Colecionador escrita por Cath Abreu


Capítulo 4
O esteriótipo ambulante e o homem submisso




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/393847/chapter/4

Cá estou eu, meu quarto é nó primeiro andar, soltei uma das tabuas do chão para guardar meu primeiro troféu de caça. Acho que é hora de outro. Um especial, meu chefe.

Eu trabalhava horas e horas, de graça as vezes, sem descanso, e aquele bastardo sempre olhava com desejo para minha Cloe. Estava perdido em meus pensamentos quando descia as escadas rumo ao mundo externo, uma vez lá fora eu me sentia indefeso, o rapaz da cadeira veio me cumprimentar ele disse que se chamava Versh, Victtor Versh, deve ser russo ou algo assim, ele tinha um sotaque bem forte e uma voz grave um tanto quanto assustadora.

Me disse que era detetive, senti meu sangue gelar, era um típico russo e típico detetive, até parecia um estereótipo ambulante,  cabelos negros, olhos azuis, nariz magro e comprido, cabelos curtos com um pequena franja sobre os olhos que o deixava misterioso.  A julgar pela camisa branca entreaberta até o terceiro botão, porem absoluta e impecavelmente limpa, notava-se que era perfeccionista... O cumprimentei, mas era como se ele estivesse ali apenas para contracenar comigo no palco que chamamos de vida, e em todo, todo lugar, tem uma plateia com os olhos vidrados te esperando errar uma fala se quer, ele parecia ser o mocinho da história, creio que seja apenas mais um figurante para mim, já que é minha vida, eu protagonizo, mesmo que apenas por eu estar sozinho agora, ninguém escreveria algo com um protagonista tão ruim como este que vos fala.

Pedi licença e fui para a fabrica, era por volta das 6 da tarde, o chefe devia estar no escritório, eu iria pedir demissão. Ah sim, o perturbado Nicolas, abalado com a morte de sua esposa no terrível incêndio, precisa de um tempo.

Entrei no prédio sentindo os olhares de dó das pessoas na minha nuca, o mesmo olhar com que uma mãe amorosa olha para um garoto pobre e magro que está pedindo dinheiro na rua para comprar um qual quer coisa que possa comer apenas para lhe dar a impressão de vitória na vida miserável dele.

 Bati na porta e comecei o dialogo que me tiraria do trabalho mais enfadonho do mundo para sempre.

Desde o momento que entrei na empresa para o primeiro dia de trabalho, sempre ma batia uma onda de covardia, uma coisa gelada no estomago que me impedia de contrariar, responder e até a pensar mal do meu chefe, um sentimento de submissão que se arrastava e se alastrava pelo meu corpo como uma febre.

Bati a porta sentindo um arrepio na espinha subir fazendo os pêlos do meu pescoço tremelicarem, tentei manter a cabeça fria, mas a porta se abriu diante dos meus olhos pasmos, foi como quando alguém tirar um curativo seu sem você estar psicologicamente pronto, você sente mais a surpresa do que a dor.

-Senhor Conger? O que faz aqui? Resolveu lembrar-se que tem trabalho? Faltou comida para sua esposa? Pelo menos não vai ter que gastar cremando-a, certamente que não!  

Ao dizer essas palavras ele deu um tapinha amigável em meu ombro, aquela mão nojenta e asquerosa cheia de dedos, pele e digitais pegajosas tocando na minha roupa, e a roupa tocando minha pele nua, me senti sujo, infectado, como se o homem que tocou meu ombro por um segundo estivesse cheio de lama, sujeira, folhas, lixo, uma coisa realmente desagradável, um leproso de alma, mas tem sujeira sobre as pessoas que não podemos identificar de onde vieram e como  foram parar nelas. 

O quanto a quilo me fez querer revirar os olhos de ojeriza, é uma vontade tão grande quanto a vontade de rasgar a jugular desse bastardo, abrir seu peito e retirar as costelas uma por uma, quebrando com pedras.

-Sempre espirituoso, por isso o senhor está no topo, eu vim... – O sarcasmo não era nem de longe aparente na minha frase, que soou realmente submisso e aquilo fez me sentir uma lesma rastejar pela garganta, tive que tossir antes de prosseguir com o pedido, apenas para me dar a falsa sensação de que aquele bicho não tinha decido pela minha faringe.

-Eu vim apenas formalizar a minha demissão.  Um homem nas minhas deploráveis e desventurada situação não tem cabeça para trabalhar, não senhor... – Meu olhar poderia ser comparado ao de um cão que olha para o dono jantando, com o olhar calmo, triste e submisso esperando que seu dono, seu deus, lhe de um pedaço de carne, é tudo que ele quer, em troca de todo esse respeito.

-Todo homem de fibra não devia se deixar abalar por sentimentos, isso é para as mulheres Nicolas.. Um homem de fibra deve trabalhar para suprir nossa nação, o trabalho é algo gratificante, senhor Conger, trabalho dia e noite é o que vai currar sua mente fraca! – o que começou como uma frase acabou como um grito de ordem.

  Abaixei a cabeça.

-O senhor, o senhor não entende a minha dor, sua esposa e sua filha estão em casa, confortáveis e felizes, minha família, está morta, nunca mais vão voltar, nunca mais irei vê-los, nunca conhecerei minha filha. Senhor, deixe esse homem cansado sofrer em paz.

Ele riu. Olhou diretamente nos meus olhos.

-Implore.

Me ajoelhei no chão, e pensar que tudo isso termina hoje a noite.

-Eu lhe imploro.

-Excelente...  –ele se aproximou a mesa e apertou um botão.  Ordenou a Caroline, sua secretaria que me leva-se até a saída. Eu sei muito bem aonde é a saída seu verme podre.

Da porta da sala de chefe até a pensão, varias pessoas me cumprimentaram, desejando condolências, mas eu sabia que eles não ligavam para a dor que eu estava sentindo.

Ao entrar na pensão, Molly e Olaf estavam jogando cartas em uma mesa, Versh estava ali, sentando, me fitando com os olhos parados, sem piscar. Me disse boa noite, repeti suas palavras quase como se fosse um instinto. Pedi que me perdoa-se, tinha que ir ao meu quarto. Ele apenas consentiu com a cabeça.

É estranho para eu pensar por que ele me deixa tão mexido, é como se tentasse me decifrar apenas com os olhos, e como se conseguisse, sempre que me olha com suas pupilas investigativas e levanta levemente o canto da boca, em um semi sorriso de vitória. Não preciso ser um gênio para ter saber que ele me dará problemas em breve.  

Cheguei ao meu quarto e fui olhar os meus preciosos troféus de caça, o par de orelhas. Fico pensando o que vou levar desta vez. Ele sempre falou de mais, demais para se tornar suportável.

Fiquei sentando por horas e horas a fio re planejando tudo, em frente à única janela do quarto, me dei conta de que já era por do sol quando os tons alaranjados atingiram meu rosto. Estava quase na hora de sair. Peguei tudo que precisava, coloquei nos bolsos e em uma valise preta.  


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!