Sem Pistas escrita por Return To Zero


Capítulo 4
Verso III: Areia da ampulheta


Notas iniciais do capítulo

Conforme eu fui escrevendo os capitulos, achei esse aqui um tanto... Desnecessario e confuso. Eu sinto muito.



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Naquela manhã, Clara amanheceu com um espirro.

"Eu avisei que ficaria resfriada."

- Avisou nada, fique quieta!

Rapidamente tomou seu desjejum e fora informada que o mestre Alquimista chegaria dentro de três dias de sua viagem. Os criados pediram que se comportasse e que comparecesse  às aulas naquela tarde, já que os professores ficaram furiosos ontem. Clara prontamente aceitou, cruzando os dedos atrás de si.

Silenciosa, foi até o aposento do loiro, um pouco hesitante. Prendeu varios espirros no caminho para não levantar suspeitas. Será que foram rudes com ele? Será que foi castigado? Do batente da porta ficou observando-o ler o livro em voz alta, gaguejando para vezes, e perguntando para o baixinho no frasco como se dizia aquela palavra. Achou graça na simplicidade do garoto e nos ocasionais insultos que a bolinha preta lhe aplicava.

- Atrapalho? - pigarreou da porta, entrando no aposento - Eles... Você sabe, ficaram bravos com você?

Heim permaneceu estatico na cadeira e fechou o livro bruscamente como no outro dia. De subito, levantou-se. O livro foi parar por cima da mesa e ele a pegou pelos ombros, segurando-a fortemente.

- Senhorita Clara, eu gosto muito da senhorita! - disse de uma vez, parecendo ofegante. O dourado dos seus olhos derreteu sobre os olhos claros dela, como ouro - Eu sei que, agora, não sou digno da senhorita mas vou crescer e me tornar um grande Alquimista! E então vou estar à sua altura!

Longos segundos se passaram enquanto os dois se olhavam, curiosos até. Clara estava com uma expressão incredula, reprimindo um riso. Aos poucos, ele a soltou e a vergonha tomou conta de si, avermelhando-lhe o rosto.

- Qual o seu problema, Heim? - indagou, sentindo o rosto corar também - Enfim, só queria saber se não te machucaram muito depois de você ter assumido a culpa. 

- Por que me machucariam? A culpa foi toda sua de ter me arrastado pra fora. Lembrando que eu não queria sair. - retrucou, abrindo um sorriso logo em seguida - Mas até que foi bom. Eu tenho um livro novo em folha e aprendi coisas importantes então, muito obrigado senhorita Clara.

A morena ficou sem jeito com o sorriso de Heim, e com sua facilidade em agradecer. Quanto tempo tentava agradecer por algo tão simples quanto vigiar seu sono? Cruzou os braços, recostando-se à parede e evitando contato visual - Não foi nada. Estava pensando em irmos de novo, que tal?

- M-Mellhor não... Pode trazer alguns problemas pra senhorita e...

- Não ligo para os problemas, desde que eu possa... - ela umedeceu os labios, contraindo-os, se arrependendo lentamente

- Desde que possa?

- D-Desde que possa me divertir um pouco! - emendou, irritada - Você não vai, então? Pois eu vou indo.

- Não, senhorita Clara, espere!

Ela se virou e a única coisa que viu foram os flamejantes olhos dourados de Heim sobre os seus, esquentando as calmas orbes cor de água dela. Seus labios se pressionaram contra os dela quase que imediatamente, e os olhos não se cerraram por sequer um segundo. Ambos inspiraram fundo e deram continuidade, parando apenas quando ouviram o nome de Clara ecoar no corredor.

- Dizem que fazem isso nas pessoas que gostam. Verdade? - questionou Heim, inocente

- H-Heim... - ela lhe roubou mais alguns beijos - Não faça mais isso, ou não vou saber como parar.

- Eu acho isso muito bom, também não quero que pare. - confessou, acariciando-lhe as bochechas e puxando-a para um último beijo 

- Clara Werlang, então era aí que a senhorita se meteu! - um dos criados responsaveis por ela a desgrudou do loiro pelo colarinho, arrastando-a pelo corredor - Seu professor de Matematica está aqui, e a senhorita se agarrando com um criado? Mas o mestre vai saber disso!

***

E os anos se passaram tão rapido que mal perceberam. Heim cresceu e, graças à sua aptitude em Alquimia, ele passou de um mero escravo para um aprendiz de Alquimista. Seu proprio mestre fez questão de lhe ensinar tudo que sabia e, graças ao Baixinho Dentro do Frasco adquiriu grande sabedoria tornando-o no homem que ele achava ser "à altura" de Clara Werlang.

Quanto a ela mesma, nesses anos, passou as tardes fugindo das aulas e fugindo das aulas com Heim quando seu pai adotivo não estava. Acabou descobrindo que o mestre que tanto falavam era um bom sujeito, paciente, bondoso e lhe ensinou varias coisas sobre Alquimia que ainda não sabia. Clara aprendeu a amá-lo e a respeitá-lo, bem como aprendeu a amar Xerxes, aquela cidade no meio do deserto escaldante.

E Ini continuou na cabeça de Clara, fazendo comentarios bobos vez ou outra, forçando-a a comer e dormir exageradamente.

Heim estava alto, com os cabelos louros sempre presos num rabo de cavalo e os olhos mais vivos e fugazes do que nunca. Do outro lado, Clara continuava aprisionada em seu corpo adolecente, havia crescido poucos centimetros, mas nenhum tipo de mudança. Agora ela encarava a Heim como um mais velho que deveria respeitar, mas não conseguia esconder tudo o que criou dentro de si pelo loiro.

O odiava certas vezes, pois ela era mais velha e sabia bem mais que ele. Sabia bem mais do que ele iria saber em toda a vida. Ele era apenas um Limitado.

Mas quando pensava na reação que o rapaz teve quando a viu transmutar sem o Circulo de Transmutação, seu estomago revirava de ansiedade. Será que, na verdade, ele pensa que ela é apenas uma aberração de olhos estranhos?

Uma certa vez, já crescidos e acostumados e boicotar suas atividades de fim de tarde para irem à feira, os dois já andavam de mãos dadas e ela limpava a boca dele, sempre que ele comia.

Andaram por toda a feira como sempre faziam e, chegando ao final, compraram aqueles pães doce que comeram da primeira vez e sentaram-se junto à fonte, sempre cuidando para não empurrarem um ao outro para dentro dela.

- Ei, Clara. Já descobriu algo sobre Rookbows nos livros? - perguntou o loiro, quebrando a linha de conversas bobas

- Nos livros, não muito mas eu... Eu lembro de certa coisa. - respondeu, parecendo hesitante - Uma única coisa.

- E o que é essa coisa? - indagou, curioso

Clara certificou-se de que ninguém estava por perto, ou estava ocupado demais para ouvir o que ela iria dizer.

"Ah não. Você acha que ele vai acreditar nisso?" a morena contraiu os labios, como se repreendesse a voz mentalmente "Você não pode tagarelar isso por aí, vão achar que você é louca, isso sim."

Ela respirou fundo, tomando uma enorme coragem para falar:

- Sabe, lá em Rookbows... Tinha uma garota. Ini Redlake.

"Clara Werlang. Ele vai odiar você."

- Ela não era uma garota muito comum, sabe... Ela era... Ela... - Clara mordeu o labio, extremamente nervosa - Bem, ela era artificial.

- E o que tem ela? - Heim perguntou, sem surpresa alguma em sua voz

- Ela... Ela se transmutou em mim, agora eu ouço a voz dela o tempo. - disse, fechando um dos olhos como se esperasse uma pancada

"Mas você é uma burra, mesmo!"

- E ela acabou de me chamar de burra também. - adicionou, envergonhada

Heim passou alguns segundos ponderando. Talvez ele realmente não entendera mas relacionou a tal Ini com seu baixinho dentro do frasco.

- Então ela está aí dentro? - a morena confirmou e ele começou a cutucar a testa dela com a ponta do dedo - Ela pode me ouvir?

"Ai, não me cutuca seu idiota!"

- Pelo visto sim e, ela te chamou de idiota também.

- Deixe para ela bem claro que eu não gosto que me chamem assim!

"Eu escutei, não preciso de nenhum recadinho seu, viu?!"

Clara riu-se, pondo-se a comer novamente o pão.

- Ela é como o seu baixinho dentro do frasco. E o frasco, no caso, é minha cabeça.

- Então ela é... Um Homunculo, é isso que quer me dizer?

- B-Basicamente isso... Eu quis te contar agora, já que tem um conhecimento sobre Alquimia mais elevado e... - Clara parecia encolher em cada palavra devido à falta de reação do loiro - Tem... Algum problema com isso?

- Bom... Se não teve nenhum problema até agora - Heim sorriu largamente para ela, contente -, creio que não terão problemas no futuro.

- Heim, você é o melhor!! - a morena pulou nos braços de Heim, beijando-lhe a face. Nunca haviam assumido nada mas os vizinhos já faziam o favor de lhes juntarem como casal. Se davam muito bem, apesar da aparentemente diferença de idade. Heim cresceu, e Clara parecia aprisionada naquele corpo, crescendo poucos centimetros apenas.

- Olha só, tenho algo que você vai gostar! - avisou o loiro depois de se livrar do ataque de beijos dela

Retirou do bolso da calça uma fina corrente prateada. Na ponta, uma rosa. Brilhava delicadamente sob o forte sol de Xerxes, como uma joia rara, feita de gelo. Heim girou o colar pelos dedos, enquanto Clara o observava, admirada. Seus olhos brilhavam tanto quanto o metal.

- M-Mas, como conseguiu?! - exclamou, tocando o pingente com a ponta dos dedos - Eu nunca mais vi ele naquela tenda!

- Quando você saiu toda nervosinha pra pagar a mulher dos pães - Clara fez uma careta, fazendo Heim rir - , eu pedi para o dono da tenda guardar esse colar. Prometi a mim mesmo que um dia eu iria comprá-lo, e que ele seria seu, então... - levemente corado, ele afastou os cabelos de Clara e pousou o colar em seu peito, fechando-o na nuca - Promessa cumprida.

Clara tocou o pingente novamente e cerrou os olhos. Lagrimas escorreram pelas bochechas coradas de sol, enquanto aquele flash de memoria voltava. Um lugar branco, coberto de neve, e alguém de cabelos da mesma cor. Olhos limpidos como um lago congelado e mãos palidas, que giravam o pingente à fente dos olhos azul-alice. Parecia contente. Talvez, até ironico.

- Clara... Tudo bem? - Heim perguntou, sua voz estava distante

Ela sacodiu a cabeça, espantando a memoria. Sorriu para o loiro, limpando as bochechas. - Desculpe. Eu só... Fiquei emocionada... - ela acariciou o rosto de Heim, contraindo os labios - Eu amo você.

***

Já estava quase no final do dia quando Heim e Clara decidiram voltar. O dia seguinte seria cheio, sem feira e com varias tarefas e deveres. No meio do caminho o loiro parou subitamente, como se houvesse se lembrado de algo.

- Clara... - chamou - Acho que esqueci de alguma coisa...

- Esqueceu? Mas do quê?

- Não, eu só... - o loiro apertou os olhos, forçando o pensamento, até que se lembrou - Ah, o baixinho tem uma audiencia com o Rei, e eu esqueci de devolvê-lo para o laboratorio!

- O QUÊ?! - exclamou a morena, arregalando os olhos - Como pôde se esquecer de algo assim, seu idiota?!

Clara havia armado o braço para lhe desferir um tapa, então, mais do que rapidamente, Heim pegou o primeiro oculos que estava à mostra naquela antiga tenda, e o encaixou no rosto - Olha. Oculos. Não se bate em gente de oculos.

Ela rosnou, inconformada, enquanto Heim dava os cenz para o dono da tenda.

- Você é um imbecil mesmo. Vamos. Se tivermos sorte, conseguiremos chegar a tempo.

- Acha que o mestre vai ficar bravo comigo?

- Não, não acho. - respondeu, agarrando Heim pelo pulso e saindo em disparada - Tenho certeza!

***

Rapidamente, Heim devolveu o pequeno dentro do frasco à sua prateleira, no laboratorio.

 Chegou aos ouvidos do Rei a conversa de que estavam pesquisando sobre a Imortalidade, e isso muito o interessou. Ordenou que Heim e o Baixinho discutissem sobre isso com ele. Sentia sua hora chegando, e necessitava de muitos anos para cuidar do povo que tanto amava.

No mesmo dia, Clara ficou sabendo das pesquisas. Ela sabia o que planejavam mas mesmo assim nunca os parou. Ela não podia. Apenas concordou, emburrada e, quando todos foram dormir e eles ficaram a sós, ela lhe contou:

- Heim, hoje eu descobri algo novo. - iniciou, sem muita animação - Eu não sei porque mas...

Ela hesitou por alguns instantes. Suas mãos tremiam junto com a faca que uma delas segurava. 

"Werlang. Por favor. Esqueça essa historia. Todos nós já esquecemos."

- Eu não consigo esquecer... - Heim perguntou com quem Clara falava, e ela lhe respondeu - Com Ini. Eu sei que você e meu pai... E todo mundo por aqui acha que tudo isso é mentira mas... Mas eu posso provar que não é!

"Clara, isso é loucura! Você não pode mostrar isso pra ele, é loucura!"

- Do que... Está falando? - Heim começou, incredulo - C-Como pode provar que ela existe, Clara?

A morena deu um longo suspiro e caminhou de um lado para o outro no quarto, nervosa. - Eu estive lendo aquele livro branco, sabe? Aquele que eu te comprei na feira. - ele assentiu - Nela, tem a historia de um povo muito antigo de pele, olhos e cabelos brancos como a neve, e de sangue tão vermelho quanto todos os humanos.

- Mas isso são só historias que--

- Quieto! - ordenou, mordendo o labio inferior - Também conta de um monstro que se alimentava do sangue desse povo. Bom, não do sangue em si, mas do sangue em estado solido. Uma pedra. - ela parou, contemplando o fio da faca - Eu acho que... Bem... Talvez essa seja a minha historia.

"Eu não sou um monstro, Werlang!"

Heim ia protestar contra aquela loucura, mas Clara o impediu.

- Pois eu me lembro. Me lembro de um enorme portão e de algo que estava lá, mas não estava. 

- Clara... você nunca me disse isso. - comentou o loiro, preocupado - Quando... Quando se lembrou?

- Eu nunca me esqueci disso. - respondeu, umedecendo os labios, cada vez mais nervosa - Aquele portão parecia me puxar para dentro dele, com longos braços negros mas, por algum motivo, não conseguia. Eu sinto que cometi um erro muito grande, e minhas memorias foram o preço que eu paguei. - ela fez uma pausa, suspirando - Depois me lembro claramente. Ini se transmutou em mim. Em mim, literalmente. Ela corre em mim agora, e então...

- Então...?

"Clara... Por favor..."

- Um dia, eu acabei me cortando e... Bem... - ela se levantou, tremula, roçando o fio da faca em seu pulso - Aconteceu isso.

Antes que Heim pudesse impedí-la, Clara desferiu um corte em seu proprio pulso, mordendo o labio inferior para reprimir a dor. Deixou que o sangue gotejasse e ele parecia escorrer para longe, aparentando ferver sobre o assoalho. Aos poucos, ganhou uma forma arredondada, que foi aumentando e se moldando em forma humana. Conforme o sangue vazava do ferimento, os cabelos de Clara perdiam a coloração e sua pele parecia adquirir ainda mais palidez.

A forma humana-recem criada sacodiu os cabelos curtos e avermelhados como um cachorro molhado. Olhou furiosa para Clara, caminhando em direção à ela.

- Eu disse para nunca mais fazer isso, sua albina maluca!

- M-Mas eu precisava mostrar, Ini!

Heim olhou livido para o Baixinho dentro do Frasco que sorria de forma ainda mais doente. Ele se aproximou de Clara, examinando os frios prateados que ornavam com o pingente em seu pescoço.

- Desde quando...? - murmurou, parcialmente maravilhado e assustado - Como conseguiu...?

- Ini é praticamente meu sangue agora. Quando ela escorre, ela se materializa assim. Mas por pouco tempo. - Clara tocou o ferimento com o dedo indicador e medio e, após um pequeno relampeio branco, ele se fechou

- Quanto tempo mais ou menos? - indagou Heim, curioso

- Não sei. Depende da quantidade de sangue. Eu acho que...

Antes de terminar a frase, a ruiva pareceu derreter de volta ao chão. Num relampeio de luz branca um pouco maior, voou em direção ao pulso de Clara, abrindo a ferida novamente e se enfiando dentro dela, como uma cobra. Isso arrancou um grito abafado pela mão da morena. Logo depois, a ferida se fechou e a voz de Ini ecoou em sua cabeça.

"Nunca mais faça isso! Tem noção do quanto doi?"

- Claro que tenho. - respondeu, baixo. Heim correu ampará-la - Viu? Como eu não estava mentindo?

- Seu cabelo... Está castanho de novo... - Heim parecia apreensivo, contraindo os labios - Eu nunca vi algo assim, eu...

- Heim... Eu vou embora de Xerxes. - anunciou, com um sorriso sereno nos labios - Eu vou para o Norte. Sinto que devo ir.

- M-Mas... Mas não pode ir! Seu pai nunca deixaria você ir tão longe!

- Você vem comigo, Heim? - perguntou, se levantando - Tudo bem se não quiser. Mas eu realmente... Preciso descobrir o que aconteceu comigo.

Pelo silencio do loiro, Clara resolveu dar-lhe um tempo para pensar e caminhou para seu aposento, silenciosa, recebendo broncas da voz em sua cabeça.

Heim passou algum tempo no centro do quarto, em pé. A cabeça não pensava em nada, nem conseguia. Tudo parecia um truque de magia.

Virou-se para a bolota negra no frasco, que continuava sorrindo. Passou os dedos pelo cabelo solto, tentando assimilar as coisas. - Você viu aquilo? Acredita nisso?

- Pois eu acho que nós acabamos de encontrar o que o Rei precisa. - respondeu o baixinho, com um ar brincalhão


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Notas finais do capítulo

Eu aceito o castigo que quiserem me aplicar .q



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