Obrigado e Volte Sempre escrita por Loly Vieira


Capítulo 41
Vida breve, vida leve.




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—Você pode me explicar esse seu plano de novo?

Revirei os olhos para o ceticismo de Collin. Ele não confiava em mim, dizia que estava alucinando, tinha passado por choques traumáticos etc.

—Estou indo atrás da mãe do Samuel, fingindo que sou uma das mulheres que tiveram o orgulho ferido por Jeremy e ao compartilharmos nossas dores, saberei dos próximos passos dela e então poderemos salvar Jeff.

—Isso é tão genial, Alminha! — Ellie bateu palmas, animadíssima. – Só faltou uma roupa de melhor gosto. Se for para se vestir com pouco, que seja combinando.

—Isso é fodido, Alma, vai dar em merda e está claro. – Ele me fuzilou pelo espelho retrovisor.

Suspirei, incomodada demais com minha saia levantando tanto que já chegava no início das minhas coxas, para ligar para seu olhar inquisidor e sensato.

—Eu preciso que você descubra onde ela está, sei que você pode fazer isso, Collin. Por favor.

—Você não é uma agente da CIA, morena.

—Eu posso mentir muito bem, para sua informação.

Ele passou a quarta marcha no carro com tal brutalidade que Ellie, ao seu lado, saltou.

—Estou levando você em algum tipo de missão suicida, é isso?

—Docinho... – Minha amiga acariciou seu ombro e ele visivelmente relaxou um pouco. – Nós estaremos lá com ela.

—Não! – Interrompi.

—Como assim não, miga? – Ellie virou o corpo até que me encarasse diretamente.

—Preciso que ela pense que cheguei a ela sozinha. Para que o plano dê certo. Tenho certeza que ela desconfiará de algo se eu chegar lá escoltada.

O casal no banco a minha frente trocou olhares e me senti de fora da conversa silenciosa entre eles.

—Isso não vai funcionar. – Sussurrou ele.

—Temos que deixar ela tentar. – Dedilhou carinhosamente sua coxa, deixando-me nervosa que Collin desviasse a sua atenção da estrada. – Se eu estivesse no lugar dela, eu faria qualquer coisa, Docinho.

Os negros olhos de Collin encheram de tal carinho que eu nunca tinha visto, apertaram as mãos e sorriram um para o outro.

—E se eu estivesse no lugar desse Jeremy, eu iria querer que alguém a parasse.

Ellie se desmanchou de amores e eu bufei no banco de trás.

—Eu não vou desistir, se é o que estão pensando.

—Você não sabe com quem está se metendo, morena.

—Você sabe? – Joguei de volta.

Ele não respondeu. Porque ele não sabia da história inteira, ninguém sabia ao certo. Observei as ruas que cruzamos, o caminho que eu não sabia, mas presumia que fosse a nova moradia de Ellie.

—Se você não puder me ajudar, gostaria que me levasse de volta para casa, para que eu me vire sozinha.

Ellie soltou um gritinho de irritação, característico dela e Collin me observou pelo retrovisor com uma pontada de hesitação. Ergueu o queixo, me medindo e eu repeti o gesto, disposta a mostrar que era capaz daquilo.

—Vamos para casa, vamos pensar com calma e comer bolinhos que roubei da noite passada no Café. – Cantarolou seu mantra.

—Espero que seja uma boa atriz, Alma. – Intercedeu ele.

Voltei a olhar para a rua lá fora antes de respondê-lo, baixo, ainda desconfiada que ele não iria me ajudar:

—Estou pronta para ser Meryl Streep.

*~*~*

A primeira coisa que notei de cara é que eu era uma péssima amiga. Ellie ficou extremamente saltitante ao me mostrar sua casa pela primeira vez, comparei sua atitude com Bambi vendo a mãe ressuscitada no sétimo dia, mas ela não entendeu a referência. O único momento que eu tinha ido lá era quando tinha deixado Bento e foi tão rápido que não cheguei sequer a entrar.

Era uma bela casa, como eu presumia, tinha dois andares um jardim grande e cheio de flores que eu sabia de certeza que não eram cultivadas pela minha amiga, que não sabia manter sequer uma muda de mato selvagem que geralmente vivem por si só. Notavelmente o ambiente estava passando por uma nova colonização, entretanto, perdendo os traços masculinos crus, para o furacão loiro.

Haviam quadros motivacionais, cheios de frases como “me dê Prada, não louças para lavar” que eu sabia que Ellie tinha escrito porque ela estava com os lábios vermelhos de tanto morder quando me mostrou, ansiosa para minha reação.

Soltei um riso frouxo e disse que o quadro era hilário.

—Onde você encontrou essa frase maravilhosa?

Ela pulou de alegria.

—Eu que escrevi!

Minha amiga esteve tão presente na minha vida que eu jurava que estava presente na dela, mas não era bem assim.

Depois de um rápido tour pela casa (e a retirada dos lindos e assassinos sapatos altos, roupa justa por uma blusa e calça de dormir do Collin, já que os de Ellie ficavam bem apertados em mim) notei a segunda coisa: Collin tinha tantos aparatos tecnológicos que eu me perdi. Coisas, inclusive, que nem sabia que já existiam.

Existia um quarto só para isso. Tinha 3 monitores de computador em uma mesa longa de madeira grossa, um teclado gigante e coisas como webcan, caixas de som e um coletor de digitais que me deixou com um ponto de interrogação gigantesco tatuado na testa.

Nos sentamos na mesa da cozinha em seguida, que também era amplamente equipada, nada como um fogão quatro bocas que tinha lá no meu apartamento (só duas funcionavam). Ellie colocou a chaleira no fogo e os bolinhos no micro-ondas.

—Qualquer conversa séria tem que ter café e bolinhos. – Comentei por alto, para tentar quebrar o gelo.

Minha amiga sorriu, seu namorado não. Ele estava bem na minha frente na mesa de madeira, me encarando com aqueles olhos negros que me deixavam tremendo nas bases.

—Collin, docinho, pare já com esse olhar, está deixando Alminha aterrorizada.

Ele desviou.

—Ela está fazendo uma loucura, loira, não posso permitir isso.

—Não é você que decide. – Cortei-o. Não sei porque diabos disse isso, Collin fuzilou-me.

—Se você, remotamente, quer minha ajuda, acho que posso muito bem decidir algo.

Bicho, até o inferno gelou depois dessa. Juntei toda minha dignidade e me aproximei mais dele, ficando na ponta da cadeira e estendendo minhas mãos, disposta a uma negociação.

—Por favor, Collin.

—Não.

—Por favor.

—Não vou mexer um dedo. – Disse, inflexível.

—Pensei que tínhamos conquistado uma amizade rala. – Confessei, a voz embargada. Parte verdade, parte disposta a tentar sensibilizá-lo.

Funcionou, de qualquer modo. Seus olhos amoleceram e ele segurou minhas mãos nas suas. Calejadas e ásperas, assim como as de Jeff.

—Gosto de você, Alma, acredite em mim. E por isso não vou te ajudar.

Puxei minhas mãos para mim, raivosa de repente.

—Você sabe mais do que me disse, Collin? – Estreitei os olhos, desconfiando de seu argumento.

Balançou a cabeça, mas antes que falasse algo Ellie distribuiu as xícaras para cada um de nós, acompanhadas de bolinhos tortos e murchos.

Agora podemos falar corretamente.

Revirei os olhos, mas bebi meu café em silêncio.

—A questão é que o que Alma quer é uma simples loucura e não colaborarei com isso, não quero ter uma consciência pesada no final.

—Estou te limpando de qualquer consciência futura agora, se essa for a questão. Quer que eu assine algo te isentando de culpa?

—Não é isso, Alma.

—Porque você não quer me ajudar?

—Porque é loucura? – Respondeu rápido, rápido demais.

—Porque não quer me ajudar? – Repeti.

—Eu já disse! – Rosnou.

—Porque não quer me ajudar? – Falei mais alto, entre os dentes.

Ele bateu as mãos em punhos na mesa, forte o suficiente para que assustasse a todos nós, a mesa rangesse, seu café cambaleasse na pequena xícara e então tombasse em sua direção, derramando em sua blusa. Collin xingou alto, raivoso e por um breve momento eu me arrependi até a morte de atiçá-lo até tal ponto.

—Ai meu Deus! – Ellie pulou da mesa, os olhos arregalados como píres e as mãos tremendo.

—Isso queima. – Rosnou ele, baixinho, para a mancha em sua blusa branca.

—Tire a camisa, docinho. Eu vou dar um jeito nisso e pegarei uma pomada.

Collin se levantou e como um perfeito Magic Mike, ele retirou a blusa, me arrancando uma lufada de ar. Céus, o homem tinha um corpo.

Ele entregou a blusa para minha amiga que prontamente sumiu para a área de serviço. Com um olhar chateado para a mesa ele pegou um pano de prato pendurado na geladeira e se pôs a limpar o café derramado na mesa. Indo torcer o pano na pia em seguida. Suspirei, cansada e culpada daquilo tudo. Recolhi a xícara e o pires e os levei até a pia, mas não cheguei a colocá-los dentro, em segurança.

Porque antes que eu completasse meu ato de solidariedade e ressentimento, eu notei algo que nunca tinha notado antes. Claro que não, eu nunca tinha visto o namorado da minha melhor amiga semi nu antes. No seu ombro direito tinha uma tatuagem, não era grande, do tamanho do meu punho fechado, talvez. O mais curioso era que havia um relógio e duas palavras, eu as conhecia bem, tinha passado as últimas horas acariciando-as em outras costas.

Carpe Diem.

Gelei no meu lugar. Segurando a porcelana cara nas minhas mãos tão forte que foi incrível não ter quebrado em mim.

Eu conhecia aquela tatuagem, não era a mesma, mas bem semelhante a de Jeff. A mesma que ele tinha feito por causa do clube. Era um carimbo no passaporte, segundo ele, todos do Clube tinham que tê-la.

Qual era a probabilidade de isso ser uma coincidência? De ser só piração da minha cabeça?

Mas então as engrenagens do meu cérebro funcionaram aos rangidos. O trabalho secreto do Collin, suas viagens súbitas, seu equipamento moderno em casa, sua recusa.

Com um baque feio, coloquei os objetos ao lado dele na pia.

—A quanto tempo você faz parte do clube, Collin? – Segurei na bancada de mármore forte, os nós dos meus dedos ficando brancos.

Meu quase amigo ficou tenso. Lambeu os lábios, fechou os punhos e me encarou de volta. Seu olhar negro já não mais me deixando culpada, mas decepcionada.

—Fale baixo. – Sussurrou. – Por favor.

—Então Ells também não sabe. – Grunhi, mas a voz mais baixa.

Ele negou com a cabeça, nós dois apoiados contra a pia da cozinha, travando uma guerra histórica com nossos olhares.

—Ela não precisa saber.

Soltei uma risada sem humor nenhum.

—Você está brincando comigo, não é? – Franzi o cenho.

Seu rosto ficou branco quando ouvimos os barulhos de passos se aproximando.

—Por favor, Alma.

Foi a última coisa que dissemos antes de uma bagunça loira voltar para a cozinha. Minha amiga exibiu um sorriso temeroso, adentrando o recinto como quem andar em uma fina camada de gelo no lago congelado.

—Está tudo bem aqui?

Ellie tinha esse brilho no olhar desde que a conheci. Ela não o perdeu quando sua família estava desmoronando, quando não tinha um teto em cima da sua cabeça e foi enquanto a abrigava que fizemos uma promessa indireta e nunca dita: não iríamos mentir uma para outra. Eu a amava tanto... Deus sabe como eu a amava e ao seu brilho, mesmo quando ele estava cheio de expectativa para que eu e seu namorado, futuro cara da sua vida, não nos tornássemos inimigos mortais.

—Claro que está! – Me esforcei para mostrar um sorriso completo.

Visivelmente ela relaxou, recuperou um bolinho molhado da mesa e me ofereceu. Aceitei prontamente e o observei por um segundo antes de olhá-la.

—Como é que você sabia meu jeito favorito de bolinho?

E então ela gargalhou e tudo pareceu bem. Encaixou-se entre eu e Collin, enganchando um braço em cada um de nós.

—Nunca mais suma assim de novo, viu? Mesmo que esteja dormindo com o Brad Pitt, só... Me ligue para podermos tramar a morte da Angelina juntas.

—Eu te amo, Ellie. – Falei séria. Para só então cutucá-la nas costelas. – E você sabe que não posso sumir da sua vida, imagina o que aconteceria?

Seus olhos se encheram de lágrimas não derramadas e seus braços me rodearam rápido. Foi durante nosso abraço que meus olhos se encontraram com os de Collin.

—Vamos conversar. – Movi meus lábios, sem vocalizar a frase.

*~*~*

—Eu gosto de você, Collin. – Foi a primeira coisa que disse quando entramos na sua “sala de trabalho”, deixando na sala uma Ellie vidrada na TV, assistindo o novo episódio de Are You The One. – Acho que você é o homem da vida da minha amiga, se alguém me perguntasse.

Mordi o lábio inferior, abraçando meu tronco firme.

—Eu a conheço e sei que ela tem esse jeito que parece não ter mágoa de ninguém, mas até mesmo ela tem um limite de aceitação.

—Você está me ameaçando? – Murmurou em uma voz baixa, calma.

Respirei fundo antes de responder.

—Talvez.

—Você pensa que está fazendo melhor que eu fazendo isso?

—Não sou eu que estou mentindo aqui.

—Você está me subornando para que eu a ajude.

Ergui uma sobrancelha.

—Nunca disse isso.

—Dirá em breve. – Acomodou-se numa poltrona de coro (espero que sintético) no canto da sala. Não fui convidada, mas me esparramei na poltrona ao lado.

Ele tinha os cotovelos apoiados nas pernas e a cabeça nas mãos.

—Até quanto você está envolvido no clube, Collin? – Perguntei mansamente.

—Não muito. – Nos olhamos e soube que falava a verdade. – Mas eles me fizeram uma proposta que não poderia recusar.

—Por favor diga-me que você não está envolvido no meu caso e do Jeremy.

Silêncio.

Senti minha garganta fechar.

—Não é bem assim, Alma.

—Então como é? – Driblei minha voz falha.

Respirou fundo, encostou as costas na poltrona e cruzou os braços.

—Fui contratado logo depois que você me pediu para dar uma olhada nesse Jeremy Ferraro. O que encontrei foram algumas coisas difíceis de serem engolidas e fui mais afundo. Foi assim que eles bateram, literalmente, em minha porta em um dia. Acontece que eles precisavam de uma pessoa como eu e eu precisava de dinheiro. Essa casa não se mantém com o salário de Ellie ou alguns bicos ocasionais de um marido chifrudo.

Um sorriso me escapou, droga. Ele viu e sorriu também.

—O que eu sei do caso de Jeremy, você também deve saber. Ele mirou sua irmã, acertou você, se arrependeu e agora está correndo atrás como um louco. O lance é que o Clube não aceita muito bem historinhas de amor e arrependimento. Jeremy tem uma dívida, ele vai pagá-la.

—Como Samanta se meteu nisso? Mordi o canto da unha, nervosa no meu lugar.

—Não foi coincidência, garanto isso. – Bufou. – Ela estava no radar do Clube há algum tempo. A mulher é famosa no mundo dela, uma publicitária bem-sucedida, tem uma cobertura em um bairro tranquilo, um closet com roupas de estações do ano, dois gatos persas e um ex-namorado que declarou ser gay no término. Tenho certeza que o filho da puta do Leonardo só estava esperando o momento para se aproximar.

—Quem é Leonardo?

—Um dos veteranos no Clube, ganhou troféu de babaca 3 vezes seguidas. Ele está de olho em qualquer coisa que tenha pernas e uma..

—Entendi. – Interrompi, ruborizando.

—É fácil encontrá-la em companhia dele no Clube. Nas últimas duas semanas, ela só tem postado foto com ele em seu facebook.

Ergui uma sobrancelha em sua direção.

—Você é bom nisso.

Collin sorriu.

—Agradeço o elogio, mas você se surpreenderia com as pequenas coisas que se pode descobrir apenas vasculhando as redes sociais. Espere, tenho uma coisa aqui. – Ele esticou a coluna e o braço até alcançar um tablet na mesinha ao lado.

Procurou alguma coisa e então limpou a garganta quando a encontrou.

—Hoje descobri que há várias formas de chamar o capeta e já me sinto mais próxima do dito cujo. – Leu em voz alta e clara. – Ah, essa é uma das minhas favoritas: quando você está com duas crianças, um cachorro e eles decidem roubar muletas de um garotinho.

Estou vermelha dos pés a cabeça no momento que ele me olha.

—Pare com isso! – Ralho, encabulada.

—O quê? Eu amo o seu twitter, é uma das pessoas mais divertidas que eu conheço. Geralmente as pessoas só se lamentam.

Mexo-me desconfortável no lugar, procurando por qualquer coisa na mente.

—Hey! Minha conta é fechada e sei que não me segue no twitter.

—Tem certeza?

Vasculho rapidamente minha mente, mas nada surge. Collin me seguindo em uma rede social me teria freado de certeza.

—Quem foi a última pessoa que te seguiu e você aceitou? – Ele averiguou.

—Eu não lem... Ah, espera, algo como uma garota de 16 anos que adora gatos.

Collin ergueu as sobrancelhas de tal modo que elas quase se perderam no seu cabelo loiro.

—O que você...? – Um clique e então eu já estava pulando no lugar. – Você é a adoradora de gatinhos?!

—Você pode ser qualquer um na internet, Alma. Eu sei que você não desconfiaria de uma garota assim, então aqui estamos. Confesso que você é umas das minhas seguidoras favoritas.

Ainda estava estupefata quando algo mais surgiu na minha linha de pensamento.

—São muitos os chifrudos que lhe procuram?

Ele mordeu um riso.

—Você não tem ideia do quanto.

Aí estava. Nós dois já estávamos purificando o ar novamente.

—Eu não sei muito, morena, mas o que sei é que você não deve brincar de Sherlock com esse pessoal.

—Posso te fazer uma pergunta? Na verdade duas.

Assentiu.

—O Jeff... Jeremy, ele sabia que você é parte do Clube?

—Acredito que não. – Deu de ombros. – Não nos batemos diretamente. E geralmente sou a pessoa que sabe dos outros e os outros não sabem de mim.

—Hm, certo. E...Você sabe do suficiente para me ajudar?

Relutante, ele concordou com a cabeça. Fechei os olhos, respirei fundo, escorreguei na poltrona até estar na ponta e pegar suas mãos nas minhas. Apertei forte.

—Eu quero, eu posso e vou fazer isso, Collin.

Mordeu os lábios em uma linha fina, absorto.

—Nós vamos fazer isso então.

Sorri, com os olhos marejados e o abracei pela nuca. Foi assim que Ellie nos encontrou ao abrir a porta, abraçados da maneira mais estranha de todas. E a reação dela foi um tanto quanto ela.

—Ai. Meu. Deus. – Choque passou pelo seu rosto. Todos prenderam a respiração por um segundo e então... – QUE FOFO! Chega pra lá que eu também quero participar desse abraço.

Gargalhei tanto que minha barriga doeu, mas não soltei-os do nosso abraço.

—Ellie? Collin?

—Hm? – Responderam em conjunto, quase não respirando direito.

—Mal posso esperar para ser madrinha do meu afilhado, então andem logo com isso.

Foi emocionante ver Collin corar, quase fotografei para emoldurar na sala lá de casa. Ellie sorriu, um tanto quanto envergonhada, mas com uma malícia nos olhos que só quem conhece a pessoa nas entrelinhas poderia ver.

—Assim que ela quiser. – Foi um sussurro constrangido, mas verbalizou pela sala como um berro a plenos pulmões.

Eu e minha amiga giramos a atenção para seu namorado, foi quase cômico encarar a cena de fora.

—O-o que você disse, docinho?

Ele tomou fôlego, levantou a cabeça e a observou um minuto antes de repetir as palavras.

—Nós tomaremos o próximo passo assim que você quiser.

O queixo da loira caiu, seus olhos enchendo de lágrimas.

—Eu pensei que você não quisesse filhos. – Ela tratou de explicar.

Ele procurou as mãos dela e então as segurou firme.

—Eu não queria. – Admitiu. – Mas então você apareceu e eu notei que eu só poderia ser pai se você fosse a mãe.

Escorreguei da poltrona bem naquele momento. Foi vergonhoso e acabei com o romance dos dois.

—Você está bem, Alminha? – Minha amiga logo se sensibilizou com minha situação caída de bunda no chão e veio a minha ajuda.

Ergui as mãos, sorri e neguei, afastadamente o mais respeitativamente que alguém pode se afastar com a bunda.

—Não estou aqui, podem continuar!

Ambos riram e em meio as risadas, eles bateram as bocas.

—Ai Deus. Muita informação. – Sussurrei, cá comigo mesma, desejando que o Harry Potter existisse e pudesse me aparatar naquele momento. Graças ao São Longuinho a pegação não evoluiu para algum nível mais erótico, meu casal de amigos lembraram da minha vergonhosa existência ali na sala e se separaram, mas não tanto. Ellie continuava no colo do namorado, com os braços rodeados no seu pescoço.

Senti-me vazia por um momento, sabendo que havia alguém que eu poderia estar junto naquele momento, exatamente assim, mas não poderia. Não enquanto nossa vida estivesse uma bagunça e ele me achava impotente, inocente e frágil para ajudá-lo.

O fato de ter sempre meu celular junto a mim e nenhuma vez ele ter apitado com ligação ou qualquer mensagem me deixava um tanto quanto deprimida. Muito provavelmente Jeff ainda não tinha voltado para meu apartamento e gostaria de estar lá quando ele o fizesse, só para vê-lo entrar em combustão. Cada vez mais eu sentia que estava sendo injetada com motivação. Eu resolveria isso. Então todos nós ficaríamos bem.

Respirei fundo, levantei-me e ajeitei minhas roupas (ou do Collin) e alinhei os ombros.

—Quando podemos pôr em prática o plano, Collin?

*~*~*

Ellie literalmente bateu o pé no chão e quis participar da “emoção”, mas seu namorado foi firme e disse um não que adestradores de cães teriam inveja.

—Mas...

—Não. – Curto e grosso.

—Você não me deixou nem...

—Não.

—Para com...

—Não.

Revirei os olhos.

—Eu...

—Não.

—Vou...

—Não.

—Poder...

—Não.

—Terminar...

—Nã... – Bati no seu ombro com toda minha força. – Outch!

Sorri para minha amiga.

—Obrigada, Alminha. – Mas o bico já estava instalado nos lábios da loira e não sairia tão cedo. – Você. – Apontou o dedo indicador para ele, cutucou-o nos flancos, com um olhar zangado. – Você é tão mandão, chato e nem sequer me deixou terminar uma fra...

—Não.

Pois bem, Collin tinha meu respeito, apesar dos pesares, ele foi corajoso suficiente para interromper minha amiga quando ela tinha um olhar furioso. Foi assim que ela acabou jogando um enfeite de mesa de centro na cabeça dele. (In)felizmente era leve suficiente para nem machucá-lo nem mesmo um pouco, o que seguiu um grito ainda mais raivoso de Ellie.

—Querida... Você pode ajudá-la a se vestir, tudo bem?

Ela ainda estava ofegante quando sumiu escandas a cima. Girei nos calcanhares até Collin, com meus olhos arregalados.

—Eu espero que você tenha um plano para salvar a si mesmo.

—Sexo de conciliação é o melhor. – Sorriu com um olhar sonhador e eu quis jogar o vaso de vidro nele e esse saberia que teria um efeito esperado. – Não tente me matar, você ainda precisa de mim.

Estreitei os olhos. Ele tinha razão, o maldito.

—Vai lá em cima e só volta quando estiver apropriada.

—Apropriada para quê? – Bufei, impaciente.

Ele sorriu e pareceu aterrorizante ao fazê-lo.

—Para entrar no Clube pela porta da frente.

*~*~*

Foi uma má ideia.

Ok, talvez tenha sido uma péssima ideia. Estava me equilibrando nos saltos enormes que Ellie tinha me emprestado, que me faziam sentir um jogador de basquete, um vestido colado, estampado de pele de onça rosa e cabelos presos em um rabo de cavalo alto. Altíssimo. Parecia o penteado que minha mãe fazia em mim e na Agatha quando éramos pequenas, o tal de coquinho. Enquanto eu segurava uma bolsa carteira que só cabia meu celular e uma nota de 50 emprestada pelo Collin.

Estava me sentindo ridícula e perfumada além da medida.

—Tente não tropeçar tanto, morena. – Falou no meu ouvido.

E por ainda não estar acostumada com aquilo eu saltei no meio da rua.

Uma risada não me fez sentir melhor nem um pouco.

—Lembre-me porque você não está ao meu lado, já que você já conhece esse lugar de cabo a rabo. – Murmurei com a cabeça para baixo, para que ele escutasse de onde estava o micro microfone na barra do meu sutiã.

—Já explicamos isso. – Suspirou, deixando que sua maravilhosa paciência trepidasse. – A maioria deles sabem quem eu sou, seria estranho e consequentemente suspeito aparecer do nada, com uma mulher no meu calcanhar.

Isso não me parecia estranho ou suspeito, mas já tínhamos discutido sobre e Collin ameaçou não me ajudar mais, então fiquei de bico calado.

—Ajeite a câmera, Alma. – Latiu.

Tropecei na calçada, mas por pouco não caio. Ah sim, esqueci de contar que o enfeite da xuxa do rabo de cavalo na verdade era uma microcâmera. E sim, eu estava me sentindo uma das panteras. E sim novamente, ninguém vai lembrar da japonesa-que-nem-sequer-sei-o-nome se eu matá-la discretamente e me por no lugar. Depois de tentar ajustar aquele aparato de um dos filmes do James Bond, me concentrei em não cair de cara no chão.

—Você irá passar direto na fila que está formada na frente da boate. – Instruiu-me.

Neguei com a cabeça fervorosamente e puxando um pouco a barra do meu sutiã, onde tinha um pequeno microfone, grunhi:

—Não vou furar fila, seu idiota. Não posso fazer isso. Imagina quanto tempo essas pessoas esperaram na porta? Tá maluco? E se uma delas decidir me atacar? Você não tinha dito que nós iríamos ao Clube, porque tô na frente desse cabaré? – Disse a última parte tão alto que atraí olhares alheios estranhos.

Quase vi os olhos de Collin revirarem do seu lugar de motorista no carro.

—Alma, você concordou em fazer o que eu diria.

Resmunguei baixinho, ajeitando mais uma vez meu vestido, mas ele teimava em subir pelas minhas coxas. Recusei-me a responder qualquer coisa, até porque não tinha segurança que ele iria me escutar mesmo, e estava parecendo o garotinho de The Middle com a cabeça baixa e falando aos sussurros.

—Fura. A. Fila.

Praguejei e furei a tal fila.

Poderia ter morrido com os olhares que recebi nas costas, mas me mantive firme e fui até o segurança na entrada do estabelecimento.

—Final da fila. – Ordenou, sem nem ao menos me olhar.

—Diz que está com o Clube.

—Hã... Hmm, licença. – Tentei sacudir a mão em sua direção, para chamar atenção. Ergueu o olhar, de má vontade, para mim, com uma impaciência notável e estalou os lábios, esperando que eu respondesse. – Na verdade eu estou com o...

—Obama?

—O quê? Não, claro que não.

—Com o Papa?

—Ah, bem que eu gostaria, simpatizo com o moço, mas não.

—Não me interessa com quem você está então, moça. – Olhou pelos meus ombros e gritou: – Próximo!

—Fala que está com o Jeremy Ferraro e que a vida breve, vida leve. – Grunhiu Collin, no meu ouvido. – E pelo amor de Deus, fala direito Alma, é a frase código para entrar. Se ele notar que algo está errado vai chamar os seguranças de lá de dentro.

Ajeitei os ombros, empinei os peitos e suguei o ar necessário. Eu posso fazer isso.

—Estou com Jeremy Ferraro. – Fui breve, mas me fiz ser ouvida. – E você deve saber como é... Vida breve, vida leve.

Era uma frase ridícula e eu esperava que todos soubessem disso. Mas fez com que o homem de terno preto justo erguesse uma das sobrancelhas falhas.

—O que disse?

—Isso que você ouviu. Estou com Jeremy Ferraro, tô com o Clube. E talvez o Obama e o Papa também, moço.

Pude ver ele engolir em seco e foi um sentimento maravilhoso. Fazer aquele homenzarrão temer nas próprias bases. Contive uma onda gritante sair pela minha boca e uma dança feat Galinha Pintadinha.

Ele saiu da minha frente rápido, não querendo mais me contrariar e não controlei um sorriso vitorioso ao passar.

—Você primeiro vai sentir o lugar. Sente no balcão do bar e espere o momento certo para agir.

Assenti, lembrando, tarde demais, que ele não iria entender muito bem o que estava fazendo. Pulei num banquinho giratório no bar e por pouco no tombo para trás e até mesmo Collin gargalhou no meu ouvido.

—O que vai querer? – O barman bateu no balcão e eu dei um pulo.

—Jesus, homem, não me assuste assim. – Grunhi com a mão no peito.

O homem, com um moicano e alargadores nas orelhas, sorriu divertido.

—Desculpe, querida. Vai querer algo? – Ergueu uma das sobrancelhas.

—Uma coca zero, por favor.

Ele ergueu a outra sobrancelha e depois de alguns segundos constrangedores, os quais ele aguardou um complemento, finalmente o barman concordou e deu meia volta.

—Uma coca zero? – Collin falou no meu ouvido.

—Fica quieto. – Ordenei e o homem sentada a dois bancos de distância me encarou

Depois de alguns minutos e alguns mililitros de coca dentro do meu corpo, estava começando a ficar entendiada.

—Collin, não posso agir agora? – Sussurrei quando notei que ninguém estava por perto.

—Você não me fez um relatório decente do lugar ainda.

Suspirei e olhei em volta.

—Há um cara muito suspeito perto de mim... – Pausa dramática. – Ele está comendo um hambúrguer com guardanapo. Quem faz isso, não é mesmo?

O barman me deu um olhar torto quando me viu tagarelando sozinha do meu banco.

Mas esqueci dos olhares tortos, da voz do homem no meu ouvido ou um futuro tombo no banquinho do bar quando meu celular vibrou na minha bolsa e eu já tinha um bom palpite para quem estava ligando.

Em breve trocarei a coca zero por um copo de vodka.


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Notas finais do capítulo

Aqui estamos nós.
Espero que para vocês 2016 seja maravilhoso. Com a pitada perfeita de desafio, bons e maus momentos. Também espero que não esteja tarde para desejar um feliz ano novo hahaha
EEE o que acharam da nova capa? Confesso que fiquei um tanto quanto apaixonada



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