Os Últimos Morgenstern escrita por Luna MM


Capítulo 21
Você chama de esperança


Notas iniciais do capítulo

"Você chama de esperança — aquele fogo do fogo!
Não é nada além de agonia do desejo."
— Edgar Allan Poe, "Tamerlane"



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De volta ao apartamento, Clary estava em pé diante da cama grande em seu quarto. Em cima dos lençóis pretos, estava o uniforme vermelho de Crepuscular, deixado ali por Sebastian para que ela vestisse, declarando oficialmente que lutaria ao lado dele. Enquanto ele estava no quarto de armas preparando-se para a batalha, ela estava em sua própria luta para se decidir de que lado estava. Não havia dito a ele que lado iria escolher, nem mesmo havia dito mais nada a ele desde então, mas aquela decisão a ser tomada atormentou-a durante o caminho inteiro de volta para casa. E ainda atormentava.

Soltando um suspiro dramático, ela se sentou no chão e abraçou os joelhos, abaixando a cabeça. Por um instante, fechou os olhos e se permitiu voltar no tempo. Lembrou-se de si mesma caminhando pelo Central Park numa madrugada fria e solitária depois de ter fugido do Instituto; caminhando em direção à Sebastian, jogado confortavelmente num banco, olhando-a se aproximar atentamente com um sorriso brincando nos lábios. Clary lembrava-se vagamente de ter sentido tanto medo que chegou a pensar em desistir do que planejava e correr de volta para os braços de Jace, onde ela sabia que estaria segura e amada. Mas então, seu peito havia se enchido de uma coragem repentina que ela não sabia de onde havia surgido, mas que lhe dera forças para continuar andando e seguir com seu plano que garantiria a segurança de seus amigos e, na melhor das hipóteses, colocaria o fim na guerra de Sebastian contra os Nephilim.

Tudo aquilo parecia ter sido em outra vida, ponderou Clary, abrindo os olhos devagar. Até parecia uma piada do destino ela ter feito tudo que fez achando que, heroína como achava que era, estaria colocando um fim à guerra e, agora, lá estava ela se preparando para marchar para a batalha junto com seu irmão. Contra sua família. Clary se levantou num impulso e pressionou os dedos contra a têmpora, tentando colocar sua mente para raciocinar claramente. De que lado ela estava, afinal? Por quem iria lutar?

Embora ela pudesse passar o resto da tarde ali, esforçando-se para chegar numa solução, a resposta estava tão clara quanto papel. No fundo, ela sempre soube exatamente o que iria fazer, quando chegasse a hora.

Num gesto rápido, Clary remexeu em suas roupas bagunçadas no guarda-roupa, procurando por seu antigo uniforme comum de Caçadora de Sombras, guardado há tanto tempo. Era a lembrança mais forte que ela tinha do Instituto. Vestiu o uniforme preto e deu uma olhada rápida no espelho. Com um sorriso fraco formando-se nos lábios, ela quase se parecia com a antiga Clary Fray, a mundana que descobriu pertencer à um outro mundo inteiramente diferente do dela, numa lembrança tão distante e cada vez mais fraca.

Balançando a cabeça para livrar-se dos pensamentos, Clary pegou a jaqueta do uniforme vermelho de cima da cama e colocou-a no lugar da jaqueta preta, misturando os dois uniformes em si mesma. Preto e vermelho, Caçadora de Sombras e Crepuscular. O bem e o mal. Olhou-se no espelho novamente, mas, dessa vez, ela havia se afastado totalmente da antiga Clary, de tal forma que até parecia ser outra pessoa. O preto e o vermelho se destacavam em sua pele pálida e seus cabelos pareciam ser feitos de puro fogo. De certa maneira, havia algo de maligno na sua aparência. Algo que a aproximava de Sebastian.

Dando as costas para o espelho, Clary pegou a espada Morgenstern embainhada e enfiou no cinto de armas, junto com a estela. Jogou o que sobrou dos dois uniformes no armário e saiu do quarto, indo em direção ao quarto de armas.

O quarto era muito parecido com a sala de armas do Instituto, embora o número de ferramentas fosse claramente bem menor. As paredes brancas eram cobertas por todos os tipos de armas; espadas, adagas, lanças, chicote, arco e flechas. No canto de cada parede havia uma mesa metálica retangular, mais parecida com um balcão. Sebastian estava parado em frente à mesa, de costas para ela, segurando nas mãos o que Clary reconheceu como o Cálice Infernal. Ela sentiu um calafrio.

Apesar de Clary não ter feito barulho algum, Sebastian se virou para olhá-la no exato momento em que ela entrou no quarto. Ao vê-la, seus olhos percorreram o corpo de Clary lentamente, analisando a mistura dos dois uniformes. Ele trincou o maxilar.

— Decidiu lutar pelos dois lados, irmãzinha? — Sebastian perguntou, erguendo uma sobrancelha. — Não tenho certeza se isso costuma funcionar.

Clary pressionou os lábios, sentindo-se aflita. Baixou a cabeça e olhou para si mesma.

— A calça do uniforme Crepuscular ficou apertada — mentiu, forçando um sorriso torto. Era incrível o quanto havia se acostumado a contar mentiras, embora sempre tivesse a impressão de que Sebastian não podia ser facilmente enganado. — Além disso, eu gostei do preto e vermelho.

Se ele sabia que ela estava mentindo, não demonstrou. Com um aceno de mão, Sebastian chamou Clary para perto de si, largando o que estava fazendo por um momento. Ela obedeceu e colocou-se em frente a ele, sem dizer nada. Afetuosamente, ele tomou um de seus cachos vermelhos nos dedos. Algo que ele costumava fazer sempre, Clary percebeu.

— As coisas vão melhorar entre nós depois que tudo isso acabar. Nós poderemos viver em quantos lugares você quiser, sem nenhuma ameaça para nos atrapalhar. — Sebastian disse, acariciando o rosto de Clary com um resquício de sorriso no rosto. — Eu prometo a você.

Clary assentiu, mas não disse nada. Sebastian puxou-a pela cintura e colou seu corpo ao dela, erguendo seu queixo para olhar em seus olhos. Ela ergueu o olhar, hesitante, esperando que ele não pudesse enxergar em seus olhos o que estava em sua mente.

— Você é minha, Clary. Só minha — murmurou Sebastian, encostando os lábios devagar na boca dela.

Clary colocou as mãos em volta de seu pescoço e o beijou de volta, sentindo gosto de sal e fogo. Num gesto rápido, ele a pegou pela cintura e colocou-a sentada em cima da mesa, afastando o que estava em cima com impaciência e certa urgência. Com os olhos fechados, Clary se permitiu sentir a língua de Sebastian em sua boca, o toque de suas mãos percorrendo seu corpo, os fios macios de cabelo prateado se enrolando nos dedos dela. De algum jeito, aquilo tudo havia se tornado tão certo.

Sebastian pressionou o corpo de Clary contra a parede dura e fria, e ela quase pôde escutar o coração de ambos batendo num ritmo acelerado, ao mesmo tempo. Uma onda de calor e desejo a invadiu subitamente, e ela não protestou quando Sebastian arrancou a jaqueta vermelha dela e jogou do outro lado do cômodo, derrubando algumas facas com o impacto. Com a respiração ofegante, Clary moveu as mãos para tirar a camiseta de Sebastian, que a observou com um sorriso malicioso, e enlaçou suas pernas em volta do corpo dele. Delicadamente, ela passou os dedos pelo peito duro dele, sentindo os músculos fortes de um guerreiro, pelas cicatrizes finas em suas costas que nunca iriam desaparecer. Eram marcas de seu passado, marcas de quem ele era.

Sebastian começou a traçar uma linha de beijos e mordidas no pescoço dela, provocando arrepios e sensações que Clary adorava sentir. Ela arqueou as costas e jogou a cabeça para trás, fechando os olhos, ao mesmo tempo que apertava as coxas em volta de Sebastian e puxava-o para si. No entanto, quando ele se apressou em tirar a camiseta dela, um pensamento repentino surgiu em sua mente.

— Sebastian, espere — balbuciou ela, a respiração ofegante, sem ter certeza de que havia pronunciado as palavras certo ou se havia sido só um grunhido. — Você não tem, hum, uma batalha para se preparar?

— Exatamente, irmãzinha. Por isso eu preciso de uma inspiração, não acha? — Sebastian disse. Ela abaixou a cabeça para olhá-lo, esperando ver um sorriso malicioso, mas ele estava sério. Os olhos escuros dele a encaravam e ela podia jurar que havia certo poder ali. — Eu quero você, agora. E sempre.

Clary assentiu e, silenciosamente, permitiu que ele continuasse.

◌◌◌

Sentada no chão, Clary observava o próprio reflexo no espelho. De novo. De certa forma, ela havia se acostumado a fazer isso o tempo todo; encarava a si mesma por horas e não conseguia, de fato, se reconhecer. Às vezes não tinha a menor ideia de quem era aquela estranha escondida por trás do vidro e se perguntava como ela havia chegado ali. Quem havia se tornado afinal, depois de tudo. Talvez nem ao menos fizesse sentido, mas algo dentro de Clary havia mudado drasticamente durante todo aquele tempo. Algo que ela temia ser tão poderoso que poderia, simplesmente, destruí-la num instante. Como era possível ser a mesma pessoa de sempre, mas em tão pouco tempo, sentir-se tão diferente?

Clary levantou-se, determinada, mas não conseguiu sair do lugar. Devagar, ela olhou em volta e observou o quarto desarrumado; as roupas escuras de Sebastian jogadas no chão, a cama grande ainda bagunçada pelos lençóis enrolados, a mesa de aço e vidro sempre coberta por papéis. Clary abriu um sorriso triste ao notar uma foto dela e de Sebastian no meio da mesa, ele com os braços ao redor de sua cintura enquanto ela gargalhava de alguma coisa que ele havia dito. Ela não havia notado na hora que tirara a foto, mas agora via que Sebastian olhava para ela com um olhar encantado e um pequeno sinal de sorriso aparecendo em seu rosto.

Sentindo algo dentro de si se quebrar inteiramente em pedacinhos, Clary olhou para a porta do quarto, agora fechada. Do outro lado do apartamento, Sebastian provavelmente devia estar concentrado, a mente distante dali. Não iria notar a ausência dela por algumas boas horas, se ela tivesse sorte.

Clary sempre ouviu dizer que você não percebe realmente o valor das coisas, até o momento em que se vê perdendo-as, quando não há mais o que se fazer. Agora entendia isso. Pelo Anjo, ela sentiria tanta falta de viver naquele apartamento, cada dia em um país diferente. Com Sebastian. Por um instante, ouvir ele dizer que tudo ficaria bem entre eles quando a batalha acabasse fez o coração de Clary fraquejar. Ela desejava que tudo realmente ficasse bem, para os dois lados da guerra, mas não tinha certeza se isso era possível. Não quando os dois lados estavam mais do que dispostos a destruir um ao outro completamente. O que poderia restar disso, afinal?

Mas então, subitamente e da mesma forma como na noite no Central Park, uma coragem repentina invadiu seu peito, clareando sua mente. A tristeza deu lugar à bravura e ela sentiu sua força aumentando, em cada parte de seu corpo. Talvez não fosse uma Caçadora de Sombras digna de ser chamada de heroína, mas, naquele momento, ela sentiu-se como uma. E a sensação era boa.

Com lágrimas quentes ardendo nos olhos, Clary puxou a estela do cinto de armas e delicadamente posicionou a ponta na parede do quarto, a mão tremendo mais do que ela gostaria. Momentos antes de ela fechar os olhos e pensar no Instituto de Nova York, seu olhar pousou na foto em cima da mesa. Ela balançou a cabeça e pegou a foto, jogando-a no bolso da jaqueta evitando olhar mais do que aquilo. Engoliu em seco e, encarando o Portal reluzindo diante dela, Clary concentrou seu pensamento em Jace. E pulou.


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Notas finais do capítulo

Eu quero dedicar esse capítulo pra Gaby Peters, que além de sempre fazer comentários enooormes nos capítulos, agora fez uma recomendação maravilhosa que me deixou toda emocionada aqui, ai! Sério, muito obrigada, de verdade (: Espero que tenham gostado, no próximo capítulo tem Instituto heushuseh até depois!