Olhos De Vidro escrita por Jane Viesseli


Capítulo 8
Inverno




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Naquele dia tão problemático, Embry demorou a voltar para casa. Leah e Seth foram vê-lo depois de tudo o que aconteceu, levando também algumas peças de roupa, mas somente com o cair da noite é que o quileute retornou para o seu lar.

A Sra. Call não se alegrara com o acontecido, havia escutado a história da boca dos próprios alfas e ficara possessa com o que haviam feito ao seu filho. Ela poderia não ser uma verdadeira descendente de lobos, mas se transformava numa fera quando precisava proteger seu menino e foi justamente dessa forma que a mulher reagiu, repreendendo Sam e Jacob como eles nunca foram repreendidos em suas vidas e enxotando-os de sua casa com o rabo entre as pernas.

Já passava da meia-noite e Embry ainda não havia conseguido dormir, a mágoa acumulada em seu coração parecia se unir a raiva da traição, arrancando sua paz, sua razão e seu sono. Algumas vezes ele até pegou-se a pensar em Andy, a única naquela história toda que o fazia sorrir, contudo, parecia que nem mesmo ela seria capaz de acalmá-lo e ajudá-lo a dormir.

Sentado à janela de seu quarto, o quileute fita o céu parcialmente nublado, tentando observar as estrelas por entre os espaços vagos que as nuvens deixavam no manto noturno. As pequeninas esferas brilhavam em seus tons amarelados e vermelhos, e, por mais um momento, ele lembrou-se do brilho azulado dos olhos de seu imprinting.

Conforme as horas passavam, o vento frio da madrugada começou a soprar, fazendo-o se arrepiar.

― Devo estar realmente mal. – Pensa ele. – Estou até sentindo frio!

Embry salta da janela para o lado de dentro e, quando se volta para fechá-la, fica admirado com a minúscula e gélida esfera branca que flutuava lentamente em direção ao chão. Ele força um pouco mais a vista em direção à escuridão da noite e identifica, com certo esforço, as centenas de flocos brancos que caíam do céu.

― Então teremos neve – sussurra para si mesmo. – Finalmente o inverno chegou!

Ele não estava surtando no fim das contas, o arrepio que sentira era apenas o sintoma raro de que o inverno daquele ano seria bastante intenso, mas nada que uma camisa fina de manga comprida não resolvesse, afinal, os lobos quileutes não precisavam de muita coisa para ficarem quentes.

A chegada do inverno apenas realçava o que ele sentia naquele momento, uma estação sem cor, sem vida, onde tudo é branco, frio, duro... Triste!

Ele fecha sua janela e se joga na cama tentando dormir, mas sua mente agitada não o permitia cair no sono. Mais algumas horas se passam e o Sol logo desponta no horizonte, anunciando o novo dia, e, juntamente ao astro rei, veio a esperança, pois para Embry: "Sol" queria dizer "Dia" e "Dia" queria dizer que "Andy viria a La Push". Somente lembrar dela não o acalmava, talvez ele precisasse realmente estar com ela para finalmente ter um pouco de paz.

O despertador toca em seu criado-mudo, anunciando que era hora de se arrumar para a aula. O quileute realmente decide enfrentar o período escolar, mesmo sabendo que encontraria alguns membros da matilha por lá, por lá, pois aquele era seu último ano e não queria estragar tudo por causa deles.

As aulas em si não lhe eram um grande problema, a dificuldade maior acabou surgindo durante o intervalo, onde todo o bando sentava-se na mesma mesa para lanchar... Praticamente toda a escola da reserva notou o momento em que Embry apanhou seu almoço e se sentou numa mesa diferente, bem distante de seu costumeiro grupo. O refeitório tornou-se silencioso, pois todos os olhares surpresos pareciam passear da matilha para Embry e depois de volta para a matilha, tornando o momento bastante constrangedor.

Quando as aulas chegaram ao fim, ele rapidamente se colocou a caminho de casa, não dando nenhuma chance para alguém lhe falar, pois, quanto antes se encontrasse com Andy, melhor seria para sua saúde mental.

Levou pouco menos de uma hora para Embry largar o material escolar em qualquer canto de sua casa e correr em direção à praia. E foi somente neste momento que ele percebeu a camada fina de neve que já esbranquiçava o chão da reserva, cobrindo o solo como uma cobertura suave de tecido. Será que aquilo já estava ali quando fora para a escola? Bem provável que sim, já que nevava desde a madrugada, mas o quileute estava tão aéreo que nem sequer notara o óbvio.

E lá estava ele novamente, aguardando, mais ansioso do que nunca, pelo som daquela canção engraçada que Andy sempre cantarolava. Aquela praticamente se tornara a música de seus encontros porque, se um deles não estivesse presente para completar a parte do outro, não haveria encontro algum.

― Um, dois, três, siga reto outra vez... – Ele a ouve cantar. – Quatro, cinco, seis...

― Encontre o Embry tão cortês – completa ele com voz estranha e carregada de melancolia.

Andy estava tão bem agasalhada naquela tarde que parecia ter três ou quatro quilos a mais, parte de seu cabelo ruivo estava coberto por uma toca preta que parecia deixar em destaque seu rosto de porcelana, seus olhos e seus lábios rosados com o frio. Mas havia algo a mais em seu rosto, além do “contraste” com a touca, havia uma expressão de preocupação.

― Você está bem? – pergunta Embry.

― Você está bem? – copia ela, ficando frente a frente com o lobo e deixando-o confuso.

― Isso é algum tipo de jogo?

― Não. – Pausa. – Você está bem?

― Estou – menti.

― Está mentindo! Sua voz está arrastada, um tanto melancólica... Você não está bem.

Embry dá um sorriso sincero, era cada vez mais nítido o quanto ela o preenchia e o completava. Nem mesmo mentir era possível, pois Andy parecia conhecê-lo há décadas, sabendo exatamente como se sentia.

No impulso do momento ele a abraça, e, em vez de repeli-lo, ela o corresponde. Embry era enorme e a cobria com muita facilidade, mas, mesmo assim, Andy sentia-se capaz de ajudá-lo e de consolá-lo caso estivesse se sentindo mal. Na opinião dela, o abraço era a única coisa no mundo que poderia ser o mais apertado possível, pois quanto mais apertado, mais gostoso seria; e foi por isso que ela o apertou o máximo que seu corpo miúdo permitia.

― Me empresta os seus ouvidos mais uma vez? – pede o quileute ainda com seu tom de voz triste.

Andy confirma com a cabeça e desfaz o abraço lentamente, alisando os braços de Embry até alcançar suas mãos. Ali ela entrelaça os seus dedos e deixa-se ser levada mais uma vez por ele, até o local habitual de seus encontros.

Durante todo o caminho eles permaneceram em silêncio. Embry pôde ver alguns quileutes da matilha durante a caminhada, com olhares curiosos, que miravam sua companheira com surpresa e admiração, todos interessados em conhecer o seu imprinting. Por sorte, o alvo de tantos olhares pareceu não perceber os constantes garotos morenos que "coincidentemente" decidiram cruzar seu caminho naquele dia.

Embry revira os olhos com a falta de discrição do bando, mas sentia-se aliviado por Andy não ter notado nada de anormal. E quando finalmente se sentou no tronco úmido por causa da neve, ele desabafou... Nenhuma palavra lhe fora ocultada, Andy soube da história toda do quileute, desde o início das brincadeiras de seus amigos, o medo que sentia deles a afastarem dele, o segredo que mantivera por dias, a emboscada e a pressão psicológica que lhe aplicaram para que revelasse a verdade.

É claro que tivera de manter de fora a parte mítica da história, mas, no restante, não lhe escondera nada.

― Ficou com medo de eles me afastarem de você? – pergunta Andy um pouco surpresa. – Isso é tão estranho!

― Por que seria estranho? – pergunta Embry, temendo uma censura por escondê-la de seus amigos.

―Normalmente as pessoas sentem vergonha de mim, nunca vi alguém que quisesse tanto a minha presença a ponto de preferir mentir para os antigos amigos.

― Você é a pessoa mais incrível que já apareceu em minha vida. Eu te amo, já não consigo ver os meus dias sem sua presença. Já não consigo ver minha vida sem você, Andy! Eu estaria louco se um dia sentisse vergonha de você...

Algo se agitou dentro do coração da humana, uma mistura de esperança e alegria. Andy nunca imaginou que pudesse realmente encontrar alguém com este tipo de pensamento, talvez fosse ele mesmo o homem que tanto esperou.

― E seus amigos? Não falou com eles ainda? Quero dizer, depois de tudo?

― Se pudesse apagar suas existências de minha vida, assim o faria! – responde com certa rispidez.

― Não diga isso, estar sozinho é algo muito ruim... Se eles forem seus amigos de verdade, tenho certeza que tentarão se redimir. E não se preocupe comigo... – Tomba a cabeça em direção a ele, como sempre gostava de fazer. – Costumo criar minhas próprias opiniões sobre os que me cercam. Nada do que disserem de você mudará o que eu sei sobre você.

Naquela tarde Embry sentira-se totalmente em paz e, pela primeira vez, pediu à Andy que lesse uma das histórias chatas de Shakespeare. E, depois de repreendê-lo por ofender obras tão clássicas, ela retirou o livro que escondia no casaco, aquele que trazia dezenas de sonetos.

Sua voz cálida e harmoniosa preenche os ouvidos de Embry a cada verso, e ele logo se dá ao direito de deitar sobre as pernas femininas, fechando os olhos enquanto ouvia sua voz tão reconfortante. E então, subitamente, um leve sorriso dominou seus lábios ao tomar ciência do que ela dizia:

― Meus olhos e coração travam uma guerra mortal de como repartir a conquista de tua visão: Meus olhos barrariam o que meu coração vê, meu coração aos meus olhos a liberdade de te ver. Meu coração alega ser por ele que te vejo (um segredo nunca visto com olhos puros), mas os acusados negam-lhe a autoria e dizem que és bela somente para eles. A decidir a peleja é convocada, divide as opiniões, todos reféns do coração; e por seu veredito se determina a parte dos olhos claros e do doce coração: Assim meus olhos veem o que me mostras, e meu coração vê apenas o teu amor.

― Eu gostei desse soneto – sussurra ele com voz preguiçosa. – Qual o nome?

― Soneto 46.

Andy pausa sua leitura por alguns segundos, estranhando o fato dele ter entendido um soneto tão depressa. Foram tantas as vezes que ela tentara enfiar alguma coisa naquela cabeça oca, e, agora, ele simplesmente dizia que havia entendido sem o mínimo esforço.

― O que você gostou, realmente?

― Eu gostei... – boceja, sentindo o sono que lhe faltara durante a noite, simplesmente pesar-lhe sobre os olhos. – De como ele retrata o conflito dos olhos e do coração. Ambos discutem para saber quem é o mais beneficiado pela imagem da donzela e à quem realmente pertence o amor dela.

Andy sorri. Àquela não fora a observação mais profunda que ouvira em sua vida, mas ele estava certo no fim das contas. E continuando sua leitura, ela mal nota o momento em que ele pegou no sono em seu colo, finalmente tendo o seu tão esperado descanso...

Quando a humana finalmente percebeu seu ressonar tranquilo, deixou o livro de lado e ficou a acariciar o seu rosto, sentindo na ponta de seus dedos a prova de que não dormira a noite toda: suas profundas olheiras. E ali Andy o deixa descansar, sentindo o seu cheiro, o calor daquele contato e ouvindo a canção que ela entoava somente para ele, para embalar os seus sonhos. O inverno havia começado, mas, enquanto ambos estivessem juntos, haveria calor, cor e vida... O inverno finalmente seria diferente!


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado!
O capitulo de hoje é dedicado a DudaBlack e a BadWolfSterek, que recomendaram a fanfic. Obrigada pelo carinho ♥ adorei as recomendações ^^

No próximo capitulo daremos um pequeno salto no tempo :)
Próximo capítulo será: Lyra, a mãe
O momento em que Andy conhece a mãe de Embry.
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