The Blue Blood escrita por Mrs Granger


Capítulo 17
#17




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/423763/chapter/17

Lara resolveu se contentar com um sanduíche de presunto preparado na cozinha dos Iniciados.

– Está uma delicia – ela murmurou enquanto devorava o lanche. Não tinha se dado conta de como estava faminta e cansada. Com certeza um bom lanche e um belo cochilo iriam ajudar. Mesmo tão cansada, a mente de Lara relutava me desacelerar. Ela pegou-se pensando em Alex e imaginando onde ele estaria no momento. “Provavelmente confortando a Allice .” Lara pôs-se a imaginar todo o tipo de situação que poderia estar ocorrendo na casa da garota: a briga dela com os pais, Allice choramingando e se aproveitando da circunstância para fazer uma birra, a discussão entre Dom, o pai de Allice, e Alex... “E a mãe dele, será que já sabe?” Marta, mãe de Alex, perdera seu marido há alguns anos, e desde então seu filho ficara bem rebelde e distante. Será que ela apoiaria o filho e o compreenderia? Será que apoiaria o aborto?

A mente de Lara voou dos problemas com Alex para os problemas com seus pais. Apesar de tentar compreender o motivo pelo qual eles esconderam a verdade dela durante tanto tempo, Lara se sentia um tanto enganada e traída. “O que custava ter esclarecido as coisas antes? Eu estaria preparada para os ataques, teria aperfeiçoado meu dom e talvez até conseguisse controlar minhas visões. Seria melhor e mais fácil para todos nós.” Lara mordeu mais um pedaço do seu lanche. Nem percebeu que Janna falava com ela até a amiga cutucar seu braço com força.

– Ei, planeta Terra chamando. Está aí? – ela se inclinou – Você não parece muito legal, Lara. Tudo bem? – os olhos verdes de Janna adquiriram um tom mais brilhante e estavam repletos de compaixão. – Sei que é confuso, mas se tiver problemas, sabe, se quiser conversar...

– Ele não me atendeu – Lara sussurrou assim que a voz de Janna morreu no ar – mandou uma mensagem dizendo que o exame de DNA deu positivo e pediu para que eu retornasse. Depois não atendeu mais o telefone – Lara não soube explicar o porquê, mas sua mente havia se voltado novamente para Alex. “Já chega, você tem coisas muito, muito mais importantes para resolver.” Ela sentiu raiva de si por não conseguir controlar o ciúme e desatou a falar novamente:

– Sabe, eu entendo, ou pelo menos tento entender, o que ele está passando. Alex não teve uma vida fácil, digo que ainda não tem, e cometeu um erro. Sei disso, entendo isso, mas me sinto tão, tão irritada com ele... Tinha que ser a Allice? – Ela revirou os olhos e Janna riu.

– Pois é, isso foi uma falta de sorte.

– Aquela garota não vai deixá-lo em paz enquanto isso não acabar. Vai ser um horror. E se ele não me der notícias, pior ainda.

– Bom, acho que deve tentar de novo amanhã. – Janna passou o indicador na borda do seu copo de suco – Você gosta mesmo dele, não? – Os lábios finos dela se curvaram num sorriso encantado. – Nem acredito. Achei que você nuuuunca fosse arrumar alguém.

Lara soltou uma gargalhada bem humorada e sentiu a tensão deixando seus ombros.

– Olha só quem fala. Dois anos de “melhores amigos” para finalmente evoluírem para algo mais... Quer coisa mais enrolada do que essa?

Janna abaixou os olhos e corou um pouco.

– É, acho que eu fui a enrolada. Lucas deixou bem claro, há mais ou menos um ano, que queria ser mais do que só meu amigo. Eu não soube como reagir. Foi na época em que meus poderes estavam aparecendo, e eu estava tão confusa...

– Espera aí... – Lara levantou os olhos – Um ano? E nada de me contar isso antes? – Os olhos dela se arregalaram – Já faz um ano que sabe de tudo isso aqui e nunca me disse nada?

– Lamento, mas eu não podia contar. Era tudo muito confuso no começo, eu não sabia como lidar com isso. Passei a frequentar a Sede algumas vezes por semana para treinar e aqui... Bem, aqui eu encontrei o Lucas. Entrei um choque, imagina só: aquele garotinho desajeitado, gentil e meio nerd treinando e aprendendo a manusear armas... No começo foi estranho, mas depois foi tão... – Janna fez uma pausa e mordeu o lábio – Atraente. E o melhor é que ele continua sendo tão fofo... Como é possível com tudo isso acontecendo?

– Pois é. Agora sou eu que nem acredito. E ele estava aí, bem à sua frente, o tempo todo – Lara balançou a cabeça – Sem comentários. Mas, sério, estou feliz por vocês. – Ela sorriu e comeu mais um pouco do sanduíche – Espero que dê certo.

–Ah, eu também.

– E... Hum... Há quanto tempo vocês estão juntos? Já rolou algo mais que beijinhos?

Os olhos verdes de Janna se arregalaram.

– Como assim?

– Ué, a pergunta foi clara, não? – Lara sorriu – Mais inocente impossível.

– É, foi clara. E não, ainda não rolou nada. – Janna corou e soltou uma risada nervosa.

– Não sei por que, mas isso não me convenceu – Lara tomou mais um gole de suco.

– Ah, convenceu sim.

– Qual é, Janna, somos graaaandes amigas, não? – Lara apoiou o queixo com as mãos. – Só estou curiosa.

– Curiosa até demais.

– Sim, sim... E nem adianta disfarçar bebendo o suco.

Janna levantou os olhos e colocou o copo devagarzinho a mesa.

– É... Digamos que aconteceram umas coisainhas. – Janna ficou ainda mais vermelha e começou a entrelaçar os dedos.

– Isso foi tão vago... – Lara se lamentou.

– Isso foi o suficiente. Já chega. – Janna jogou o guardanapo amassado na amiga. – Quando foi que o foco da conversa veio para em mim, mesmo? Que eu saiba estávamos falando da sua vida amorosa, e não da minha.

_ Minha vida amorosa é complicada demais... A sua é muito mais estilo novela mexicana. Isso é mais o meu tipo.

– Você é, muito, muito chata, sabia disso?

As duas riram e terminaram o lanche como se estivessem numa tarde animada de domingo ou num sábado à noite, sem nada de extraordinário ou preocupante acontecendo; apenas adolescentes normais curtindo a vida.

Depois do lanche, Janna conduziu Lara a um quarto separado dos outros Iniciados.

– Acho melhor você ficar aqui esta noite. Durante a madrugada outros Iniciados chegarão à Sede e é melhor que eu faça apresentações antes de você se enturmar.

– Tudo bem. Tendo uma cama para descansar, está ótimo. Acha que aquela garota, a Clara, vai acordar logo?

– Talvez. Ela estava bem mal e provavelmente a recuperação demorará bastante, mesmo com todo o cuidado das fadas. Vê se descansa um pouco porque amanhã cedo terá que convencer os seus pais a continuarem aqui, pelo menos por um tempo. Vou apresentar você ao Rorbert, à Nina e ao Ethan, os outros Iniciados. Vai ser divertido. – Janna sorriu para tentar tranquilizá-la, mas algo na expressão dela sugeria que o dia seguinte não seria tão agradável assim.

Lara entrou em seu pequeno e aconchegante quarto e logo foi experimentar a cama, que era incrivelmente macia e confortável para um móvel que pareia feito de gelo. Numa mesinha ao lado estavam peças limpas de pijama.

– Estou a dois quartos daqui, bem pertinho; se precisar de alguma coisa, me chame. – Janna apressou-se em deixar o quarto, mas Lara ainda tinha mais uma pergunta que precisava ser respondida para satisfazer aquela comichão de curiosidade:

– Qual é o seu dom? – Ela perguntou de repente - Seu poder? E o do Lucas? Ainda não sei...

– Não se preocupe – Janna deu um sorriso divertido, saboreando a curiosidade da amiga. – Amanhã vamos para a sala de treino e você verá todas as nossas super-habilidades-de-dar-inveja.

– Muito humilde, não? – Lara revirou os olhos – Bem, boa noite.

– Boa noite, até amanhã.

Lara estava esgotada e relaxar o corpo numa cama macia era muito bom, mas, infelizmente, ela sabia que não conseguiria pregar o olho.

A noite foi muito, muito mais longa do que Lara imaginara. Para começar, depois de relaxar um pouco, seu corpo já estava descansado, mas a mente estava a mil e a cabeça ainda latejava. Suas visões insistiam em atormentá-la a cada segundo e cada vez que Lara tentava estabelecer uma conexão entre elas parecia que seu cérebro entrava em curto. “Preciso dormir, preciso relaxar...” Mas era inútil. Quando jurava que havia fechado os olhos e já estava sonhando, ela se dava conta de que ainda estava acordada, pensando e remoendo suas visões.

Lara não sabia exatamente o porquê, mas um nome me particular que Kith mencionara lhe parecia muito familiar. “Lion... Será que já o conheço?” Depois de muito pensar, Lara se censurou por ser tão idiota. “É claro que você não o conhece. Ele tem alguma relação com uma rainha alienígena de uma galáxia distante, por que diabos você o conheceria?”

E é claro que ela não se convenceu. “Pode ser um empresário famoso, alguém rico e influente ou um governante envolvido em uma conspiração...” O leque de possibilidades se abriu e parecia impossível deduzir quem ele era assim, ao acaso.

Lara não fazia ideia de quanto tempo se passara desde que colocara a cabeça no travesseiro, mas uma coisa ela podia garantir: já era madrugada. A Sede inteira ficara silenciosa, vazia, escura e um tanto sombria. A temperatura caíra bastante e as paredes de pedra translúcida brilhavam suavemente na penumbra do quarto.

Um movimento constante de passos começou do lado de fora. Vozes sussurravam com urgência e um conjunto de magos passou apressadamente pela porta do quarto de Lara. Pela fresta rente ao chão, ela observou a passagem de diversos pés. Lembrou-se do que Janna dissera a respeito dos outros Iniciados – que estes chegariam de madrugada. A voz de Lucas ecoou pelo corredor numa conversa animada com Janna.

– Lara está dormindo? - O garoto perguntou – Ótimo, assim... – A voz dele foi ficando mais distante e sumiu. “Droga.” Praguejando, Lara levantou-se e encostou o ouvido na porta, mas as vozes já estavam distantes. “Perfeito. Até aprece que vou ficar aqui...”

Já que não conseguia dormir e ficar se revirando na cama não adiantaria nada, ela abriu a porta bem devagarzinho quando não escutou mais nenhum ruído e se pôs a caminhar cuidadosamente, pé ante pé, pelo chão frio e liso. Tirara os chinelos para não fazer nenhum barulho e já chagara a metade do corredor quando viu a porta mágica se abrir ao longe. Duas pessoas entraram no salão de Sede e, com a praça interia entre Lara e os outros Iniciados, ela não foi capaz de identificar se eram garotos ou garotas. Janna conversava animadamente com um dos adolescentes, enquanto o outro cumprimentava um mago com um gesto displicente. Lara olhou para os lados, sentindo-se terrivelmente exposta por estar num corredor aberto sem nenhuma saliência ou esconderijo. Seus olhos arregalados vasculharam a área e ela continuou até um pequeno jarro que decorava a junção do corredor com a região circular da praça. Abaixou-se ali e ficou espiando.

Depois de alguns minutos e uma conversa rápida, os Iniciados, juntamente com um conjunto de três magos e dois elfos, começaram a avançar para o interior da praça. Lara conseguiu ver que uma das Iniciadas era uma garota na faixa dos dezessete anos, alta e esguia. Trajava uma calça preta, botas de couro, um casaco escuro e carregava armas presas ao cinto – Lara não sabia se eram facas, punhais, adagas ou um pouco de cada, mas pareciam bem ameaçadoras. O rabo de cavalo loiro da garota balançava freneticamente enquanto ela gesticulava e a acenava para Janna. A duas pareciam animadas, radiantes e fortes, e a interação das delas gerou uma pontada de ciúmes em Lara. “Parece que se conhecem há anos”.

Já o garoto era a imagem da rebeldia adolescente. Tinha o cabelo preto todo liso e repicado, usava calça jeans rasgada e cheia de alfinetes pendurados, uma blusa preta larga tão surrada que mais parecia cinza e, por cima, uma jaqueta de couro toda arranhada. O rosto era coberto de piercings – Nos lábios, nas sobrancelhas e no nariz – isso sem falar nas tatuagens que cobriam quase toda a lateral do pescoço. Apesar de se esforçar para não julgar as pessoas pela aparência, Lara não via como aquele garoto podia arcar com as responsabilidades de um Iniciado. Tinha uma expressão indiferente entediada, como se achasse aquele lugar magnífico um tédio. A coisa toda ficou mais estranha quando a garota loira, que parecia tão simpática e sorridente, abraçou o garotou pela cintura e o beijou.

“Esse negócio de os opostos se atraem... Estou começado a acreditar.”

O grupo se aproximava da fonte central, com a estátua da sereia, e Lara já se preparava para voltar ao quarto quando um grito ecoou pela praça. Viera de um dos corredores à direta e todos ficaram subitamente alertas. O gritou ecoou novamente, dessa vez mais longo e desesperado. As luzes foram se acendendo gradativamente, enchendo o ambiente de luz. Os magos puxaram seus cajados, os elfos prepararam seus arcos e os Iniciados sacaram suas facas. Um murmúrio seguido de corre-corre se espalhou pela Sede e os gritos voltaram a ecoar pelo complexo, causando pânico e apreensão. Os soldados élficos continham as criaturas em seus corredores para evitar o acúmulo de gente na praça, enquanto outros magos e um grupo de centauros emergiam de uma câmara a oeste e atravessavam o salão rapidamente, indo em direção aos gritos. Crianças esfregavam os olhos e se agarravam aos adultos, que por sua vez as acalmavam como podiam.

Lara se levantou e fez a coisa mais impulsiva que podia se esperar dela: de pijama e tudo, correu em direção a Janna, driblando os guardas e ignorando os avisos e ordens para que permanecesse no corredor.

– Mas que diabos...- Janna começou quando a viu correndo em sua direção – Lara, você enlouqueceu? Vá para o seu quarto!

– Espere aí. – Ela puxou a amiga bruscamente, fazendo o ombro de Janna estralar e dar um tranco.

– Ai! – A garota exclamou. Um grupo de magos gritava pedindo passagem e os outros Iniciados, que já estavam metros à frente, voltaram para ver o que estava acontecendo. Mais gritos ecoavam pelo corredor e mobilização aumentava. Apesar de toda a comoção e do movimento, a organização, rapidez e presteza dos soldados eram admiráveis: eles contravalam as outras criaturas e mantinham a ordem enquanto identificavam e solucionavam o problema.

– Quem é essa aí? – O garoto vestido de negro apontou a ponta da faca para Lara. – Não parece de Millions – O rosto dele adquiriu um semblante de deboche. – Iniciada? – Ele ergueu a sobrancelha delineada por piercings.

A garota loira cutucou-o e indicou o corredor à frente.

– Vamos. Janna? – A menina dirigiu-se para Janna com um olhar carregado de incômodo – Você vem?

– Estou indo – Janna virou-se para Lara a sussurrou:

– Você enlouqueceu? – Elas afastaram-se para um canto a fim de darem passagem aos magos. Lucas aproximou-se e interferiu:

– Lara, você deveria estar no quarto.

– Sim, eu sei, mas não consegui dormir, ouvi o movimento e...

O barulho seguinte não foi nada parecido com um grito, mas bem que todos na Sede gostariam que o tivesse sido. O baque da explosão encheu o ar e, a princípio, todos ficaram atordoados demais para reagir. Seus corpos receberam o impacto de blocos que pedra que se desprenderam do chão e foram lançados ao longe. Depois do choque inicial, veio o caos. Todos começaram a correr em direção à fonte, atropelando-se e gritando pelos amigos, parentes ou exigindo uma ação rápida dos soldados.

Lucas havia abraçado Janna de uma forma protetora e os três – Lara, Janna e Lucas – se viram caídos no chão da Sede. Lara tentou ficar em pé e, para sua surpresa, não sentiu os efeitos de nenhum ferimento sério. Seus amigos também se levantaram e no meio da gritaria e do empurra-empurra um pensamento desesperador martelou na cabeça de Lara. “Meus pais.”

– Janna, precisamos buscar meus pais! – Ela fez um esforço para chamar a atenção da amiga, mas esta estava concentrada demais analisando a praça e tentando identificar de onde viera a explosão

– Janna! - Lara gritou mais alto e puxou-a com força- Qual é o caminho mais rápido até meus pais? Precisamos tirá-los daqui!

Mas Janna não reagiu e, no instante seguinte, Lara descobriu o porquê. Do lado oposto da Sede, emergia de um dos corredores um monstro enorme. O bicho tinha metros e metros de tentáculos negros e asquerosos, que dava voltas e mais voltas no chão, na parede e alcançavam até o teto. Rapidamente um grupo de soldados armados cercou o animal e tentou contê-lo com cordas brilhantes – seriam de ferro, de aço, ou de outro material desconhecido? Lara não sabia, mas a técnica dos soldados não estava surtindo efeito. Os tentáculos se debatiam e contorciam de forma medonha, liberando-se das cordas com extrema facilidade.

– Vamos! – Janna despertou de seu estupor e puxou-os pelos braços para dentro do corredor mais próximo.

– Aonde vamos? – Lara gritou enquanto disparava com os amigos corredor adentro. O barulho da batalha na praça ecoava por toda a Sede, batendo nas paredes de pedra e retumbando como se toda a ação acontecesse ali, ao lado deles.

– Janna, por favor, vamos até o quarto dos meus pais...

– Temos que fugir AGORA! – a garota disparou sem ao menos olhar para trás. – Seus pais provavelmente já estão no abrigo fortificado.

– Abrigo? –A mente de Lara estava a mil. Será que conseguiriam deter a criatura? Será que os outros Iniciados tinham conseguido escapar? Não parecia justo correr para o abrigo e deixar os outros na mão, principalmente quando Lara não sabia se seus pais já haviam sido atingidos por uma explosão ou pelo monstro...

Ela estacou no corredor e deu meia volta.

– Lara, volte aqui! – Janna correu em direção à amiga, mas Lara já voltava para a praça.

– Não seja tão idiota e impulsiva! – Janna alcançou-a e agarrou-se a blusa dela – Olha só, você não pode fazer nada! – Ela virou-se para Lara. Seus olhos tinham um brilho desesperado e assustado, contendo uma súplica: por favor, não se arrisque. Não faça nenhuma besteira. - Está desarmada, destreinada e despreparada. Vai acabar se machucando.

Lara se acalmou um pouco e tentou pensar com clareza. Claro que era idiotice voltar para a área de conflito, e com certeza ela não estava preparada para lutar nem em sua própria defesa, muito menos na de seus pais. Mesmo com os instintos gritando para que ela fugisse, Lara nunca se perdoaria se chegasse ao abrigo e espcapasse sã e salva enquanto seus pais pereciam do lado de fora, talvez até procurando por ela. A ideia de pensar em John e Anna mortos fez as pernas de Lara trabalharem sozinhas, motivadas pelo pico de adrenalina, e ela disparou para a praça.

–Não! – Janna segurou-a novamente, mas desta vez Lara não parou pacificamente. As duas se empurraram até caírem no chão, mas Janna era muito mais forte e mais hábil em combate corpo a corpo; não demorou muito para que Lara se visse imobilizada, de costas no chão.

– Por favor, Lara. Vamos. Isso é muito, muito grave. – Lara continuou se debatendo e, num aceso de desespero e raiva, Janna deu um tapa no rosto dela. - Eles estão atrás de você!

Isso foi o suficiente para fazer Lara se acalmar e escutar.

– Desculpe. Ah, Lara, desculpe mesmo. – Janna saiu de cima dela e ajudou-a a se levantar. – Eu não queria bater em você.

– Tudo bem – Lara esfregou os braços, sentindo-se envergonhada por precisar ser contida como uma criancinha teimosa. - Atrás de mim? Como assim? – Seu estômago foi se contraindo e ficando mais pesado. Quem poderia estar atrás dela, afinal? Todo esse ataque era só para capturá-la? Impossível. Ela nem era uma Iniciada poderosa e mal sabia controlar suas visões...

– Agora não há tempo para conversar. – Janna olhou de um lado para o outro, ansiosa. – Precisamos encontrar uma passagem escondida para o abrigo. – Os três voltaram a se deslocar pelo longo corredor, dessa vez mais devagar – Cada corredor tem uma passagem, geralmente escondida nos últimos quartos, nas paredes ou no chão...

Janna se abaixou e começou a tatear a pedra. Lara fez o mesmo e, quando Lucas distanciou-se para verificar uma fresta na parede, ela cochichou:

– Janna, quem você acha que está atrás de mim?

– Não se preocupe com isso agora. – A amiga respondeu sem tirar os olhos do chão – Todo corredor tem uma passagem; todo corredor tem uma passagem... – Ela murmurava baixinho enquanto verificava cada centímetro da pedra translúcida – Ah, vamos, lá... Vamos...

Lara começou a vasculhar as paredes, mas sua mente estava em outro lugar. Barulhos de passos soaram pelo corredor. Estavam no encalço deles.

– Entraram no corredor! – Janna exclamou com a voz fina e baixa. – Precisamos nos esconder.

– Ali! – Lucas apontou para um quarto que estava com a porta entreaberta. Fazendo o mínimo de ruídos possível (pois, infelizmente, as paredes altas e lisas produziam um eco terrível) eles entraram no recinto.

Janna sacou a faca e escondeu-se atrás da porta, Lucas entrou num pequeno armário e Lara se arrastou para baixo da cama. O quarto não era um bom esconderijo, já que quase não tinha móveis, mas esse fato foi compensado pela faca de prata que os que ali dormiam deixaram em baixo da cama.

Com o coração martelando feito doido e a testa úmida de suor, Lara esperou pacientemente embaixo da cama, com a faca nas mãos, observando a fresta de luz entre o chão e a porta. Janna estava pronta para atacar quem entrasse no quarto. O barulho de passos, seguido de um ruído nojento de sucção, fez Lara se lembrar do ataque em sua casa e das feições horrendas das criaturas que a atacaram.

Os segundos se arrastaram penosamente até o barulho de sibilos e grunhidos diminuir. Os três saíram cuidadosamente de seus esconderijos e, como já não ouviam mais nenhum sinal de movimento, relaxaram um pouco.

– Aquelas criaturas... – A voz de Lara morreu no ar. Ela sentou-se na cama e apoiou a lâmina fria da faca no colo.

– Onde conseguiu isso? – Lucas apontou para a arma e arregalou os olhos.

– Ah, acho que os donos esqueceram aqui no momento da fuga...

– Impossível. Eles não fugiriam sem levar a arma. – Janna balbuciou.

– Talvez, num momento de desespero, eles tenham se esquecido de levá-la. – Lara alisou o cabo de couro da arma.

– Não, você não os conhece. São organizados e muito bem preparados para enfrentar situações assim. Não sairiam sem levar a arma. O dono dessa faca... Ainda está aqui.

A espinha de Lara gelou. E não, não foi pelo que Janna acabara de dizer. Mas sim porque, gravado na junção do cabo com o punhal, estava um nome.

Um nome familiar.

Lion.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "The Blue Blood" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.