Carmilla escrita por camila schwert


Capítulo 6
III - Não pare agora


Notas iniciais do capítulo

Gente, desculpa a demora pra postar. Eu tive uns probleminhas, mas enfim... demorei duas horas pra escrever esse capítulo (a criatividade não ajudou muito), mas quando enfim consegui ter algumas ideias, elas fluiram do jeito certo. Só posso dizer que nunca coloquei tanto de mim mesma no Lucian... boa leitura!



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CARMILLA ABRIU OS OLHOS PARA A LUZ DO SOL que invadia a janela. Estava deitada no tapete macio, a lateral do corpo roçando na tapeçaria quente. Estava deitada sobre o braço esquerdo, o cabelo caído no rosto e uma das carteiras de cigarro de Lucian à sua frente. Ela fechou os olhos novamente, não querendo acordar. A lareira já estava apagada, a madeira que não havia virado cinzas transformada em um monte disforme e negro. Ela respirou fundo, e com certa dificuldade, sentou-se. Havia algo ali ao lado que fez um barulho baixo, como uma roleta girando e um estalo logo em seguida. Ela sentiu um aroma conhecido, e uma fumaça se fez presente perto dela: acinzentada, fina, transformando-se em espirais brancas, perdendo-se onde a luz do sol se fazia presente.
Lucian estava ao seu lado, como na noite anterior, fumando um cigarro novamente. Ele tinha os cabelos bagunçados e olhava para baixo, os olhos azul-escuros fitando os próprios pés calçados com um par de Converse pretos. Se ele tinha trocado de roupa ou não, ela não podia saber: agora ele usava uma calça jeans com apenas um rasgo no joelho direito e uma camiseta preta simples; a noite anterior estava escura demais para que ela pudesse ter visto as roupas que ele vestia. Ela puxou o cabelo para trás e bocejou, chamando a atenção dele para si sem querer. Ele a observou de maneira estranha, quase grotesca, como se pudesse ver através do vestido prateado, como se estivesse contendo um desejo profundo. Ela sorriu.
– Bom dia? – Perguntou, em um tom irônico quase palpável. Ela queria provocá-lo, testar seus limites, ver até onde ele poderia ir. Estava sorrindo ainda, com aquele olhar insolente e provocante que ela adorava.
– Bom dia. – Ele respondeu, sorrindo mais ironicamente do que ela, enquanto chegava mais perto se apoiando no tapete fofo.
Ela podia perceber que aquilo que acontecera ontem já tinha sido esquecido por ele. Lucian havia adormecido com a cabeça encostada no ombro dela, e Carmilla havia ficado ali, parada, brincando com os dedos dele até quando o sol começou a nascer, uma aurora azulada aparecendo na janela. E então se deixou cair, encostando a própria cabeça na dele, dormindo profundamente. A sensação desconhecida ainda estava ali – aquela coisa estranha que sentiu desde que ele começou a ficar estranho com ela, parecendo completamente drogado. Mas ela podia ver, podia sentir que o que acontecera não era efeito de nenhum tipo de droga ou bebida. Lucian estava diferente hoje, não só com olheiras profundas por ter dormido pouco. Ele tinha aquele olhar estranho de quando a pediu para que não fosse embora, aquela súplica silenciosa, cheia de pedidos ocultos e promessas não ditas. Ela sentia, no fundo, que algo estava acontecendo, mas não tinha noção da importância e nem do motivo pelo qual tudo estava mudando. Ela olhou bem para seus olhos, e soube que, naquele mar azul profundo, ele lembrava – ele sentia a mesma coisa, a mesma estranheza de sentimentos que o havia motivado na noite anterior. Ele lembrava tão bem quanto ela do pedido que fizera, e sabia que isso mataria os dois. Mas nenhum dos dois se importava verdadeiramente com isso agora.
- Quer café da manhã? – Ele perguntou, sorrindo de repente. Ele sabia o que sentia e sabia que tudo podia dar errado, mas o amor era feito de riscos. Ele se surpreendeu por pensar assim. Amor. Não era muito cedo para isso? Ele não sabia. Não queria saber.
- Quero saber por que eu ainda estou aqui. – Ela respondeu. Pela manhã, normalmente ficava mais agitada, até mais engraçada, mas com Lucian tão perto ela não conseguia. Parecia que algo a estimulava a ser cada vez ser mais estúpida e além do mais, não sentia como se estivesse agredindo-o verbalmente, porque sabia que ambos eram agressivos, e imaginou que ele não se importaria.
- Porque você quis ficar? Eu não estou te obrigando a nada. – Ele disse. Mesmo tendo admitido para si mesmo o que sentia por ela, ainda não conseguia parar com a agressividade natural que simplesmente emanava dele.
- Bem, talvez porque você tenha pedido. – Ela respondeu, sorrindo, e colocou um pouco de vinho na taça que havia usado na noite anterior. Bebeu alguns goles e sorriu, colocando novamente a taça na mesa de centro. O sol bateu no copo e no vinho, transformando a junção entre o transparente e o bordô em um arco-íris brilhante que nenhum dos dois viu. Ela não se levantou do tapete, mas assim como ele, também se aproximou. – E ultimamente eu estou um pouco suscetível a pedidos. – Ela sorriu, e ele chegou mais perto.
- Isso pode ser divertido. – Ele disse, em tom de voz baixo, o timbre ainda corrompido. Chegou mais perto dela, os narizes quase se tocando. Algo os puxava, um para perto do outro, algo forte que não tinha explicação e não precisava. Mas nenhum deles se moveu mais para perto. Era essa angústia que os mantinha presos, essa vontade controlada de ficar perto um do outro que mantinha o desejo enlouquecedor.
- Só se você souber o que fazer. – Ela respondeu. Aproximou o rosto do dele, agora as bocas quase se tocando. Ele respirava mais fundo a cada segundo que passava. – Mas ninguém vai fazer nada agora. – Ela sorriu, a boca na dele. – Eu tenho aula. – Levantou-se num pulo, deixando Lucian totalmente atordoado para trás. Saiu andando, sem se despedir, como se conhecesse o caminho para a rua.
Ele sorriu enquanto ela saía da sala, a luz do sol batendo no vestido prateado, brilhando como se fosse algum tipo de diamante. Ela saiu sem se despedir, os cabelos compridos batendo em suas costas. Ele ficou parado ali, como se ela fosse aparecer na porta e perguntar onde era a porta de saída - mas ela não era burra. Ele tinha certeza de que ela conseguiria sair da casa sem esbarrar em nada. Olhou para a taça que ela havia usado há poucos minutos - ainda havia certa quantidade de vinho nela, tinto, roxo. Ele hesitou em beber do vinho; queria manter aquela taça intacta pelos próximos séculos, guardá-la onde ninguém poderia encontrar. Deixá-la longe de qualquer coisa que pudesse tirar a essência que Carmilla havia deixado para trás. Ele respirou fundo. Como ele era idiota. Levantou-se e caminhou pela sala até uma das prateleiras lotadas de livros. Aproveitou a luz do sol da manhã tocando seu corpo enquanto mexia no anel que estava preso à um colar que Carmilla não vira. O anel era bem simples - de prata, com uma depressão fina no centro, que circulava toda a extensão da joia. Recolocou o colar sob a camiseta e saiu da sala da biblioteca, caminhando pelos corredores frios da casa. Passava a mão sobre as paredes, blocos de pedra escura que escondiam tantos segredos... Ele desceu algumas escadas, as últimas do corredor, e abriu a primeira porta. O cheiro de sangue o fez sorrir.
– Então, como estamos? - Perguntou. A garota acorrentada a cadeira gemeu de dor e medo, o cabelo cobrindo o rosto. Ele sorriu para ela, um sorriso totalmente cruel e cheio de ódio.
A garota estava coberta de sangue, cheia de arranhões, cortes que ainda sangravam e machucados abertos. A perna era uma grande fratura exposta, o osso quebrado e os músculos para fora do corpo. Seu rosto estava machucado, cortes provocados por facas, estiletes e lixas. Um dos olhos estava fechado de tão inchado, o outro já começando a ficar arroxeado, as pupilas dilatadas. Os cabelos negros estavam cortados de forma grotesca, e uma franja improvisada se grudava à testa com sangue. As pulsos amarrados para trás sangravam, cortados por causa da pressão da corrente. Ela choramingava, pedia "por favor, não me mate" enquanto ele selecionava a próxima faca a ser usada.
O local era um antigo galpão, usado pelos avós dele para construir qualquer tipo de coisa inútil. Agora o galpão não era mais nada daquilo que fora um dia. As paredes de pedra isolavam os gritos, e o fato de o local estar no subsolo da casa era um bônus que ele adorava. Era empoeirado, sim, mas quem se importa? O importante era a dor que ele podia causar às vítimas. E as vítimas eram tantas... Tão belas, sempre tão inocentes que ele quase hesitava no momento de matá-las. Essa garota - uma tal de Angel - era secretária de Alex Hitchfield, um dos melhores advogados do país e dono da maior empresa de advocacia da cidade - provavelmente do país, também. A garota recebera informações dos advogados da acusação, informações que jamais deveriam ter chegado até ela; a vagabunda namorava o promotor de acusação e tinha informações valiosas para ele. Ele já extraíra as informações de que precisava, mas não custava nada se divertir com ela antes de terminar o serviço. Ele agora escolhera uma adaga de quinze centímetros, fina, de ponta arredondada. Chegou na frente dela, que estava com a blusa rasgada provocando um decote tenebroso. Sentou-se sobre ela, de frente para a garota, e colocou as mãos no encosto de metal da cadeira. Sorriu novamente.
– O que acha de me dar um beijinho? - Ele perguntou, o tom de voz visivelmente ácido. Ela só não cuspiu na cara dele porque sua boca estava machucada, e cuspir seria um trabalho difícil. Mas ela implorou, novamente, sussurrando coisas como "por favor", "não faça isso". Ele sorriu mais. - Shhh... Não queremos estragar o momento, não é? Pense pelo lado positivo, Angel: você não vai ficar assim machucada para sempre. Esses cortes? Vão virar cicatrizes, imagine que feio vai ficar esse seu rostinho se eu te deixar viver. Seu namoradinho da promotoria não vai gostar nem– Ele inseriu a adaga nas costas dela, perfurando o pulmão e fazendo-a engasgar de dor. Ela gemeu, a garganta arranhada pelas tentativas anteriores de gritar. - Um– Ele socou o peito dela, fazendo-a ficar totalmente sem ar agora. Ela arfou, tentando buscar o ar, mas não conseguiu. Ele puxou o cabelo dela para trás, cortado grotescamente por ele mesmo com uma faca antes da festa de ontem à noite. O pescoço dela estava exposto, as veias pulsando com força. - Pouco.– E ele mordeu, cravando os caninos afiados no pescoço da menina, deixando-a ainda mais sem ar, totalmente presa à sua mordida. Ela tentou se livrar, movendo-se incontrolavemente sob ele na cadeira, mas não conseguiu. Procurou pela voz, para gritar por ajuda, mas não a encontrou. Ele puxou a pele dela entre os dentes com mais força, arrancando um pedaço inteiro da veia, mordendo novamente e satisfazendo seu apetite. Quando ela parou de se mover, ele a soltou. Largou os cabelos dela e levantou-se da cadeira, passando a mão no rosto para tirar o sangue que o sujava até o nariz. Virou-se para ela, inalando mais do ar sujo. Ela estava morta.



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Notas finais do capítulo

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