When You're Strange escrita por Jamie Hermeling


Capítulo 4
Nós não temos valor nesses cálculos




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Sakura exalava mal humor. Por causa da confusão com o ébrio rapaz, tivera de comer com pressa e ainda levar sermão da antipática professora de literatura por chegar atrasada. Recolou seus fones de ouvido, escondendo-os com o casaco e com o cabelo durante o resto da aula. Quando o sinal marcou o fim daquele momento tedioso, finalmente pôde baixar a cabeça, jogando-a contra os próprios braços. Brian Molko cantava em seus ouvidos algo sobre ter perdido seu lubrificante e uma bunda bonita. Resolveu olhar para a sala, observar os poucos colegas que haviam ficado ali. Surpreendeu-se com o número, ainda menor do que pensara. Restava apenas um ruivo pra lá de esquisito, o que lhe rendeu momentos de contemplação, e uma menina olhando para ela atrapalhada. Apressou-se para virar sua cabeça para o outro lado, dando o recado de que não queria conversa. Já bastava Rock Lee, que por uma misteriosa sorte, não aparecera.

A segunda aula era de matemática, e ela agradeceu mentalmente. Matemática podia ser entendida com poucas palavras, apenas olhando as resoluções no quadro e copiando os exercícios. Porém, o professor teve a ideia de por em prática algo típico de matérias humanas: trabalho em grupo. Sakura pediu repetidas vezes em sua cabeça para que o número de alunos fosse ímpar e ela sobrasse. Mas enfim, quando abriu os olhos depois da sessão de cadeiras rangendo, o professor apontou para ela e um garoto na exata extremidade oposta da sala, e juntou os dedos, ordenando que fizessem par. Revirou os olhos. De todas as pessoas, quem sobrara era o junkie.

Ele não fez menção de sair de seu lugar, de modo que Sakura se viu forçada a atravessar a sala com sua carteira na cabeça. Olhou com desgosto para o rapaz, mas ele não lhe deu atenção. Kakashi Hatake entregou as duas folhas, avisando que apenas uma deveria ser entregue. Sakura observou o garoto escrever seu nome no cabeçalho.

Sasuke Uchiha.

“É um nome até bonito” pensou, “até que combina com ele. Sei lá”. Deu de ombros.

-      Se quiser, pode deixar que eu faço sozinha – ela disse. Não obteve resposta. Sasuke rabiscava alguma coisa em sua folha. Sakura soltou uma pequena risada zombeteira. – Quase ninguém gosta de exatas mesmo.

-      Na verdade, eu prefiro números – o garoto falou pela primeira vez, lançando-lhe um olhar cortante, ainda encostado desajeitadamente na cadeira. – Se as pessoas os valorizassem mais, não teríamos tantas conversas inúteis.

Seu sorriso sutil era insuportavelmente zombeteiro. Sakura deixou um “tsc” escapar e voltou a se concentrar na atividade. Não falaram nada mais depois disso. Sasuke lhe entregou a segunda parte das respostas em silêncio, e ela agarrou a folha com mais brutalidade do que desejou transparecer.

Durante toda a aula, sentia o olhar da menina estranha, do outro lado da sala.

Foram os primeiros a entregar. O professor lhes sorriu forçado e disse que podiam ir embora. Assim que pisaram no corredor, Sasuke sumiu de suas vistas. Imaginou onde ele poderia ter se enfiado tão depressa. Deu de ombros e continuou seu caminho até seu recém-inaugurado armário.

Sentada perto dele, ao chão, encontrou a mesma garota ruiva que a abordara mais cedo. Ela olhava para o solo, sem nenhuma reação à aproximação de Sakura. Não se cumprimentaram. Sakura abriu seu armário, vasculhou-o de cima a baixo, cada vez mais nervosa. Algo estava faltando.

-      Valeu pelo presente – a ruiva disse por fim, coçando o nariz. – Era da melhor qualidade.

-      Eu sei que era da melhor qualidade – Sakura bateu a porta do armário, olhando indignada a moça que a agora se levantava.

-      Desculpa, esse era meu antigo armário, eu ainda tinha uma cópia – disse com um ar divertido, entregando a chave pra nova dona.

-      Eles não deviam trocar ninguém de armário.

-      É, mas aconteceu uma reforma aqui e mudaram nossos armários pra mais perto da nossa sala.

-      Enfim, não me importa – Sakura cortou, com impaciência. – Eu não te dei nada, quero de volta.

-      Claro – ela sorriu torto. – Olha, tem um lugar aqui perto chamada Ellus. Se você vier hoje à noite, quem sabe eu não te pago?

Sakura rolou os olhos. Já preparava seu “quem disse que estou interessada em ser sua amiguinha?”. Mas a ruiva já estava longe. De repente, ela parou, e virou-se de novo para a rosada. – Ah, e meu nome é Karin.

...

Acordou com um gosto amargo na boca. Outra vez, dormira no sofá. O relógio já marcava oito da noite. Desejou conseguir dormir mais. Levantou-se, ainda zonza, e encheu um copo d’água. Levou-o até seu quarto, resolvendo tomar o líquido devagar enquanto via as luzes da cidade pela janela. De súbito, Karin veio à sua mente. Não havia, de fato, nem considerado aceitar tal convite, mas agora, por uma razão desconhecida, os dizeres da ruiva continuavam aparecendo em seus pensamentos, repetidamente.

-      Diabos – afastou-se da varanda bruscamente, e voltou à cozinha para guardar o copo. Jogou-se novamente no sofá, ligou a televisão.

Às vezes se perguntava por que ainda pagava TV à cabo e logo em seguida, perguntava-se como alguém sobrevivia sem TV à cabo. De qualquer forma, nada a interessava. Os filmes bons disponíveis já haviam sido repetidamente assistidos.

Começou a imaginar que tipo de lugar seria Ellus, e inventava possíveis desfechos para a noite, variando de otimistas e pessimistas.

“Tsc. Seja o que for, é melhor que ficar mofando aqui. E aquela Karin não sei das quantas está me devendo mesmo.”

Vestiu rápido uma calça jeans, tênis all-star pretos, uma camisa com o rosto de David Bowie estampado e uma jaqueta jeans, mais clara que a calça, por cima. Pôs algum dinheiro do bolso e saiu sem nem mesmo pentear os cabelos.

Foi até o metrô, e no entanto, acabou voltando, decidindo-se por ir a pé. Andava, sem saber por que havia tomado aquela decisão. As ruas, em sua maioria, estavam desertas, e um vento frio batia em sua cara.

Depois de meia hora de caminhada, finalmente se deu por vencida e entrou na estação de metrô mais próxima. Chegara à escola, e agora se via andando pelos arredores, tentando achar a tal Ellus. Aquela avenida em particular estava bem movimentada, mas ela guardava a opção de pedir informação a alguém como a última.

Depois de três quadras, finalmente achou o chamativo lugar. Era uma disco, cheia de luzes neon rosas, verdes e azuis na entrada. Parecia enorme do lado de fora. Como iria achar uma ruiva no meio da multidão que deveria ter ali?

Entrou amuada, sem olhar ao redor, dirigiu-se direto ao bar. Pediu um suco de frutas e só então se pôs a tentar identificar alguém.

A música da Ellus era alta, mas não tão alta quanto costumava ser a música daqueles lugares. Não era o suficiente para ensurdecer, pelo menos. Nem tão ruim. As luzes banhavam os que se restringiam a beber no bar, jogar conversa fora nas mesas ou nos grandes sofás e os mais dispostos, que se aventuravam na pista de dança.

Foi aí que viu o que não queria ver.

Sasuke Uchiha. Sentado numa mesa apinhada de gente, que tentavam camuflá-lo enquanto o rapaz aspirava um pó branco.

Sentiu seu coração acelerar, exatamente como se tivesse levado um susto de alguma criança travessa.

Karin, que se encontrava naquela mesa também, avistou-a, e não demorou para que Sakura reconhecesse a ruiva vindo ao seu encontro. Pulou da cadeira afobada, sem esperar pelo suco. Precisava sair dali. Precisava ir embora.

Esbarrou na ruiva, que soltou um “Oh” de reclamação.

-      Não vai nem pegar seu pagamento não? – Karin disse alto, tentando sobrepor a música.

Sakura parou na metade do caminho. Voltou a encarar a garota, e seu rosto iluminou-se. Dirigiu-se à mesa a passos firmes. Pegou uma nota de cinco dólares amassada em seu bolso e enrolou-a. Apoiou-se no ombro de Sasuke e aspirou uma fileira do pó branco que ainda se encontrava espalhado na superfície de madeira.

-      Pronto – disse, sorrindo. –Pagamento feito.


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