No dia seguinte, pedi para Thomas me ajudar na inspeção dos chalés. Era o dia do Chalé de Atena revisar as atividades gerais do Acampamento... e, como sou conselheira-chefe do chalé, maioria das "atividades" caem todas em meus ombros.

Acordei e arrumei minha cama. Pedi a meus outros irmãos que fizessem o mesmo para que tudo ficasse em ordem na inspeção. Como sempre, eles reviraram os olhos e houveram alguns comentários como: eu sempre arrumo minha cama...

Outro ponto ruim de ser filha de Atena: o orgulho te corrompe. Na minha opinião, é a pior das qualidades (ou deveria dizer defeito?).

Pode ser até confuso... mas o orgulho é algo complicado de avaliar. Ele é crucial para um filho de Atena, e também é uma consequência. Somos gênios, guerreiros, artesãos... E tudo isso causa uma única coisa: a vontade de ser melhor em tudo.

Eu odeio isso em mim. Odeio quando me pego pensando que posso acertar mais flechas que Gabriel, lutar com espadas melhor que Mirando ou até encher a cara melhor que Alejandro. Então, mais uma vez, eu amaldiçoo Palas Atena. E isso gera outros xingamentos de outras coisas que ela acabou na minha vida.

Então eu suspiro. Alexia Garcia... A única filha de Atena que não quer ser filha de Atena. Que não tem... orgulho.

Uma voz bem no fundo de minha mente sussurra: Ela é sua mãe. Ela planejou você, como faz com todos os seus filhos. Você surgiu da força do pensamento dela... Ela te quer...

NÃO. Não quer. Se quisesse já teria me ajudado. Teria me dado um sinal de que me ouvia, de que confiava em mim ou até mesmo que me amava. Podia ser qualquer coisa, ao invés de a mesma coruja vermelha que brilha acima de nossas cabeças quando um filho de Atena é reclamado...

Parei com o drama e segui até o Chalé 4 para a inspeção. Thomas me esperava na porta.

- Demorou... - ele disse - está chorando?

Limpo as lágrimas que nem notei que tinham caído.

- Desculpe. A mesma coisa de sempre!

Thomas revira os olhos e me puxa pela mão.

- Alexia, entenda que isso acontece com todo semideus! Alguns nem sequer são RECLAMADOS. E ficam entupidos no Chalé de Hermes eternamente...

Era verdade, claro! Alguns morriam e não descobriam quem eram o seu pai ou mãe Olimpianos. Passavam suas vidas no Chalé 11 confusos e sem nem uma luz para guia-los (ou deus para culparem).

Era o que mais acontecia. Hermes era deus dos viajantes e não se importava em guardar filhos de outros deuses em seu chalé. Isso significava: entupir todos os semideuses sem pai/mãe no Chalé 11 sem se importar com seus problemas.

- Eu sei, Tom. Mas a questão é que eu queria que ela me respondesse. Como responde Francis, Heyle, Jonas e todos os meus outros irmãos. Por que ela me odeia?

- Vamos lá. Eu prometo que um dia, Atena falará contigo. E tudo vai se ajeitar. Vamos inspecionar o Chalé?

Faço que sim com a cabeça.

O Chalé 4 era o da deusa da agricultura, Démeter. O telhado era de grama e o resto (como as paredes e a varanda) eram revestidos de várias plantas diferenciadas.

Geralmente, se começa com o primeiro chalé ao último - de 12 - porém, os três primeiros chalés estavam vazios. Seus deuses são: Zeus, Hera e Poseidon respectivamente. Hera, como deusa do casamento, obviamente não pode ter filhos com mortais.

Mas com Zeus e Poseidon é outra história... Há muito tempo (desde a II Guerra Mundial) esses dois deuses e Hades fizeram um acordo de não ter filhos, já que estes causam problemas demais.

Mas sei que algum deles quebrou o acordo. É uma coisa lógica! Zeus nunca conseguiu se controlar...

- Alexia! - chama Thomas - eu sei que você adora ficar pensando e refletindo em horas impróprias, mas temos que ir.

- Desculpa.

Abro a porta de madeira e entramos no Chalé.

A conselheira-chefe, Lauren, lia um livro em cima de sua cama. Ela levanta os olhos de suas páginas e sorri quando nos vê. Sua pele era morena e as bochechas rosadas. Era bonita de um jeito doce, como alguma parente sua que você sente vontade de apertar!

- Olá, Ferdinand - ela olha para mim - Olá, Alexia.

Todos chamam Thomas pelo segundo nome. Eu sinceramente nunca consegui. É como um costume... Essas coisas de melhores amigos e tal.

- Olá, Lauren - diz Thomas. Ele olha para mim, me fulminando com os olhos como se dissesse: Pare de ficar raciocinando, filha de Atena! Fale alguma coisa!

- Hã... oi, Lauren - digo sorrindo.

- Bem-vindos ao Chalé 4.

Agradecemos e demos uma vistoria no Chalé. Estava tudo arrumado e em seus devidos lugares (exceto por algumas plantas). Observei a madeira bem polida e os beliches perfeitamente arrumados. Tudo simples e confortável. Bem como eu gostava.

- Muito bom, Lauren - comento.

- Perfeito! - diz Thomas se empolgando - nunca vi um equilíbrio tão perfeito com a natureza e...

- Menos Thomas - digo rindo.

Ele sorri.

O sonho de Thomas era seguir carreira procurando Pã, o deus da natureza selvagem que estava perdido há mais de mil anos, mas era difícil conseguir tal cargo no Acampamento Meio-Sangue. O que dizer? Dionísio, o diretor do Acampamento e deus do vinho, era um tanto chato com algumas coisas.

- Alexia pare de perder! - ele diz em voz alta.

- Desculpe-me! Sabe como é difícil...

-... Uma filha de Atena ficar sem refletir sobre algo. Sei. Minha melhor amiga é filha de Atena. Mesmo sendo teimosa!

O teimosa claro significa: criticando sua mãe o tempo todo.

Nos despedimos de Lauren e seguimos para o próximo chalé: Chalé 5, do deus da guerra Ares.

Quase gritei para pularmos o Chalé. Eu o odiava. Odiava os filhos de Ares. Nesse ponto, tenho algo a concordar com minha mãe: ares era um idiota. Achava que guerras era só batalhas físicas e mortes. Porém, há meios de evitar as mortes. Sendo um bom estrategista e sendo sábio. Sendo... como Atena.

Thomas e eu andamos devagar até a varanda do Chalé 5 e paramos bem na porta vermelha e mal pintada - com um javali entalhado acima do número 5 - do chalé cheio de arame enfarpado no telhado.

A conselheira do Chalé, Miranda, nos atende com as sobrancelhas levantadas e cheia de ataduras pelo corpo.

- Hoje tem inspeção? - pergunta.

- Tem - respondo seca.

Ela dá um meio sorriso torto e debochado.

- Relaxa, Garcia. Sabe que eu não quis magoar seus frágeis sentimentos de filha de Atena aquela hora... ótimo trabalho matando a Hidra, aliás.

- Obrigada - respondo ainda seca.

Thomas dá um pigarro.

- Então, Miranda, podemos entrar?

- Claro. Cuidado com os campos minados.

Entramos.

O Chalé de ares estava - como sempre - uma bagunça! Camas mal feitas, curativos e ataduras sujas de sangue espalhadas pelo chão, armas para todo o lado e sem falar nos campos minados que estavam em todos os lugares possíveis.

- Nota 4 - eu digo anotando em minha prancheta.

- 4? - Miranda começa a se revoltar - como assim 4? Passei o dia montando guarda na porra da fronteira e você ainda quer me dar um 4?

- Regras do Acampamento, Mi...

- Escuta, Garcia, você está começando a me irritar!

- Quer lutar? Você sabe que perde. Atena SEMPRE vence Ares.

Miranda ri.

- E quem fala é uma filha de Atena mal resolvida e cheia de crise existencial.

Eu já ia para cima dela quando Thomas me segurou antes que eu pisasse no campo minado entre nós duas.

- Chega disso - ele diz - vamos aos outros chalés.

Demos uma olhada rápida no meu Chalé - o 6 - e me dei uma nota 8 porque alguns irmãozinhos teimosos deixaram a cama desarrumada.  Thomas me deu um 10, mas sei que foi por piedade.

Saímos para o Chalé de Apolo, o número 7.

O Chalé 7 era incrível, e parecia brilhar com a luz do sol. Era revestido de mármore branco, com acabamento dourado. Havia um sol entalhado acima do número 7. Quando batemos a porta, Gabriel nos atendeu.

Ele sorri.

- Oi, Alexia. E aí, Underwood!

- Oi. - responde Thomas.

- Gabriel... - digo - esta de saída?

- Reunião no Bunker 9. Há algumas informações dos romanos.

- O que?

- Miranda não falou nada?

Rosno.

- Não. Não falou.

Gabriel dá de ombros.

- Bom, reunimos secretamente os melhores chalés em combate para isso (enquanto o chalé 12 e o 4 ficam de patrulha). Isso inclui o Chalé de Atena.

Troco olhares com Thomas e falamos em uníssono:

- Inspeção Cancelada.