John entrou pelo corredor e subiu as escadas atrás de Sherlock que abriu a porta e lhe apresentou o pequeno loft que moravam. Parou na porta e olhou em volta antes de entrar e colocar sua mochila no chão, olhando para Holmes.

– Então...vivemos aqui. – disse.

– Sim, há pouco mais de um ano. Pertence a Sra. Hudson, ela tinha uma república antes de alugar apartamentos neste prédio. Foi lá que nos conhecemos.

– Certo. Uau...é de verdade. – apontou para o crânio em cima da lareira.

– Sim. Quer guardar suas coisas, no nosso quarto? – o moreno respondeu enquanto observava que John estava completamente perdido e confuso.

– Sim, por favor.

Os dois então seguiram por um pequeno corredor que tinha três portas. Sherlock entrou na última, revelando o quarto dos dois que era composto por uma cama, um armário, uma escrivaninha e três mobílias cheias de livros.

– De casal...a cama. – John observou.

– Foi sua ideia. Dormirei no quarto ao lado, não se preocupe. – respondeu abrindo as gavetas, mostrando suas roupas guardadas.

– Oh, sim...seria ótimo. Outro quarto?

– Sim, é menor e usamos para guardar algumas coisas.

– Não quero incomodar, eu posso dormir na sala e...

– Não, John. Eu ajeitei as coisas por lá. Não insista, não é necessário. – Sherlock respondeu e os dois se encararam. O detetive estava intrigado, afinal. Aquele a sua frente era John Watson, mas de certa forma não era, não o seu John. Isso seria muito difícil.

– Ok. Você quer me mostrar algumas coisas? Que talvez possam me ajudar...- Watson sugeriu percebendo que o olhar do outro deixava-o nervoso agora.

– Sim. Vamos para a sala.

Voltando para lá, os dois sentaram-se nas poltronas um de frente para o outro e Holmes disse:

– Então...por onde quer começar?

– Bom. Pelo início.

– Qual?

– Como assim?

– O seu? O nosso? Contarei tudo que quiser saber, John...- Sherlock respondeu pacientemente.

Watson se ajeitou na poltrona e encarando-o, perguntou:

– O que você faz?

– É isso a primeira coisa que você quer saber?

– Sim...porque eu tenho a impressão de que você conhece, na verdade parece que você me lê...o tempo todo.

– Estamos cinco anos juntos, nos conhecemos o suficiente para isso.

– É, mas não só a mim. Todo mundo. Você lê as pessoas...quem você é?

Sherlock passou a mão pelos cabelos, mas o loiro nem piscou, apenas aguardando-o.

– Sou um detetive consultor. Meu nome é Sherlock Holmes e eu tenho 25 anos. Sou formado em Direito e Biomedicina. Filho de dois arqueólogos, tenho apenas um irmão...mais velho, Mycroft. – se apresentou sem emoção.

– Certo...o que é um detetive consultor? Isso existe?

– Existe, pois eu inventei. O único no mundo.

– Muito esperto...- John sorriu – Você resolve casos então?

– Sim, todos os que a polícia não consegue por não saber ou por ser extremamente ineficaz e lenta, o que quer dizer que eu tenho muito trabalho.

– Emocionante! Esse é o seu trabalho?

– Sim. Consegui ele através de um conhecido nosso, Gregory Lestrade a alguns meses.

– Hum. E o que eu faço? Atualmente? – perguntou John muito interessado.

– Você após se formar conseguiu uma vaga disputada como assistente do chefe cirurgião, no St. Bartholomew.

– Sério? Eu me tornei um bom médico então?

– Sim. Um dos melhores que eu já vi. – Sherlock respondeu sinceramente.

John então deu um meio sorriso e após refletir em silêncio por poucos momentos, continuou:

– Diga-me sobre você agora.

– Sobre mim?

– Sim...se moramos cinco anos juntos, é porque nos amamos...certo? Eu nunca faria algo assim se não tivesse completamente envolvido...apaixonado, e eu quero saber tudo sobre você. Eu preciso. - John respondeu tomando coragem.

– O que quer saber exatamente? – Sherlock suspirou ao ver que loiro ainda não tinha percebido que nem o antigo John o conhecia completamente.

– Sei lá, qualquer coisa...o que você gosta, desgosta, seus hobbies e preferências.

Sherlock parou para refletir enquanto John o encarava muito sério. Após um tempo, disse:

– Eu gosto de violino. De chá. Não gosto de pessoas limitadas e quintas feiras. Gosto de ler e ir até o laboratório nos finais de semana...nos dias de semana também. Todos os dias.

– Ok. Legal...e sobre nós...o que você tem a dizer?

– Eu gosto quando você beija minha nuca. Você odeia quando eu fico vendo você dormir, algo que eu faço com frequência. Suas torradas são as melhores do mundo. Eu aprendi a gostar dos Beatles por sua causa e eu odeio quando você morde meus lábios quando me beija. A idéia da cama de casal foi a sua melhor idéia e eu odeio o fato de você ser respeitoso, paciente e otimista com tudo e com todos, o tempo todo. – respondeu olhando nos olhos.

John sorriu encabulado, se ajeitou na poltrona, e continuou:

– Nós...como aconteceu? Quem teve a iniciativa? Primeiro beijo...esse tipo de coisa, você disse que éramos amigos antes. Me diga.

– John, você tem certeza que é esse tipo de coisa que quer saber primeiro?

– Sim...eu tenho...- Watson disse decidido.

– Bem, você. Sempre foi você. Nosso primeiro beijo...foi inesperado e você não estava em seu normal, mas ainda assim aconteceu. Nosso segundo beijo foi inesperado também, mas nós dois queríamos. – Sherlock confessou – Nossa primeira vez fui eu que tive a iniciativa.

– Sério? – John sorriu surpreso.

– Sim. Após tentativas suas mal sucedidas. – Sherlock sorriu de volta.

Os dois então se olharam e John balançou a cabeça desacreditado. Sherlock sabia que para o loiro era tudo muito curioso. Ele estava ouvindo a história de sua própria vida e esta lhe parecia bem diferente daquela que tinha planejado.

– É estranho porque alguns meses antes de passar no vestibular, eu terminei com a minha noiva...

– Jenny, vocês ficaram muito tempo juntos. Agora ela é casada e tem gêmeos. – Sherlock interrompeu.

– E eu então eu te conheci...e uau, pouco tempo depois isso tudo.

– Eu fui o primeiro homem que te atraiu, palavras suas. – Sherlock respondeu.

John então esticou os braços e dando um leve suspiro, prosseguiu:

– Como é nosso dia a dia? Digo...juntos?

– Costumamos nos ver muito pouco ultimamente por causa dos nossos trabalhos. Mas quando estamos juntos, costumamos comer fora, alugar filmes...você gosta de me ouvir tocar violino e de escrever em seu blog.

– Eu ainda tenho meu blog?!

– Definitivamente. Nem sempre atualizado, mas ainda assim...

– Posso vê-lo? – John pediu.

– Claro. – Sherlock se levantou e lhe entregou seu próprio notebook.

– Pede uma senha...- John sorriu.

– Não seja por isso. - Holmes digitou rapidamente a senha, logando-o.

– Você sabe minhas senhas?

– Elas são bem fáceis, na realidade. Passo todas para você depois...- o moreno brincou sentando-se no braço da poltrona, se aproximando propositalmente de John.

– Oh, seria ótimo na realidade. Então, uau. Que layout moderno! Bom, deixe-me ver...é, basicamente um blog sobre medicina...

– Sim.

– Eu geralmente contava coisas da minha vida, sabe. Coisas que estavam acontecendo...tipo diário, só que mais discreto - estranhou ao ver apenas artigos sobre sua profissão por pelos seis últimos meses na página – É, aparentemente só isso acontecia na minha vida ultimamente.- sorriu mas isso deixou Sherlock pensativo.

Neste momento alguém bateu na porta e logo a Sra. Hudson entrou pedindo licença enquanto olhava para John.

– John, esta é a senhora Hudson. – o moreno a apresentou.

Watson se levantou e de maneira atenciosa estendeu a mão para a senhora que o puxou em um abraço enquanto se debulhava em lágrimas. Deu de ombros para Sherlock que deu um meio sorriso.

– Oh, querido! Que bom te ver novamente aqui e bem...meu Deus! Se lembre de tudo o mais rápido que puder ok? Sherlock, veja...ele emagreceu tanto!

– Naturalmente, ele estava no hospital em não em hotel em Bahamas. - o moreno revirou os olhos.

– Eu sei, eu sei...oh querido, se eu puder lhe ajudar com algo, com qualquer coisa! – ela disse enquanto acariciava o rosto de Watson.

– Oh, eu...obrigado, senhora...eu estou bem...

– Não precisa se preocupar, John. Se precisarmos de qualquer coisa a chamaremos. Neste instante eu estava fazendo algo efetivo para a melhora dele, que é mostrar nossas coisas.

– Oh..sim! Ele adora a minha lasanha, poderia preparar uma para ele! Claro...não costumo cozinhar muito, mas valerá a pena! Quando estiver pronta chamarei os dois! – a mulher disse saindo e fechando a porta antes de John conseguir agradecer.

– Não ligue, ela não costuma ser assim o tempo todo. – Sherlock comentou sentando-se ao seu lado novamente.

– Eu achei ela adorável. Uau...

– Ela nos conhece há muito tempo.

– Nos damos muito bem então? Eu e ela? – John perguntou.

– Sim, vocês dois costumam dar muito bem com tudo mundo, então naturalmente se adoram. – Sherlock respondeu em seu tom normal, mas isso surpreendeu John que apenas o encarou - Temos coisas nossas nesta pasta. Digo, fotos de viagens que fizemos, festas...esse tipo de coisa. Temos uma foto juntos em Baskerville. Veja.

John se viu na foto e parecia outra pessoa. Sim, era ele mas ao mesmo tempo não era. Nela os dois estavam em frente a um restaurante, sorrindo.

– Foi uma viagem nossa? – perguntou.

– Na verdade eu fui a trabalho e você estava de folga e me acompanhou. Faz três meses, é bem recente.

– Oh. Parecemos felizes...estávamos bem quando o acidente aconteceu? – Watson perguntou.

– Sim, sim. Estávamos. – Holmes mentiu.

Os dois se olharam e então John suspirou e respondeu:

– É uma pena. Que tenha acontecido isso...digo, eu estou me sentindo tão perdido. Eu não me lembro dos anos que vivi...mas eu os sinto, sabe?

– Não poderia imaginar como se sente. O médico te receitou muitos remédios?

– Três, mas dois são por causa acidente e um é antidepressivo. Uau, eu odeio isso. O que eu costumava fazer? Quando estava nervoso, estressado? Quando brigávamos? – sorriu.

– Você sempre gostou de escrever. E ah, você frequenta ainda o clube de natação da faculdade.

– Sério? Natação? Que legal que eu fui a fundo nisso...poderíamos visitar esse clube? Sei lá...

– Quando quiser, John.

Neste momento a senhora Hudson os chamou e eles desceram as escadas. Ao chegar lá embaixo viram que Molly, Greg, Mike e Mycroft.

– John! – Molly disse abraçando-o

– Muito bom te ver, cara! – Lestrade sorriu.

– Que susto, hã? – Mycroft comentou.

– O que fazem aqui? Vocês todos? – Sherlock perguntou muito sério enquanto Watson estava ainda mais perdido.

– Viemos vê-lo! É claro! – a jovem disse tentando disfarçar o clima.

– Mas não percebem? John precisa descansar. Não de ver um monte de estranhos! Qual é o problema em esperar até o fim de semana?

– Está tudo bem, Sherlock...não se preocupe! Ei, Mike? De você eu lembro! Oh, graças a Deus! – o loiro riu abraçando o velho conhecido, tentando também amenizar a situação.

– Ei, John! Cara...está melhor? – este perguntou.

– Na verdade não! Mas agradeço...muito a atenção de vocês. Sério mesmo. – agradeceu.

– Oh, meu irmão...veja, o John mesmo que desmemoriado consegue ser sempre mais educado que você, em qualquer circunstância, impressionante! – Mycroft comentou e isso fez Sherlock fuzilá-lo com os olhos.

– Ei, pessoal! A lasanha estará pronta em dez minutos! Vocês estão com fome? – a senhora Hudson surgiu chamando-os.

– Claro, eu ajudo a senhora! – Molly disse levando Greg junto, enquanto Mike e Mycroft o seguiam, deixando-os sozinhos, de frente um para o outro, naquele corredor estreito.

Sherlock então observou John que estava muito assustado com toda a situação. Seus olhares se encontraram e então John pigarreou e disse:

– Bom, acho melhor irmos também senão ficamos sem lasanha.

– Se não quiser, se achar que é muita coisa para um dia só, eu posso pedir para eles irem embora.

– Obrigado. Não precisa se preocupar, ok? Eu quero me recuperar logo...e acho que eles podem me ajudar também...estou bem. – Watson sorriu tocando levemente a mão de Holmes, e apenas isso fez seus corpos se arrepiarem, um choque.

Sherlock deu um sorriso preocupado e isso fez John rir e seguir para a cozinha sozinho.

– Eu também quero, John. Quero que você se lembre de absolutamente tudo. – Holmes respondeu baixinho, seguindo-o.