Era a terceira vez na semana que o Acampamento Meio-Sangue era atacado por monstros.

Sim, o cheiro forte e magicamente modificado dos morangos que cultivávamos encobria nossos cheiro, mas ainda sim as fronteiras eram fracas e tendiam a falhar algumas vezes. Vezes como aquela.

Esse é um dos principais motivos que nós tememos tanto que os romanos consigam descobrir nossa localidade. Nos atacariam e massacrariam. E embora sejamos fortes e bravos guerreiros, Grécia já perdeu de Roma uma vez. Isso preocupa cada semideus grego existente.

Eu e Gabriel nos aproximamos da Hidra atirando quantas flechas podíamos, mas sabíamos que não adiantaria muita coisa. Precisávamos de fogo. Enquanto subíamos a Colina correndo, Gabriel gritou a algum filho de Hefesto próximo a nós:

- FOGO GREGO! PRECISAMOS DE FOGO GREGO!

O filho de Hefesto assentiu e saiu correndo passando a mensagem.

A Hidra era enorme. Sua pele era verde e escamosa, de suas nove cabeças saíam uma gosma verde e obviamente ácida. Porém, a cabeça do meio cuspia algo diferente de gosma verde: Fogo.

Procurei algum raio de filho de Atena por ali para dar as ordens de batalha. Como conselheira-chefe, esse era meu trabalho nas lutas. Mas não achei nenhum que pudesse ajudar. Estariam todos aquele inúteis ainda lendo mapas de guerra?

A Hidra cospe uma rajada de fogo na minha direção. Rolo para o lado e atiro uma flecha em seu olho direito da terceira cabeça à esquerda. Ela urra de dor e derrama mais da gosma verde numa árvore qualquer.

- ALEXIA! - escuto meu nome. Viro-me e vejo Francis Harrison, um dos filhos de Atena, segurando um frasco que continha um líquido verde muito forte. Fogo grego.

- JOGA! - grito de volta.

Francis arregala os olhos e franze as sobrancelhas. Obviamente como quem diz: Tá maluca?

- PODE JOGAR!

- COMO VOCÊ VAI ACENDER? - ele pergunta ainda segurando o frasco.

- CONFIA EM MIM.

Ele joga o frasco e eu o pego com facilidade. Porém, para o plano dar certo, a droga da Hidra deveria olhar para cá. Infelizmente, eu havia soltado o arco para pegar o fogo grego com as duas mãos e o tempo era preciso.

- GABRIEL!

Ele olha para mim com a expressão interrogativa. Ergo o frasco de fogo grego.

- HIDRA! - grito urgente - FLECHA. FOGO.

A confusão passa rapidamente pelo seu rosto, então ele assente, compreendendo. Ele mira a flecha na direção da Hidra e ela voa em direção ao olho da segunda cabeça do monstro. A Hidra urra novamente e se vira na nossa direção.

Sua boca do meio se abre, pronta para mais uma parede de chamas. Mas eu estava preparada. No segundo exato que as chamas chegaram a seus dentes, lancei o fogo grego em sua direção. O frasco entrou em contato com as chamas e a Hidra começou a explodir internamente. Em poucos segundos, ela era pó.

Troco um soquinho com Gabriel.

- Conseguimos! - ele disse triunfante.

Os semideuses aplaudiram, exaustos. Chamei Alejandro Versalhes, conselheiro-chefe do Chalé de Dionísio, e pedi para que seu chalé montasse guarda nas horas seguintes. Alejandro concorda. Parecia estar milagrosamente sóbrio aquele dia. Seus olhos castanhos não exibiam nenhum sinal de loucura ou embriaguez, confiei em sua palavra.

Lá de baixo da Colina, uma figura alta vem trotando na minha direção. Gabriel franze o cenho e aperta os olhos para tentar reconhece-lo, mas eu já sabia quem era há décadas...

- TOM! - fui correndo abraça-lo.

Thomas vestia uma blusa comum do Acampamento. Porém havia algo de novo em seu visual: a calça jeans e os tênis all star escondendo seu traseiro peludo de sátiro.

Ah, esqueci de contar. Thomas é um sátiro (dã). Mas como usava disfarce quando me conheceu, ele mudou o sobrenome Underwood para Rider (como meu pai o conhecia). Até hoje, nós dois damos risadas ao contar a história da minha cara de quando descobri que ele tinha pernas de bode. 

Mas omitimos o fato de que eu descobri isso logo depois do ataque de rejeição do meu pai...

- Vai em missão? - pergunto observando suas roupas, confusa.

Ele esbanje um imenso sorriso.

- Tecnicamente.

Ele estende um papel para mim. Uno as sobrancelhas e começo a ler o conteúdo em grego antigo que se encontrava no estranho documento. Dizia:

Nome: Thomas Ferdinand Underwood

Idade: 26 anos

Função: Buscador

Observação: O sátiro Thomas Ferdinand Underwood, por prestar serviços muito bem realizados ao Conselho dos Anciões do Casco Fendido, tem permissão para buscar o Senhor da Natureza, Pã, em uma ou mais missões solicitadas.

Ass: Senhor Dionísio. Deus supremo e todo poderoso do vinho e da fartura.

Quando termino de ler o documento dou um grito ansioso e abraço Thomas com a maior força que podia. Ele havia finalmente conseguido o que tanto lutara para ter. Eu queria fazer alguma comentário do tipo: uau, o Sr. D parou de ser pão-duro. Mas o diretor do Acampamento Meio-Sangue não era muito amistoso com... Meio-Sangues.

Tom riu da minha reação e pegou o documento, beijando-o em seguida.

- Nem acredito que consegui, Lexy. Será que encontrarei Pã... - seu rosto então se torna triste - ou morrerei como os outros.

- Você vai encontra-lo, Thomas Ferdinand! Eu sei disso. E quando voltar terá mais milhões de histórias para contar para o seu sobrinho-sátiro!

Tom sorri.

- Grover... Ele vai ter tanto orgulho do tio.

- E eu também, não se esqueça! - meu sorriso diminui um pouco quando lembro que não o terei por perto mais - quando sairá em missão?

- Daqui a dois dias. As roupas são para buscar uns semideuses por aí. Nada muito importante...

- Sei. Recrutar guerreiros. Nada importante.

Ele levanta uma sobrancelha.

- Ora, ora. Alexia Garcia finalmente falando como filha de Atena.

Reviro os olhos.

- Por que todos estão falando nisso hoje...?

- Vai ver é verdade, Garota Esperta.

- Esperteza... Eu a trocaria com prazer pela sabedoria.

Thomas sorri.

- Todos trocariam. Bom, tenho que ir. Até logo, Lexy. E não se meta em encrencas!

- Não irei! Juro!

Infelizmente eu estava errada.