Mantendo O Equilíbrio - Um Novo Amanhã escrita por Alexis terminando a história


Capítulo 37
Capítulo 7


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo... eu simplesmente amo. Um de meus favoritos tbm!
Murilo se supera em nos fazer cair de amor por ele *------* aqui ele vai roubar atenção MESMO.

Enjoy :D



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No belo domingo ensolarado, ao adentrar na casa de meu avô-sogro – seu Júlio que brincou um dia com esse termo e gostou; pegou – a conversa com Vinícius estava tão acalorada na adivinhação, eu querendo saber, ele tentando esconder uma tal surpresa, que nem percebeu que o carro do pai estava do outro lado da garagem. Na noite passada dormi no apartamento com as garotas, Filipe passou a noite fora, e até então não se mandara dali. Antes que Vini notasse, preferi intervir com uma distração, para evitar uma exaltação desnecessária.

– Tá, se não vai me dizer o que é ou pelo menos sobre o que é, nem te digo uma coisa que... ah, deixa pra lá.

Pego minha bolsa para descer, assim como ele se desliga o carro e ajeita umas coisas no painel antes de sairmos.

– O quê? O que é?

Eu não tava de sacanagem, apesar de usar a informação como um trunfo. Queria de verdade falar que havia procurado Eric, começar a fazer o que tem de ser feito com calma. Como, eu ainda pensava sobre isso. Na noite passada havia sonhado com Eric, que me dizia algo, já não sei o quê. Dani, já mais espivitada pela manhã, me acordou na base das cócegas, só me veio a memória do sonho quando chegava em casa. Ficou pelos pensamentos até hora de Vini me buscar, já que Murilo ainda não havia voltado do plantão, ele nos encontraria no almoço.

– Nada... eu queria te contar uma coisa, mas...

– Mas eu não posso dizer nada agora, amor, assim não vai ser surpresa. Só digo que, quando for a hora certa, eu falo sobre o que é, tá? Vou dar um tempo para sua resposta e tudo.

– Resposta? Como assim resposta?

Paro no meio do jardim extenso enquanto Vini continua o caminho antes de notar que eu havia ficado para trás. Estava tudo indo aos conformes, até que ele virou e ia retrucar algo, quando se dá conta do carro de Filipe, ele viu além mim. Suspiro na minha ao ver que isso o chateava um pouco. Era uma realidade da qual ele não podia fugir, afinal. E olha que ele tentava a todo custo.

– Ele já deve estar de saída, Vini.

– Melhor que esteja.

Alcanço-o em passos calmos. Não gosto de sua expressão de desprezo... Se pudesse livrá-lo dela de alguma forma permanente, eu faria. Não basta como seguro seu rosto, aninhando-o em minhas mãos, mas tento. Vini desvia o olhar de mim, encara o gramado, sabe que não sou a favor de seu comportamento.

– Não precisa dizer nada se o encontrarmos... Vamos, seu Júlio nos espera lá dentro.

– E se esperássemos aqui fora o Murilo?

Nessa hora o carro de meu irmão entra, quase como chamado e atendido. Vini expira com certa derrota do plano mal formado, concorda em entrar. Entrelaça seus dedos nos meus, faz um aperto mínimo a minha mão, como que para confirmar que eu estava lá por ele, que isso lhe tranquilizava mais. O alívio mesmo se dá quando entramos e não há sinal algum de Filipe. Ouvimos ao longe o motor de seu carro, ele ir embora. Imagino que deva ter utilizado alguma saída alternativa.

Guardo para mim mesma o aperto no peito pelo fato do Filipe ter esse cuidado.

~;~

Dê dinheiro, não dê intimidade.

Houve um problema com a sobremesa depois do almoço – vulgo Murilo tombou com a cozinheira logo que ele vinha afobado do corredor e não a viu, o pudim foi de cara no chão, eu ri tanto dele desconcertado que tive de me segurar para não constranger a cozinheira. Quando ela se retirou dizendo que iria preparar algo rápido, Aline a interrompeu, pediu desculpas pelo meu irmão e disse que tinha uma ideia.

– A senhora se importaria se a gente fizesse?

A senhorinha foi pega de surpresa com essa, tanto que não sabia como responder, até Djane intervir, aconselhou a aceitar a proposta. Seria nossa supervisora a cozinheira. Djane tava doida para ver a cena e não deixamos, insistimos que ela descansasse, afinal, o cargo dela tem puxado muito ultimamente e são poucas as horas que ela larga tudo. Quando ela e seu Júlio acordassem do sono da beleza do pós-almoço, veriam a delícia que prepararíamos. Sim, me botaram no meio.

– Só pra dizer, se der errado, tem uma sorveteria na esquina.

Aline me cutuca com o cotovelo do lado da pia.

– Milena, para de ser pessimista. Até parece que vocês não sabem fazer nada.

– E não sou muito boa com doces, aquele cupcake foi um caso à parte.

Vini vem para perto a fim de pegar uns utensílios que a cozinheira, dona Fanny – já dei logo apelido, para encurtar Estefânia – havia indicado. Meu lindo estava uma graça de avental azul, sorrindo vitorioso por tê-lo ganho na sorte, deixando meu irmão com uma vestimenta rosa, como era a minha e de Aline. Como se isso garantisse alguma masculinidade, os dois tiraram na moeda. Homens e suas competições bestas.

– Tá tentando se safar do serviço, amor?

Sorrio. Brinco:

– Tá muito na cara?

– Tá.

Dona Fanny quis tomar meu lugar, expliquei que era brincadeira minha. Logo estávamos com a mão na massa seguindo as instruções de Aline, tão a vontade que a conversa logo fluiu. Iara estava perdendo tudo isso, disse que não poderia comparecer ao almoço dessa vez, não entrou em detalhes. Senti sua falta.

Em dado momento dona Fanny foi verificar a medicação que seu Júlio toma para a pressão, ele às vezes esquece, ainda bem que pode contar com a senhorinha. O papo na cozinha continuou conosco. Aline contava sobre o almoço que faria sua família para a mãe dela, e Murilo cogitava fazer uma surpresa para a nossa, uma pequena viagem de fim de semana, só que o projeto dele estava num ponto tão delicado que estava difícil deixar, mesmo por poucos dias.

– A Lena disse que viu um vestido ontem no shopping que mamãe possa gostar. Mais tarde vamos lá, vão manter as lojas abertas mesmo no domingo por causa do dia das mães.

Complementei:

– É, e eu quero ver se acho ainda uns pijamas, ontem não deu para ver direito.

Untava a forma do bolo (sim, desistimos do pudim, iria demorar muito), com a manteiga, distraída. Fiquei com a fôrma depois de brincar com a farinha de trigo no rosto do namorado (sempre quis fazer isso como nos filmes). Que culpa tenho se tive a oportunidade de soprar? Alguns instintos não se abandonam fácil, gostava de aprontar.

Aline veio com o bolo batido para espalhar na fôrma:

– Sei de um lugar ótimo e com promoção. Lá tem uns pijamas ótimos.

Já ia perguntar onde, quando meu irmãozinho fez a gentileza de cutucar, apontando para aquele que devia ser seu amigo:

– Espero que não tão curtos como um que ela tem. E ainda quer usar na frente desse daí.

Se ele quer sacanear, eu também posso. Depois de eu ter rido dele por ter derrubado o pudim, ele riu a valer de mim quando escorreguei no pó da farinha que deixei escapulir do pacote quando assoprava na cara do Vini. Me sentia traquina hoje. Solto:

– O que você prefere, eu usando um pijama ou eu usando nada?

Só que quem pula da cadeira é meu namorado.

– Milena!

Apontei para Murilo, que tinha as sobrancelhas surpresas, olhava de mim para Vini e vice-versa, sem muita reação além dessa.

– Foi ele quem começou.

Aline intervém, antes que Murilo leve a brincadeira como algo sério demais:

– Relaxa, Murilin, ela quer te deixar aborrecido. Não caia nessa.

A traquinagem se desperta mais em mim ao ouvir o apelido que Aline deu a meu irmão. Ele nunca foi fã de nomes carinhosos, apesar de dengoso que é. Vini capta que vou fazer algo, assim me ameaça com o olhar. Boazinha que sou, calço as luvas protetoras e apenas engulo, já planejando aprontar algo mais elaborado com o “Murilin”. Ele que me espere.

~;~

Sequer alguma vez pude cogitar de pensar numa cena tal a qual eu via. Presenciar? Vish. Se me contassem eu não acreditaria... ou demorasse a acreditar. Mas já que estou diante da visagem da vida, melhor eu passar a acreditar.

Murilo realmente tá mexido com isso de se tornar pai. Desde que colocaram esse ponto de interrogação em sua cabeça, já o peguei várias vezes ruminando sua situação. Essa dúvida deve lhe fazer sentir-se pai ou responsável por isso, que mesmo criança do jeito que é, ele não é do tipo que fugiria da raia. Meu irmão pode ser o maior covarde das agulhas de hospital, mas na hora do “vamo-vê” de alguma coisa séria, ele encara, do jeito que seu gênio manda.

Agora seu gênio anda é confuso. E não nego que isso o faça passar por coisas engraçadas. Isso até me dava ideias do que fazer de noite com o celular... coisas para planejar melhor depois... Por enquanto me mantenho quieta a observá-lo de longe.

O caso é que, por um grande milagre de vida, ele ofereceu carona de me levar ao shopping, mesmo cansado como estava. Após nossa empreitada na cozinha do avô-sogro, Vini iria me trazer, já que não queria ficar para mais tarde e encontrar o shopping lotado, até porque eu teria umas coisas para fazer em casa. Contudo, ele não pôde por um problema de última de um trabalho em equipe, que seu colega teve de repassá-lo.

Eu que não ia ficar no meio, impedindo, né? Também não pediria para Aline, pois havia contado mais cedo que havia uma reunião de família para ir, eu não iria desviá-la de seu caminho. Aí Murilo ofereceu, dizendo ele que para comprar logo o presente de nossa mãe, que ficou pendente.

E não só me deu carona, como me espantou ao descer do carro para me acompanhar. Via como estava cansado, pedi apenas seu cartão que eu fazia o resto, mas não, ele insistiu em ir comigo. Enquanto ele fazia o pagamento, liguei para Aline, para me dar as indicações da loja que havia comentado comigo.

Aí entrei numa loja feminina, a que me foi indicada. Murilo preferiu esperar do lado de fora. E foi assim, que quando saí da cabine para o caixa, observei através da vitrine para checar se meu irmão estava lá no banquinho e... não, Murilo estava de pé, de costas para mim, quieto com algo que via além do vidro a sua frente. A atendente quase teve que gritar comigo para que eu passar o cartão, para efetuar a compra, e eu paradona olhando lá pra frente. Porque eu queria ver mais e não me era deixado por tanta mulher na loja em que eu estava.

Fiz rapidamente a compra pra me livrar logo, então corri para onde tinha o visto da ultima vez. A vitrine era de uma loja de brinquedos, percebi. Ao fundo dela identifiquei sua cabeça andando por uma seção. Ai sumiu. Fui atrás, queria saber que fim daria essa sua passagem pelos brinquedos. Tava muito estranho para meu gosto...

O movimento do estabelecimento estava baixo até, consegui me deslocar bem. Não demorou muito para encontrá-lo, sentado numa cadeirinha colorida de um conjunto de brinquedos abertos diante de um inventário de bonecos masculinos e femininos. Uma atendente passou apressada com uns pacotes e deixou uma boneca na mesa ao lado dele, quem parecia em conta com seus próprios pensamentos ainda. Era daquelas bonecas estilo bebê, de fraldinha e babador. Me mantive de longe.

Qual não foi nossa reação quando ela, a boneca, numa doce voz, começou a falar. Ele por achar que fora outra pessoa, eu por ele ter respondido:

– Olá.

– Oi?

– Bom dia, mamãe.

Aturdido, olhando para os lados, ele identificou a boneca. Deu de ombros, respondeu mais uma vez, com um sorriso incerto dessa vez. Não havia ninguém por ali mesmo, além de mim que assistia um pouco afastada.

– Errr... bom dia.

A boneca não hesitou como ele, foi direta na “conversa” mais uma vez:

– Me dá um abraço?

Deus, como eu quis rir nessa hora.

Murilo, por outro lado, ficou de olho na boneca, sem mover-se para um “abraço”. Gostaria muito de saber o que se passava na mente dele com uma menina conversadeira. Ele se manteve na mesma postura quando ela retornou a falar um “tô com fome”. Mas até eu fiquei sentida quando a gravação soltou as seguintes palavras:

– Mamãe? Te amo.

Nessa hora Murilo abaixou a cabeça, soltou a sacola de compra que detinha nas mãos aos pés e ficou um tempo assim, muito quieto. Acho que o cansaço não contribuía muito.

Tive que me segurar mesmo quando, um pouco mais em seguida, a delicada boneca fez uma vozinha de culpada que fez meu irmão abrir um sorriso meigo e besta:

– Acho que fiz caquinha.

Era estranhamente fofo encontrá-lo assim desconcertado. Talvez fora demais para sua cabeça, pois ele se levantou. Ou percebera que se demorara. Eu? Eu corri destrambelhada para a loja que estava antes, para fingir que estava de olho em outra coisa. Fingi espanto também quando surgiu ao meu lado resmungando:

– Eu podia ir na Europa e voltar e você ainda estaria aqui. Mulher demora demais.

– Você que quis vir. Agora aguenta. Te compro um sorvete para você se distrair, que acha?

– Só se tiver calda de caramelo. E castanhas. E...

– Tá, vamo lá.

Lá estava a criança interior dele de volta.

~;~

– Que você fez?

– Eu? Por que acha que fiz algo?

– Tá com cara de culpado.

Murilo tava pensativo demais, jogado no nosso sofá, alheio a tv num volume moderado. Conhecendo-o como conheço, ali morava o perigo.

– Não fiz nada dessa vez. Só... tô pensando.

Resmunga se aconchegando mais às almofadas, quando devia estar na cama já. Isso me preocupava cada vez mais.

– Disso que tenho medo.

Ressentido, levanta a cabeça para mim, de pé, atrás do sofá. Ele odeia quando falo desse jeito, sugere que não confio nele. Só que já tive muitas provas do que acontece quando ele se comporta desse jeito e não me vem nenhuma vez que trouxe algo de bom. Ele emburra fácil, soca a almofada e volta a deitar a cabeça nela.

– Não esculacha não, Lena. Só tô com muita coisa na cabeça agora.

Percebe-se. Tenho compaixão por fim.

– Sorry. É que não sei como você pode passar todo esse tempo sem, você sabe, esclarecer as coisas com a Aline. Quer dizer, isso é bem sério. E isso vai te acabar, mano. Qual é a dificuldade afinal?

Expira cansado, abatido. Pior que cachorro em cólicas, meu irmãozinho esparramado tava sem sua energia até para falar. Também não se trata do que faz ou deixa de fazer, mas do que anda acontecendo por si só. Além do cansaço do dia, tudo cai sobre ele:

– Acho que fico esperando o dia que ela vai me dizer, e nada até agora. Porque ela deveria falar, né? Tenho o direito de saber. Além disso, esses dias têm sido difíceis, a gente quase não se vê, mesmo trabalhando no mesmo prédio. Pode parecer loucura, mas tem hora que ela simplesmente some... Fico meio bolado com as desculpas, e comigo mesmo por não conseguir fazer a pergunta direta. Parece que nunca temos uma hora para conversar. Cheguei até a...

Hesita. Atenta, me policio para não julgar.

– Murilo... olha lá.

– ... a vasculhar pelas coisas dela, pra ver se havia algum indício, qualquer coisa. A bolsa dela tava perto e Aline não, me pareceu uma oportunidade. Ela nem notou.

– E havia algo?

Remexida como ele com a história, me percebi já no sofá, sentada, onde ele me deu espaço e logo repousou a cabeça no meu colo junto da almofada. Foi instintivo fazer carinho nele, que se aconchegou mais a mim. Se negasse meu toque, aí sim eu diria que o mundo tava de ponta cabeça. No entanto, para ele, o mundo estava desse jeito, já que nada parecia certo.

– Não. Mas isso também não quer dizer muito. Só sei que as coisas meio que tão estranhas, até mesmo pelo seu desempenho com a diretora. Nem sei te explicar direito. E ainda fico tendo uns... sonhos...

A cabeça de meu irmão pode funcionar das maneiras mais extraordinárias possíveis; contudo, cérebro é cérebro. Ele trabalha nossas preocupações e vontades das maneiras mais bizarras. Agora sim sei que Murilo anda atormentado.

Será que tem medo de ser pai? De ter que assumir essa responsabilidade?

Agora tenho minhas dúvidas...

– Sonhos?

Carente como nunca, Murilo alcança outra almofada, a abraça com força. Expira mais outra vez, abrindo-se mais. Ou “vomitando mais”.

– É... já sonhei com ela me mostrando o teste médico, e ela dizendo que é meu. Outro era Aline com um bebê nos braços. E eu comprava fralda numa loja de eletrônicos... como se isso fosse possível.

– Sonhos são estranhos mesmo.

Ele franze a testa, os músculos do rosto se contraem. Me dá uma dó de vê-lo assim que nem consigo me afastar dele. Queria ter algo que pudesse aliviá-lo, ajudar de alguma maneira. Mas como?

– Ô maninho. Deve haver alguma lógica por trás disso... e vocês são tão... comunicativos, ligados. Como que vocês podem estar num mesmo lugar e não conversar?

– Mas não temos ficado sozinhos ultimamente, não para conversar... tô com trabalho extra, ela também, aí já viu. Ela já mencionou algo para você?

Ele vira a cabeça, me olha nos olhos, olhos seus que estão baixos, tristonhos. Quase ingênuos em busca de resposta. Continuo o cafuné, na esperança de que pelo menos conforto tenha.

– Na verdade, Aline me contou que você anda meio estranho. Também, depois dessa de vasculhar as coisas dela, deve ter ficado na cara. Apesar de eu saber a razão, despistei. Ela pode não ter visto você remexendo nas coisas dela, porém sabe que algo tá acontecendo. Murilo, você nunca é discreto!

Ok, não evitei de ralhar. Pelo menos foi na base do carinho.

Ele se vira novamente para a tv, pega o controle e desliga. Ao silêncio, revida:

– Porque sou verdadeiro, oras. Não dou para essas coisas...

Isso me parece BEM sugestivo. Minha cabeça insiste para ser paciente, que não é hora de brigar... Ainda assim, me escapole pegar o que ele deixa no ar:

– Tá dizendo que eu d...

Ele não me olha.

– Tô dizendo que você me engana às vezes. Ou me deixo enganar fácil, num sei, por mais que me mantenha presente e atento.

Como que Murilo mudou de assunto tão rapidamente?

De fato, tem muita coisa nessa cabecinha fazendo um estrago. Assim ele apenas desabafa, e eu escuto, sem retrucar, nem brigar:

– E se isso acontece comigo tão perto, o que pode acontecer se estiver longe? Vai que... que nessa viagem tem algo? Eu não vou tá lá.

– Mu, não começa não. Você tá me barrando de novo.

Então ele levanta os olhos, direto para mim dessa vez.

– Não consigo evitar, Lena. Eu tento, sério. Vejo você se preparando para essa viagem faz meses, e ainda sinto esse aperto. Paranoico, eu sei, só que ter noção disso não minimiza em nada.

– Desculpa, mano, dessa vez você tem que barrar a si mesmo. Poxa, uma hora você vai ter que desgarrar de mim. Somos irmãos, isso não nos faz viver em função do outro, mas com o outro. Cada um vai construir a sua própria... Vai que você é pai mesmo?

As sobrancelhas dele mexem-se de forma a baixarem de vez, fechando um pouco seu aspecto. Legal, agora ele tá chateado.

– Você não se mudaria, mudaria?

– Não, claro que não. Tô falando que precisamos de limites. Não dá pra interferir a cada vez que não concordar com algo. E são poucos dias, poxa, você não vai nem notar.

Sua expressão se abranda, felizmente. Me toca no rosto com uma mão, outra a leva ao lado esquerdo do peito.

– Vou notar sim. Vou sentir sua falta. Tenho coração, você sabe.

Sorrio que nem besta desse seu coraçãozinho. Dito com a maior das certezas:

– O mais derretido, confuso e bobo de todos. Vai mimar essa criança demais.

– Acha que eu seria bom pai?

Quando me joga essa pergunta, paro uns segundos para vê-lo de verdade, dando-lhe mais atenção. Vejo nos seus olhos que há curiosidade, entusiasmo, apesar do receio e tensão. Minhas dúvidas de minutos atrás vão embora.

– O mais tapado, talvez... Que acontece de ser um dos melhores.

Murilo puxa uma mecha de meu cabelo, brincalhão. Meu mano estava de volta, ou pelo menos voltando, ao seu estado normal.

– Chata. Tu vai ser a tia trambiqueira.

– Meu plano de vida, você sabe. Porque se eu já apronto, quão melhor será se eu tiver um reforço de seu próprio filho?

Aí ele me “conserta”:

– Filha. Você me condenou a ter uma filha.

– Ah sim, verdade. Uma grande lição de vida... e assim terei a quem passar meu legado, estratégias e planos maléficos...

– Estratégias? Você tem estratégias, Milena Lins?

Eu e minha boca grande.

Tento me sair dessa, uso a clássica tática de contornar e mudar de assunto.

– Modo de falar, coisa. Agora vai pra tua cama, senão tu não levanta amanhã cedo de tão zumbi que vai ficar.

O besta se aconchega mais em mim. Ah, ele não fez isso...

– Ah, não, aqui tá melhor. Se eu levantar, acaba cafuné.

Arranco a almofada que ele detinha aos braços ainda, taco direto na fuça dele. Delicadamente, claro. Ele emburra um pouco, faz o bico de sempre.

– Ô garoto besta, fim de expediente já. Ai de ti de querer dormir aqui.

– Tá, já vou... Juro que amanhã falo com Aline e... Tenho pelo menos direito a um abraço?

Quero dar, sem dar o braço a torcer para o bico que mantém. Me pergunto ainda se “sua filha” fará gato-sapato dele. Bem possível se tiver um dossiê meu que a prepare...

Antes de me entregar a essas fantasias, me volto para o mundo real.

– Não. Vai logo.

Quando trota para seu quarto, eu o acompanho, era meu caminho para o banheiro, onde escovaria os dentes. No fim das contas, acabei por dar-lhe um breve abraço, pego de surpresa por trás. Sei que sorriu pela forma como recebeu, então o dispensei logo para não cantar vitória ante meu amolecimento.

Mesmo uma figura difícil de lidar, amor não posso lhe negar.


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Notas finais do capítulo

Curiosidade: a cena da boneca realmente aconteceu hahaha Uma prima minha ganhou essa boneca, e outra prima inventou de sacanear, ligou o brinquedo que começou a falar. Mas a Alexis aqui... tava pensando em outra coisa, né, 'Murilin'? XD #adogo



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