Sorria! escrita por UniversoInfinito


Capítulo 6
Sorriso eterno




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Fechando os olhos por um instante, me concentro naquela estrela. Aquela que só quem voa pode alcançar. E logo a vejo de frente como um holograma. É uma ilha. Uma ilha voando no meio do universo, como um outro mundo. Quem está lá não vê mais nada, aquilo é todo o universo para eles, exceto para aquele que pode voar para outros mundos.

Não é fácil voar, não para pessoas que não são como “ele”, mas eu posso me teletransportar para onde quiser, isso me resume muito caminho.

Fecho os olhos mais um vez. (Ainda não sou tão veloz e hábil quanto o Noturno, dos X-Men, mas dá para ir onde eu preciso sem nem mesmo saber onde, basta visualizar o que quero). Ao abrir os olhos lá estou eu. No meio da floresta. Ninguém à vista. Afinal, quem eu vim ver?

Um som vem da floresta. Me escondo? Corro? Ou espero seja lá quem for aparecer? Não há o que temer não é? Então, vou esperar, mas não aqui, exposta. Se há algo que eu aprendi nessas viagens é: “Mantenha a calma, e haja sabiamente, não importa a situação”. Não que eu siga isso o tempo todo… Bom, pode ter sido ruim deixar o Loki furioso para trás. Não, pode não, é claro que foi ruim.

— Creck! - faz um galho lá atrás.

“Tem alguém se aproximando”. Entro no meio de um monte de folhas grandes de umas plantas que estavam ali perto, e me abaixo vendo por entre as folhas o que irá aparecer por detrás das árvores.

Os sons se repetem, mais e mais, ficando mais altos. Até que surgem os primeiros vultos na floresta, vultos de pessoas. Eles se aproximam andando depressa.

Eram piratas. Um a um, foram brotando como ervas daninhas num jardim.

Um velho baixo e gordinho, com óculos pequenos em cima do nariz, para na frente de todos e olha ao redor.

— O que foi Barrica? - diz uma voz tenebrosa atrás dos outros.

— Acho que vi alguma coisa capitão.

Ouço passos vindo dentre os piratas. Eles abrem caminho. E então o vejo. Vestindo roupas vermelhas que lhe concedem ares de nobreza. Um enorme chapéu com uma pena lhe cobre o rosto. Cabelos longos e encaracolados com a aparência de velas negras. E uma pose de superioridade que mete medo. Em sua mão direita, um gancho de ferro vinha erguido como se protegesse o coração e ao mesmo tempo preparasse um ataque ameaçador.

Ele faz um sinal de silêncio com o gancho. Saca uma arma de cano comprido e aponta devagar para os lados para onde olha. Todos os piratas estão atentos. E então, ele olha para o meu lado, e atira.

Por um instante tive medo. Mas logo passou por causa do susto que tive a seguir. Um grande pássaro colorido cai bem ao meu lado, morto.

— É um pássaro do nunca! - diz Barrica.

— Não. - diz o capitão tirando o chapéu. - É uma criança. - diz sorrindo com seus dois brilhantes olhos azuis. Então percebo que meu esconderijo foi descoberto quando o pássaro, ao cair, quebrou alguns galhos, que vieram a descobrir as folhas que me ocultavam. - Peguem! - grita o capitão.

Imediatamente vários piratas vêm em minha direção. Eu me levanto devagar. Serenidade acima de tudo. Eles param de repente.

— TIC TAC, TIC TAC, TIC TAC.

— Me protejam! - grita o capitão.

Todos correm e desaparecem na floresta. Ele dá uma arrancada para correr, mas sabe que o monstro o quer, e ele não conseguirá fugir. O capitão olha para mim e sorri:

— Quem sabe a fera não quer algo mais fresco?

Ele vem até mim. Seus olhos são tão belos, que sua agressividade é suprimida, e fico hipnotizada. Ele me pega pelo braço. Quando dou por mim há um enorme crocodilo à nossa frente.

O capitão sorri.

— Olá monstro. Não quer experimentar algo diferente?

Tento me soltar, ele coloca o gancho no meu pescoço.

— Quieta peste! Esta perseguição precisa terminar.

Não sinto medo. Na verdade, só não saí de lá por estar, numa hora dessas, pensando: “Será que a pessoa com quem devo falar é ele? O crocodilo? Um daqueles homens?” Não posso ir embora agora.

O crocodilo se aproxima. E o capitão me joga para frente, em direção à fera. Ele abre sua enorme boca com incontáveis dentes e parte para cima de mim, enquanto gancho cai no chão paralisado de medo.

— Pare aí mesmo! - digo com autoridade, apontando a mão direita aberta para o animal. Imediatamente ele para pasmo. - Você não vai comer ninguém aqui. - sem saber o que estava acontecendo, o crocodilo fica indeciso. - Se não veio para ajudar não atrapalhe. Vá embora! - ele hesita - O que está esperando? Xô xô!

O crocodilo sai envergonhado. Não pôde ter a sua refeição, e ainda foi enxotado por uma garotinha de 13 anos. Quando nada mais resta de sua presença, o homem finalmente ​relaxa.

— Mas o que… como…

Ele não sabia o que dizer. Mas logo foi tomado por uma ideia.

— Mas que grande exemplo de bravura! - diz o capitão sendo lisonjeiro. - A quem devo os meus sinceros agradecimentos, e desculpas? - parece até um homem sem nenhum orgulho, mas muito pelo contrário, ele apenas busca ser humilde, porque aprendera a ter bons modos, e acha tudo isso muito bonito, o que para ele é assunto muito sério e importante.

— Meu nome é Luz.

— Luz! Que belo nome minha querida. - diz ao tirar o chapéu - James Gancho. Ao seu dispor, senhorita. - sorri amigavelmente. - Eu nunca te vi por aqui antes…

— Estou em uma jornada, para…

— Uma jornada! Mas que indelicadeza a minha - diz me interrompendo, como se isso não fosse indelicadeza - Talvez você queira fazer uma pausa em sua jornada para comer alguma coisa, conhecer algumas pessoas…

— Bom, foi justamente por isso que eu vim…

— Perfeito! Venha comigo que te apresentarei a muitas pessoas.

Ele não me deixa falar um único instante, e me direciona para um caminho que eu já imagino aonde vai dar. O navio Jolly Roger, ancorado em uma baía, esperava notícias do capitão. Teria ele sobrevivido?

— É o capitão! Ele voltou!

— O capitão voltou!

Gritavam os marujos. Um pequeno bote com dois homens veio buscá-lo, e qual não foi a surpresa de Barrica ao me ver.

— Capitão, é a menina! A menina da floresta​! - diz enquanto entramos no bote.

— É, é a menina… - diz o capitão sorrindo. Os outros começam a sorrir também. Ele fica sério e atira na direção dos seus marujos. Eles gritam de medo, e um deles cai no mar. - Vocês me abandonaram!

Barrica, aliviado e ao mesmo tempo assustado retrucou:

— Hora capitão, você sabe como aquela besta é assustadora, você mesmo estava assustado, não estava?

— Estava…

— E você não ficaria para salvar nenhum de nós né?

— Não... Ah, reme logo para o navio! - retrucou o capitão. E Barrica o fez com um sorriso no rosto.

Eu me mantenho calada. Será Barrica a pessoa que procuro? Ele sofre tantos perigos nas mãos desse capitão, e ainda consegue sorrir para ele.

Vou com eles até o navio, em silêncio. Na proa, tudo é escuro e fétido. Os marujos brigam uns com os outros sem nenhum motivo, bebem e dormem em qualquer lugar, muitos parecem que nunca tomaram banho na vida. O capitão me conduz até a sua sala. Lá dentro parece um oásis no meio de tanta imundice. Barrica me oferece um lugar à mesa para eu me assentar. Muito educado, o Gancho se porta como um verdadeiro cavalheiro, nem parece o homem que matou friamente o seu subordinado.

— Gostaria de comer alguma coisa? - diz cordialmente o capitão.

— Não, obrigada.

Barrica assistia a tudo muito curioso, e atento a possíveis ordens do capitão.

— O que está buscando nessa terra infeliz, minha querida? - diz agaxando ao meu lado.

— Bem, na verdade, de longe parece bem feliz… E foi por isso que eu vim.

— Oh, mas se é felicidade que procura, tenho uma ideia muito boa! Aqui não é bem um hotel cinco estrelas, mas podemos te oferecer uma vida bem confortável, comida, lugar para dormir, lazer…

— Lazer?

— Você sabe tocar piano, minha querida?

— Não.

— Oh, não há problemas, eu conheço muitas músicas, você pode cantar. Gosta de cantar?

— É… Acho que sim.

— Maravilhoso! Então você irá cantar o que quiser! Comer o que quiser! Vai ser tratada como uma rainha.

— Mas eu… - ele ouve atento - Eu só vim aqui para descobrir algo…

— Oh, mas não gostaria de ficar por uns tempos? Será muito bem tratada…

— Bom, eu não pretendo ficar…

— O que você está procurando, minha cara? Talvez nós possamos te ajudar...

Pelo Capitão Gancho ser muito educado, dá até vontade de me manter ali por mais um pouco de tempo, mas eu sei que não fora para isso que eu vim aqui.

— Capitão… Eu vim aqui… descobrir por que esta ilha sorri.

Barrica ouviu emocionado, como se eu tivesse recitado um poema. Obviamente, eu não via graça no que disse, e pelo visto, o Gancho também. Foi só falar da alegria da ilha que o seu rosto se congelou com uma frieza fantasmagórica.

— Pan… - disse ele com o semblante frio, de onde nascia uma fagulha de ódio - Por que ele?! - gritou ferozmente, fincando o gancho na mesa logo a minha frente em um ataque de fúria. Barrica tentou acalmá-lo e foi empurrado sem cerimônia. - Justo quando encontrei uma solução para o meu problema com aquela fera! Justo quando encontro alguém que pode lidar com ela! Esse alguém está procurando ele! - Gancho percebe que alterou o tom de voz, ele para, respira fundo e volta a ser um calmo cavalheiro. - Querida, a ilha não sorri de verdade. É uma máscara para ocultar a tragédia por trás de seu brilho. Me diz uma coisa, alguma vez na vida você já quis ser pirata?

— Já. - ele sorri ao ouvir - Mas agora não quero mais. - me levanto para sair, e vejo seu semblante se aproximar do desespero.

Quando dou um passo para a porta, ele me segura pela roupa com a ponta do gancho. Mas logo para quando ouve algo que para ele é assustador. Tiros lá fora, o desespero dos marujos, e uma voz alta de menino.

— Ôh Capitão Ganchoooooooo!!!

— Capitão! Ele está aqui! - grita um pirata.

— É ele! - grita outro.

— Lá lá lá lá lá!!!! - grita o menino com a voz mais alegre e sorridente que eu jamais havia ouvido.

Gancho me joga para dentro com violência. Barrica me acode. Gancho sai da cabine se deparando com o seu… Espera, ele não está lá? De repente ele salta pela janela.

— Olá. - diz apontando a espada para Barrica, que logo sai correndo e gritando, e é chutado para fora com a porta batendo em suas costas.

— Quem…

— Eu sou Peter Pan. - diz o menino sorrindo. - E você…

— Eu…

— Não temos tempo, venha! - ele me puxa pelo braço e me leva até a janela. É uma janela alta, e a queda na água naquela altura deve doer. Antes que eu tivesse tempo de gritar, me vi voando ao seu lado pelas nuvens. Me abraço a ele, mas não sinto segurança, ele é menor que eu, não tem nem muito onde segurar, embora parecesse forte. Voamos por um tempo. Ele ri de vez em quando, mas nunca entendo o por quê.

— Obrigada.

— De nada… Quem é você?

— Eu sou a Luz.

— Que nome engraçado. - Ele ri.

— Por que está rindo?

— Por que estou me divertindo.

— Se divertindo?

Então ele me larga no ar, e me deixa despencar em queda livre. Morrendo de medo grito bem alto até quase chegar ao chão, quando ele me pega gargalhando.

— Você é louco?

— Sou.

— Ixi, mais um.

— Louco por diversão!

Ele me joga nas árvores e bato de copa em copa até atingir o chão. Todo o meu corpo fora arranhado pelos galhos. Logo, ele chega ao chão. E me vejo cercada de meninos menores ainda que ele, vestidos com peles de animal e usando armas feitas de coisas da floresta.

— É ela? - diz um menino

— Sim, é como as sereias disseram. - diz Peter Pan.

“Sereias?” Penso. “Não vi sereia alguma”

— Não sei o que está acontecendo aqui, mas você é o Pan, do qual Gancho estava falando?

— Claro que sou. O maior de seus medos! - sorri orgulhoso.

— Não sei… E se tiver outro Pan - diz um menino.

— Aí lhe corto o pescoço! Só pode haver um Pan! - diz Peter, sorrindo como se aquilo fosse coisa que criança pudesse dizer tão naturalmente.

— O maior medo? Gancho pareceu muito mais assustado quando viu o crocodilo! - falo na maior naturalidade. Ele não pareceu gostar nada disso. Percebo um certo orgulho ferido em sua face. As nuvens tampam o sol, a floresta fica um pouco escura. Ele tira a espada, os meninos se afastam. Ele abre a mão para o lado e faz um gesto para lhe darem algo, o menino maior passa outra espada para ele. Eram espadas de verdade, nas mãos daqueles pequeninos.

— Então, você é o outro Pan? - diz desafiando. As nuvens destampam o sol, a floresta volta a brilhar, ele sorri como se brincasse, e me joga a outra espada. Ao invés de pegar, me desvio dela, ela cai no chão perto de mim, os meninos vaiam. - Não parece tão corajosa quanto as sereias disseram.

Pego a espada um pouco assustada.

— Isso não devia ficar nas mãos de uma criança. - os meninos vaiam novamente, ele sorri.

— Então as sereias estavam mentindo… - desanima Peter. - A pessoa que estou vendo não encararia aquele crocodilo.

— Ela fez isso? - diz um menino.

— Uau! - dizem juntos os gêmeos.

— Não seus idiotas! O Peter disse que as sereias estavam mentindo! - diz o maior.

— Não é mentira! - digo - Só não gosto de espadas por que me machucava muito com espadas de brinquedo quando era menor.

— Então você não sabe o que é diversão! - diz Peter em guarda.

— Foi por isso que eu vim… Quero entender o sorriso dessa ilha.

— Quer aprender a se divertir? - diz sorridente - Eu te mostro! - me ataca com sua espada. Só tive tempo de dar um passo para trás e inclinar o corpo ao mesmo tempo.

Isto parece um convite a Peter, que começa a dar mais investidas. Ele é rápido demais para eu ver o que estou fazendo, então me concentro para ver o tempo passar devagar. Seus movimentos ficam lentos como nuvens em dias quentes. Largo a minha espada e dou um passo para o lado dele, ao mesmo tempo dou-lhe um soco bem no meio das costelas, e o tempo volta ao normal.

Ele está caído no chão, sem respirar. Uma fadinha bate contra mim, violentamente, mas eu a lanço fora. Fiquei de mau humor, por ser obrigada a participar da perigosa brincadeira. Os meninos vão acudir Peter, que os afasta arrogantemente. Ele olha para mim com uma seriedade assombrosa. Quando finalmente recupera o fôlego se levanta sozinho já com a espada empunhada e um golpe furioso. Novamente vejo o tempo em câmera lenta e lhe dou um chute na barriga, o fazendo ser empurrado a alguns metros para trás. Ele não cai, na verdade ele nem toca o chão. Ele está voando. Trocamos muitos golpes até ele finalmente cair no chão e não poder levantar mais.

Os meninos estavam assustados, a fadinha chorava ao seu lado, e ele, furioso, tentava se levantar. O céu negro se move ameaçador. Trovões ecoam entre as nuvens, todos estão apavorados, menos eu.

— Quem é você? - diz Peter.

— Me desculpe. - digo. - Você é só um menino. Não terá a resposta de que preciso.

— Só um menino? - diz com raiva - Eu sou… - para um pouco para respirar - Peter… Pan! - diz orgulhoso se levantando. Ele sorri novamente, e o céu volta a ser brilhante. - E eu sempre serei um menino para me divertir.

— Você diz isso… mas acho que você nem é mais um menino. - olho para o céu - Você é um sonho. E sonhos nem sempre são divertidos. - Ele vem me atacar. Olho séria para ele. Ele para, assustado com meu semblante. - Você não tem a resposta de que preciso. Você nem é mais humano, a Terra do Nunca não é uma ilha, é você. E não há como aprender isso de alguém tão imaturo quanto você. Este lugar, é uma piada sem graça.

Ele parece muito bravo. Me preparo para sair, como fiz com o Loki, fecho os olhos. Ele vem com sua espada. E penso o que aconteceria se o deixasse assim, será que o faria mau? Então me vejo em casa.

— Nem deu tempo de mudar de rumo. Acabei saindo cedo demais. Acho que vou dar uma espiadinha lá, será que ele vai ficar assim por muito tempo?

Com os olhos fechados, vejo o lugar como se fosse por uma televisão. Eles não me veem, mas eu os vejo. Ainda bravo, ele manda os meninos me procurarem. A fadinha tenta consolá-lo lhe fazendo cócegas.

— Pare Sininho! - grita.

Ela para, triste.

— Oh Sininho, não fique assim. - diz amigável - Vamos ver os índios? - diz animado.

Ela fica feliz rapidamente. E sai como se nada tivesse acontecido minutos atrás. Volto a ver o meu quarto, tranquilizada.

— No fim, parece que todos que são realmente felizes são loucos… Mas o que quer dizer esta loucura de que eles tanto se orgulham? Embora sejam insanos, todos parecem estar em seu perfeito juízo ao praticar suas maluquices… Isso me leva a outro pensamento… Existe algo na loucura que leva as pessoas à verdadeira felicidade?

Me ajeito na cama, já é tarde da madrugada.

— Pelo visto, respostas fundamentais da vida não são conseguidas de um dia para o outro. Vou ter que continuar numa outra vez...

E adormeço.

Continua....


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