Tocada escrita por Beatriz Seraphini


Capítulo 2
Um


Notas iniciais do capítulo

Ei, como vocês estão? Mais um capítulo para vocês.



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Atualmente

Romeo, Michigan

Avistei Meghan, descendo de seu Volkswagen Jetta apressadamente. Seus cachos negros, da raiz até pontas, perfeitamente tratados e modelados, esvoaçavam ao vento enquanto ela caminhava em nossa direção, dentro de um moletom da Cheap Monday e um jeans skinny que caia perfeitamente em seu corpo de medidas um pouco largas demais. Ela era simplesmente linda daquele jeito. Era uma pena que não percebia isso da mesma forma que eu.

– Adivinhem – comunicou a nós, jogando a bolsa-carteiro cinza no gramado e sentando-se ao meu lado com as pernas cruzadas, estilo chinês.

– Conseguiu exatamente quatro ingressos para o show do Arctic Monkeys em Detroit? – Arrisquei sorrindo.

– Claro que não, Lauren. Ela conseguiu quatro ingressos para a próxima estreia no Romeo Theatre – sugeriu Luke.

– Por favor, Laurie e Luke, não se decepcionem à toa – comunicou, estragando nossas esperanças. – não vai arriscar nada, Logan? – Seus olhos seguiram de encontro até ele.

– Me desculpe parecer insensível, – sorriu cinicamente – mas isso iria mudar a surpresa?

Dei um empurrão de leve em Logan juntamente de um sorriso. Ele sorriu de volta e me envolveu em seus braços quentes e aconchegantes. Era o que eu precisava. O outono estava me matando.

– Sempre idiota – Meghan revirou os olhos e nos olhou, um por um, em sequência – bem, conseguimos férias para Malibu no verão – deu suaves palminhas – o que me dizem?

Califórnia, claro. Minha emoção era tão forte em compartilhar água com outras pessoas, que eu não sei se posso aguentar minha total ansiedade. Mentira.

– Fico feliz por você. – Voltei a comer as bolinhas de chocolate que estavam depositadas dentro do pacote.

– É só isso? Sem histeria ou qualquer outro sentimento anti aquático? – Meghan franziu o cenho – Quem é você e o que fez com a minha melhor amiga?

– Anti aquático? Essa palavra existe? – Interroguei com sarcasmo.

Insignificantemente, lembrei-me da promessa que havia feito a minha mãe e à Ben – mais conhecido como meu pai. Fui invadida por uma angústia aterrorizante.

– Vou à Austrália no verão – murmurei com os olhos baixos – o infeliz do Ben chamou os filhos para visitarem sua nova e detestável família.

– Cole também irá?

– Ele também é um dos filhos, certo? – Acabei com as alegrias – Não entendo esse seu interesse pelo Cole.

– Nem o seu pelo Logan. – Revidou. – Aliás, não entendo o porquê de querer viajar. Detesta tanto seu pai.

– Sei disso, mas não tenho escolha. – Prossegui. – E depois, só vou a Melbourne por um único motivo: Scottie. Ela ainda é minha irmã apesar do caos.

O silêncio pairava sobre o ar. Os três ficaram se encarando como sempre faziam quando se tratava da família Gries. Ninguém opinava sobre o assunto, apenas assistiam aos dilemas do gênero novela-mexicana, cheios de choros, traições, e é claro, muito drama.

– Belo suéter. – Logan direciona o indicador para o awesome escrito nele. – Combina com a dona.

Apenas demonstrei um sorriso modesto para não deixar o elogio passar em branco.

Depois de mais alguns outros segundos silenciosos, o sinal soou e a calmaria acabou levando consigo o horário da entrada. Minha vida seguia assim, no mesmo ritmo, sendo levada constantemente por situações cada vez mais previsíveis e ridículas.

– Bem, Meghan e eu temos aula de astronomia agora. – Dei um selinho em Logan. – Te vejo no almoço?

– Claro, vou sentir sua falta. – Mencionou, com uma voz mais fina que o normal. – Eu te amo. Muito mais do que você imagina.

Meghan fez cara de nojo. Eu sorri novamente.

– Eu também, Logan. Muito mais do que aparenta.

– Também te amo, Meghan Woodford. – Fez biquinho.

– Não amola, Trasgo.

Escutei alguns risos enquanto Meghan puxava-me pelo antebraço para dentro do Romeo High School. Lançou-me no corredor movimentado, com os típicos barulhos de armários batendo pela fúria de seus donos estressados. Enquanto os alunos conversavam e soltavam gritos estridentes, entramos na sala 9B.

A sala de astronomia possuia seis bancadas, organizadas em duas fileiras, com duas cadeiras em cada uma. Há também, um quadro negro de ponta a ponta com a mesa central que abriga o professor e uma pequena maquete planetária. Além, é claro, dos alunos desinteressados, a maioria que estão aqui a fim de conseguir créditos para futuras dependências em outras matérias, já que é uma aula optativa.

Eu sou diferente. Amo astronomia, dedicando cada tempo livre para mais um estudo.

Mas Meghan se encaixa perfeitamente no grupo dos “não interessa como, mas quero passar de ano”, acompanhando-me apenas para levantar suas notas que não passavam do clássico D. Eu sou a responsável em ajuda-la nos estudos, embora não seja todo esse glamour de aluna e nem passe tão perto assim. ­

Os alunos chegavam e sentavam-se enquanto o Sr. Redway, técnico de astronomia, olhava por cima dos óculos cuja armação encontrava-se quebrada precisamente ao meio, remendada por fita durex. Quando foi perceptível que a quantidade de alunos que habitava àquela sala era suficiente, o técnico tratou de levantar-se de sua cadeira acolchoada e macia introduzindo:

– Bom dia, alunos. – Saldou. – Primeiramente, quero os trabalhos em cima da mesa.

Ouvi dois ou três suspiros de estudantes traídos pelo esquecimento. Sempre os desinteressados. Sempre os mesmos.

– Em segundo lugar, quero apresentar um novo colega de turma: – Sr. Redway puxa alguém pelo braço que estava na porta – Daniel. Ele é de Denver, Colorado.

Senti Meghan chutar minha canela e silabar “garoto”. Não consegui conter um risinho nervoso. Quando voltei a olhar para frente, me deparei com um rapaz esguio, vestido em suéter cinza, jeans e gorro ainda mais cinza que o suéter. Além do olhar tímido direcionado para o chão que seguia desvendando o rosto de cada aluno da sala, um a um.

Até que chegou ao meu.

Seus olhos azuis cor-de-mar penetravam nos meus de uma forma estranha, radiavam energia. Parecia que liam cada história pela qual eu já havia passado, cada dor que eu já tinha sentido. Aqueles segundos pareciam horas, como se somente eu e Daniel estivéssemos naquela sala. Como se um buraco negro tivesse surgido do nada no meio da classe e sugado tudo que estava naquele ambiente, restando apenas eu e ele. E mais ninguém.

Foi quando senti uma forte voz ecoando dentro da minha mente, levando consigo cada fantasia que aquele olhar me provocara. Junto com a voz, uma pergunta perseverada, embora eu não soubesse de onde ela vinha.

– Pensei que a sala estivesse completa...

Os olhos do técnico se voltaram a mim num segundo. Senti que tinha algo de errado quando ele deu um sorrisinho sarcástico.

– Andrew foi transferido para Seattle, Srta. Gries. – Diz, sem rodeios. – Aliás, já que se importa tanto com o bem estar do nosso novo aluno, você está encarregada de ajuda-lo na adaptação na escola e na cidade nova.

– Por que está fazendo isso? – Rebati. – Eu só fiz uma pergunta. O que há de mal em perguntar?

Novamente senti algo em minha cabeça, algo que desorganizava as ações e impulsionavam novas ideias nela. Era como se eu estivesse sendo controlada inconscientemente. Não percebia o porquê das minhas perguntas, o que estava acontecendo e o motivo de eu não conseguir parar de tagarelar.

– Desculpe-me, Sr. Redway. – Suspirei expulsando todo o ar da garganta. – É claro que irei ajuda-lo.

E de novo. O que estava acontecendo comigo? De onde essas ideias estavam surgindo? De fato, não sabia o que estava dizendo e pior: eu não conseguia parar.

– E para começar, a Srta. Woodford não se importaria de trocar de assento com Daniel, certo?

Olhei para Meghan. Obviamente, ela não estava nem um pouco animada de largar sua muleta de notas. Seu olhar se tornou algo vazio e fundo demais para ser lido.

– Claro... – Direcionou seus olhos raivosos a mim. – que não, Sr. Redway.

Um último sorriso do técnico antes de virar-se para o quadro negro. Cassie conseguia estar mais perdida e desolada que eu.

– O que há com você, Lauren?

– Eu não sei, desculpe-me.

Voltei à atenção ao quadro que já estava todo rabiscado com linhas e figuras geométricas indecifráveis sobre a formação das estrelas e seus sistemas planetários.

– Bem, vamos retomar a última aula em que eu dizia sobre as nebulosas: sistema de nuvens formadas de poeira, hidrogênio e plasma. Essas nuvens dão origem às estrelas que, consequentemente como o processo de formação das estrelas é muito violento, os restos de materiais lançados ao espaço, por ocasião da grande explosão, formam um grande número de planetas e de sistemas planetários.

Quando dei uma olhada ao lado, percebi que todo o processo de transição de lugares estava concluído. Daniel me encarava com aqueles mesmos olhos que me faziam ver ondas e sentir a maresia – além da forte voz que comandava todo meu sistema nervoso.

– Não ligue para ele. – Disse sorrindo, sem mostrar os dentes. – E não me chame de Daniel.

– Por quê?

– Formal demais.

– E como vou chamá-lo?

– Então tem planos para mim?

– Por que será que os homens enxergam outras coisas contidas em simples perguntas? – Perguntei ironicamente.

– Apenas Day. – Apertou os olhos enquanto esboçava uma pequena linha curva no rosto.

– Apenas Day, você acaba de melhorar as coisas entre nós.

– Você não parece ser do Michigan, Lauren. — Afirmou confiante.

– Sou da Flórida.

– Trocou a Sunshine por esse gélido estado?

– E?

– Isso é loucura. Imagine, na Flórida há praias e faz sol o ano todo. Aqui só há lagos e neva com certa frequência.

– Percebi que você sabe diferenciar que os estados ao norte são mais frios que os do sul. Parabéns, Day.

O burburinho sobre estrelas e constelações do professor continuava ao fundo há longos minutos e Day insistia em me olhar. Era como se eu fosse a roupa mais cara e estivesse em uma das vitrines mais procuradas de Nova York.

Mas não. Parecia preocupado, como uma mãe ursa defendendo seu filhote do predador.

– Não para um segundo?

– Com o quê?

– De me fitar.

– Se estivesse no meu lugar, também não conseguiria.

– O que você quer dizer com isso?

– Descobrir será seu trabalho de casa.

Day levantou-se em perfeita sincronia com o ecoar que indicava o término do primeiro tempo. E levou todo seu amor consciente em me encarar junto consigo.


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Notas finais do capítulo

O que acharam? Comentem, por favor (estou triste, não estou recebendo resposta sobre a fanfic).