- E então... – Hinata disse, salvando o rumo da conversa. Sakura olhava de cabeça baixa em seu celular a data daquela quinta-feira. – Que clube você escolheu mesmo?

- Teatro – respondeu pelo canto da boca, sem muita vontade.

- Ah, não sabia que você gostava de teatro, é legal mesmo. Eu também faria, se a timidez deixasse – riu baixinho.

- Não é nada disso – Sakura revirou os olhos, com a mão no queixo. – É só mais fácil ficar sem fazer nada lá.

- Gezz... Onde eu já escutei isso antes? – Hinata balançou a cabeça para os lados, lembrando das exatas palavras de Sasuke.

- Digo, eu poderia ir no clube de matemática, já que é a disciplina que eu menos odeio, mas as pessoas desses clubes sempre são fanáticas demais, sabe? Em uma semana já estariam me chamando pra tomar suquinho de laranja e falar sobre Nikola Tesla numa sexta-feira.

Hinata riu.

- É, mas você vai acabar tendo que escolher uma disciplina avançada. Umas, na verdade. É o currículo.

- Tô sabendo... Mas pretendo deixar isso pra última hora, sabe.

Hinata sorriu, e o sinal decretou o fim do intervalo antes que ela pudesse continuar a conversa. Acenou para Sakura e voltou ao seu lugar.

A última aula passou rápida e muda, sem proveito para Sakura. Quando acabou, ela fez exatamente o que sempre fazia: permaneceu em seu lugar. Sempre esperava que todos tivessem saído, para não ser espremida na porta. Sem querer, já havia percebido que Sasuke, do outro lado da sala, também fazia o mesmo, com os braços cruzados e olhar impaciente. No momento em que a última pessoa da fila saía, ela começou a se preparar, pegando seus fones de ouvido. Porém, eles se engancharam na carteira de tal forma que foi necessário uns dois minutos para que ela conseguisse desenroscá-los.

- Droga! – xingou para a sala já vazia, e ainda gastou algum tempo selecionando a música.

O corredor já estava quase deserto, excluindo alguns estudantes que com certeza, por um motivo ou outro, haviam se atrasado como ela. E apesar disso, Sakura foi forçada a retirar os fones por um barulho externo. O som de uma briga, bem diante de seus olhos. Sasuke e Naruto discutiam vermelhos de raiva, prestes a se debaterem. As pessoas olhavam curiosas, mas não faziam nada. Sakura se perguntou onde estaria Kabuto numa hora dessas.

- Você armou isso pra ME prejudicar – Naruto acusava, aos gritos. – O que eu quero sabe é POR QUE. E por que envolver outra pessoa? Você não tem esse direito!

- Eu não estou afim de responder nada – Sasuke resmungou. – E se eu fosse você, deixaria de gritar na minha cara.

Sasuke tinha um ar feroz e intimidador. Naruto cerrou os dentes, com uma careta de fúria.

- Estou cheio das suas armações. Ou você me explica tudo, ou eu vou contar isso pra direção e você é suspenso.

Sasuke riu.

- Como se eu me importasse! Você deveria ter pensado melhor antes de se meter comigo. Agora não finja inocência.

Naruto não disse nada, seu rosto estava tomado pela ira. Sakura assistia a tudo sem conseguir tomar uma decisão. Sua mente estava quase em branco.

O loiro agarrou Sasuke pelo colarinho, e como o moreno estava encostado aos armários, não tinha escapatória. Sakura sentiu seu corpo tremer, como num alarme, e de uma só vez, correu e se pôs no meio dos dois.

- Calma, Naruto – ela disse, virada para ele. Não vá fazer nada impensado que te prejudique depois. Não vale a pena.

Naruto franziu o cenho, e gradativamente, mudou o olhar de Sasuke para Sakura. Relaxou os ombros.

- Você sabe que ia levar a pior né? – Sasuke provocou, com um sorriso.

Sakura aumentou a pressão nos ombros de Naruto, mantendo-o longe. Ele afastou-se definitivamente, dando três passos para trás. Pôs-se a encarar os dois, balançando a cabeça para os lados.

- Você não tinha nada que se meter nisso, se meter com ele, Sakura. Você sabia que o que estava fazendo era errado. Ah, quer saber? Vocês dois são é da mesma espécie.

Naruto foi embora com sua cara de desgosto, a passos longos e firmes. Sakura ficou sem ação a princípio. Olhou para Sasuke com incredulidade – ele deu de ombros.

- Olha, agora eu estou com dificuldades de descobrir qual de vocês dois é o mais idiota.

Já não sentia a necessidade do fone de ouvido, tamanha era a confusão de pensamentos que se acotovelavam rápidos. Saiu fazendo lentamente o mesmo percurso de Naruto.

...

Eram três da tarde e ela dormia. Aliás, dormia desde que almoçara. O despertador fez seu alarmado som que percorreu todo o apartamento. Ela acordou mal humorada pegando o maldito celular para ver qual a maldita coisa interrompera seu sono.

Era um lembrete. “Teatro da escola: daqui a uma hora”. Balbuciou um “nãoooo” e pôs a mão no rosto, ainda divagando sobre ir ou não ir. Shin também dormia, ao seu lado, na cama.

- Queria ser como você, Shin, sono e comida sempre, sem interrupções. Onde eu estava com a cabeça quando resolvi proporcionar a um ser vivo uma vida melhor que a minha própria? Agora eu acho que vou ter que ir àquela porcaria do teatro, mesmo que for só pra ver aqueles candidatos a atores fracassados, porque olha, outra detenção na biblioteca... Não.

Ficou ainda uns quinze minutos na cama, balbuciando um “só mais dois anos, só mais dois anos”, buscando coragem para o primeiro passo: levantar-se.

Ainda estava com sono, praticamente semi-consciente ao pegar o metrô.

O teatro da escola estava cheio – muito mais cheio do que ela considerava em suas projeções mentais. De longe, podia-se notar algumas das pessoas com os jeitos, cabelos e roupas mais estranhos da Loyal Trenton High School. Pelo menos setenta por cento deles eram riquinhos que sonhavam com em entrar para a Brown e depois para a Broadway. Não era o caso de Sakura. E muito provavelmente também não era o caso de Sasuke, sentado na quinta fileira com uma cara de tédio comovente. Não sabia por que, mas não se surpreendera tanto ao encontrá-lo ali. Ao seu lado estava Karin, batendo a perna direita nervosamente e escutando com atenção o que a professora de cabelos roxos dizia.

A mulher não devia ter muito mais de trinta anos, seus cabelos de cor chamativa ficavam presos e estranhamente espetados. Vestia uma blusa semi-transparente e por cima, um casaco bege, que não tirava nem com o calor que estava fazendo. Sentava-se na beirada do palco e balançava as pernas infantilmente. Parou de imediato seu discurso ao ver Sakura.

- Você está atrasada, senhorita... Como mesmo?

- Sakura.

- Então, senhorita Sakura. Por que se acha que deve nos deixar esperando?

- Eu só cheguei cinco minutos atrasada... – ela respondeu numa voz morta e sem paciência.

- Cinco minutos por aqui é muito, senhorita Sakura. Espero que seja boa o suficiente para valer a pena esperar por você.

Sakura revirou os olhos e tratou de se sentar na fileira do meio, do lado distante de Sasuke e dos demais. Mas Anko – como a professora se apresentou – logo instruiu para que todos se juntassem nas fileiras da frente.

- Como já é tradição – Anko retomou sua fala. – a primeira peça do ano é sempre um clássico. Depois vem um musical, e depois, uma peça atual, e depois uma feita pelos próprios alunos. Isso é o mínimo de peças que temos. Para dar início, esse ano, eu me decidi por “A Dama das Camélias”. É um drama que exige muito dos atores, principalmente da atriz que viverá Marguerite Gautier. Interpretar essa personagem é sempre uma honra. Aqui, ao lado no palco, está o cartaz para as inscrições. Vocês devem escrever seus nomes abaixo de cada personagem a qual quiserem se candidatar para interpretar. Podem se candidatar a quantos quiserem, eu marcarei as audições depois. Podem se levantar organizadamente e se inscrever agora.

Todos se levantaram, com certa pressa. Karin soltou um “eba” animado e foi correndo. Os únicos que permaneceram em seus lugares foram Sasuke e Sakura.

Anko lhes lançou um olhar de clara e soberba desaprovação e, sem se importar com as boas maneiras.

- E vocês? – ela chamou alto e bruscamente. – Não pensem que vão ficar sem fazer nada. Vocês dois aí, vão fazer o que?

- Trilha sonora – eles responderam, uma voz atropelando a outra.

Anko levantou uma sobrancelha.

- Só precisamos de uma pessoa para a trilha sonora. Sasuke, deixo com você. E você... Pode ser a técnica de som.

Sakura olhou para Sasuke e fez uma careta. Ele viu, mas só se dignou a olhar para a frente. Revirou os olhos e resmungou baixinho – Algo me diz que essa peça vai ser um desastre sonoro.