Nas Asas Da Escuridão escrita por Nyx


Capítulo 3
Desconcertante


Notas iniciais do capítulo

Camilla está encantada com Gabriel, mas já percebeu que ele esconde algo. O que será?



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Ele estava me esperando na varanda sentado numa rede. Ele tinha colocado tênis e boné. Gato! Eu também tinha colocado uma calça de moletom e blusa. Tinha colocado tênis e prendido o cabelo num rabo de cavalo.

-Vamos? – perguntei. Quanto antes começasse, mais cedo ia acabar.

-Vamos. Por que prendeu seu cabelo?

-O quê?- Será que eu tinha ouvido bem?

-Seu cabelo fica mais bonito solto.

-Não estava bonito àquela hora. Tem espelho no banheiro. – respondi tentando não dar importância a este outro comentário sobre minha pessoa.

-Tinha um ar bagunçado. Acho que combina com você. – ele disse enquanto íamos atravessando o jardim cheio de rosas da vovó.

Achei melhor cortar o mal pela raiz.

-Se você for ficar fazendo comentários do meu vestuário ou minha aparência vou voltar para casa.

Ele não pareceu ficar abalado ou qualquer coisa do gênero.

-Desculpe. Geralmente sou mais discreto, mas não sei por que quando se trata de você as palavras simplesmente saem.

Novamente meu rosto corou.

-Minha intenção não é deixá-la embaraçada. Vou tentar me controlar.

Ele parecia sincero.

Assenti e coloquei-me no caminho que eu conhecia muito bem. Era uma trilha que ficava do lado da casa, que iria dar numa cachoeira. Ela não era muito grande, mas era bonita. Seria um lugar legal para Gabriel conhecer. Afinal, ali não existiam muitas opções de passeios. Se fôssemos ao centro de Montes poderíamos ir ao boliche.

Andamos lado a lado observando tudo, ou melhor, as árvores. A natureza era algo maravilhoso quando observada bem de perto. As borboletas, os pássaros, o dia, tudo. Tudo lindo. Céu lindo. Verde lindo. Gabriel lindo. Ai meu Deus. Ele andava em silêncio. Isso era pior. Era constrangedor. Resolvi quebrar o gelo.

-Então, o que faz aqui com minha avó.

Ele me olhou e respondeu muito tranquilo:

-Estou dando um tempo.

-Como assim? Tempo de alguma namorada? – O que eu estava fazendo? Isso era só para perguntar lá pela décima vez.

Ele sorriu e colocou as mãos no bolso da calça.

-Digamos que me meti numa confusão muito grande.

O que poderia ser? Ele não tinha cara de traficante, nem de assassino... Mas como diz o velho ditado: quem vê cara não vê coração.

-E o que foi? – perguntei timidamente, sem saber se ele me daria a resposta.

-Coisas de trabalho. Mas não gostaria de falar sobre isso. Eu só quero esquecer por um tempo...

- Me desculpe. Eu não queria ser intrometida. –eu realmente sentia.

-Está tudo bem. Um dia te conto. Só não quero lembrar agora. –ele deu um sorriso triste.

-Mas não seria melhor tentar desabafar?

-Não, acho que não seria bom. - ele chutou uma pedrinha que estava no caminho.

-Tudo bem. –Resolvi não insistir mais.

Já estávamos quase chegando à cachoeira. Passamos por um portão de madeira onde estava escrito “Cachoeira”. Sentamos numa pedra grande que ficava em frente à cachoeira. Eu não queria perguntar mais nada. Estava dando um tempo a ele.

-Realmente é bonito aqui. –ele disse olhando para a cachoeira. –É calmo e transmite paz.

-É verdade. Toda vez que venho pra casa da vovó passo muito tempo aqui. Pensando na vida.

Ele ficou em silêncio. Duraram séculos antes de ele me fazer outra pergunta.

-Você está com problemas?

Olhei pra ele. Porque será que tinha me perguntado aquilo? Será que eu parecia alguém com problemas?

-Não. Nada que realmente valha a pena falar.

Olhei para o chão. Daniel valia a pena sim como pessoa. Não mais para uma garota que não o amava. Ele merecia tudo de bom, tudo de melhor que a vida pudesse lhe oferecer. Eu me sentia mal por aquilo. Gostaria que tudo fosse como antes, mas não era. Suspirei.

Do nada ele me abraçou. Por um momento pensei em me soltar, mas foi uma sensação muito boa. Ficamos assim por alguns minutos. Era bom. De repente ele me soltou e se levantou. Fiquei olhando pra ele sem entender nada.

-Obrigado. –ele se virou para a cachoeira e me fez outra pergunta.

-E o seu problema-não problema? Quer desabafar?

O quê? Como eu ia contar pra ele?

-Pode confiar em mim. Sou um ótimo ouvinte.

Deve ser um ótimo tudo.

Abracei meus joelhos e olhei para o chão. Quando me dei conta, já estava falando.

- Bem, eu tenho um, ou melhor, tinha um namorado.

Ele me olhou meio confuso.

-Espera aí. Você tem ou tinha um namorado?

-Da minha parte não tenho mais. Mas da parte dele... Acho que ele não entendeu.

Ele sentou novamente ao meu lado e não disse nada.

-A gente namorou por dois anos, mas pra mim não era a mesma coisa. Eu tenho um carinho muito grande por ele, mas não quero namorá-lo mais. Sabe quando falta algo? É como se ele fosse apenas um adorno que eu tinha que ter por obrigação. E não é só ele. Sou eu também. Eu ultimamente tenho sentido como se algo fosse acontecer. Não sei se é em relação ao Daniel ou a minha vida. Tenho sentido como se minha existência fosse acabar a qualquer momento. Sinto-me estranha e confusa.

Tomei fôlego e olhei para ele. Ele me olhava com olhar preocupado.

-O que foi? Sou uma tola mesmo. –abaixei minha cabeça nos joelhos.

-Claro que não. Você está confusa. É normal. Tem certeza de que não gosta mais do seu namorado?

-Não. Pra mim está muito claro. Eu sinto por ele amizade. Meu coração palpita muito mais com você do que alguma vez palpitou com ele.

Opa! Eu e minha boca grande. Senti meu rosto corar. Essa minha mania de falar primeiro e pensar depois.

Ouvi uma risada.

-Seu coração está palpitando agora?

-Um pouco. Mas não fique convencido. Deve ser porque você é bonitinho.

-Me acha bonito também?

-Acho. Algum problema com isso?

-Não. É recíproco.

Bem, era melhor voltarmos. Se bem me conhecia e do pouco que conheci dele, eu sabia onde aquela conversa ia terminar.

-Acho melhor voltarmos. Ainda temos que nos virar com o almoço. –Dizendo isso me levantei. Ele fez o mesmo.

-Melhor você saber cozinhar porque nessa faculdade fui reprovada. –disse a ele. E não era mentira. Eu só sabia fazer ovo e arroz.

-Pode deixar comigo. Você vai experimentar as maravilhas culinárias deste chef aqui.

-Espero que seja tudo isso que está me oferecendo. –sorri.

-Garanto que mal não vai passar.

Fizemos o caminho de volta em silêncio. Só que agora era diferente. Era um silêncio confortador, de dois quase amigos. Pelo menos da minha parte era o início de uma amizade. Ainda tinha muitas dúvidas em relação a ele. Mas isso se resolveria com o tempo. Eu ia ficar pelo menos duas semanas lá. Tempo suficiente para nos conhecermos melhor.

Entramos em casa e vi que vovó já tinha voltado. O almoço já estava à mesa.

–Vovó?

–Oi queridos. O almoço já está pronto.

–Não ia visitar sua amiga doente? –perguntei.

–Fui, meu amor. Mas ela voltou para o hospital.

–Oh vovó. Sinto muito. Conheço essa sua amiga?

–Ah não. Ela não morava aqui. Tem uns dois meses que veio para cá. Eu a conheço há muitos anos. Estudamos juntas.

–O que ela tem?

–Ela teve uma queda muito feia da escada da casa dela e fraturou as duas pernas.

–Nossa vovó. Coitada. – que coisa horrível!

–É sim minha filha. Mas amanhã voltarei para visita-la. E vocês? Se divertiram hoje?

–Acho que sim. –Gabriel respondeu.

–Que bom. Fico feliz que estejam ficando amigos.

–Pena a senhora ter voltado antes. –Lamentei. –Por que Gabriel me ofereceu o manjar dos deuses. - olhei para ele e ri.

Minha avó olhou assustada de repente para nós dois.

Não entendi a reação dela.

–Eu ia fazer o almoço... – Gabriel explicou.

–Ah sim... –ela respondeu.

Não entendi muito bem a reação dela. O que ela tinha pensado? Que por acaso manjar dos deuses queria dizer alguma coisa a mais. Não consegui reprimir o riso diante deste pensamento.

–Qual a graça, meu bem? –Minha avó quis saber.

–Nada! –Me apressei em dizer. –Pensamentos tolos apenas.

–Bem, meus dotes culinários vão ter que ficar para outro dia, não é mesmo? –Gabriel piscou para mim.

Meu coração acelerou. Que coisa! Isso ia virar hábito?

–Vão lavar as mãos para podermos almoçar. - minha avó ordenou.

Obedecemos e logo depois fomos almoçar. Minhas férias começaram bem. Muito bem.....


À tarde resolvi ficar no meu quarto e ler um pouco. Eu adorava ler. Principalmente no silêncio. Passei a tarde toda trancada no meu quarto. O bom da vovó era que ela não me incomodava. Eu podia fazer tudo o que eu quisesse que ela respeitava. Também não ouvi nada do Gabriel dentro de casa. Não que eu estivesse prestando atenção, mas o silêncio era absoluto. Quando dei por mim, eram quase seis da tarde. Minha barriga roncava desesperadamente.

Fui até a cozinha e peguei um iogurte na geladeira e pedaços de pão de milho com requeijão. Será que estava passando algum filme legal na tv?

Quando cheguei a sala, pude ver que Gabriel estava cochilando no sofá. Resolvi não incomodar. Me virei e sentei na rede na varanda.

Como alguém podia ser tão bonitinho dormindo? Eu não devia estar no meu juízo perfeito. Tinha conhecido o cara ontem. Será que era isso amor à primeira vista? Não!!!! Que loucura. Era só a situação que estava me fazendo ficar deste jeito. De férias, sozinha, numa casa, com um cara legal, lindo e blá, blá, blá. E outra: cadê minha avó que de repente desaparecia e me deixava sozinha com ele?

Será que ela queria dar uma de cupido?

Acho que não!

Fiquei olhando para o céu enquanto escurecia. Daniel me voltou à mente. Eu realmente não queria mais ficar com ele. A minha decisão estava tomada. Eu iria voltar destas pequenas férias e iria comunicar minha decisão. E ele ia ter que entender.

Vi minha avó chegando no carro dela. Ela estava com muitas sacolas. Devia ter ido até o mercado. Fui ajuda-la.

–Porque não me chamou para ir com a senhora? – indaguei.

–Ah minha querida, você estava tão absorta na sua leitura que não quis incomodar. Como o Gabriel ficou aqui para tomar conta de você, sai tranquilamente.

–Tomar conta de mim? – Ora essa! E eu era criança agora? Com 17 anos nas costas?

–Vovó! Sou bem grandinha e sei tomar conta de mim.

–Os tempos são outros minha querida! Não é bom uma mocinha como você ficar sozinha em casa. Não assiste aos noticiários???

–Ah tá! E deixar sua neta com um completo estranho sozinha em casa pode! – questionei.

–Gabriel é de minha inteira confiança. Acha mesmo que se não o conhecesse o suficiente, o deixaria aqui com você?

Coloquei as compras na mesa da cozinha e me sentei.

–Eu sei vovó. Só que eu não o conheço. E vai demorar um pouco para confiar nele assim como a senhora confia.

–Tudo ao seu tempo minha filha. Agora me deixe fazer o jantar. Você viu Gabriel?

–Ele estava cochilando no sofá. Deve estar lá ainda.

Neste momento minha avó deixou tudo na cozinha e saiu chamando por ele.

–Gabriel!

Nenhuma resposta.

–Gabriel!

Minha avó foi até o quarto dele e abriu a porta. O quarto estava vazio. Vi que ela começou a ficar nervosa.

–Calma vovó. Ele deve ter ido dar uma volta.

–Não minha filha. Ele é minha responsabilidade. Ele não ia sair sem me avisar.

E mais essa! Vovó preocupada com ele exageradamente. Meu sinal de alerta piscou naquele momento. Eles não estavam me contando tudo. Estavam escondendo algo, e dos grandes.

–Mas essa pessoa não carrega celular?- perguntei.

–Ele não te um. Ele não precisa.

–Como assim, não precisa? Todo mundo precisa. Se ele tivesse um neste exato momento saberíamos onde ele está e...

De repente paro atônita. Vejo Gabriel caído nos fundos da casa, perto de uma árvore.

Corremos em sua direção.

–Gabriel, Gabriel, acorda. – Tentei sacudi-lo pelos ombros.

–Eu sabia que algo tinha acontecido. Rápido, Camilla. Pegue a minha caixa de Primeiros Socorros na cabeceira da minha cama.

Entrei correndo na casa. O quarto da vovó nunca pareceu tão longe. Peguei a caixa e fui correndo de volta aos fundos da casa.

Vovó pegou a caixa e pegou um vidrinho vermelho. Aquilo não era um remédio convencional.

–O que é isso?

–É um xarope.

–Xarope? Nunca vi nada parecido.

–Eu que fiz.

Ela tirou a tampa e derramou direto na boca dele. Como por mágica, Gabriel começou a tossir.

–Gabriel, o que aconteceu???- me ajoelhei ao seu lado e coloquei sua cabeça no meu colo.

–Eu não sei. –Ele me respondeu meio perturbado.


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Notas finais do capítulo

Muitos mistérios ainda estão por vir....