A Herdeira escrita por Cate Cullen
Renée serve o jantar com as mãos a tremer tal o nervosismo que sente por Rose estar com a rainha no quarto ao lado.
- Sentis-vos bem, mãe? – pergunta Jacob que observa a mãe com atenção já há algum tempo.
- Claro que sim, filho. Porque não haveria de estar? – responde Renée com ligeireza sentando-se.
- Pareceis nervosa, mãe.
Charlie troca um olhar com a mulher. Até o filho notou.
- Não estou nada, que disparate. Comei a sopa e calai-vos!
Jacob come observando a mãe pelo canto do olho.
...
- Eu não acredito que deixastes lá a mãe. – protesta Victoria. – E que ides voltar para lá. Não ireis passar a noite numa casinha no meio da aldeia, pois não?
- Filha, a vossa mãe não está em condições de voltar a cavalgar hoje. – diz Carlisle com paciência.
- Então levai uma carruagem para a trazer. – insiste Victoria. – A mãe está doente? A cobra fez-lhe mal?
- Mordeu-a, querida, e tinha veneno. Mas a mãe já está bem, apenas tem de descansar antes de voltar.
- Não podem passar a noite na aldeia como dois mendigos. A casa deve estar cheia de pulgas e as pessoas são tão grosseiras e andam sempre a queixar-se, não tomam banho, nem lavam as mãos antes de comer. São uns selvagens.
- Victoria, parai de falar assim do povo, um dia serão o vosso povo. – lembra o pai montando no cavalo.
- Estais sempre a dizer-me isso, eu já sei. O meu marido tratará deles, eu terei mais que fazer.
Experimentar vestidos e sapatos, calcula Carlisle conhecendo bem a filha.
- Pai, tomai conta da mãe. – pede Victoria, apesar de frívola e mimada sempre adorou a mãe. – Vede se ela volta bem amanhã.
- Não vos preocupeis. – Carlisle passa a mão nos cabelos da filha. – Ela voltará bem, pronta para vos abraçar.
Carlisle parte a galope com a carruagem atrás.
Victoria vira-se e vê Emmett a observa-la.
- Não vos preocupeis. – Emmett agarra-lhe na mão para a confortar. – Ela ficará bem. Não ouvistes o vosso pai? O veneno já tinha sido extraído e ela tomou um antídoto.
- E achais que alguém na aldeia sabe fazer isso como deve ser? – pergunta Victoria. – Eles nem médicos têm.
- Não penseis assim. – aconselha Emmett. – Se o vosso pai disse que a vossa mãe está bem é porque está, não acreditais nele?
- Ele pode apenas dize-lo para não me preocupar.
- Tenho a certeza que não.
- Vede porque não gosto do campo. A minha mãe devia fazer como eu e ficar sossegada no palácio.
- A vossa mãe gosta de andar a cavalo.
Victoria faz cara feia.
- Eu só a queria aqui em segurança.
Emmett abraça-a. A princesa parece tão frágil assim. Sempre foi muito mimada e protegida pela mãe.
- Nunca me deixeis, Emmett. – murmura Victoria. – Prometei-me.
- Nunca vos deixarei. – promete Emmett dando-lhe um leve beijo na cabeça.
...
Carlisle entra na pequena casa. Renée, Charlie e Jacob viram-se para a porta assim que a ouvem abrir.
- Majestade. – Jacob levanta-se e faz uma vénia. Os pais imitam-no.
- Senhores. Agradeço-lhes por me deixarem passar aqui a noite com a minha esposa. Podem arranjar qualquer coisa para os guardas e o cocheiro que estão lá fora. Eles dormirão na carruagem, mas precisam de comer. Senão for muito incómodo. – tira uma bolsa do cinto e poisa-a na mesa, ouve-se o barulho de moedas.
- Não é necessário. – diz Charlie olhando a bolsa.
- É um agradecimento. – diz Carlisle.
- Desejais comer alguma coisa? – pergunta Charlie.
- Comi no palácio, obrigado. Se me dão licença…
- Claro.
Carlisle entra no quarto onde deixara Esme.
- Amor. – murmura ela assim que o vê.
Rose vira-se.
- Majestade.
Carlisle caminha até Esme e abraça-a.
- Meu amor.
- Eu deixo-vos sozinhos. – diz Rose sorrindo-lhes.
- Obrigado. – diz Carlisle. – Obrigado, por terdes tomado conta dela e por a terdes salvo. Esme é a minha vida. – murmura e beija-lhe a mão.
- Salvá-la-ei as vezes que for necessário, Majestade, desde que os possa ver sempre felizes. – faz uma vénia e sai deixando-os sozinhos.
- Dói-vos a mão? – pergunta Carlisle observando a mão dela.
- Dói-me um pouco.
Ele dá-lhe um pequeno beijo na mão.
- Espero que passe depressa, não gosto nada de vos ver magoada.
Ela sorri e dá-lhe um beijo na face.
- Vai passar. A nossa filha?
- Ficou preocupada convosco e fartou-se de reclamar por passarmos cá a noite.
Esme ri.
- É típico dela.
Carlisle deita-se ao lado dela e puxa-a para os seus braços.
- Dormi, meu amor. – murmura ao ouvido dela. – Eu estou aqui convosco.
Esme põe a mão por cima da dele e fecha os olhos pronta para dormir.
...
Rose deita-se no colchão de palha posto no chão da cozinha.
- Os pais estão estranhos. – diz Jacob.
- Estranhos como? – pergunta Rose com uma sobrancelha franzida.
- Parece que não estão muito à vontade de ter Suas Majestades aqui.
- É natural. A nossa casa não tem condições para os reis.
- A mãe parecia bastante nervosa. – continua Jacob.
- Deve ser impressão vossa. – continua Rose espreguiçando-se. – Sabieis que a rainha teve outra filha?
- Outra filha? – pergunta Jacob.
- Sim. Desapareceu semanas depois do nascimento e nunca mais ninguém soube nada dela.
- Estranho.
- É, não é? A rainha ficou muito triste ao falar dela. – continua Rose. – Disse que espera que a filha seja assim como eu.
- Como vós? – Jacob está com ar de gozo.
- Meiga e simpática era o que queria dizer. Tive tanta pena. Deve ser difícil para uma mãe perder um filho, não imagino a dor que ela deve sentir.
Jacob encolhe os ombros e deita-se.
- Dormi e não penseis nisso.
- Será que os pais sabem?
- Sabem o quê?
- Do desaparecimento da princesa.
- Sei lá.
- É estranho nunca me terem falado dele.
- Porquê? Não é um assunto que se goste muito de falar e de qualquer forma já deve ter sido há muito tempo.
- Pois acho que sim.
- É natural que os pais não se lembrem, têm mais em que pensar. Boa noite.
- Coitadinha da rainha. Boa noite.
...
Renée ouviu a conversa dos filhos e fecha a porta do quarto preocupada.
- A rainha falou-lhe na filha. – murmura Renée. – Deve ter percebido algumas semelhanças. Na verdade qualquer pessoa percebe. Os olhos são os da mãe e o cabelo é do pai, o sorriso é da mãe. Ela é tão parecida com eles e tão pouco connosco.
Charlie abraça a mulher.
- Acalmai-vos. Eles vão-se embora amanhã, não vão perceber nada.
- E se perceberem? Vão tirar-nos a nossa menina.
- Não. Prometo-vos que não.
Renée encosta-se a ele a chorar.
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