Sim, era verdade, adorava o trabalho que, como mágica, havia conseguido manter. Mas odiava, sem sombra de dúvida, odiava quando "cortavam" suas asas. Não estava satisfeita com o desfeche do caso. Como poderia o delegado, o senhor Gold, aceitar um resultado tão mísero apesar de todo o tempo investido? Regina, eventualmente, começara a suspeitar da capacidade do seu chefe, mas sempre tentava desviar o rumo de seus pensamentos antes que começasse a se meter demais onde não deveria - bem, ao menos não por hora, ainda mais levando em conta a persistência de sua parceira, Emma, em relação ao caso. Por sorte, sua "casa", um bem que havia herdado de seus pais, estava em reforma, algo que acabara por se afastar de toda a papelada que mantinha no armário da sala ou das fotos que guardava nas mais improváveis gavetas. O quarto que hotel que ocupava, por mais impessoal que fosse lhe trazia certo conforto. Caminhou até o armário, onde havia algumas de suas peças de roupas favoritas e logo escolheu o que vestiria para mais uma manhã tempestuosa de trabalho: uma camisa social azul marinho com delicados botões prateados, um sobretudo cinza escuro, do mesmo tom de suas calças sociais justas e um par de sapatos sociais de salto, pretos e lustrosos. Jogou a toalha vermelha, na qual até então estava enrolada, sobre a cama e vestiu suas roupas. Não demorou mais que dez minutos para terminar de se arrumar e de pegar o que precisava - chaves, documentos, distintivo. Havia, sobre uma pequena mesa ao lado da porta que dava no corredor de acesso aos quartos, uma cesta de frutas. Foi logo pegando uma maçã, a mais vermelha de todas e dirigiu-se às escadas. Deu a primeira mordida, conferiu os bolsos. Tudo okay. Talvez fosse só impressão, mas algo quase gritava em sua consciência que seria um dia "daqueles", algo que já começou o dia deixando-a frustrada. Desceu as escadas e, antes de dirigir-se à garagem, direcionou o olhar ao grande relógio que jazia acima da enorme porta de madeira do hall principal. Estava adiantada. E quase podia prever que Emma acabaria atrasando, outra vez. Ela era uma ótima detetive e uma excelente mulher, mas sua falta de pontualidade era algo que deixava a morena com os nervos à flor da pele. Balançou a cabeça após dar a última mordida na maçã e acabou jogando-a no cesto de lixo do estacionamento. Olhou vagamente para o céu cinzento antes de entrar em seu corvette preto, fazendo-o, acidentalmente ou não, cantar os pneus assim que começou a se mover. Ao contrário do que havia previsto, não teve que enfrentar o trânsito costumeiro. Demorou menos de meia hora para chegar à delegacia. E assim que pôs os pés lá, o senhor Gold já se aproximava, mancando freneticamente enquanto agitava algumas – várias – folhas de papel no ar.

 - Detetive Mills, é exatamente de você que estávamos falando – dizia. Regina não soube definir se estava sendo sarcástico ou se estava aflito, desesperado. – Precisamos de você e da senhorita Swan.

- Bom dia, Gold – sibilou Regina, "amistosa como sempre", ao aproximar-se do chefe. - O que foi? Precisando de sugestões sobre a cor do carpete? - ouviu alguém rindo, sufocadamente, provavelmente a velha recepcionista. - Já disse que gosto do preto.

Gold bufou. Se a mulher não fosse competente, já a teria demitido há tempos

- Olhe. Esse é novo caso, o qual você e a – começou ele com a ironia certeira, olhando ao redor, procurando a detetive loira. - Senhorita Swan vão trabalhar – concluiu, estendendo a mão com os papéis que Regina logo tomou. A mulher revirou os olhos e deu uma leve folheada. Nunca se sentira tão feliz por não ter tomado um café da manhã decente.

 - Por quê? Isso, certamente, sai de nossa jurisdição! – rosnou quase amassando os papéis, tamanha a força com que os segurava. – Deixe com a FBI, ou com quem você quiser! Nós já temos um caso.

 - Já disse, aquele caso foi concluído – sorriu o delegado, a acidez de suas palavras ia se intensificando. – E já que estavam sem nada pra fazer, resolvi lhes dar um presentinho. Ótimo, não? Se acham que podem encontrar algo que não existe – e apontou para a foto, um monte de ossos flutuando numa mistura de banha e sabe-se lá o que numa banheira. – Comecem por essa... Coisa. Agora, vá ao trabalho.

Ambos trocaram olhares fulminantes por sabe-se lá quanto tempo. Regina queria esmagar aquele homenzinho irritante como se ele fosse uma barata. Mas acabou dando as costas e subindo as escadas. Ao entrar em seu escritório, olhou para o relógio. "Atrasada, como sempre" sussurrou consigo mesma enquanto pendurava o sobretudo no cabideiro. Sentou-se à mesa, e antes que voltasse a torturar seu estômago, pegou os óculos de leitura. Mais alguns minutos passaram-se e ouviu alguém se aproximando. Só pelo jeito apressado dos passos, já sabia quem era. Então não desviou o olhar dos papéis. Mesmo quando Emma falou.

 - Bom dia, Detetive Mills.

- Está atrasada, Swan - comentou, ríspida.