Quando morava no Rancho, por não sair com frequência da propriedade e o sinal de wifi nunca ter sido, apesar de funcionar, o forte do lugar. Melissa procurava passatempos como aqueles: lavar o carro, cozinhar coisas gostosas, cavalgar e descer a colina cada vez mais rápido, pintar o por do sol e escrever o próprio nome, naqueles momentos de vazio criativo. Tudo isso, é claro, escutando algumas boas músicas e sempre que possível, se mexendo no ritmo das notas e batidas.

Por isso, antes de começar seu trabalho, Melissa colocou uma das muitas fitas que haviam no porta luvas do carro e encontrou AC/DC o que particularmente a agradou bastante.

A mangueira estava à mão e não se molhar era uma tarefa difícil, a única coisa que ela esqueceu, é que usava uma camiseta branca.

—- Mel. -- Bobby chamou às suas costas

—- Fala. -- Ela respondeu sorrindo.

—- Eu vou ficar fora por um tempo com Sam, vamos atrás do Grimório. -- Explicou Bobby um tanto agitado, enquanto Sam vinha mais atrás com uma mochila nas mãos.

—- Você e os meninos vão e eu fico? -- Ela perguntou com um olhar assustado.

—- Claro que não, criança. -- Bobby lhe beijou a testa -- Dean vai ficar de olho em você. --

Melissa sentiu um arrepio na nuca ao ouvir aquilo, mas ignorou. Se sentiu bem por ficar com ele, Dean era o tipo de companhia que passa segurança.

—- Ah, me sinto melhor -- Ela brincou se encostando no carro, suspirando. -- Não estou preparada psicologicamente para ficar sozinha. --

—- Vai estar em boas mãos. -- Bobby falou se afastando, sendo seguido por Sam, que ria.

—- Se eu descobrir algo sobre a pulseira, eu dou um jeito de falar com você -- Sam falou quando já estava dentro do carro com Bobby.

—- Tudo bem. Valeu, Sammy. -- Melissa sorriu voltando a molhar o carro -- Boa Viagem! -- Exclamou ao mesmo tempo que aumentava o volume do som.

Perdida nos solos de guitarra, Melissa realmente se divertia e brincava mais com a água e o sabão do que trabalhava, o Impala parecia ser seu parceiro de dança e a mangueira era o microfone.

—- Yeah, you shook me all night long -- Ela cantarolava se esticando por cima do capô do carro para alcançar o topo.

Xx

Dean ainda estava dentro da casa, perdido em seus pensamentos, quando viu pela janela Bobby e Sam saindo do ferro velho e em seguida ouviu uma música alta que ele tinha certeza que vinha de uma de suas fitas cassetes e de seu carro.

Dean tentou não se importar, mas o ciúme que tinha de seu bebê foi mais forte que a força de vontade, precisava conferir o que estava acontecendo.

Porém, quando viu do que se tratava, a parte prudente de si teve o ímpeto de voltar para o interior da casa, mas não conseguiu. Ela era linda demais para parar de olhar.

Melissa usava uma camiseta branca, que devido a água havia grudado em seu corpo de curvas perfeitas e estava um pouco transparente.

Isso, aliado ao modo que seus cabelo parcialmente molhado se moviam de acordo com o que seu corpo determinava, era de deixar qualquer homem de queixo caído, era puramente sexy. E não era como se estivesse fazendo de propósito, Mel parecia se divertir e sua diversão era encantadora.

Dean precisava fazer alguma coisa, ficar ali parado como se fosse um pré-adolescente que nunca lidou com uma garota não era a atitude mais indicada para alguém da idade dele. Além do que...

Espera um pouco, aquilo era sabão na pintura do carro?

Xx

—- E então, Bobby, tem algo a mais em mente sobre o que possa envolver a família de Mel? -- Perguntou Sam quando já estavam na estrada.

—- Eu tenho alguns palpites Sammy, mas eu vou mantê-los para mim por enquanto, precisamos encontrar esse maldito livro primeiro. -- Bobby suspirou.

—- E quanto a deixar Dean e Melissa sozinhos, acha que vai dar certo? --

—- Eles vão se entender. -- Disse Bobby com um risinho discreto.

Sam não respondeu mais, algo no céu o chamou atenção, algo parecido com um pássaro negro voava muito alto e rápido no céu.

—- Pássaro estranho... -- Comentou para si mesmo.

—- O que disse, filho? -- Perguntou Bobby.

—- Ah, nada. Pensei alto. -- Sam respondeu ligando o rádio.

Xx

—-Mel, -- Dean disse descendo a escadinha de madeira e andando rápido até bem perto de onde ela estava -- Por acaso você está usando sabão? -- Ele estava um tanto nervoso, mas era engraçado o esforço que fazia para não ser rude.

Melissa parou o que fazia e se virou para ele com a mangueira na mão.

—- Sim senhor. -- Ela brincou, prendendo o riso pela maneira boba como ele a olhava.

—- Err... eu não quero parecer rude... -- Ele procurava as palavras, quando ela começou a rir.

—- Não, Dean, não vai queimar ou prejudicar a pintura do seu carro de maneira nenhuma. --

—- Ah não? -- Ele parecia confuso.

—- Não. -- Ela se abaixou pagando a embalagem do sabão. -- Olhe, é próprio para a pintura, não vai fazer mal algum, eu prometo. -- Ela disse estendo a embalagem para o homem e beijando os dois dedos indicadores cruzados, num sinal de promessa.

—- Aah -- Dean disse relaxando um pouco quanto a segurança do seu bebê -- Melissa, Bobby te contou que... -- Ele perdeu as palavras mais uma vez olhando para ela. Afinal, além de tudo que ele já sabia, Melissa também tinha um ótimo gosto musical, ela havia escolhido a sua fita cassete preferida e cantava absolutamente tudo, sem falar no cuidado dela com seu carro.

Gostar do Impala era o meio do caminho para o coração do dono.

—- ... que vamos ficar sozinhos por um tempo? -- Ela completou se abaixando para limpar as calotas do carro -- Contou. --

—- E por você, tudo bem? -- Ele perguntava, sério.

—- Claro que sim. Já te conheço o suficiente pra saber que não é o psicopata americano, ou algo assim... além do que, você me parece um ótimo caçador, então posso dizer que me sinto bem segura. -- Ela contou, voltando a ficar de pé e o olhando de maneira sapeca.

Dean suspirava, tentando não parecer hipnotizado.

—- Que bom que se sente assim. -- Dean se encostou na lateria do carro, de braços cruzados -- Não pretendo mesmo deixar que nenhum filho da puta de olhos pretos chegue perto. -- Apesar do tom bem-humorado, Dean estava sério.

Melissa ficou alguns segundos em silêncio, notando a preocupação exagerada que pairava sobre Dean.

—- Dean, você sabe que eu agradeço a proteção e o cuidado todo -- Ela se aproximou, colocando a mangueira em posição estratégica. -- Mas, olha, tá tudo bem por enquanto. -- Ela colocou a mão no ombro dele -- não precisa ficar assim tenso como se fosse batalhar a qualquer momento, de verdade. Já que a gente tem esse tempo de ócio até o Bobby voltar com algo significativo, acho que a gente podia fazer algo divertido pra passar o tempo... -- Os olhos dela brilharam por um segundo -- Eu preciso me distrair. --

—- Como o que, por exemplo? -- Ele perguntou, inocente do que tramava a garota.

—- Como por exemplo... -- Ela deu de ombros -- Me ajuda a lavar o seu carro. -- Ela riu e colocando o dedo polegar no jato de água, aumentou a pressão e molhou Dean o máximo que conseguiu até que ele conseguisse sair de seu alcance.

—- Mel, -- Dean passou o braço na testa limpando a água -- O que foi que deu em você? -- Ele ria, o que provava que sua estratégia anti-estresse estava funcionando.

—- Em mim nada. -- Ela se fazia de inocente se aproximando de maneira graciosa dele -- Eu só acho que você está muito tenso, Dean Winchester. E você precisa se divertir. -- Ela voltou a molhá-lo -- Anda, me ajuda a terminar de lavar o seu carro. --

Dean ficou parado por alguns segundos, fazia tempo que não sabia o que era aquilo, se divertir, principalmente depois de sua estada no inferno, não sabia nem o que era rir de verdade.

E de repente aquela garota estava ali, com seu jeito radiante, o fazendo rir com um simples banho de mangueira.

Ele esqueceu sua crise interior e tirando a camisa molhada se juntou a ela no serviço que de lavagem de carro virou molha-molha e nada melhor que um molha-molha para um aproximação mais física.

—- Me dá aqui essa mangueira, abelhinha. -- Ele ordenou com um sorriso de canto.

Já estavam os dois completamente encharcados.

—- Abelhinha? -- Ela estranhou o apelido dando passos para trás fugindo dele enquanto sorria.

—- Mel, abelha.. -- Ele expôs seu raciocínio.

Melissa revirou os olhos, jogando mais um jato d'água nele.

—- Dean... você não existe. --

—- Não gostou? -- Ele perguntou quando ela bateu de costas numa pilha de carros próxima.

—- Na verdade, -- A respiração dela estava um pouco fora de compasso a medida que ele continuava a andar em sua direção -- eu achei uma gracinha. -- Ela se balançou um pouco, olhando nos olhos dele.

Dean tomou a mangueira da mão da garota e jogou no chão, algumas gotas de água escorriam vagarosamente pela pele exposta dele.

—- O que é isso? -- Melissa perguntou colocando sua mão sobre a marca de mesma forma, que Dean tinha em seu corpo.

—- Sinceramente, eu não sei. -- Ele tinha a voz num tom mais baixo e uma das mãos colocadas ao lado da cabeça da garota, a impedindo de fugir e a outra segurava de leve a cintura dela

—- Como não sabe? -- Ele perguntou levantando os olhos da marca e se surpreendendo com a proximidade entre os dois.

Os dois ficaram a se encarar por um longo momento, seus rostos se tornando perigosamente perto. Era curioso o que acontecia entre eles, quanto mais próximos ficavam, mais certo aquilo parecia ser, como se fosse familiar e comum toda aquela proximidade. Seus narizes se tocaram e seus lábios estavam cada vez mais perto.

Mas, por seu campo de visão, Melissa percebeu que Noite não estava onde deveria estar, aquilo era estranho, ele nunca saia sozinho, sempre estava por perto dela. E embora interromper aquele momento parecesse um crime, ela não se conteve.

—- Onde está Noite? -- Ela perguntou passando por baixo do braço de Dean, que ficou um tanto frustrado.

—- Deve ter saído pra pastar, não é isso que cavalos fazem? -- Ele respondeu mal humorado.

—- Não. -- Ela disse com certeza -- Dean, ele nunca sumiu, onde está o meu cavalo? -- Ela parecia mais assustada do que brava.

Xx

Aproveitando a distração de Melissa com Dean, Noite se afastou do ferro velho, uma distância grande demais para um cavalo comum percorrer no tempo de vinte minutos. O mustangue olhou ao seu redor, certificando-se de que o beco esquisito em que estava, se encontrava realmente vazio.

Depois da certeza da solidão, o animal traçou com seu casco um símbolo estranho no chão sujo, e cortando sua pata num caco de vidro próximo, ele deixou seu sangue escorrer no símbolo, que depois de brilhar com certa força, sumiu.

Então, de imediato, uma figura de sobretudo e gravata azul, caiu desorientado em frente ao animal.

—- Prazer em conhecê-lo, alado. -- Disse uma voz grave e masculina que ecoou no beco estreito sem parecer vir de um local exato.

—- Noite. -- Disse o homem -- Então é verdade o que soube...--

—- O que quer aqui? -- A voz ressoou mais uma vez.

—- Você sabe que a resposta desta pergunta. -- Falou com a seriedade transbordando por seus olhos azuis -- A profecia começou, agora céu e inferno não vão descansar até por as mãos na feiticeira. -- Respondeu -- Mas o que lhe fez me trazer até aqui? --

—- Você é o primeiro anjo que eu sinto se aproximar. -- O cavalo arrastou os cascos no chão -- Não podia esperar para lhe conhecer. --

—- Fui o primeiro a receber a ordem de busca, por isso estou aqui. --

—- Mais um obediente e cego. -- Observou o animal com certo deboche -- Embora ache que não vá encontrá-la... eu gostaria de saber o nome do soldadinho solitário. -- Disse a voz retumbante.

—- Eu sou Castiel. -- Apresentou-se.