The End Is Coming escrita por Aya Ishikawa


Capítulo 6
O Dono da Voz


Notas iniciais do capítulo

Esse não é um capítulo muito grande, ele é mais descritivo... tentei me lembrar de cada detalhe que pude. Espero que gostem!



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Lá estava eu, caminhando lado a lado com aquele homem de face disforme. Caminhamos primeiro por todo o salão, ele me levou próximo ao trono onde estivera sentado. Em cima de um degrau havia dois tronos, um maior, com um apoio de costas enorme e sem muitos detalhes e outro menor um pouco, porém com vários desenhos de flores em relevo nos pés e nas bordas. Eles pareciam ser feito de uma espécie de madeira muito escura e resistente, o assento e as costas tinham também uma parte estofada com uma espécie de veludo preto.

-Aqui como pode ver minha querida, é o salão principal, lugar meio triste de ficar, muitas vezes é aqui que as almas vêm para pedir ajuda, fazer acordos, contar suas histórias, tudo muito sem graça para você. Você deve estar achando que gosto de coisas caras, mas acredite, nesse ramo você precisa mostrar-se imponente.

Continuamos andando, viramos a esquerda no fim do cômodo. Era uma espécie de corredor, ligeiramente largo e com alguns pedestais de ambos os lados. No primeiro par de pedestais haviam bustos, provavelmente de meu anfitrião usando seu elmo. No segundo par havia o busto de uma mulher, cabelos encaracolados, olhos doces, ela usava uma tiara com desenhos de flores.

Paramos em frente ao terceiro par de pedestais, esse era ligeiramente mais alto que os outros, no pedestal à nossa esquerda havia a tiara que estava no busto feminino. Vista em cores ela era linda! Feita de ouro, sua flores eram decoradas com pedras preciosas delicadas em tons de rosa a vermelho. Por um momento me senti tentada a tocá-la e até mesmo prová-la, mas, mesmo imaginando estar sonhando, senti medo do que poderia acontecer.

No pedestal à nossa direita estava o elmo, não era de ouro como a maioria das pessoas imaginaria, porém era digno de atenção especial, tendo em vista a beleza e imponência do objeto. Forjado, exceto por um pequeno enfeite de três pontas pouco acima da testa, em uma única peça, era um trabalho que seria digno do próprio Hefesto. A prata de que era feito o fazia mais reluzente que o mais belo luar. A viseira consistia em três cortes diagonais e paralelos, que lhe permitiam ver perfeitamente embora para uns pudesse parecer difícil. A superfície era lisa, de desenho alongado, que ao descer pelo rosto terminava em um par de apêndices como pontas, uma de cada lado do queixo, única parte do rosto descoberta, assim como seu lábio inferior, fazendo com que qualquer um que o olhasse se sentisse envolvido pelo mistério transmitido. Mais uma vez à testa, era possível notar que o adorno em relevo representava Eolh, um sinal rúnico de proteção.

Os dois últimos pedestais apenas reproduziam os bustos vistos anteriormente, primeiramente o da jovem e logo depois o de meu anfitrião. Quando terminamos de percorrer esse corredor ele virou-se para mim e disse:

-Bom minha cara, não posso percorrer todo o castelo com você, realmente uma pena, peço-lhe então que acompanhe meu querido criado Hector e continue o passeio. Creio que a essas alturas já não preciso mais me apresentar minha querida, já sabes o meu nome?

Naquele momento eu imaginava que aquele era o sonho mais estranho que eu já tivera em toda a vida, mas mesmo assim ainda tive forças para dizer:

-Você é Hades... É conhecido por muitos nomes e um dia todos virão para esse lugar que é seu reino, o reino dos mortos.

Nesse momento notei que ele sorriu, sim havia um sorriso perfeitamente nítido em seu rosto. Este, antes sem foco, agora me parecia completamente nítido. Eu podia ver a pele com suas incontáveis marcas – provavelmente de batalhas antigas – o cabelo negro e encaracolado que lhe caía até os ombros, uma barba, não muito longa, apenas o suficiente para lhe dar um ar rígido e respeitável, também negra. E os olhos tão reluzentes quanto a mais escura das turmalinas. Entre o queixo e olho direito uma cicatriz mais profunda marcava seu rosto, mas nem por isso o tornava menos belo. A cor de sua pele era ligeiramente pálida, como esperado de alguém que vive longe do sol. Aparentava ter entre trinta e quarenta anos de idade. Assustadoramente incrível.

Ele me deixou ao lado de Hector, o mesmo cara magro que me recepcionou. Eu sentia calafrios só de tentar imaginar como ele era sem aquele manto negro que lhe cobria o rosto. Ao contrário de Hades que me parecia simpático, Hector limitou-se em anunciar cada cômodo em que entrávamos no mesmo tom monótono. Assim passamos por incontáveis salas disso e daquilo, todas muito bem decoradas em tons escuros que davam um ar de sobriedade ao local. A primeira parada pela qual me interessei foi a que eu o ouvi anunciar:

-Os aposentos de Perséphone, aqui estão todos os seus pertences e o local reservado para seu descanso.

Olhei meio sem jeito para dentro do quarto com medo que a dona de tudo aquilo aparecesse. Era um quarto enorme, uma cama com dossel de tamanho suficiente para quatro ou cinco pessoas deitarem confortavelmente estava bem ao centro, lençóis brancos com fronhas vermelhas combinando com as cortinas de veludo. Um armário em um dos cantos, enorme, me fazia imaginar quantas roupas a esposa de um deus precisava ter. Havia também uma bela penteadeira com três espelhos que permitiam uma visão total do rosto ao se arrumar. Aquele era o cômodo mais iluminado que devia haver no palácio, sua iluminação era proveniente de uma enorme janela que, naquele momento, estava com parte das cortinas abertas permitindo a visão parcial de um grande jardim.

Passamos por mais umas salas, algumas delas tinham tapeçarias realmente lindas nas paredes, e então chegamos ao segundo ponto interessante: a biblioteca! Naquele ponto eu já estava tão envolvida com aquele sonho mágico que tudo parecia real, olhei todos os livros que minha vista pode alcançar, acho que nem em 2000 anos seria possível ler todos aqueles livros! Eram estantes e mais estantes de uns cinco metros de altura cada cheia de livros, eu adoraria poder ler todos, mas em vez disso Hector ordenou que continuássemos o passeio.

Finalmente toda aquela caminhada com ele terminou e chegamos ao jardim, um lugar lindo, parecia um sonho! Nem o pintor mais detalhista conseguiria retratar todas aquelas flores com tanta perfeição... Várias espécies, que nem mesmo existiam na terra, todas com cores muito lindas! Aquela era uma paisagem contrastante com a ideia de morte que aquele lugar passava, ali só havia vida e a sensação de uma enorme felicidade. Ouvi meu guia anunciar com sua voz rouca:

-Por fim, temos os jardins da senhora Perséphone, espero que tenha apreciado a visita, voltemos agora ao salão principal para que meu senhor resolva o que vai fazer com a senhora.

Na volta, fizemos um caminho diferente e passamos por um corredor escuro, perguntei a Hector o que havia depois daquele corredor, com sua antipatia usual ele apenas disse:

-Meu senhor não me permitiu leva-la até essa ala.

Enquanto pude continuei olhando para trás imaginando o que poderia haver naquela direção. E então voltamos ao salão de entrada onde Hades aguardava em seu trono. Ao nos ver chegar ele levantou e veio até mim.

-Hector foi simpático com a senhorita?

Uma pergunta irônica, respondi a altura:

-Oh sim, muito! Um ótimo exemplo de criado.

Tive a impressão de que Hector havia murmurado qualquer coisa sobre “pirralha metida”, mas não posso afirmar com certeza. Logo que me deixou com Hades ele se retirou com uma reverência ao seu senhor. Hades esperou até que ele estivesse longe e caminhou em direção ao trono fazendo um sinal para que eu o acompanhasse.

-Veja minha querida, eu lhe mostrei minha casa, fiz isso porque espero poder revê-la aqui outras vezes, gostaria que fizesse desse o seu lar também. Sempre que se sentir cansada do mundo pode vir até aqui para descansar, ou mesmo se estiver entediada, vou fazer o possível para diverti-la. Sinta-se a vontade para retirar qualquer livro da biblioteca e lê-lo, providenciarei para que você possa entender todos eles independente da linguagem. E claro, sinta-se a vontade para percorrer todo o jardim quantas vezes você desejar, trate-o como se fosse seu.

Ele ficou em silêncio por uns segundos e depois prosseguiu:

-Eu apenas gostaria de lhe pedir uma coisa: prometa confiar em mim e, quando chegar o momento, fazer algo que irei lhe pedir.

Estávamos em frente aos dois tronos, eu o olhava nos olhos, embora fossem tão imponentes os olhos dele eram doces, pareciam implorar por algo que o fizesse sentir... Vivo. Aquele olhar me fazia sentir vontade de cuidar dele, de estar ao lado dele por toda a eternidade.

-Sim. – Respondi sem hesitar. – Eu confiarei.

Lembro-me de ter visto um sorriso, o sorriso mais infantil que eu já havia visto no rosto de alguém. Depois disso abri meus olhos, eu estava em meu quarto. Meu primeiro pensamento: foi só um sonho?


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