Saí da faculdade quando já estava começando a anoitecer. O céu tinha tomado um tom escuro de azul e o vento suave deixava o clima fresco e completamente agradável. Fui andando calmamente pela cidade e mal percebi quando cheguei no apartamento. 

- Boa noite. - o porteiro sorriu para mim quando entrei. 

- Boa noite, Julian. - sorri de volta e continuei andando até entrar no elevador. 

Ouvi meu celular tocar baixo dentro de minha mochila e demorei tempo demais para atender. 

- Sally! Pensei que não ia me atender. - escutei sua voz engraçada.

- Liam! É bom ouvir sua voz. 

- Sabia que estava sentindo minha falta. 

- Odeio admitir... - revirei os olhos e saí do elevador. 

Ouvi a risada de Liam no outro lado da linha e no fundo conseguia ouvir If I Had a Gun tocando. Mesmo sabendo que não podia me ver, sorri. 

- Estou ouvindo o CD que me deu e resolvi te ligar para saber como está. 

- Estou bem. Fui na lanchonete hoje e Jane perguntou por você. Disse para aparecer lá qualquer hora e ajudá-la com novos sabores. Sabe... ela gostou de você, então é bom se acostumar com o instinto acolhedor dela. - ri. 

- Assim que voltar vou passar lá. Falando nisso, acho que volto semana que vem e a boa notícia é que vou aceitar tocar no dia dos namorados. - suspirou. - Quem sabe esse clima de amor não me atinja também? 

- Espero que sim. Você está precisando. 

- Obrigado, senhorita sentimental. 

- Disponha. - disse com uma voz atraente, o que vez Liam rir. 

- Isso é bom. Muito bom. - sua voz era safada. - Mas tenho que desligar agora. Meu pai está batendo na porta e me esperando para ir na empresa com ele. - senti pelo seu tom de voz que aquilo o deixava com tédio. 

- Nos falamos depois, então. 

- Se cuide e até mais. 

- Beijos. 

Desliguei o celular e coloquei-o no bolso enquanto caminhava pelo corredor. Senti-o vibrar de novo no bolso e quando abri a mensagem vi que se tratava de uma foto vinda de Liam. Ele usava terno completo, o que o deixava mais atraente e profissional do que o normal. Seus cabelos claros estavam devidamente arrumados e seus olhos verdes transmitiam uma expressão divertida. "Só para você ver o quanto fico sexy de terno.", li na legenda e acabei rindo daquilo. Sem querer, fiquei parada em frente a porta observando novamente aquela foto. Voltei a guardar meu celular no bolso enquanto procurava minha chave e fui surpreendida ao ver que estava tocando novamente. 

- Liam? Aposto que esquecer de di... - disse sem olhar no visor.

- Sally? Sou eu. Andrew. 

Naquele momento, senti minha cara cair no chão de tanta vergonha e me encontrei engasgada, sem encontrar as palavras certas para dizer. 

- Oh, Andrew. Me desculpe, é que... - tentei dizer algo, mas fui interrompida. 

- Não se preocupe. - deu uma risada fraca. - Só liguei para saber se vamos sair mesmo hoje... tem uma lugar que gostaria de te mostrar, não é nada demais, mas... - não terminou a frase. Havia uma mistura de timidez e sensualidade em sua voz. 

- É claro. - disse com a voz mais animada. 

- Então te pego mais tarde. 

Sorri. Talvez sair com Andrew fosse divertido e no momento de tédio, tudo poderia ser incrível. 

*

No carro, tocava Is This Love e o clima tinha tudo para ser romântico, o que me fez pensar que isso fosse intencional. 

O cheiro do perfume de Andrew era amadeirado e misturava perfeitamente com meu perfume de rosas que havia ganhado de minha mão no aniversário passado. 

Olhei para o lado enquanto ele dirigia calado e me senti levemente desconfortável com seu silêncio. Apesar de termos sido namorados na adolescência, ele ainda parecia tímido com minha presença. 

- Onde estamos indo? - tentei puxar assunto enquanto abria a janela do carro. 

- É uma construção mal acabada. - disse mas não entendi ao certo o que aquilo significava. - Meu pai é engenheiro e começou um projeto confiando que eu levasse para frente. É importante pra mim, sabe? - olhei sua imagem de perfil e percebi que ele sorria. Fiz o mesmo quase sem perceber. 

- Te entendo. - falei enquanto sentia o vento entrar levemente pela janela. 

- É aqui. - disse estacionando o carro perto de um lote. 

Uma casa de dois andares estava sendo construída em um lugar isolado e completamente confortável. Era perto da praia, mas mesmo assim era calmo e vazio. 

Observei-o sair do carro e fiz o mesmo. Ele parecia olhar para aquela obra como eu olhava para minha coleção de CDs. 

- Ah! A física... - disse suspirando, o que me fez rir. 

- É um bom trabalho. - elogiei sua obra enquanto caminhava para seu lado. 

Andrew sorriu e me olhou. Toda a luz que iluminava aquele lugar vinha do poste e da pizzaria que havia em frente a obra. 

- Lembra quando você me disse que queria morar em um lugar totalmente isolado? Onde você pudesse ser você mesma sem ninguém dizer nada? - fiquei surpresa ao ver que ele lembrava daquilo. 

Fiz que sim com a cabeça. 

- Lembrei de você quando meu pai me mostrou esse lote. Essa seria a casa perfeita. - disse chegando mais perto da casa. 

Fiquei parada. Havia algo convidativo em sua voz. 

- Seria mesmo. - disse tão baixo que ele mal me ouviu. Havia algo no clima que me deixava realmente sem ação e eu não sabia se aquilo seria bom naquele momento.