou quando são feitos por amor. E você e Jonathan parecem entender muito bem sobre sacrifícios, sendo que estão tão dispostos a dar o fim na própria vida pela vida do outro. Ithuriel disse e Clary notou, admirada, que nas pontas das asas douradas em suas costas haviam olhos; as runas da visão Nephilim. Você não conseguiu provar para os outros que Jonathan ainda tem humanidade, Clarissa, mas você provou isso para mim e conseguiu me convencer, especialmente depois dessa conversa. Apenas perguntei se Jonathan podia mudar porque queria ouvir a sua opinião para finalmente tomar minha decisão, mas você me surpreendeu. Você não desistiu dele, nem mesmo depois que ele partiu. E por isso, estou disposto a devolver a vida de Jonathan Morgenstern, para que ele finalmente tenha algo que nunca foi lhe dado: chances.

Clary abriu a boca para dizer alguma coisa, mas as palavras desapareceram antes de serem pronunciadas. Sebastian iria realmente viver? Parecia surreal demais para acreditar.

– Eu não entendo. Você havia dito que não havia bondade suficiente nele para prevalecer, então como seria possível trazê-lo de volta? – Clary perguntou, sentindo a voz tremer. Agora que havia uma esperança para se agarrar, ela não podia perder um único detalhe importante.

Não havia mesmo, mas isso não significa que não pode haver, Ithuriel respondeu, enigmático. Clary não precisava se olhar no espelho para notar o grande ponto de interrogação que deve ter aparecido no rosto dela. Jonathan não vai se livrar da maldade tão fácil, mas ele ainda pode encontrar espaço dentro de si para a bondade. Um equilíbrio é o suficiente.

– Um equilíbrio – repetiu Clary, abrindo um sorriso. Então, seu olhar pousou nos Caçadores de Sombras a alguns metros dela, petrificados enquanto comemoravam a morte do inimigo. – Sebastian era o maior inimigo dos Nephilim... Está tudo bem trazê-lo de volta?

Você quer dizer, se eu tenho permissão para fazer isso? Ithuriel perguntou, fazendo Clary querer se encolher, constrangida. Mas ele não pareceu ofendido. Essa não é a primeira vez que Jonathan morreu e, pelo o que me lembro, Lilith encontrou um modo de trazê-lo de volta, do lado dela. Você, Clarissa, estava conseguindo despertar o lado humano em Jonathan e eu acredito que ainda possa continuar com isso, não é? Uma alma que pode ser salva sempre vale a pena.

Clary balançou a cabeça, concordando. Ela se lembrava vagamente de ter lido em algum lugar que anjos não se envolviam com assuntos humanos e muito menos tinham misericórdia por eles, mas apesar de não conhecer muitos anjos, ela simplesmente não conseguia imaginar Ithuriel como uma criatura assustadora e indiferente ao que acontece na Terra. Na verdade, ela quase podia enxergar certa humanidade presente nele, embora fosse impossível concluir como ele teria sido em sua forma humana. Perdida em pensamentos, ela encarou o anjo por mais alguns segundos até cair a ficha de que Sebastian teria uma chance real de viver. Sentindo-se mais leve do que nunca, ela sorriu, verdadeiramente.

­ – Eu posso fazer isso – ela sussurrou, mais para si mesma do que para Ithuriel.

Eu sempre soube que podia, menina. Tive ainda mais certeza disso quando você se ofereceu para trocar de lugar com ele, mesmo que você não mereça o Inferno, o anjo respondeu, carinhoso. É difícil para algumas pessoas acreditarem que milagres existem, mas acho que em breve todos vão presenciar um. Você é o milagre de Jonathan, Clarissa Morgenstern.

Clary abriu a boca para dizer alguma coisa, mas a imagem dourada do anjo começou a se dissipar no ar. Ela deu um passo na direção dele, embora não soubesse direito o que poderia fazer.

– Você irá trazê-lo de volta, não é? – Clary perguntou, tentando parecer mais segura de si do que realmente sentia.

Você pode fazer isso, Ithuriel respondeu, o eco da voz dele na mente dela enfraquecendo cada vez mais. Num súbito instante, Clary percebeu, encantada, que os olhos do anjo também eram completamente dourados. Basta chamar o nome dele e ele voltará para você.

E então, uma rajada de vento frio percorreu a clareira devagar, levando aos poucos a imagem do anjo de volta para o Céu. Clary assistiu a fumaça dourada desaparecer no horizonte por mais alguns segundos e, em seguida, ouviu as vozes dos guerreiros retornar.

Maryse Lightwood e mais alguns Caçadores membros do Conselho abriram espaço pela multidão e começaram a ir em direção de onde estava o corpo de Sebastian. Eles queriam levá-lo. Sentindo a alegria se esvair de seu corpo e o desespero invadir seu peito, Clary lançou um olhar de súplica para Jace, pedindo ajuda. Ele pareceu entender o recado e balançou a cabeça, concordando, embora não estivesse parecendo exatamente satisfeito com aquilo. Sacando a adaga recuperada do cinto de armas, Jace postou-se na frente de Clary e diante dos outros Caçadores, de maneira defensiva. Aos poucos, Isabelle, Simon, Magnus e Alec assumiram posições parecidas, armados, e os cinco formaram um círculo ao redor de Clary e Sebastian, protegendo-os.

Clary olhou para cada um deles e sentiu os olhos lacrimejarem. Como algum dia ela podia ter pensado que aquela amizade havia sido destruída? Nada poderia destruir um laço daqueles. Ela encontrou o olhar de Jace e sussurrou um “obrigada” silenciosamente, embora o que realmente quisesse fazer era puxar todos para um abraço coletivo e dizer que sentia muito, por tudo.

Concentrando-se no corpo do irmão e ignorando os protestos que os guerreiros começavam a fazer, Clary voltou ao chão e puxou a cabeça de Sebastian para seu colo, mantendo uma mão em seu rosto e outra em seu peito. Acariciando a pele gelada com o polegar, ela apertou os lábios e respirou fundo.

– Sebastian – disse ela, a voz saindo fraca demais. Clary engoliu em seco e repetiu, dessa vez mais firme e alto. – Sebastian, abra os olhos e volte para mim.

Nada aconteceu. O silêncio tomou conta da clareira novamente e Clary quase podia ouvir o som do próprio coração batendo, acelerado e desesperado, atendo-se a única esperança que ainda restava. Ela sentiu quando Jace virou a cabeça para ela e se aproximou um passo, cauteloso. Ele ia tentar consolá-la, ela sabia. Dizer que havia acabado e que ela deveria aceitar, tentar seguir em frente. Mas ele não sabia das palavras de Ithuriel, ninguém sabia. E se Ithuriel acreditava que Sebastian ainda tinha uma chance, a opinião do resto do mundo não importava mais.

Delicadamente, Clary depositou um beijo carinhosamente na testa fria de Sebastian, fechando os olhos com força e desejando com todo o coração que ele estivesse encontrando o caminho certo, dessa vez de volta para ela. Naquele momento, ela ergueu a cabeça e olhou para o céu escuro e cheio de estrelas, quando uma estrela cadente cruzou todo o céu num arco desenhado perfeitamente, no exato instante em que ela concluiu o desejo. E então, quando Clary abaixou a cabeça para olhar para o irmão mais uma vez, ela sentiu um ligeiro movimento debaixo de sua mão direita, apoiada gentilmente no peito dele, significando apenas uma coisa. O coração de Sebastian havia voltado a bater.


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Notas finais do capítulo

Eu seeeei que demorei e vocês devem querer me atacar por isso o tempo todo, mas eu adoro um suspense heuahsuha e agora que finalmente me livrei da escola (pra sempre, produção!), vou dedicar meu tempo pro fim da história, já que só faltam mais uns 2 ou 3 capítulos. E muitos me pedem pra continuar escrevendo depois que OUM terminar, então eu fiz uns rascunhos nesse tempo que fiquei fora e trouxe uma enquete pra vocês: vocês preferem que eu escreva uma fanfic Dramione (Draco e Hermione de HP) ou mais uma fanfic Clastian (Clary e Sebastian)? Eu tenho ideias para as duas, mas não consigo escrever mais de uma história ao mesmo tempo :(
Então, deixo essa com vocês! Por favor, comentem o que vocês acham disso e o que acharam do capítulo, é muito importante para mim c: Aliás, dedico esse capítulo pra Mrs. Fiction que tá deixando comentários maravilhosos aqui nesse mês desde o Prólogo... e eu tô adorando!
Enfim, volto daqui uns dias pra postar o próximo, se cuidem xoxo