Voltei ao quarto ofegante e com as faces rubras, tanto pelo caminho percorrido às pressas para minha cama, quanto pela presença de Draco, ainda impregnada em mim, sob minha pele e em meus pensamentos.

Havíamos passado cerca de uma hora nos jardins, observando as fontes, as montanhas que cercavam a Academia, conversando e rindo. E, claro, nos beijando.

Só pensar nisso me deixava com calor.

A pior parte da noite, porém, veio-me à memória quase imediatamente, apagando as boas lembranças, momentaneamente, e mudando meu humor.

Houve uma parte da conversa que não foi nada agradável. A parte em que decidimos manter nosso relacionamento em segredo.

Se é que havia realmente algum relacionamento.

Olhei-me no espelho antes de deitar. Cabelos embaraçados, olhos brilhantes demais e bochechas rosadas demais me encaram de volta. Com certeza foi uma noite ótima, tirando a parte ruim, pensei ironicamente.

Fui deitar, antes que acabasse me atrasando para as aulas na manhã seguinte, que já estava assustadoramente próxima.

Demorei a pegar no sono. Não conseguia desligar minha mente que trabalhava a toda velocidade, passando de um pensamento a outro, analisando lembranças, boas e más, e assim garantindo uma dor de cabeça insuportável.

O que certamente não me ajudaria a dormir.

Lembrava-me agora de meu padrinho, com seus cabelos louros e seus olhos castanhos calorosos. Certamente um calor falso, agora percebia. Ressentia-me dele agora que sabia de toda a verdade.

Perguntava a mim mesma, com raiva, o porquê do destino ter posto justo ele como meu padrinho. Será que não bastava uma profecia que dizia que era eu a que estava destinada a matá-lo?

Aliás, será que meus pais, quando o escolheram para o “cargo” de meu padrinho, sabiam do amor platônico dele por minha mãe? Se sabiam, porque mesmo assim permitiram que ele fizesse parte da família? E se não sabiam, Bohrstrueid fingira-se de amigo para conquistar sua confiança dessa maneira?

Pensar nessas coisas fez-me lembrar de que o pai de Potter, Tiago, também era meu padrinho e sua mãe, Lílian, era minha madrinha.

Isso só me fazia questionar ainda mais as coisas. E se os Potter não tivessem morrido pelas mãos de Voldemort, ou pelas mãos de qualquer outro, meu pai ainda

estaria vivo? As duas famílias, Potter e Black, seriam próximas? Iriam se reunir todos os finais de semana? Harry e eu seríamos amigos afinal, quase parentes de sangue devido à proximidade?

Se. Se. Se. Palavra mais imbecil, eu estava indignada, embora não soubesse bem o porquê.

Só sei que, ao lembrar dos Potter, meus pensamentos voltaram-se para pensamentos mais sombrios.

E se eu morresse? Bohrstrueid estava atrás de mim e ainda havia o Torneio Tribruxo assomando, misterioso e iminente, em meu futuro próximo.

Eu estava prestes a entrar em pânico. Sentia isso em meu coração. Em minha respiração. Sentia o medo mais puro, verdadeiro e primitivo dos seres humanos, trouxas e bruxos, e de todos os outros seres. O medo da morte.

Mas ao invés de lutar contra o sentimento, como meus instintos me mandavam fazer, eu o aceitei em mim, se não de bom grado, apenas conformada com a situação. Era apenas inevitável.

Além do mais, eu estava curiosa para saber por quanto tempo suportaria esse peso em meu peito sem sucumbir. Ou se essa aceitação faria com que eu me tornasse imune a ele a partir de agora.

E foi em meio a esse turbilhão de pensamentos que adormeci, quase ao raiar do dia. Na hora exata em que a noite torna-se ainda mais sombria, antes do sol nascer.