Crônicas da meia noite. escrita por JeeffLemos


Capítulo 8
Pesadelos às 2:30 AM


Notas iniciais do capítulo

Alguns pesadelos parecem mais reais do que outros. Quem dera se os sonhos fossem todos assim..



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/400942/chapter/8

O relógio na parede marcava 02:30 AM.

   Acordei com a brisa balançando as cortinas da janela do meu quarto. Dormi com a televisão ligada e deixei a casa toda aberta.

   Levantei ainda sonolento, peguei o controle da televisão, que estava no chão, pois eu o joguei lá enquanto me mexia no sono, apertei o botão de “desligar”, mas a TV já estava desligada. Jurava que tinha deixado ela ligada quando fui dormir. Caminhei até a porta da sala, passei o trinco. Voltei para o meu quarto e fui em direção a janela. Olhei para o céu e a noite estava nitidamente maravilhosa.

   O céu na cidade não é lá grande coisa, mas nessa noite em especial estava perfeitamente visível.

   Fiquei encarando a lua. Ela estava sedutora e revelava toda a sua beleza. Por alguns instantes, me senti hipnotizado por toda aquela beleza, à admirei por alguns minutos, e então decidi que o vento frio acabaria me prejudicando, já não tenho uma saúde muito boa, por isso, fechei a janela. Mas antes que pudesse fechá-la por completo, me dei conta de que algo estava fora do comum. Havia alguma coisa que estava diferente, e estava bem na minha frente, mas eu não conseguia notar.

   O lugar onde eu moro é um apartamento minúsculo que fica na parte mais precária da cidade. Eu moro no sétimo andar, muito relutante, pois meu prédio é uma espelunca tão velha que tenho um medo real de que um dia ele caia. Mas eu não tenho muitas opções, pois não tenho muito dinheiro, simples assim.

   À noite, minha rua fica completamente deserta, então a monotonia é o que há por ali, noite após noite. Mas nessa noite estava diferente, e o que eu não percebi de imediato, creio que por conta de ser sempre um lugar monótono e deserto, era que os postes de luz, que também eram uma porcaria e tinha umas lâmpadas toscas que nem sequer deveriam ser de 60 watts, estavam todos desligados.

   Ai está o motivo de o céu estar tão lindo.

   Abri a janela novamente e observei por toda a extensão da rua, para os dois lados, e era a mesma coisa. Nenhuma luz vinda de lugar algum. Nem dos postes e nem dos prédios. Olhando dali do meu sétimo andar, eu ainda tinha uma vista privilegiada de alguns pontos da cidade e pude ver que a situação não era diferente por onde meu campo de visão alcançava. Menos mal, pois minha conta já estava atrasada há uma semana, e se fosse só comigo não iria ser legal.

   Provavelmente dever ser algum tipo manutenção preventiva, ou só estão tirando com a nossa cara mesmo, pensei.

   Esse é o maior problema de morar no subúrbio. Ninguém liga para o que você quer. Você aceita o que eles te dão e se contenta com aquilo.

  

   Fechei minha janela com esse pensamento resignado e rebelde ocupando minha mente e voltei para o meu quarto escuro. Deitei na cama, me enrolei nas cobertas e em menos de dez minutos, capotei.

   Acordei às oito da manhã com o despertador buzinando e minha televisão ligada.

– Parece que a luz voltou, e ainda não cortaram a minha. – falei para mim mesmo – Comecei o dia com o pé direito.

   Sorrindo, peguei o controle que já estava no meu pé a essa altura, quase caindo, e fui desligar a televisão. No canal passava um noticiário e isso chamou minha atenção.

  

   O homem no noticiário estava assustado e a notícia que ele dava era para que não saíssemos de casa, em hipótese alguma, até que o problema fosse resolvido e que o governo tivesse uma posição em relação aos fatos que estavam ocorrendo.

   E que fatos são esses? Pensei comigo.

   Zapeei por alguns canais e o ícone de “Plantão” estava em todos os noticiários. Parei em um onde o homem, um famoso repórter com cara de galã de novela que geralmente faz reportagens internacionais, estava falando sobre a situação grave em que estávamos e que ainda não havia resposta do governo, mas que se especulava que aquilo fosse um ataque biológico, provavelmente lançado pelos terroristas da al-Qaeda.

   Desde o 11 de setembro, tudo que acontece aqui, na visão do povo, é culpa dos terroristas mulçumanos. Isso é ridículo, mas é verdade.

   Assisti o noticiário por mais alguns minutos e então me cansei de ouvir toda aquela baboseira e teorias de terrorismo. Desliguei a TV.

   Fui pro banheiro, tomei um banho frio pra acordar e voltei pro meu quarto.

   Abri a janela, e por incrível que pareça, não vi carro nenhum passando pela rua. Os carros estacionados que estavam ali na noite passada permaneciam no mesmo lugar, e só havia mesmo pessoas caminhando pela rua. E pelo que vi, estavam aproveitando, pois metade das pessoas que eu conseguia ver dali andava pelo meio rua ao invés da calçada.

   Sorri daquilo. Essa mídia, a cada dia que passa, perde cada vez mais seu poder de manipulação sobre a sociedade, e isso é uma coisa ótima, pensei.

   Me dirigi pra minha sala/cozinha e fui preparar meu café. Abri o armário e vi que não tinha pão, e pelo visto, eu teria que desobedecer a ordem de ficar em casa e ir até a padaria pra tomar café. Que pena. Voltei pro quarto, vesti uma roupa adequada, catei as chaves que estavam em cima da TV e saí pra tomar meu café.

   No momento em que girei o trinco da porta, a luz acabou novamente. Meu único pensamento naquele momento era que ainda tivesse algumas rosquinhas na padaria.

  

  O silêncio era a única coisa ali nos corredores e escadarias do meu prédio. Não vi uma única viva alma, durante todo o trajeto do meu apartamento até a entrada do prédio. E confesso que achei assustador e muito maneiro.

   Mas, mais assustador do que meu prédio vazio, era do lado de fora, nas ruas. E isso não era nada maneiro.

   As pessoas que caminhavam pela rua, pareciam entorpecidas. Vagavam aleatoriamente para lugar nenhum. Achei aquilo um tanto bizarro, mas não perdi meu tempo olhando. Tudo parecia um pouco estranho e fora da realidade naquele dia, desde o momento em que eu havia acordado de madrugada.

   Por onde eu passava, as pessoas se viravam em minha direção e me encaravam com olhares mortos, e logo em seguida se dirigiam caminhando a mim. Comecei a ter medo de tudo aquilo e de uma caminhada lenta, passei a uma caminhada mais acelerada, de tempo em tempo dava uma corridinha e parava. E as pessoas continuavam a se virar em minha direção, e me seguir com seus olhares mortos e expressões vazias. Comecei a acreditar que realmente o que haviam dito na televisão, pudesse ser verdade.

   Depois de alguns minutos alternando entre caminhar e dar umas corridas breves, o medo tomou conta de mim e no meio de todas aquelas pessoas estranhas, eu disparei. Não estava mais ligando em chegar à padaria ou qualquer outro lugar. Só queria voltar para minha casa que era o lugar de onde eu nunca deveria ter saído. Porém, eu estava indo na direção errada.

   Corri por alguns quarteirões e as cenas se repetiam por onde eu passava. Pessoas e mais pessoas com olhares mortos, vagando sem direção alguma pelas ruas. De primeira, a única coisa que eu reparei eram os olhares sem vida. Mas depois de um tempo eu comecei a notar que algumas das pessoas pelas quais eu passava, estavam com roupas sujas de sangue e aos farrapos. Eu estava tão apavorado que nem sequer me dei ao trabalho de processar toda essa informação bizarra que eu estava recebendo. Não tinha como eu voltar para minha casa, não com as ruas infestadas com esses “zumbis”, pensei eu, então corri em linha reta, e fui em direção à cidade.

   

   Quando virei na esquina da Lewis Avenue com a Broadway, eu perdi o fôlego completamente.

   A rua estava infestada de pessoas. Mas o caos era o que reinava ali. Pessoas correndo para todos os lados. Gritos de horror, carros batidos e largados para todos os lados. Hidrantes quebrados e jorrando água por toda a rua. E também, misturado com toda aquela água, um liquido escarlate que manchava pegajosamente toda a rua. Sangue.

   Tinha sangue e gente morta pra todos os lados. Mas o pior não era isso. O pior de tudo era que tinham pessoas comendo outras pessoas. Os “zumbis” atacavam as pessoas que ainda estavam lúcidas e a carnificina era tanta, que não consegui raciocinar e entender tudo o que se passava ali, naquele momento. Eu fiquei congelado por alguns instantes, esperando que o sangue esquentasse novamente, e assim que o sangue voltou a correr em minhas veias e o choque inicial passou, eu pensei que deveria mais do que tudo correr para salvar minha vida. Me virei para retornar pelo caminho pelo qual tinha vindo, mas já era tarde demais. As ruas agora estavam ainda mais infestadas do que quando eu havia passado e todos vinham para a direção em que eu me encontrava. Eu me virei novamente e sai em disparada em direção a rua do outro lado da principal. Sai correndo sem nem olhar para trás. Mas pude sentir aquelas criaturas rastejando em minha direção com seus olhares vazios e expressões sedentas. Corri por mais ou menos quinhentos metros e encontrei uma igreja abandonada no meu lado esquerdo da rua. Me embrenhei para dentro e desesperado, passei pelos corredores até chegar na parte central da igreja. Ao alcançar a segurança lá dentro. Eu abaixei a cabeça e respirei fundo.

– Que porra é essa que está acontecendo!? – falei comigo mesmo, com a respiração pesada e o fôlego voltando lentamente.

   Pessoas zumbis por toda a parte e ameaças de ataques biológicos por terroristas. Isso tudo é tão louco e sem nexo que parece mais um sonho. Uma alucinação.

   Tomei um pouco mais de fôlego e levantei a cabeça para ver o lugar como era por dentro.

   O terror era grande em mim naquele momento, mas quando levantei a cabeça, fiquei sem saber o que pensar.

  

   Lá dentro, pessoas estranhas me observavam com olhares mortos e expressões selvagens. Em seus olhares eu conseguia perceber o que eles queriam em mim. Sangue, todo o sangue que eles puderem pegar.

   Havia muitos corpos espalhados pelo chão, e mais alguns ainda de pé. Faltando alguns membros ou com a cara esfacelada. Eu caminhei lentamente para trás. Dei o primeiro passo, e ninguém se moveu. Dei o segundo e eles ainda estavam no mesmo lugar. Quando dei o terceiro passo, topei com algo que estava atrás de mim. Me virei e eram mais desses “zumbis” que me seguiram até ali pela entrada. Entrei e nem me dei ao trabalho de fechar a porta, pelo visto, minha estupidez me matou, pensei resignado e aterrorizado. Era o meu fim.

   Lentamente eles se aglomeraram a minha volta. Senti a carne se arrancada à dentadas de meu corpo e o sangue escorria quente e em cascatas devido a toda a adrenalina que estava em meu corpo. Gritei de dor e vi meu braço sendo arrancado enquanto o outro era devorado ainda comigo. Agonizei por alguns instantes e a dor começou a se dissipar enquanto eu começava a ficar sonolento. Comecei a fechar os olhos lentamente e um segundo depois, acordei aos berros no meu apartamento, suava frio e tremia feito um louco.


   No final de tudo aquilo tinha sido apenas um sonho. Mas o sonho tinha me parecido tão real que eu fiquei em choque por alguns minutos, apenas encarando o chão, e pensando naquela loucura toda, e na dor que havia parecido tão real.

   Levantei ainda assustado e fui ao banheiro. Joguei uma água no rosto e me encarei no espelho por alguns momentos para poder ter provas de mim mesmo que aquilo havia sido um terrível pesadelo e que tudo ainda estava normal.

   Quando voltei para o quarto, uma forte brisa balançava as cortinas da janela e deixava um frio incomodo pairando no ar.

   Dormi com a janela aberta como sempre, pensei sonolento.

   Fui até a janela e fechei a cortina. Antes de fechar eu dei uma olhada pro céu, e a lua estava maravilhosa. Deitei-me na cama novamente e esperei que o sono viesse.

  

   Meu apartamento é um lugar muito pequeno e eu já conheço cada canto. E pelo fato de ele ser no sétimo andar, tem uma luz natural que vem da lua, principalmente em noites em que o céu está limpo e nítido. Eu fiz tudo o que fiz depois de acordar daquele pesadelo, no escuro. E me lembrei muito vagamente de que havia dormido com a televisão ligada. Com esse pensamento eu peguei no sono novamente e dormi esperando que aquele pesadelo não se repetisse.

Na hora que acordei, eu estava tão assustado que nem cheguei a notar que o relógio na parede marcava 02:30 AM.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Crônicas da meia noite." morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.