Sem Direção escrita por Renan Suenes


Capítulo 25
Novo mundo




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25
 
Antes que eu pudesse reagir ou fazer qualquer coisa, uma voz interrompeu a conduta impensável de Josh.
- Senhores passageiros, dentro de instantes estaremos pousando no aeroporto internacional de Dallas/Fort Worth, Texas. Solicitamos que mantenham o encosto das suas poltronas na posição vertical, suas mesas fechadas e seus cintos afivelados. Obrigada.
 Permaneci parado, ter alguma reação era a ação mais inusitada desde que toda essa loucura começou. Jessie estava com os olhos vermelhos, ela começou a se debater no chão, lançando seus braços que se chocavam contra o ferro dos acentos. Senti lentamente a aeronave se movimentar para baixo no intuito de pouso, tratei de sentar rapidamente no meu lugar dando uma última checada em Daniel, que continuava adormecido depois do meu soco.
- Eu juro que ainda vou te matar número um! – comentou Josh, apertando o cinto na outra fileira e me fitando raivosamente. – Você, e essa maluca.
- Não tenho culpa de nada, apenas quero saber o que realmente está acontecendo.
- Tudo o que você precisa saber logo será revelado. Se tiveres a sorte de viver até lá...
 Ignorei a última frase e encostei a cabeça tentando relaxar, seja o que eu estava prestes a descobrir depois de pousar, tudo seria uma nova realidade na minha vida. Tudo seria novo. De repente, a presença de Beatrice naquele momento para mim, resolveria algumas coisas, de fato, me acalmaria um pouco mais, visando que suas opiniões e ideias concretizariam minhas atividades futuras.
 Daniel acordou repentinamente, olhou para mim e gritou.
- Seu maldito!
 Revirei os olhos e questionei a mim mesmo se ficar na cidade era tão ruim quanto ficar ao lado de Daniel. Simplesmente sua personalidade era insuportável, ele carregava muito ódio dentro de si e expressava ordem nas palavras, como se fosse o dono do mundo.
- Sonhei com Beatrice. – continuou ele. - Ela me pediu para deixar um recado para você, mas não estou a fim de falar.
 Comecei a analisá-lo. O sangue no seu nariz, o pé machucado com o tiro de Josh e os arranhões no rosto o fazia parecer um monstro. Tão pavoroso quanto Jessie se contorcendo no solo do avião naquele mesmo instante. Me empenhei a não visualizar a cena, que me embrulhava o estômago ainda mais.
 O voo finalmente teve fim. O pouso foi tranquilo e a pista estava normal. O clima podia ser visto pela janela, supostamente era verão no Texas. Uma mulher vestida de aeromoça nos recepcionou educadamente, abriu a porta e nos direcionou para uma limusine. Entrei e me confortei no banco mais macio que já sentei em toda minha vida. Havia garrafas de água por toda a parte, peguei uma sem permissão e matei a sede, que também me dominava assim como o cansaço. Daniel se acomodou o mais longe possível de mim, e Josh ficou no meio.
 A mulher que nos trouxe até o carro ficou no banco de carona conversando com o motorista, que, aliás, eu não pude identificar.  
- Bom, acho que finalmente vocês voltarão para suas famílias. – falou Josh.
 Fiquei perplexo. Então quer dizer que toda aquela aventura acabaria ali? Sem mais nem menos? Claro que eu estava ansioso e curioso para saber quem eram meus pais e voltar para minha realidade, mas nenhuma explicação seria suficiente para compreender os fatores que estavam ocorrendo no momento.
- Você poderia nos dizer alguma coisa? – perguntei.
- Dizer o que? Parabéns?
- Pelo o que? Por que você nos levou até lá?
- Eu não levei ninguém até lá. Apenas sigo ordens, como eu já avisei.
- Josh, me explique. O que está havendo?
- Peter, cala essa boca cara, não consegue ver que ele não quer conversar? – disse Daniel me atacando com grosseria.
- Eu falei com você? – esperei por uma resposta. – Não? Então fica quieto na sua, se não preferir apanhar de novo, é claro.
 Daniel pulou do acento e veio para cima de mim, segurou meus braços e tentou me apunhalar rapidamente, girei meu corpo contra ele e o empurrei para o meio do veículo, que se movimentava com extrema velocidade. Josh segurou Daniel e prendeu seus braços bradando.
- Vocês são duas meninas, não conseguem parar de brigar! Peter, fique com essa bunda sentada ou eu lhe mato agora com um tiro certeiro no meio da cabeça, juro que vou estourar seus miolos! – quando se dirigiu para Daniel, Josh o jogou com força no acento e continuou. – E quanto á você, fique calado, ou eu lhe mato agora também, mas antes com uma boa surra!
 O carro dobrou uma esquina de forma violenta e me machuquei por distração. Meu braço que já estava arranhado sofreu outro ferimento, e meu cotovelo começou a sangrar.
- Droga! – murmurou Daniel.
 A viagem continuou por mais dez minutos, e ninguém falou nada enquanto percorríamos o caminho. Pensei em tirar um cochilo ou perguntar algo para Josh, mas era perceptível o ar tenso do ambiente. A provável aeromoça abriu a porta e me chamou. Sai do carro e me deparei em uma rua asfaltada, com pequenas casas, particularmente iguais, com poucas pessoas caminhando. O céu ficou nublado e havia poucas árvores.
- Aquela é a sua mãe. – disse ela.
 Me virei bruscamente na direção de uma mulher magérrima, trajando um vestido xadrez, colhendo flores no quintal de uma velha casa de madeira.
- Vá. Corra. Faça o que você tem que fazer.
- Mas...
 Eu ainda estava parado. Mesmo querendo abraçar minha mãe, me confortar no seu colo, comer adequadamente, dormir numa cama deliciosa e ter alguma boa diversão, ela era um nada para mim. Infelizmente minha memória não tinha voltado, não sei se eu podia confiar na mulher do aeroporto. Também não sei se poderia confiar nas suas instruções, uma vez que Josh avisou-me de que eu sou o líder. 
- Peter... Não me irrite. Saia do meu caminho e vá pra casa. – ela pegou no meu braço e complementou. – Faça o que você tem que fazer.
 Olhei dentro dos olhos dela e percebi que havia alguma mensagem sendo repassada por aquela expressão. Pousei minha atenção na minha suposta mãe e comecei a caminhar em sua direção. As flores sendo colhidas eram bluebonnets, não fazia ideia de como eu sabia daquilo, mas o cheiro refletido por elas de longe me trazia alguma lembrança especial.
 O automóvel que me trouxe até ali saiu em disparada, seguindo reto até desaparecer no horizonte. Minha mãe observou lentamente o carro percorrer o fim da rua, e virou o pescoço logo depois, finalmente me encontrando e percebendo minha presença. Seus olhos encheram de lágrimas em segundos, ela largou as flores que caíram na grama seca do terreno, pôs a mão na boca supostamente incrédula por me ver e ergueu o braço apontado o dedo para mim.
- Meu filho...
 Consegui ouvir baixinho.
- Mãe...?
 Ela correu e me abraçou com muita força. Envolvi meus braços nas suas costas e pude sentir seus ossos. Minha mãe era muito magra, seja lá o que ela precisasse, eu estava ali agora para ajudá-la.


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