Stay Alive escrita por Giullia Lepiane


Capítulo 33
Sessões Individuais - II


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem!



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Duas horas haviam sido usadas para as apresentações dos tributos dos Distritos 1 ao 6, e durante esse tempo, muita comida e vinho foram consumidos na mesa dos Idealizadores.

A maioria deles já estava cansada. Eles estavam lá desde cedo, haviam assistido e avaliado muitos tributos, e ainda tinham muito por fazer antes de poderem voltar para casa. A bebida contribuía no cansaço e na lentidão deles, que tiraram cinco minutos antes de chamar o próximo tributo.

– O que você achou do que vimos até agora? – Era uma das perguntas que circulavam pela mesa.

– Gostei muito daquela sessão...

– Eles não estão deixando a desejar...

– Você se lembra do ano passado, quando...?

– O que faremos quanto às afrontas?

Essa última pergunta calou imediatamente todas as conversas, evidenciando que todos eles haviam pensado naquela mesma coisa. O que fariam a respeito dos tributos que desafiavam a Capital ou passavam dos limites durante suas sessões?

– Bem – o primeiro a se pronunciar foi um Idealizador de cabelos em diversos tons de verde –, acho que eles deviam receber notas mais altas pela coragem e a audácia...

– Ah, então devemos apoiar essa abominação? – Retrucou outro.

– Certamente não podemos simplesmente ignorar.

– Talvez seja o mais seguro a ser feito...

– Basta – Giullia se pronunciou, e todos voltaram suas atenções a ela sem, no entanto, olhá-la. – Não vamos fingir que não sabemos como a Capital sempre lidou com afrontas. Os tributos que as fizeram ou as farão devem ser punidos.

Por um segundo, ninguém falou. E então:

– Punidos? Na arena, você diz? – Perguntou uma Idealizadora.

– No caso de alguma injúria ser feita na arena. – Respondeu Giullia. – Mas os tributos que as estão fazendo nas sessões devem ser punidos nas notas.

Os Idealizadores se entreolharam.

– O que sugere? – O de cabelos verdes perguntou.

– Diminuição de nota. Para todos que se atreverem. Um ponto a menos. Aí já ensinamos uma lição, para tal atitude não ser repetida durante os Jogos. Todos de acordo?

Houve um silêncio seguido de um burburinho, e então todos começaram a concordar com a ideia, um por um. Giullia esperou a confirmação de todos, e então assentiu.

– Podemos dar continuidade, então.

Eles aproveitaram o tempo que o próximo tributo – um menino de catorze anos com feições ainda infantis – demorou até estar em frente a eles para se ajeitarem em suas cadeiras e darem um ultimo gole em suas tacas de vinho. Mas, quando ele se apresentou como “Matthew Quingley, Distrito 7”, foi como a declaração definitiva de que o intervalo estava acabado.

Como era de praxe para tributos do distrito dos lenhadores, Matthew foi para os machados. Começou a escolher os menores e mais leves dentre eles e, no processo, também começou a cantar, como havia feito durante a colheita.

Muitas pessoas tinham se encantado com a iniciativa e com a voz daquele menino antes, mas os Idealizadores permaneceram sérios enquanto a canção dele preenchia e ecoava pelo ambiente.

No entanto, estava claro que Matthew cantava apenas para si mesmo, e não parou enquanto atirava os machados escolhidos em alguns bonecos. E curiosamente, veio a terminar as duas atividades ao mesmo tempo, para ser dispensado em seguida.

Chegou então uma garota de dezesseis anos cujo sobrenome era bem conhecido em Panem mesmo antes de ela ser sorteada. Os dois irmãos dela já haviam morrido nos Jogos Vorazes, o que tornava aquela menina de cabelos castanhos ondulados e olhos azuis vítima de comentários como “Então é ela a próxima” e “Será que só existe a família dela em todo o distrito?”. Houve, inclusive, uma ou outra risadinha quando ela anunciou:

– Bonnie Field, Distrito 7.

Assim como Matthew, ela foi para a seção de machados, mas se diferenciou por escolher um único, grande e ameaçador.

Sua tarefa foi decepar cabeças. Deu machadadas precisas nos bonecos, como se eles fossem árvores, até suas cabeças caírem, e quando já tinha feito isso em um número considerável deles, jogou o machado por sobre o ombro, com um sorriso satisfeito.

Quando Bonnie saiu, tomou o seu lugar um garoto ruivo, alto e magricela, também de dezesseis anos de idade. Ele tinha a postura desengonçada, e estava confuso e hesitante ao dizer, baixo:

– Ahn... Logan Morgan, Distrito 8.

Em seguida, mais confusão para se decidir quanto ao que fazer e para chegar à seção escolhida por ele, a de arco e flecha. Sendo apenas por isso, ele já teria perdido pontos valiosos, mas a situação piorou quando ele começou a atirar as flechas nos alvos.

Logan não tinha nenhuma mira ou talento para a atividade. Suas flechas passavam muito longe dos alvos, errando-os por completo, muitas vezes chegando a cair no chão assim que saiam do arco.

Foi um desastre completo. O que salvou foi a única flecha que conseguiu se fincar na ponta de um dos alvos circulares, a maior proeza que Logan tinha conseguido ao se retirar do centro de treinamento.

A garota de dezesseis anos, longos cabelos loiro-prateados e hipnotizantes olhos azul-elétricos que entrou depois certamente não poderia fazer pior do que ele. Apenas sua postura graciosa ao caminhar e parar em frente à mesa dos Idealizadores já era bem melhor, e ela tinha um tom firme e melodioso quando disse:

– Lyre Crosswell, Distrito 8.

Ela seguiu para a seção de facas. Havia um quê de fragilidade nela que tornava difícil imaginar ela manuseando as armas – sua beleza não era mortífera como a das meninas Carreiristas, mas delicada. Ainda assim, ela começou a atirar as facas nos mesmos alvos que Logan tentara acertar antes dela.

Lyre não obteve sucesso com todas as facas. Na verdade, algumas delas bateram nos alvos e caíram no chão em seguida, ou sequer chegaram perto de lá. Mas outras perfuraram a madeira e lá ficaram, em um ato que seria mortal se fosse uma pessoa parada naquele lugar.

Ela fez o melhor que podia e, no final, até acabou se saindo bem. Saiu com a mesma firmeza com que tinha entrado, e então, veio um garoto de quinze anos, também com cabelos loiros tão claros que chegavam a ser esbranquiçados e bochechas rosadas, mas com majestosos olhos cinzentos.

– Cornelio Harvester, Distrito 9. – Ele se apresentou, e seu olhar aparentava avaliar os Idealizadores mais do que eles o avaliavam.

A primeira coisa que ele fez foi pegar um pouco de tinta na seção de camuflagem e se dirigir a um boneco de treinamento intacto, no qual escreveu o nome “Soyalia”, bem grande e visível. Então, com uma faca que tinha pegado no caminho de volta, começou a fazer diversos cortes de profundidades diferentes por toda sua extensão.

Não se demorou, e logo arrastava o boneco até a seção de primeiros-socorros, onde preparou diversos elixires usando apenas ingredientes naturais. Enquanto o fazia, narrava em voz alta o que estava fazendo, declarando os nomes das ervas utilizadas e citando suas propriedades cicatrizantes. Ao concluir, tratou os cortes do boneco com os remédios, e finalizou a seção trançando uma corda com cipós, amarrando-a no boneco para içá-lo até uma coluna, onde estaria a salvo, uma vez na arena.

E o tributo seguinte foi justamente a menina representada por ele através do boneco – a irmã gêmea de Cornelio, que podia também ser considerada a versão feminina dele, de tanto que eles se pareciam; não apenas fisicamente, como também de jeito. Até o olhar petulante dela e o tom ao anunciar “Soyalia Harvester, Distrito 9” foi idêntico ao do irmão.

Também como ele, ela iniciou pegando tinta vermelha e indo até os bonecos. Selecionou justamente o maior e mais pesado dentre eles, e em seu centro escreveu o nome “Cornelio”. Repetindo a proeza feita antes por seu irmão gêmeo, trançou então cordas feitas de cipó em uma quantidade curta de tempo, e as utilizou para amarrar o boneco em suas costas.

O boneco parecia ser mais pesado do que Soyalia, mas ela o sustentou com excelência. Foi atrás de uma espada e, sem nunca deixar o boneco cair, estraçalhou vários outros bonecos em uma questão de segundos.

Ao concluir, deixou a espada de volta no lugar onde a pegou e o boneco sentado cuidadosamente no chão.

Ela se retirou, e entrou um garoto de dezesseis anos recém-completados, que parecia ainda mais velho por seu grande porte e sua barba rala. Ele parecia perdido, sem saber o que fazer, e inclusive esqueceu-se de se apresentar. Os Idealizadores esperaram, mas como ele não abriu a boca, Giullia pediu:

– Seu nome e distrito, por favor.

Ele piscou, incomodado. Permaneceu ainda um segundo sem falar, e por fim disse:

– Sanderson Cutner, Distrito 10.

Era de se esperar que ele começasse a sessão após isso, mas Sanderson continuou parado por um longo tempo. Depois, vagou pelo centro por minutos a fio, sem nada fazer, parando por vezes para encarar uma ou outra arma.

E os Idealizadores começaram a comentar, perguntar entre eles o que Sanderson achava que estava fazendo. Alguns até sorriam, como se achassem graça, mas Giullia apenas observou por algum tempo antes de se pronunciar:

– Sr. Cutner, se não se importar...

Sanderson parecia estar sob muita pressão. Conforme os Idealizadores falavam, ele começava a suar e enrubescer. E quando foi feito o comentário diretamente direcionado a ele, foi a gota d’água.

Como uma besta enlouquecida, ele começou a, sem avisos, quebrar tudo que estava a sua frente com suas próprias mãos. Isso silenciou a todos de imediato. Sanderson atirava longe objetos que deviam ter o dobro do peso dele e quebrava manequins duros como se fossem feitos de papel.

Ele ainda parecia trêmulo quando sua crise de fúria passou e ele saiu. Os Idealizadores também precisaram respirar por um segundo antes de mandar que o próximo tributo fosse chamado.

Felizmente, a menina seguinte parecia mais controlada. Tinha quinze anos, cabelos castanho-arruivados e olhos verdes, e como mandava o figurino, iniciou falando:

– Savannah Rayworth, Distrito 10.

Ela foi então para a seção de armadilhas, desviando dos destroços feitos pelos outros tributos no caminho. Chegando lá, ela separou o que iria usar e sentou no chão.

Savannah não se empenhou em fazer armadilhas muito complicadas, mas em montar corretamente algumas simples. Por vezes lançou olhares para a mesa dos Idealizadores enquanto fazia três pequenas armadilhas para animais e demonstrava os seus usos. Todas funcionaram bem, e ela as desmontou no final da apresentação.

Ao sair, Savannah deu lugar a um rapaz de dezessete anos, magro e de cabelos, olhos e pele escura. Ele observou bem a destruição presente por lá enquanto caminhava e parava em frente aos Idealizadores, como se avaliando o que ainda restava do centro de treinamento.

– Bryan Taylor, Distrito 11. – Anunciou-se, indo em seguida até as espadas.

Olhou algumas delas, mas não pareceu encontrar uma que o agradasse, então vagou pelas dezenas de bonecos desmembrados e dilacerados que estavam pelo chão e puxou uma espada que estava fincada no tronco de um deles.

Bryan demonstrou alguns movimentos que tinha aprendido nos últimos dias com a espada, de ataque e principalmente de defesa, sem, no entanto, visar acertar qualquer alvo.

Fez seus melhores golpes, mas não obteve completa atenção dos Idealizadores, que já pareciam cansados e dispersos. Eles apenas assistiram um pouco e, em seguida, o liberaram.

Entrou então uma garota negra com longos cabelos ondulados e grandes olhos cor de mel. Ela tinha dezesseis anos e se apresentou como “Desdemona Black, Distrito 11”.

Desdemona foi pegar algumas facas e começou a atirá-las contra os alvos circulares. Seus movimentos foram melhores que sua mira – ela não acertou muitas das facas, mas pelo menos mostrou boa parte do que tinha aprendido. E também mostrou determinação, pois não parou depois de alguns acertos, como todos tinham feito.

Na verdade, Desdemona continuou, sem parar ou demonstrar cansaço, por quase dez minutos, e provavelmente ainda assim não pararia se Giullia não tivesse dito:

– É o suficiente, Srta. Black.

Ela enfim parou, respirou fundo e, após um breve alongamento, foi para fora.

O penúltimo tributo foi um menino de treze anos. Ele tinha olhos azuis-claros e cabelos bem negros. Seu rosto era calma, angelical, mas seus olhos eram duros e frios.

– Kriger Scherbitsky, Distrito 12. – Disse, indo direto para a seção de fogueiras.

Reuniu madeira seca e colocou sobre uma base. Esfregando duas varetas, em alguns minutos conseguiu algumas faíscas, que por sua vez, originaram fogo. Queimando rapidamente, consumiu a madeira quase de imediato, e Kriger passou a jogar outros elementos dentro da fogueira.

Carvão e folhas secas aumentaram o efeito. O fogo cresceu até quase estar do tamanho de Kriger, que riu, como uma criança feliz. E continuou a alimentar as chamas.

Isso alarmou os Idealizadores. O fogo estava muito alto, e uma grande quantidade de fumaça saía dele. Giullia, especialmente, parecia bem apreensiva ao dizer:

– Sr. Scherbitsky, por favor, apague o fogo e retire-se.

O riso dele se transformou em uma carranca. Ele não queria parar, mas obedeceu – usou apenas mais alguns minutos para diminuir as chamas até elas praticamente se extinguirem. Mas não totalmente, pois parte da madeira continuou vermelha e queimando.

Kriger foi embora e, enfim, chegou a última garota. Horas haviam se passado do primeiro tributo até ela, e não só os Idealizadores estavam muito cansados de assistir como também ela parecia cansada de ter esperado até então.

– Anna Borgin, Distrito 12. – Apresentou-se. Ela tinha dezesseis anos de idade, era ruiva, e pareceu prestes a ir até os arcos e flechas antes de bater os olhos na fogueira feita pelo tributo anterior.

Seu rosto se iluminou. Como fizeram os tributos do Distrito 9, Anna correu para arranjar tinta e usou-a para escrever algo em um manequim, embora o tenha virado para o lado de forma que os outros não pudessem ler.

Então, foi pegar um arco e apenas uma flecha, seguindo depois para a fogueira de Kriger. Ajoelhando-se ao lado dela no chão, colocou a flecha no meio do pouco que restava das chamas.

E ela se acendeu. Anna cuidadosamente levantou e encaixou a flecha no arco, para apontá-la na direção do boneco e atirar. Ele começou a pegar fogo no mesmo segundo em que foi atingido no peito.

E, assim que ele caiu no chão, sendo consumido pelas chamas, foi possível ler o que estava escrito nele:

“Snow”.


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Notas finais do capítulo

Até o próximo capítulo!



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