Limpo ou organizado não eram palavras certas para descrever o lugar em que Sebastian estava alojado. Não era nada parecido com a casa onde Clary passara uma temporada algum tempo atrás. Não era algo muito inovador para ela entretanto. Um casebre antigo que mais parecia ter saído dos tempos medievais. Existiam apenas mais três cômodos além da sala mal iluminada e apertada: um banheiro minúsculo e um quarto, que obviamente pela bagunça notória era dele e o outro compartimento estava trancado. Na parte lateral da sala existe uma pequena pia e uma bancada. Tudo muito arcaico e ainda assim muito familiar. O cheiro de mofo e podridão era evidente na casa. Sangue se espalhava por todo o chão, e não era uma consequência de luta, era consequência diferente, constatou Clary. Aquele era o sangue de Sebastian. Sangue.

Ele não pareceu surpreso quando a garota ruiva caminhou pela casa atenta a tudo. Nem largou seu olhar pesado sobre ela também. Quando sua “vistoria” acabou ela apenas o encarou de volta. Não havia muito o que falar. Clary não se imaginava conversando com ele – sua missão aqui era uma só, e ela estava mais viva do que nunca. Todavia sabia que uma luta a essa altura não renderia muito. Não seria possível obter algo próximo de confiança de Sebastian agora. Ela teria que mostrar submissão para conseguir alcançar o que pretendia. Ele cruza os braços e cai sentado em um sofá, sem a metade do estofado de couro, levantando poeira. Clarissa engasga e tosse rapidamente, cruza os braços e se senta ao lado oposto, no braço do sofá.

“Nós iremos ficar apenas estreitando os laços familiares aqui sentados?” ela joga ironizando

Isso faz um sorriso sombrio cruzar o rosto do shadowhunter “Nós poderíamos tentar algo a mais do que ficar simplesmente sentados.”

Clary sabe que é ridículo, mas ela está corada. Isso a irrita ainda mais, ainda assim tenta novamente.

“E o que você tem planejado em sua mente do mal?” tenta soar como algo casual

Ele ri novamente. Há algo muito errado. Muito errado. Senão estes sorrisos não eram para estar aí. Ela se lembra e tenta não pensar em todos aqueles deixados para trás.

“Você não acha que esse lar está precisando de uma ordem?” ele pergunta gesticulando categoricamente para o lugar decadente “Acho que você poderia começar pela sala mesmo. Deve ter algum balde no banheiro.”

Incredulidade cruza o rosto de Adele, mas ela sabe que ele não está brincando. Essa deve ser só uma de suas vinganças. Ou até mesmo uma brincadeirinha. Uma cartada. Afinal este era seu jogo. Isso não será nada demais, convence a si mesma. Com o balde meio cheio de água e um esfregão velho começa a limpar o sangue do chão da sala.

***

Uma semana e nenhuma visita de Clary, essa desculpa de que ela estava doente não era nada convincente. Jace sabia disso. E era por isso que nem mais um minuto no Instituto seria aceitável. Foi fácil enganar os outros, mas havia Zachariah – uma pessoa um tanto singular. Foi apenas os lábios de Jace formarem a palavra “Clary” que tudo pareceu claro para o irmão do silêncio, que com apenas um aceno de cabeça, permitiu que Jace saísse ignorando ter visto qualquer coisa. O ex-mundano, ex-rato, ex-carregador da marca de Caim já estava esperando do lado de fora.

“Hey” Simon diz dando de ombros, ele não parece nada bem aos olhos de Jace

“Alguém viu você?” pergunta Jace dando uma volta ao redor

“Só diga logo, ok?”

“Onde está Clary? E não me venha com essa de que ela está doente, pois nós dois sabemos que é mentira. Agora, me diga onde ela está ou eu farei o favor de arrancar sua cabeça com um só golpe.”

Simon hesita. Mas cansaço ou talvez frustração o vençam. “Eu não sei. Ninguém sabe Jace. Ela sumiu noite passada. Eu pensei que ela estava com você, mas agora tenho certeza que não.”

“E SÓ AGORA VOCÊ ME DIZ ISSO?” Jace consegue sentir o calor irradiando de seu próprio corpo, um fogo além do atual crescendo abruptamente “E TODOS NÓS SABEMOS O QUE ELA FOI FAZER. E SÓ AGORA ME DIZ?!” ele passa as mãos nervosamente pelos cabelos enquanto Simon dá de ombros

“Ninguém queria que isso acontecesse.”

É tudo o que Simon diz e Jace olha a volta, sua própria roupa chamuscada, uma poeira deixando as folhas queimadas pela áurea que só agora está parecendo sumir. Porém mesmo depois a áurea não some e a pele dele continua iluminada pelo fogo. Pela chama de raiva e chama dos anjos. Demoro muito até sumir, Simon está sentado em um paralelepípedo na rua fraco demais para olhar. As chamas depois de um longo tempo deixam o corpo de Jace e sua pele volta ao tom normal, apesar da temperatura corporal ainda elevada. Mas Jace ainda tem brasas dentro de si. Brasas nada puras como as dos anjos.