Obrigado e Volte Sempre escrita por Loly Vieira


Capítulo 3
Entrando numa rotina (ou quase).




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–Preciso de uma ajudinha sua. – Seus olhos me fitaram quase desesperadamente.

Eu estava no meio do capítulo de O Lado Bom da Vida quando ele quase se debruçou no balcão na minha direção.

–O que é?

A presença dele já estava virando rotina. Aprendi a aturá-lo por osmose. Duas semanas que Jeremy vinha até o Café do Lewis disposto a tirar o estabelecimento do prejuízo, experimentando todo o cardápio por partes, com uma única exigência: eu o atendesse.

–Está vendo a garota atrás de mim? Com a blusa curta? – Ele mordeu o lábio inferior. Era engraçado vê-lo nervosinho.

–Com o top? Ah! A com cara de prostituta! – Sorri em confirmação.

E a culpa não era minha se a coitada tinha mesmo cara de garota de programa. Os cabelos loiros extremamente claros em contraste com seus lábios grossos pintados com rosa choque. Ela estava tão deslocada sentada no Café quanto um rockeiro numa aula de tricô.

–Exatamente. É minha prima. – Minhas bochechas queimaram.

–Opa...

–Olha... Preciso que saia de trás do balcão e seja uma atriz bem convincente. – Continuou falando baixo.

–E porque, diabos, eu faria isso?

–Porque o amigo que está lhe dando uma boa gorjeta tá pedindo com jeitinho. – E soou bem convincente ao dizer isso. Rolei os olhos. – Minha prima é apenas uma forma da minha mãe ficar de olho em como estão as coisas para o meu lado. Ela se preocupa comigo e com o Sam.

–Sua família não mora no interior?

–Exatamente. Mas tem a Bárbara, que vez ou outra está aqui, sendo a porra da pedra no meu sapato. Minha mãe acredita que só poderá ficar tranquila se eu arranjar uma mulher decente na minha vida.

–E você quer que eu faça esse papel? – Gargalhei.

–Por favor. – Jeremy se inclinou ainda mais na minha direção. Quem tava começando a ficar nervosa sou eu. – Só um abraço, uma apresentação e um sorriso convincente que ela vai pra esquina.

–Você não tem outra pessoa para te socorrer, não? Uma que de preferência não esteja trabalhando?

–Seu trabalho nunca foi um problema para nós dois. E eu não tenho amigas mulheres.

–Como não tem?

–Homens e mulheres não podem ser amigos. - Falou assim, na lata.

–Claro que podem! Isso é por causa de sexo? É isso? Ou porque atrás de toda amizade há segundas intensões?

–Você é minha única amiga, tá legal? - Ele queria ser objetivo. - Pode fazer isso pra mim ou não?

Revirei os olhos mais uma vez. Nem eu mesma acreditei quando me levantei e fui até ele do outro lado do balcão.

Ellie estava atendendo uma mesa quando parou para olhar a cena: Jeremy abraçando-me sufocadamente, inebriando-me com aquele cheiro de perfume masculino e cigarro que pareciam que nunca o abandonava. Seus olhos miraram os meus rapidamente quando nos afastamos, e, se havia uma coisa que eu achava bonita no cara a minha frente, eram seus olhos verdes acastanhados, em seguida de seus cabelos negros sempre bagunçados. Tão Jeff Buckley...

Seguiu em direção a mesa com a mão na minha cintura (REPLAY NESSA PARTE: mão na minha cintura).

Senti-me desconfortável com sua aproximação. Minhas mãos suaram, meus óculos voltaram a escorregar pelo nariz e minha mente borbulhava com perguntas retóricas sobre eu ser uma ‘mulher decente na vida dele’.

O que eu achei muito engraçado, já que nem minha mãe me considerava isso.

Mas ali estava ele, com sua mão pousada na minha cintura como se fosse um ato simples, comum entre nós dois.

–Bárbara... – Limpou a garganta. – Essa é Alma. Alma, essa é Bárbara, minha prima.

Estava pronta para beijá-la no rosto cordialmente, quando ela me estendeu sua mão com um sorrisinho educado por obrigação.

Apertei-a ainda nervosa.

–Prazer.

Ela não me respondeu e puxou o cardápio ainda sentada.

–O que tem de bom? Tô morrendo de fome.

–Hã... – Dois passos distante de Jeremy e eu consegui pensar melhor. – O Jeremy sabe o cardápio de cabo a rabo, pode perguntar a ele.

–Eu quero comer. – Falou lentamente como se tentasse se comunicar com uma deficiente auditiva.

–E eu irei te ajudar nesse quesito. – Respondi ainda com um sorriso no rosto, mais de mau agrado agora.

–Podemos pedir muffins. – Jeremy puxou o lápis de trás da minha orelha e me entregou. – E chocolates quentes. O que acha? – Ele lançou um olhar para mim. Perdão? Sugestão? Divertimento com a minha cara? Não sei.

–Parece óti...

–Não. – Ela fez uma careta de desgosto. – Odeio chocolate.

Quem, em sã consciência, odiava chocolate?

Não consegui conter a careta de descrença. Jeremy pisou no meu pé para que eu compusesse minha postura.

–Tudo bem... – Fulminei-o com o olhar. – Temos capuccinos, se preferir.

–Estou de re-gi-me. – Odiava gente que falava pausadamente por puro deboche.

–Que. Bo-om. – Resmunguei baixo e mais uma vez meus alls stars foram pisoteados. Grunhi. – Café descafeinado. Temos isso também.

–Esse aí. Pronto. – Empurrou-me o cardápio. – E você, priminho, vai sentar não?

Minha boca escancarou. Mas o quê?

Essa garota tava querendo pagar o lanche, é isso? Ou ela estava somente lambendo os beiços por vontade?

–Claro. Claro. – Balancei a cabeça, ainda atordoada. – Vou trazer os pedidos.

E fugi o mais rápido que consegui.

–Não acredito que você vai deixar aquelazinha com o deus grego. – Ellie me deu uma bronca.

–O que você queria que eu fizesse, hein? – Tratei de puxar a bandeja e preenchê-la com os pedidos. – Só estou quebrando um galho para o Jeff.

–Jeff? – Engasgou-se a loira.

Estreitei o olhar em sua direção.

–Você já viu que os cabelos dele são tão bagunçados quanto os do Jeff Buckley? – Corei ao admitir isso.

Ellie sorriu toda cheia de segundas intenções.

–Nem sei quem é esse tal Jeff Buckley, mas deve ser mó gato.

–É um cantor. – Coloquei, por fim, os muffins na bandeja. – Você pode levar para mim? Tenho que dar uma conferida no caixa.

–Alma! – Exasperou. – Você tem que defender seu homem.

–Ele não é meu homem!

–Só porque você ainda não esqueceu ainda o nerd do seu ex, não quer dizer que o bonitinho vai te esperar a vida toda. Aproveita que ele tá te dando mole.

Bufei de raiva e equilibrei a maldita bandeja nas mãos.

–Que demora, hein queridinha? – Mordi o lábio inferior, engolindo a linha de xingamentos para a garota.

–Bárbara... – repreendeu Jeff de olhos fechados.

–Eu só falo isso para seu bem, ok? – Ela sorriu para mim. Pude ver veneno irradiando de seus lábios.

Alguém me segura porque eu ia dar na cara dessa garota.

–Temos caixinha de sugestões no balcão. – Sorri o mais falsamente que conseguia para ela. – Se você souber escrever, lógico.

Sua boca se abriu de surpresa.

–Alma... – Jeremy me lançou um olhar desesperado.

–Eu falo com seu gerente, garota! – Ergueu uma oitava a voz.

–Você vai precisar dormir com ele antes disso? Só curiosidade. – Sibilei entre dentes, as mãos apoiadas na mesa fuzilando-a sem pudor nenhum.

A tal Bárbara adquiriu uma coloração vermelha viva. Não tão diferente de como eu deveria estar.

Passaram-se poucos segundos de silêncio atormentador quando ela gargalhou estrondosamente.

–Jeremy, primo... – Ela sorriu para mim e depois para ele. – Essa está totalmente aprovada.

Ele soltou um suspiro aliviado e eu fiquei sem entender nada.

A garota me estendeu a mão, dando-me um sorriso bem mais simpático.

–Será muito bem vinda na nossa casa para as férias.

Assustada, olhei para Jeremy, que sustentava o sorriso de meia boca.

–Sem problemas. O Jeremy já me contou que você tem problemas de relacionamento com as pessoas.

–Contou, é? – Sorri irônica.

–Mas você se sentirá em casa. Será um prazer te receber Alma, fico feliz que meu primo finalmente tenha achado alguém com personalidade.

Engoli em seco. Eu poderia negar tudo agora e cair fora o mais rápido possível, mas algo no fundo da minha mente queria saber até onde isso ia parar.

–Obrigada. Será um prazer estar lá.


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Notas finais do capítulo

Ai caramba.
Acho que esse capítulo foi refeito mais de 10 vezes e por isso que demorou tanto. Vocês me desculpam se eu oferecer balinha? ):
Podem conversar comigo, ok? Adoro um bom papo.
Beijo e queijo.