Loki: Segredos Sombrios escrita por Tenebris


Capítulo 18
Cicatrizes


Notas iniciais do capítulo

Eu não mereço perdão, depois dessa longa ausência, eu sei, rs. Foi um final de ano muito agitado, acabei passando um tempo longe de casa e atrasei minhas postagens. Maaaaas, cá está esse capítulo. Devo dizer que foi um dos que eu mais gostei de escrever, porque explora uma parte da Stella que até então eu não tinha mostrado pra vocês. Espero que vocês gostem e peguem algumas coisas que eu deixei "no ar", meio vagas. Depois, vocês irão entender melhor do porquê de certas atitudes dos personagens, auhauhauahauah #mistério E pra quem quiser acompanhar o que eu estou fazendo, eu às vezes posto trechos extras ou futuros aqui no meu twitter: Seguem que eu sigo de volta :D Estou sempre lá: @ohyeahmagneto Beijos beijos!!



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O deus terminou de fazer o meu curativo calmamente, embora os seus olhos sombrios ainda ardessem em curiosidade. Nem mesmo a distração do interesse de Loki, em saber o que eu falaria, lhe tirou a incrível habilidade em tocar-me. Os dedos brancos e longos do deus rapidamente envolveram o pano ao redor de meu corte, que ficou levemente vermelho nas extremidades.

E eu abaixara os olhos, de modo a evitar encarar os de Loki durante todo esse tempo. Eu não queria desconcentrar-me. Não agora que eu tocaria em um assunto que também era difícil para mim.

Em seguida, como eu estava sentada no chão, ajeitei-me de modo a continuar cara a cara com o deus, que estava sentado da mesma forma. Agora, à minha frente só havia o semblante obscuro e inexpressivo de Loki, que colocava displicentemente as duas mãos na frente do corpo, num gesto despreocupado, porém atento.

Eu suspirei, buscando encontrar algum equilíbrio mental antes de contar a minha história. Coloquei uma mecha de cabelo atrás da orelha e levantei meus olhos na direção de Loki. De alguma forma inexplicável, olhar para o deus me trazia alguma tranqüilidade. Dava-me foco para lembrar os motivos de eu estar fazendo tudo aquilo.

– Bem... Essa cicatriz tem uma história um pouco complicada. Vou ter que contar algumas coisas um pouco mais... Antigas. – Murmurei, rindo levemente ao final da frase.

Loki arqueou as sobrancelhas e retribuiu o sorriso, dizendo pausadamente:

– À vontade... Afinal, a história é sua.

Eu me recompus e tornei a dizer, fraquejando em alguns momentos:

– Bem... Eu nunca fui o exemplo perfeito na minha família. Imagine... Família Alessa. Feiticeiros dominantes em toda a Europa desde a época do Império Romano. Os mestres da máfia. E nenhum feiticeiro como eu. – Fiz uma pausa, suspirando. – A Família Alessa é uma família de feiticeiros telepatas. Não existem pessoas como eu. Eu sou a única que não o é. Isso sempre me fez ser meio... Excluída.

Loki franziu o cenho, como forma de demonstrar seu desentendimento. Eu continuei, nervosa, sentindo meu tom de voz aumentar duas oitavas:

– Ora, Alessa é uma família de mafiosos. Telepatia é algo essencial para os melhores negócios. Podemos manipular e induzir as pessoas a fazerem o que queremos. Podemos lucrar muito mais. E meu poder? Serve para quê? Para eu me transformar em sombra e fugir quando precisar? – Eu bufei. – É apenas um poder que prova o quanto sei ser covarde... Ou pelo menos, é o que eu cresci ouvindo da boca do meu pai. Minha mãe nunca me deu atenção. Ela está ocupada demais cuidando dos nossos negócios na Sardenha.

Loki cerrou os lábios numa linha fina e levou uma mão ao queixo, num gesto reflexivo. Ele assentia, à medida que eu explicava tudo. Provavelmente, o deus se perguntava até que ponto aquela história melodramática chegaria.

– Meu poder sempre foi considerado inferior. Além disso, sou mulher. Existe uma hierarquia na família Alessa, na qual mulheres não têm tanta preferência. Eu me sentia oprimida por todos os lados! Por isso, assim que completei 13 anos, eu treinei. Treinei muito. Um dia, os negócios ficaram principalmente em minhas mãos e nas de Lucca. – Expliquei, gesticulando de maneira aflita.

Como se adivinhasse que a conversa estava chegando a seu ponto crítico, Loki voltou seus olhos profundos para minha direção. Ele tinha a expressão séria e fechada. Eu engoli em seco, antes de continuar, sentindo o nervosismo aumentar:

– Lucca... Meu irmão. Homem e telepata. Ele nunca precisou fazer nada para se dar bem. Faltava nos treinos. Não se dedicava... Ele não se esforça nas missões que meu pai nos oferece. Ele não mudou muito... E ainda fica com boa parte dos lucros, simplesmente porque “leu a mente de alguém” e descobriu alguma senha idiota de um cofre. Eu que sempre lutei, usei as armas... E nunca fui reconhecida por isso!

Eu arfei, num gesto de desabafo.

– Mas tem que ser assim. Foi assim durante séculos. É minha missão respeitar a hierarquia e suportar isso. Nasci e fui educada para respeitar e colocar família e dinheiro acima de tudo. Até mesmo acima de mim. E... Tudo começou quando completei 18 anos. Lucca tinha 22. Era nossa primeira missão juntos. Era um contrabando de uns livros celtas antigos. Ganharíamos uma boa grana, porque a negociação era com uma família espanhola famosa pela “generosidade” nas compras.

Loki olhava para mim de um jeito curioso, quase incrédulo. O deus estava achando graça ao me ver falar daquele modo, totalmente capitalista e frio. Um sorriso de satisfação formou-se em seus lábios, outrora inexpressivos. Eu continuei, gesticulando à medida que falava:

– Tudo estava indo muito bem. No entanto, a Guarda Italiana descobriu a nossa localização e entrou no galpão. Tentou prender todas as pessoas que encontrou. A família espanhola achou que eu e Lucca tínhamos revelado nosso paradeiro, o que é uma grande mentira. Eu e Lucca conseguimos fugir a tempo. Alguns membros da outra família foram presos e outros vieram atrás de nós. Lucca foi idiota desde sempre, e desafiou o líder deles, ao invés de fugir. Eu pedi pra ele deixá-lo lá! Disse a Lucca que precisávamos ir. Mas ele não me ouviu.

Loki ainda me olhava atentamente, seus olhos vítreos fixos em minhas expressões. Eu contei, ligeiramente revoltada:

– Lucca ia perder aquela luta. O líder deles era muito forte. O que adiantava a telepatia de Lucca? Meu irmão estava completamente ferido, impossibilitado de reagir. Eu troquei de lugar com ele na luta. Eu sabia que seria responsabilizada se Lucca chegasse em casa quase morto. A culpa seria minha. Eu lutei com o líder, ganhei a batalha, e ganhei também algumas semanas no hospital. Mas essa cicatriz foi o prêmio mais marcante.

Eu mostrei a ele meu pulso esquerdo, exibindo aquela cicatriz em forma de meia lua. O deus, gradualmente, tornava seus olhos para meu pulso.

– O líder da família espanhola tinha uma lança bem perigosa. E com um veneno bem incomum. Deixou essa cicatriz meio gelada em mim.

– Permite-me? – Loki indagou pela primeira vez, depois de algum tempo calado. Ele fez menção de tocar meu pulso, e o tocou após meu consentimento. O toque do deus era tão frio quanto minha própria cicatriz, o que me provocou leves arrepios, que imediatamente tentei reprimir. Eu murmurei, melancólica:

– Essa cicatriz é como uma lembrança do meu lugar. É uma lembrança de que eu tenho que honrar minha família, suportar as humilhações, e me contentar com o pouco que é meu. Eu fui educada para obedecer e seguir algumas regras. Essa cicatriz é um lembrete que carrego comigo sobre respeitar minha família, suas decisões, e os nossos negócios. Enfim... Um lembrete para colocar minha família e o lucro acima das minhas vontades. Assim, aprendi a jamais questionar meu destino.

Nesse momento, voltei meus olhos para Loki. O deus tinha a expressão diferente. Os olhos verdes pareciam distantes, em outra atmosfera, perdidos em algum horizonte de outro tempo que eu jamais conseguiria compreender. Seu semblante era melancólico, quase complacente. Num surto repentino, tive a impressão de visitar os pensamentos do deus.

Eu via um Loki ainda menino, no auge da infância, escondido num canto escuro enquanto observava um agitado menino loiro brincar com as armas. Naquele momento, eu senti por alguns instantes tudo o que Loki sentiu. Opressão, dor e raiva. Era como se o deus estivesse se pondo em meu lugar, ao ouvir minha história. Ele estava percebendo alguma semelhança nas nossas histórias de vida. Loki percebia, naquele momento, que nós nos identificávamos. Nossas histórias tinham as mesmas raízes de brigas e desavenças familiares. Eu sentia que Loki descobria uma poderosa identificação entre nós, algo que poderia mudar tudo.

Subitamente, pisquei meus olhos. Eu ainda estava na sala de treinamentos, observando Loki. O surto passara. O deus não parecia mais tão distante, e ainda tinha uma mão tocando meu pulso suavemente.

– Stella... Deixe-me te falar uma coisa.

Loki murmurou, aproximando-se de mim. Nossos rostos estavam consideravelmente perto, de modo que eu podia observar seus olhos por meio da claridade emitida pela luz de velas. O par de olhos verdes estava cuidadosamente sombrio e um pouco agitado.

– Fale... – Concordei, fixando meus olhos firmemente nos do deus, como se tudo dependesse daquele simples gesto.

– Eu tenho experiência em magia... E sei que seu poder é magnífico. Nunca vi nada como isso antes. É inigualável. Você tem um talento raro e único. Nunca deixem que lhe digam o contrário... Os telepatas nada são, sem uma mente frágil para controlar. O poder deles só se revela porque depende de outra mente fraca. Um poder raso, superficial, dependente de outros fatores ao acaso.

Eu pisquei os olhos várias vezes, arqueando as sobrancelhas em indignação e incredulidade. Loki estava tentando fazer com que eu me sentisse bem? Aquilo parecia meio incoerente, até eu me lembrar de que o deus estava se identificando com minha situação de vida. Talvez tudo o que ele quisesse fosse ter tido alguém para lhe confortar quando ele passou por aquelas opressões. Afinal, quem eu era para julgar alguém como Loki? Sem dúvida, ele cometera atos condenáveis e terríveis. Mas sofrera também. Eu sabia como Loki tinha se sentido durante todos esses anos, vivendo à sombra do irmão. Eu o entendia. Isso gerou em mim uma perspectiva de aproximação e identificação que, até então, eu nunca tinha pensado.

– Seu poder é único. Ele se faz grande com uma simples sombra. Ele subjuga a escuridão à sua vontade. Ele independe de fatores externos. Seu poder é raro por si só, e transforma a ausência de luz em uma coisa belíssima. Não deixe os outros dizerem o que você pode ou não pode ser. Você tem poder, e almeja mais. Busque a liberdade e se liberte dessa sua prisão. Questione tudo e não se conforme. Afinal, as trevas te obedecem, minha Dama Sombria...

Loki continuou, falando misteriosa e sedutoramente. Seu hálito fresco ressoava contra minhas maçãs do rosto, e eu sentia um arrepio dominar-me novamente, de maneira irrefreável. Eu encarava Loki com vestígios de surpresa, mas acabei entregando-lhe um sorriso discreto. Ele realmente me havia feito pensar melhor a respeito de certos aspectos da minha vida.

– Obrigada, Loki. – Agradeci.

– É meio irônico. Você diz que eu sou um homem dominado pela vingança e que fez todas as escolhas erradas. Mas você é uma garota dominada pela submissão, que nunca sequer teve a oportunidade de fazer alguma escolha. – Loki disse agressivamente, e um sorriso perigoso nasceu em seus lábios. Seus olhos verdes letais estavam atentos, como se ansiassem pela minha reação. O deus queria, portanto, provocar-me. Só para não perder o costume.

Eu fuzilei Loki com o meu olhar, retirando bruscamente meu pulso do contato com os dedos relaxados do deus. Cruzei os braços, cerrando os lábios numa linha fina, dizendo friamente a ele:

– Você tinha dito uma pergunta por outra pergunta... Lembra?

Loki soltou um riso leve e despreocupado. Estava, obviamente, feliz por ter alcançado seu objetivo de elogiar-me e provocar-me. Um jogo que era exatamente de acordo com seu estilo trapaceiro.

– O que deseja saber? – Ele indagou displicentemente, como se não se importasse. Eu o olhei fixamente, perguntando determinada:

O que aconteceu na caverna aquela noite?


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Notas finais do capítulo

E então? Curiosos? Me contem!