Coração Gelado escrita por Jane Viesseli


Capítulo 5
Refeição




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Durante todo o dia, Maximilian dedicou seus minutos a arrumação de seu aposento pessoal e a leitura de um dos livros que lhe fora dado. Dentre as caixas deixadas em seu quarto haviam sobretudos, mantos e peças de roupas ao estilo Volturi, assim como a grossa corrente que carregava o brasão do clã, ele com certeza teria de usá-las no banquete daquela tarde.

A chuva pôde ser ouvida do lado de fora da janela escurecida, conforme as horas corriam, contudo, foi somente quando estava para anoitecer que o vampiro deixou seu livro de título francês de lado e se arrumou para o banquete.

Preto, preto, preto e preto, era apenas disso que a vestimenta dos Volturis era feita. Não que o camaleão achasse isso ruim, afinal, ele adorava preto, mas aquele sobretudo e o manto eram, no mínimo, uma ofensa para o seu gosto descolado. E no fim das contas apenas a calça e a blusa de gola alta lhe foram úteis, pois, acima disso, o camaleão preferiu vestir seu casaco de couro.

Apesar de tudo, Maximilian sentia-se elegante com aquela blusa que moldava perfeitamente o contorno de seu tronco, o que também parecia deixar o brasão Volturi ainda mais evidente sobre seu corpo. E Aro não deixou de se alegrar com o fato, de início acreditando que se tratava de orgulho por pertencer ao clã mais poderoso do mundo.

Todos os vampiros já se faziam presentes na sala dos três tronos quando o camaleão apareceu. Jane e Alec esperavam ao lado dos tronos, lado a lado, pela entrada dos humanos para novamente realizar seu jogo preferido. A vampira era linda e Maximilian não conseguia tirar seus olhos do contraste sedutor que sua pele alva fazia com seus olhos vermelhos e com sua vestimenta negra. E como se pudesse ler os seus pensamentos, Jane vira o rosto em sua direção, o encarando e estreitando os olhos ao perceber que era observada.

Ele sorri, achando graça na forma com que ela tentava parecer cruel, pois não conseguia enxergá-la daquela forma: como alguém sem sentimentos ou a quem devesse temer. É claro que o camaleão se conformava com a ideia de alguém com o coração congelado, afinal, até o dele era, mas nunca pensaria em Jane como alguém sem sentimentos.

La mia ragazza— sussurra ele para a vampira, fazendo-a bufar no mesmo instante em que as portas do grande salão se abriram.

O cheiro dos humanos se espalhava rapidamente conforme eles adentravam o local. Estavam todos alvoroçados, como sempre acontecia naquele ponto do passeio, e suas fragrâncias se misturavam no ar fazendo os olhos do camaleão cintilaram num vermelho tão profundo, que qualquer um pôde perceber o quanto ele estava sedento.

Dentro todos os aromas, houve um em especial que fez Maximilian respirar profundamente e sua boca salivar. É claro que aquele não era o aroma "la tua cantante" de Jane, pois este, infelizmente, ele nunca pode apreciar depois de transformado; todavia, o cheiro em questão era realmente agradável e lhe renderia uma boa refeição.

Aro se levanta para o pronunciamento de boas-vindas, o mesmo que sempre fazia e que sempre gerava as mesmas reações na raça humana. Os vampiros apenas esperavam o seu comando para avançar, e como Maximilian era de longe o mais sedento de todos eles, logo se agachou, colocando-se em posição de ataque e com os olhos fixos no aglomerado de humanos. E assim como sua presença atraiu seu olhar da primeira vez, tal movimento não passou despercebido por Jane, que agora o fitava com interesse, imaginando se ele era tão bom caçador quanto parecia ser.

Bon appetite— recitou Aro por fim, fazendo os vampiros saltarem de seus lugares no segundo seguinte e um coro de sofrimento se erguer pelo salão, escalando suas paredes como almas tentando fugir de sua condenação.

O banquete era farto naquele dia e os vampiros pareciam não poupar esforços para saciar suas sedes. Todos se moviam com extrema velocidade, fazendo seus mantos parecerem borrões negros aos olhos dos pobres mortais. Todos estavam caçando... Bem, talvez não todos...

― Vamos Jane, por que não se move? – questiona Alec um tanto irritado, retornando ao lado da irmã ao perceber que ela não o estava seguindo para seu jogo habitual.

― Por que ele não se move? – rosna ela com raiva, não entendendo o porquê do vampiro novato ainda estar parado, e irritando-se mais ainda por se sentir afetada com aquele fato.

Ela realmente odiava não entender o motivo das coisas e seu questionamento pareceu causar interesse no irmão, que agora encarava Maximilian com uma mistura de curiosidade e confusão, afinal, por que ele permanecia parado quando era nítido que era o mais sedento de todos?

O vampiro continuava ali, estático em sua posição de ataque. Seus olhos corriam de uma presa a outra, analisando-as, e Alec conseguia ver seus músculos se tencionando à medida que ele tentava conter seu ataque. Os gêmeos não conseguiam compreender sua atitude, tampouco entendiam sua estratégia de caça, mas tudo pareceu fazer sentido quando os olhos do camaleão avistaram sua presa ideal, o dono do cheiro agradável que sentira.

Com um salto ele avançou, desviando de um ou dois vampiros no caminho até alcançar um homem alto, com ares de advogado. Primeiro o vampiro se agachou, passando uma rasteira em sua vítima e fazendo-o cair em meio a sua corrida.

― Pobre homem, nem sabe o que lhe atingiu – comenta Alec, divertindo-se com a cena.

Jane não conseguia pronunciar palavra, estava vidrada com a cena, com a ferocidade que ele esboçava, achando tudo aquilo realmente interessante, mas sem saber ao certo como classifica-lo.

O humano rolou, colocando-se de barriga para cima para avistar o que o tinha feito cair, contudo, tudo o que pôde ver foi a intensidade da sede nos olhos de Maximilian. O vampiro salta sobre o tronco do homem, não dando a mínima importância para o sexo de sua vítima, porque, quando a sede de um vampiro gritava por atenção, tudo o que ele conseguia pensar era no sangue que corria pelas veias humanas.

― Por favor, poupe minha vida, eu pago o que você quiser – choramingou o homem em seu desespero, porém, tudo o que conseguiu de Maximilian foi uma leve risada e um aperto forte em seu pescoço. – Por favor, não! – intercedia a vítima, sentindo-se cada vez mais sufocada.

O camaleão ergue o homem pelo pescoço, obrigando-o a se sentar, e inclina levemente a cabeça do mortal para a direita, deixando completamente vulnerável a curva de seu pescoço.

― Tum, tum, tum, tum, tum, tum, bate seu coração acelerado – sussurra o vampiro no ouvido do humano. – Eu adoro este som, pois quanto mais rápido seu sangue correr, com mais força ele esguichará quando eu o morder!

O homem arregala os olhos ao assimilar o significado de tais palavras, mas não rápido o suficiente, pois, antes que pudesse protestar, Maximilian afundou seus caninos na pele branca de seu pescoço, perfurando a jugular e sentindo aquele sangue quente descer por sua garganta como o néctar da vida.

― Esse camaleão realmente sabe caçar – conclui Alec com uma leve risada. – Gostei da forma como ele brinca com a comida... O que acha, Jane?

― Acho que estamos perdendo tempo o assistindo – diz ela, sacudindo levemente a cabeça como se tentasse escapar de um transe. – Vamos caçar antes que não sobre nada para nós!

Alec assente com a cabeça, correndo logo em direção a primeira pessoa que cruzou seu caminho, deixando Jane para trás, sentindo-se atordoada. O que sua mente não sentiu em anos de transformação ela sentia naquele instante, tudo de uma vez: um torpor irritante em seus ouvidos que a impediam de prestar atenção às coisas ao seu redor, um rodopio em sua cabeça que fazia-a vacilar em seu equilíbrio e um magnetismo estranho que sempre guiava seus olhos para o novo membro da Guarda.

A vampira balança a cabeça uma segunda vez, irritando-se consigo mesma por se deixar atingir por aquele forasteiro, afinal, ela já havia visto muitos vampiros machos caçando, por que com aquele camaleão seria diferente? No que ele seria distinto dos outros? Só porque ele olhava sua vítima com tanta cobiça, que passava a agir de forma sensual e ferozmente sexy?

Maledizione! – pragueja ela, sacudindo a cabeça pela terceira vez – Que um raio me parta a cabeça antes de ter meus pensamentos invadidos por algo desse tipo. Tsc, nada disso me interessa! – rosna para si mesma, com a voz não passando de um sussurro fraco.

Ela não queria ser ouvida e por sorte não fora. Jane estava finalmente se concentrando em sua refeição quando um novo movimento de Maximilian pareceu atraí-la como um ímã. Ele havia apenas se levantado e sequer estava olhando para ela, mas, ainda assim, tinha atraído a total atenção da vampira.

O camaleão estava concentrado em sua próxima vítima, ainda tinha sede e por isso permitiu-se fechar os olhos, procurando mais algum cheiro que lhe agradasse, antes que tudo acabasse se tornando triste e morto. Ele respirou profundamente, abrindo os olhos tão rápido quanto os tinha fechado e correndo em direção ao cheiro, mas parando abruptamente ao se deparar com a imagem de uma garotinha encolhida no canto da sala.

Pouco mais de 7 anos ele daria para ela... Ele não podia fazer aquilo!

Seus cabelos estavam presos num coque, por um laço, e seu rosto estava úmido e aterrorizado, como se ela estivesse num pesadelo e não conseguisse acordar... E ele teve certeza de que não conseguiria fazer aquilo!

Por mais que estivesse com sede e por mais que o sangue daquela menina o agradasse, Maximilian sabia que não conseguiria fazer aquilo, pelo menos, não com uma criança humana.

― Algum problema? – pergunta Jane, aproximando-se subitamente.

O rosto de Jane era sério e cruel. Hesitar era uma palavra que definitivamente não existia em seu vocabulário e, ao vê-lo hesitar, a vampira pareceu se libertar do transe que a dominava.

É claro que ela havia notado sua hesitação, pois, mesmo que ele não tivesse reparado, a vampira não havia tirado os olhos dele em nenhum momento e agora ela sentia raiva dele, achando-o um fraco.

― Fique com ela... Eu não quero! – diz ele, virando-se.

― Você a queria, segundos atrás...

― Não a quero mais, eu não mato crianças – explica ele, não deixando-se intimidar com a expressão de Jane, que praticamente o condenava.

― Covarde! – diz ela, colocando numa única palavra toda a raiva que estava sentindo naquele momento, pois ela definitivamente odiava os covardes, os fracos, os que tinham compaixão. Ela odiava qualquer um que não agisse como ela.

Maximilian dá de ombros, afastando-se lentamente da menina humana e ouvindo os seus gritos angustiados aumentarem cada vez mais. Jane já havia a atacado, mas, diferente da primeira vez, ele não conseguiu olhar... Não queria olhar...

Sua mente era bombardeada por lembranças de sua criadora, cujo alimento preferido eram crianças. Todas as maldades, todas as pequenas vidas que ela tirou e que ele ajudou pareciam açoitá-lo naquele momento, e as imagens somente pararam, quando os gritos da garotinha cessaram para sempre.

Não havia mais vida naquele salão e quando o camaleão caiu em si, todos os olhos avermelhados o encaravam questionadores.

― Tomei o suficiente, não se preocupe, mestre – explica-se inutilmente. – Lhe trarei excelentes notícias de nossa missão – completa ele, fazendo uma leve reverência e se retirando do grande salão.

― E ele vai ser capaz de matar a criança? – questiona Alec irritado, partilhando dos pensamentos da irmã sobre o novato ser fraco e covarde.

― Se ele não fizer... Nós fazemos – responde Jane no mesmo tom.

Os gêmeos definitivamente odiavam sentimentos humanos, porque, para eles, sentimento era um claro sinal de fraqueza e de humanidade.


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Notas finais do capítulo

Olá pessoal, olha eu ressurgindo das cinzas e agora de férias :D
Espero que gostem do capitulo... No próximo capítulo veremos a viajem de Max em busca da criança imortal. Vocês acham que ele conseguirá destruí-la? E qual seria o motivo do lapso de compaixão que ele tivera com a menina humana?
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Beijos, nos vemos no próximo capitulo ^___^