A Lágrima Escarlate escrita por SorahKetsu


Capítulo 16
As férias mais longas


Notas iniciais do capítulo

Não gosto muito desse cap.



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Os dias seguintes mostrar-se-iam longos, porém encorajadores. Enquanto Sabrina pensava no quanto se sentia bem estando na Ilha Eid, Mirian se convencia cada vez mais que não queria partir. Ficava mais amiga de Nicka, e todos que ela pudesse querer estar perto, estavam ali. Os dias eram repletos de ação, e uma semana nunca era igual à outra. Tinha um local pra dormir e já nem sentia tanta falta da Internet, quanto à meses atrás. Sorah ainda não havia lhes dito sobre o que Belthor pedira para contar às guardiãs. Talvez fosse confundi-las um pouco. Pensar se quer mesmo voltar pra casa, a partir do momento em que surge uma possível oportunidade para que isso aconteça, é totalmente diferente de não ter mais esperanças de voltar. E este segundo modo é a forma com a qual vêm pensando ultimamente.

A semana demorou a passar. Elas perderam a noção do tempo. E só souberam que os sete dias ficaram para trás quando acordaram cedo demais com o barulho dos lifings acomodando-se nas arquibancadas, já lotadas bem cedo. Sorah ia até lá, ver a luta, mesmo sem se importar muito com os lutadores, uma vez que nem mesmo conferiu seus nomes. No entanto, alguém bateu à porta assim que despertaram. Quem batera, não esperou ser convidado, e puxou a maçaneta para abrir caminho e entrar.

Era aquele mesmo vulto tão conhecido. Belthor, novamente sozinho, com sua máscara prata e as longas vestes negras, cobrindo o corpo por completo. Sabrina não pode deixar escapar um grito abafado de susto, já que mal se lembrava da aparência do guerreiro de Yume.

- Preciso falar com as guardiãs. – anunciou ele sem se dirigir diretamente à uma pessoa, já que não sabia muito bem quem estava no aposento. – Mas como você sempre ás segue, venha também. Chame todos os demais. – desta vez, falou mirando Sorah, assim que a viu.

Ele fechou a porta e seus passos ainda foram ouvidos apressados no corredor.

- Sabe sobre o que ele quer falar?

Só então Sorah se lembrou do que ele pediu que conversasse sobre com Sabrina e Mirian.

- Ele pediu pra que eu perguntasse a vocês… - a lifing fez força pra se lembrar - Se querem voltar pra casa. Acho que é isso.

E se levantou, sem dar importância para o que havia dito. Mal sabia ela o que se passou na cabeça de Sabrina naquele momento. Ficara branca de repente, e suava frio. Tantas possibilidades lhe vieram à cabeça… Reencontrar Lia podia significar nunca mais ver Dart, nunca mais estar na Ilha Eid, no único lugar à que sabe que realmente pertence. Voltar? E perder Nicka, perder tudo que conquistou? Nunca mais lutar pela lágrima e por todos que ama? Quem lutaria por ela? Quem a substituiria? Será que encontraram uma segunda humana com poderes e descobriram que ela, na verdade, não é uma guardiã?

Sabrina engoliu seco, sentido suas entranhas darem uma cambalhota. Seguiu Sorah pela porta, sem pensar direito em mais nada. Mal notou quando chegou à porta dos meninos e estes conversaram sobre algo com Sorah, que ela não prestou atenção. Logo, o grupo estava caminhando novamente pela masmorra, até chegar no próximo quarto conhecido. Só voltou a prestar atenção no que acontecia à sua volta quando encontrou Mirian. E também unicamente porque ela achou a expressão de Sabrina estranha demais e a cutucara algumas vezes pra tentar tirá-la do transe em que parecia estar.

- O que aconteceu? Parece que viu um fantasma… - comentou Mirian.

- Nós vamos falar com… Belthor…

- Sim, e daí?

- Ele pediu pra Sorah nos dizer… nos perguntar… - corrigiu embolando as palavras. – Se queremos… voltar.

- Voltar? Voltar pra onde?

Já estava no pé da escada externa quando Sabrina conseguiu completar.

- Pra casa… Pro nosso mundo.

A mesma expressão de pânico tomou conta de Mirian ao ouvir essas palavras. A mesma confusão, o mesmo olhar. A mesma dúvida. Medo, pressão. Queria ter um tempo pra pensar, queria não ter que responder essa pergunta. Desejou que não tivesse essa opção. Que fosse obrigada a ficar na Ilha Eid, e não o poder de escolher entre ela e seu mundo. Se é que aquele ainda era seu mundo.

Belthor estava lá fora, esperando pelo grupo. O vento que bateu naquele momento esvoaçou suas longas vestes. Ele permaneceu parado observando-os alguns metros de distância.

- Por favor, me sigam. – pediu ele, seguindo a mesma direção de onde Dart fora uma semana atrás para procurar por Sorah.

Vários monstros ainda chegavam e a entrada do estádio ficara mais lotada do que nunca. Estava difícil caminhar por ali. Quando finalmente se desvencilharam da multidão, já estavam definitivamente indo para o mesmo lugar onde Sorah encontrou-se com Belthor.

Pararam na margem da imensa cratera, onde Hebel quase caiu, sem vê-la a tempo. Seu nariz ainda tinha a grande gaze humilhante cobrindo-o.

- Foi aqui… uns duzentos e cinqüenta anos atrás… - começou Belthor nostálgico. – a última batalha da última guerra de Yume…

Sabrina deu uma boa olhada para o imenso buraco à sua frente. Era o local onde a mayle morrera. E gerara uma grande explosão, abrindo a cratera ao seu redor.

Hebel notou que Belthor o seguia com o olhar. Tratou de se apresentar imediatamente, antes que ele suspeitasse dele.

- Por que nos trouxe aqui? – perguntou Sorah, tentando poupar-se de uma longa conversa.

Belthor virou-se para ela. Mesmo sob a máscara, era notável o tom agressivo e acusador. Em seguida, dirigiu-se tão somente à Sabrina e Mirian.

- Eu posso fazê-las voltar pra casa.

As tão temíveis palavras que nenhuma delas queria ouvir.

- Eu não quero voltar. – Mirian foi a primeira a se pronunciar.

- Nem eu. – Sabrina enchera-se de coragem com a atitude da amiga.

Belthor ficou alguns momentos parado. Todos ao redor desejaram saber qual face se construía em seu rosto coberto.

- Vocês poderão voltar pra cá quando quiserem.

Uma chama curta de esperança nasceu nos coraçõezinhos apertados das meninas.

- Quando… quisermos? Mas… Por que fez isso conosco? Trouxe-nos aqui e nos prendeu, mesmo havendo uma forma pra irmos e voltarmos…

- Se eu tivesse lhes dado a oportunidade de voltar assim que chegaram, será que um dia colocariam os pés nesta ilha novamente?

Sabrina não precisou pensar muito para concluir que se pudesse, teria ido para casa nas primeiras horas em que pisara naquele mundo. Foi realmente preciso estar ali tanto tempo para convencer-se de que aquele lugar era sua verdadeira casa.

- Eu esperei que me dissessem que não queria mais ir para suas casas, nos seus mundos. Desta forma, me asseguraria de que sentiriam falta daqui e voltariam. Sabe, ainda há muita coisa pra ser feita. Tanto por aqui quanto por lá.

- O que quer dizer?

- Naquele mundo… existe um perigo muito maior que aqui. Por hora, não se preocupem com isso. A única coisa com a qual devem se preocupar no momento é com o fato de que repetiram o ano na escola, receio. E o ano letivo já começou. Acho que terão alguns problemas com o estudo. Mas tenho certeza de que ainda conseguirão se matricular.

- E… como vão as coisas por lá?

Sabrina mal pode se conter em esperar uma resposta. Estava tão curiosa com o que haviam dito sobre seu desaparecimento que cada segundo aguardando as palavras de Belthor a castigavam.

- Lia está muito preocupada. Eu disse a ela que você foi conhecer um parente seu… ele havia sido identificado, mas estava bem doente. Você precisava viajar imediatamente. Não posso dizer que ela aceitou bem… - lamentou-se Belthor. – No início correu tudo bem, mas obviamente, se ele estava quase morrendo, não podia durar mais tanto tempo quando você ficou longe. Acabei convencendo-a de que você estava desaparecida até então. E… bem… ela também não aceitou isso… como se era esperado.

- E quanto aos meus empregados? E meu tutor?

Belthor riu um pouco e olhou nos olhinhos curiosos de Mirian.

- Foi realmente muito fácil convencê-los de que você quis fazer umas férias adiantadas na Disney, e que passaria uma longa temporada por lá.

- Disney? – Mirian torceu o nariz. – Já fui pra lá oito vezes!

As pessoas ao redor, provindas da terra onde pisavam, não entendiam nada do que os três conversavam, e também não faziam questão.

- Ainda não posso levá-las. Antes de tudo, tentem aprender um pouco da matéria do ano. Estamos em fevereiro, quem sabe ainda possam se recuperar.

- Mas como vamos estudar?

Belthor não respondeu. Tirou uma sacola grande de dentro das vestes e estendeu às duas. Apenas de abri-las um pouco, Mirian confirmou serem todos livros novos, muito bem conhecidos pelas duas. Matemática, Ciências… Estava tudo ali.

- Ah, e tentem ensinar alguma coisa pra esses aqui. – ainda pediu Belthor antes de ir, referindo-se a Nicka, Hebel, Sorah e Dart. Estes ainda estavam bem distantes do assunto. – Bom retorno às aulas.

Antes de ele sumir completamente, Sabrina lembrou-se de uma última pergunta.

- BELTHOR, ESPERE! O que aconteceu com Roberto e Viviane, meus professores?

- Seus professores? Nada que eu saiba… Ah, sim… - ele se lembrou - Foi à muito tempo… Nós os encontramos desmaiados. Não foi intencional, mas eu os teletransportei junto com vocês naquele dia. Afinal… eles estavam na mesma sala que vocês. Como eu ia perceber? Deu o maior problema. Mas consegui trazê-los de volta antes que notassem onde estavam. Ainda dão aula na sua escola e estão bem vivos por sorte. Mas… alguma coisa me intriga neles… Não sei, é apenas uma suposição. O que quero dizer é… eles se transportaram pra cá um pouco antes de vocês. Eu cheguei a pensar que não fui eu quem os trouxe. De qualquer forma, fiquem de olho.

Sabrina agradeceu e ele voltou a seguir caminho sem parar mais, correndo até sumir no meio da mata, como havia feito tantas outras diversas vezes.

- Não acredito que repeti o ano!

- Sabrina, a gente foi na escola dois meses e meio.

- Grande coisa… Não quero estudar com os pirralhos da sexta.

- Você nunca estudou de jeito nenhum mesmo…

Quando notaram, já estavam bem perto da masmorra. E os monstros já haviam, em sua maioria, deixado o estádio. Restavam apenas alguns que também já iam embora. A luta demorara muito pouco tempo pelo que se podia notar.

Hebel se adiantou assim que viu a Juíza saindo do estádio e correu até ela. Não perguntou sobre, apesar de estranhar o nervosismo e a cara de choro da mulher.

- A luta já acabou?

- Ta brincando? Não durou nem cinco segundos!

- E quem venceu?

- Kiev e Orts… Foi horrível… Horrível… Kiev não soltou a garganta de Rest até que os ossos de seu pescoço moessem dentro dele… Horrível… os gritos…

Até mesmo para um lifing, parecia que a crueldade havia sido demais naquela luta tão desonesta. Tanto, que Hebel sentiu vontade de perder a luta contra Sorah daqui a alguns dias para não correr o risco de lutar com eles. A expressão de choro da juíza, tamanho seu medo e choque, passavam um certo desconforto ao humano. Uma lifing, chorando pela crueldade de outro lifing? Ele tinha que ser muito desumano para tal.

Hebel voltou até o restante do grupo. Sorah já havia entrado na masmorra, assim como Dart. Qual fora a expressão de susto quando o humano contara aos amigos o que havia acontecido durante a luta mais curta da história daquele torneio. Das mentes de Sabrina e Mirian, desapareceu-se por completo o fato de poderem em alguns dias, voltar pra casa. O torneio corria rápido, devido a pouca quantidade de participantes. Dezesseis duplas, trinta e dois lutadores. Já haviam se passado três lutas. A Próxima também não incluía ninguém que conhecessem, nem a seguinte. Mas a que se sucedia era a luta de Nicka e Mirian. Não contra Nacknar e Nely, por sorte do destino. Apesar de ter sido no mesmo grupo, só se enfrentariam se ambos vencessem suas primeiras lutas.

Esses pensamentos foram substituídos imediatamente, pois causavam enjôo em Nicka e Mirian. Ao invés de pensarem na própria morte, Mirian se preocupou em passar alguma coisa de Matemática à Nicka. Enquanto Sabrina já achava demais ter que aprender polinômios quadrados perfeitos sozinha, ainda tinha que ensinar uma lifing que preferia estar matando alguém, a servir de guarda costas para ela.

Despediram-se quando chegaram ao quarto de Nicka e Mirian. Sabrina ainda a lembrou de estudar, antes de seguir até o próprio aposento, onde Sorah já esperava por ela. Ou ao menos já estava lá, mesmo que não a esperasse.

Assim que entrou, sem se preocupar em bater na porta, Sorah a mandou anotar a vitória do dia na tabela.

- Por que não fez isso enquanto eu não estava? – perguntou Sabrina indignada.

- Porque eu não sei quem ganhou, humana idiota.

- Faz sentido…

Sabrina foi até o baú de gaze e puxou o vidrinho com liquido vermelho com a pena. Apoiou o pergaminho no baú mesmo e anotou o nome do vencedor.

- Kiev… - murmurou bem baixo, quase num sussurro, enquanto escrevia o nome.

- O que disse? – Sorah pareceu perguntar isso por conhecer o nome pronunciado.

- Não, nada… é só o nome do vencedor.

A lifing ainda fez cara de dúvida, negou algo para si mesma e deitou-se na rede.

- Nossa próxima luta é contra Dart?

- É sim. – respondeu Sabrina, olhando na tabela para confirmar. – Está marcada para quatro de abril.

- Que dia é hoje?

- Ainda falta muito tempo… Hoje é vinte e três de fevereiro.

Sorah suspirou, sem mais nada pra dizer. Após esperar que a lifing dissesse mais alguma coisa, Sabrina pegou a sacola de livros e deitou na rede, puxou o primeiro que lhe veio na mão e folheou.

- O que é isso? – perguntou Sorah sem dar muita importância.

- É meu livro de Ciências. Eu estudo… ou ao menos deveria estar estudando – corrigiu-se – essa matéria.

         - E pra que?

Sabrina pensou um pouco e virou o livro na contra-capa. “Compreender melhor os animais é tão importante quanto aprender sobre o ser humano. Una ambos e você terá CIÊNCIA!”.

Sem muito que dizer, Sabrina repetiu essa frase, tendo dificuldade em memorizá-la, e notavelmente, lendo a segunda parte. Ainda fez questão e dar um soco no ar com a palavra “ciência”, empolgada.

Sorah fez uma cara de desgosto.

- Ninguém nunca precisou estudar os lifings e nós vivemos muito bem.         Sabrina ignorou e folheou o primeiro capitulo, sobre a cefalização. Já havia visto isso no ano passado, e àquela altura, a classe com que estudaria também.

Passou mais algumas folhas e chegou à moluscos. Também já havia visto isso. Mas provavelmente, em fevereiro, ainda estivessem fazendo prova do capitulo passado, como calculou Sabrina.

Ainda assim, passou este e chegou à vermes achatados. Infelizmente, este não fora visto. E era, talvez, o mais odiado entre as meninas. Afinal, por que todo livro de Ciências faz questão de pôr uma foto bem grande de uma solitária logo na primeira página do capitulo? E ainda com o típico fósforo do lado, para comparar o tamanho dos dois e mostrar que ela pode ficar incrivelmente grande (e nojenta).

Enjoada ou não, Sabrina leu o capitulo todo, até decidir pegar o próximo livro. Puxou o de Geografia sem ver.

- E este? – perguntou Sorah revelando estar prestando atenção nos movimentos de Sabrina.

- Geografia. – A lifing fez uma cara de cãozinho sem entender nada. – Pra… compreender melhor o mundo ao nosso redor… A Europa, a América… Nosso bairro… - a expressão de Sorah parecia ainda mais confusa – Ah… não sei explicar. Eu só sei que estudo isso.

Após alguns segundos de silêncio, Sabrina parou de ler, pois chegara à conclusão de que não estava com a mínima vontade de saber qual é o PIB da Holanda comparada aos Estados Unidos. Olhou para Sorah meio em dúvida, até finalmente lhe perguntar:

- Belthor disse que você vai comigo ao meu mundo… Você vai estudar lá?

- Não sei. Há quanto tempo você estuda?

- Desde os três anos de idade, acho.

- Então não há como eu começar agora, certo?

- É… Mas eu posso dar um jeito. É só pra manter as aparências. A Mirian lê pensamentos, quem sabe consiga falar com você durante a aula telepaticamente pra te passar respostas dos exercícios e da prova, caso esteja indo mal. Ia ser demais… A maneira mais… - Sabrina buscou uma palavra apropriada em seu vocabulário – genial de passar cola.

- Passar o que?

- Cola. É como se chama quando se troca respostas durante um teste. É proibido, mas todo mundo faz. – avisou Sabrina.

- Se todo mundo faz, por que é proibido?

- Porque todo mundo faz… Se ninguém fizesse, não precisaria ser proibido.

Sabrina puxou o livro de Matemática também sem perceber. Se tivesse olhado antes, teria pego qualquer um, menos aquele. Ignorou Sorah, que ainda tentava entender as palavras anteriores e o folheou. A quantidade crescente de números era pior que a foto da solitária no livro de Ciências.

- E quando estiver estudando, vai ser apresentada à pior coisa nisso tudo. – Sabrina levantou o livro à altura da cabeça, exibindo-o com cara de desânimo. – A Matemática.

- A o que?

- Matemática. – repetiu, com certa inveja dela, por nunca ter ouvido falar daquilo. – A gente soma números, divide, multiplica… até aí é fácil… daí começa as equações, álgebra, monômios e polinômios… Horrível…

- E se você odeia tanto isso, por que estuda?

- Primeiro porque é obrigatório. Segundo porque, como eles dizem, não importa o que eu queira fazer, tudo tem a ver com Matemática. Quero só ver se eu querer fazer Filosofia, onde vai entrar essa… coisa… de Matemática.

- Tem algo que você goste nisso tudo?

- Na escola? Bem… tem o intervalo…

- O que se aprende no intervalo?

- Nada. É um espaço de tempo de quinze minutos que eles dão pra você comer.

Sorah parecia cada vez mais um cãozinho confuso. Quer dizer que o melhor de estudar é quando não se está estudando?

- Mas acho que agora também vou me dar bem em Educação Física. – continuou Sabrina pensando melhor. – Eles tem um curso de Artes Marciais… acho que é de Karatê e Capoeira. Nunca prestei atenção. Também nunca me interessei. Acho que menina nenhuma nunca fez nenhuma das duas. Vou ser a primeira!

Naquele dia, Sabrina ainda tentou passar alguma coisa básica à Sorah, como palavras simples em Inglês. Mas nada que fosse suficiente para começar na sétima série. Convenceu-se de que seria preciso passar tudo à ela durante a aula através do poder de Mirian. Geografia seria ainda pior, uma vez que Sorah nunca havia pisado no mundo cujo qual, via o mapa detalhadamente desenhado nas páginas do livro. Ciências foi um pouco melhor, até chegarem ao processo de evolução da terra e dos seres vivos. História também foi difícil, já que a lifing nunca ouvira falar em Napoleão ou Pedro Alvarez Cabral. E não importava o quanto Sabrina negasse, Sorah insistia em dizer que os monstros que os antigos temiam nos mares ainda por se descobrir, eram lifings marinhos. Mas o pior de tudo, como já se era esperado, era Matemática. Sabrina precisou fazer Sorah imaginar que os números eram a quantidade de monstros que ela matou, para somar ou subtrair. O que ficara bem bizarro nesta segunda opção. “Imagina que você matou doze lifings. Mas aí chegou o Nely e reviveu cinco. Quando continuaram mortos?” E até dava certo. Não fossem os socos que chegavam perigosamente perto da face de Sabrina quando Sorah xingava Nely por diminuir seus triunfos.

No dia seguinte, Mirian chamou todos para explicar um pouco de Matemática. Ela também odiava a matéria, mas ia melhor que todos da classe. Ou ao menos da antiga classe. Ganhara um prêmio de melhor do ginásio nessa matéria. É claro que parte disso era devido aos vários professores particulares de que Mirian desfrutava. Uma estudante exemplar, adorada por muitos mais professores do que o normal. No entanto, Viviane, a professora, nunca demonstrou muito entusiasmo com relação à Mirian. Sempre preferiu muitas vezes mais, Sabrina. Mesmo que esta fosse uma das piores alunas desta matéria em especial.

História, quem soube explicar melhor aos olhinhos confusos de todos os presentes – estavam os seis no quarto de Nicka e Mirian – foi Sabrina, sempre corrigindo Mirian quando ela errava alguma data. Até que esta desistisse e passasse a vez à outra humana daquele mundo completamente desconhecido aos demais.

Só havia um problema que ambas haviam se esquecido. Ninguém além de Sorah iría para a mesma série que elas. Nicka iría para o terceiro ano, Hebel para o primeiro e Dart para a oitava série, se sua idade fosse comparada aos humanos. Além de terem que criar documentos para os mesmos, como certidão de nascimento e RG. Teriam é claro, que falsificar a certidão, uma vez que Sorah tem cerca de cento e trinta anos e Dart cento e quarenta. As complicações eram tantas, que Sabrina nem se lembrou que faria tudo isso sob os olhos de Lia. O que tornava tudo tão mais difícil. Decidiu-se por pensar nisso depois, quando já estivesse lá.

A semana toda foi inteiramente dedicada à ensinar um pouco sobre cada matéria à todos. Mesmo que fosse a da sétima série e a maioria dos presentes estavam em classes mais adiantadas. De qualquer forma, era preciso começar do básico com todos. Também aproveitariam que Nicka parece ter menos de treze anos para colocá-la na sétima série, como ficou decidido sob sugestão de Mirian. Dart também poderia ser disfarçado como tendo um ano a menos. Mesmo que ele parecesse ter dezessete. O problema era Hebel, que tinha dezesseis e cara de. Simplesmente não havia como passá-lo por treze. E, sob decisão de Sabrina, mentiriam na cara dura mesmo.

Os dias passaram rápido. Outra luta ocorreu. Entre Nagin e Lant, dois desconhecidos e Rood e Naia, reconhecidos por Dart como sendo de seu reino, porém não tão conhecidos para que o reconhecessem. A próxima daria início às lutas do segundo grupo, o de Nicka e Mirian. Tal como de Nely e Nacknar. Mas ainda não era de ninguém realmente conhecido. Era uma segunda Sorah, talvez a que a Juíza mencionara que havia no torneio e que, portanto, deveria anotar o sobrenome daquela outra Sorah. Esta estava com um parceiro chamado Sorye. Tinha o mesmo sobrenome que ela. Devia ser parente, quem sabe até irmãos, lutando juntos. Luta marcada para o dia cinco de março.

Os dias se passavam e Belthor não voltava para levá-las à sua casa. Chegaram a imaginar que ele havia desistido ou mentido. Foram tranqüilizadas por Sorah, afirmando de que Guerreiros de Yume são proibidos pela mesma de mentir “o que os torna muito honestos, como devem imaginar. Honestidade demais é pior que uma mentira, acreditem”, mencionara Sorah na época.

Numa das “aulas particulares” de Matemática, cedidas por Mirian, alguém bateu à porta educadamente, sem entrar em seguida. Os presentes se entreolharam, uma vez que um frio passou pela espinha dos mesmos. Seus presságios se confirmaram assim que Mirian, a única de pé, abriu a porta e o vulto alto – não tanto quanto Sorah e Dart, porém igualmente assustador – entrou dando a impressão que flutuava, com a grande capa negra que cobria todo o corpo, a não ser pelo rosto, protegido por uma máscara prateada. Era dia três de março, quando ele finalmente apareceu.

- Vejo que seguiram meu conselho e estudaram. – comentou, analisando o livro de Matemática nas mãos de Mirian e os demais sentados em volta dela. Até pareceu rir um pouco quando viu que Sabrina também estava tendo aulas com sua amiga. – Contudo, não temos mais tempo. A situação está piorando cada vez mais e tenho que levá-las imediatamente.

- O que está acontecendo do lado de lá? – assustou-se Sabrina preocupada com Lia.

- Não é o que está acontecendo, mas o que está preste a acontecer. – respondeu ele sério.  – Não sei se posso dar certas informações agora, elas as colocariam em uma posição perigosa. Saber demais pode significar a morte. Ou a perda de tudo que estamos tentando construir.

- Mas o que está acontecendo? O que pode haver do lado de lá? – repetiu Sabrina – Nely está aqui, a não ser que ele tenha ido pra lá…

- Não, esse traidor ainda está neste mundo. Mas não é com ele que estou preocupado. Venham, vou lhes contar tudo na passagem.

O seguiram sem mais perguntas. Estavam todos muito assustados, sentindo algo remexer dentro de si. Uma insegurança, já que não sabiam o que aconteceria em seguida. Estavam tão preocupados que mal perceberam quando chegaram no mesmo local onde haviam encontrado Belthor. Aquela mesma cratera gigantesca. O guerreiro de Yume apontou o centro do buraco, anunciando se tratar da passagem.

- Quando Yume gerou a explosão que matou Zigor, acabou ligando os dois mundos de forma física. Antes eles só estavam ligados pela energia desta mesma mayle, que fazia com que o lado de lá se mentisse em harmonia, mas não havia como transitar de lá pra cá. A passagem fica exatamente sob o local em que ela explodiu.

- Sim, mas nos conte o que está acontecendo. Por que precisamos voltar? – lembrou Mirian.

Belthor respirou fundo sob a máscara. Ficou em silêncio alguns instantes e baixou os ombros.

- Eu contarei parte disso tudo. O restante eu discutirei com Íris e Mia. – Belthor notou as faces confusas dos presentes e anunciou – São as outras duas Guerreiras de Yume. Por hora, direi tudo que posso dizer. Mas lhes aviso… vão preferir não ter ouvido.

- Tem a ver com o que?

- Com a vida de vocês


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