POV Sophie

Depois da noite passada, assim que acordei contei tudo para minha mãe. Apesar de meu olho estar de aparência normal, eu não enxergava com ele. Para dizer a verdade, estava tudo escuro, sem nem uma leve brecha de luz. Eu estava com medo, meu olho só enxergava escuridão. Minha mãe ficou desesperada e claro, fomos para o lugar que eu mais odeio, uma clínica.

Assim que terminamos os exames, tive certeza do que eu já havia comprovado. Estava cega de um olho. Minha situação era emergência, não tinha mais o que se fazer, só me restava o transplante.

Quando eu saí da clínica, meu transplante estava marcado. Para daqui há quatro dias, seria numa sexta-feira. Mas seria em São Paulo, dizem que é a melhor clínica para tratamento visual de todo o Brasil. Eu precisaria partir amanhã para conseguir chegar há tempo da cirurgia.

Sempre me achei preparada, mais agora que se aproximava cada vez mais do dia, o nervosismo me dominava e eu via que, por mais que uma pessoa ache que esteja pronta para fazer uma cirurgia de risco. Ela nunca vai estar completamente pronta, porque não há modo de se preparar para isso. Como você pode se preparar para o pior, se nunca o enfrentou ?

POV Bernardo

Acordei. Coloquei nossa foto em pé sobre a mesinha. Tomei banho. Me deitei novamente. Não estava disposto para fazer nada e nem queria. Eram duas e doze da tarde e eu não havia comida nada e nem bebido. Meu celular começa a vibrar assim que deito em minha cama.

– Hey .

– Na verdade não, eu não estou disposto para passear com ele hoje, e parece que ele entende, tanto que nem sequer se levantou hoje.

– Acho... acho que não estou com fome hoje. – Disse tentando disfarçar a tristeza em minha voz.

– Preciso de você aqui Mari, mais do que tudo. – Afirmei eu.

– Hã...mas como? Você não iria... hã? – Assim que abro a porta Mariana está me esperando lá. Vestida com seu casaco rosa e com os cabelos presos em um rabo de cavalo.

Deixo meu celular cair da minha mão. Não estava acreditando. Sem ação, eu fico parado em frente a porta encarando ela. Devagar, Mariana vai entrando e se aproximando de mim. Ela fica na ponta dos pés e me dá um beijo, definitivamente era ela.

Fomos para o meu quarto e ficamos um bom tempo sem dizer nada. A pessoa que eu mais queria estava ali comigo, e eu não conseguia dizer nada. Apenas encarar ela.

– É só que... bom, eu chorei a noite toda com a sua partida, e agora você está aqui,sabe? – Disse eu confuso.

– Seus olhos estão vermelhos e você parece cansada. Você nem dormiu há noite e queria ficar se preocupando comigo? - Disse eu num tom carinhoso.

– Saiba que eu dormi muito bem ontem a noite. Dormi como um anjo e nem pensei em você. – Disse com um ar de convencimento na voz.

– Nem um pouquinho. – Minto eu.

Era claro que eu tinha pensado a noite toda nela. Ela não precisava saber disso. Mas no fundo, tenho certeza que ela sabia disso.

– Chorei por você. Chorei só de pensar em ficar longe de você. – Disse abraçando ela.

Pela primeira vez, nós havíamos dormido juntos.

POV Sophie

Minha mãe estava me tratando como se eu fosse uma criança que não conseguia fazer nada sozinha, estava odiando isso. Entendo que ela faz isso por preocupação e por estar com medo de algo de pior acontecer comigo sem uma das visões. Mas era desnecessário aquilo tudo.

Já havia arrumado minha mala com tudo o que eu achei necessário levar. Roupas, meu cd do Paramore, urso de pelúcia , escova de dentes. Tinha pego tudo que iria precisar.

Fazia tempo que não falava com Bernardo, eu precisava contar para ele tudo o que tinha acontecido e tudo o que iria acontecer também. Ele realmente estava preocupado comigo, embora eu achasse ele fofo se preocupando comigo.

Mesmo me conhecendo há pouco tempo, ele se preocupa comigo de uma forma...diferente. Ele demonstra que está preocupado e sinto que realmente posso confiar nele, muito diferente do Guilherme, embora eu o ame de qualquer maneira.

POV Mariana

Não queria chorar na frente dele, queria parecer feliz e confiante que iríamos nos reencontrar muito em breve.

– Não tem como ficar mais um pouquinho até, quem sabe amanhecer ? – Arrisca Bernardo.

– Tá, entendi. – Respondeu ele triste.

Passei as mãos nos cabelos dele e o abracei.

– Te esquecer ? Como assim, por que você ta falando como se fossemos terminar aqui ? – Pergunto para ele me afastando um pouco.

Bernardo pensou por um tempo no que me responder, parecia que ele não sabia o que me dizer, então apenas disse uma coisa. Que pra mim, foi mais que o suficiente.

– So- Sophie ? – Pergunta Bernardo.

– Bom, nós já estava... – Mariana me interrompe sem deixar eu terminar.

– Mas, não quero deixar você ir sozinha.

– Mariana... – Disse com uma voz baixa.

– Olha me desculpa se te atrapalhei com ela. – Diz ela se desculpando.

– Você deve estar se perguntando o porquê de eu ter vindo aqui não é? Bom, muitas coisas aconteceram. – Fala ela cabisbaixa.

Sophie me conta tudo, que foi na clinica, que perdeu a visão e que seu transplante já está marcado. Que vai partir para São Paulo nessa madrugada e também, que precisava contar e desabafar com alguém, por isso veio até mim. Até mesmo para se despedir.

– Eu... eu não sei o que te dizer Sophie. Sinto muito. – Digo olhando pra ela.

– O que você pensa que está fazendo? – Perguntei eu. – Você não disse que gostava de um outro cara que mora em São Paulo?

– Bom, eu pensei que você quisesse me beijar. Mariana foi embora, sabe-se lá se ela não vai encontrar ninguém em Santa Catarina não é? – Ela falava com um toque de malicia.

Definitivamente eu não conhecia esse lado dela.

– Bernardo, você não vai trair ela. Mas e ela? Que garantia tem, de que não vai te trair? – Fala Sophie na minha frente, colocando as mãos no meu rosto.

– Eu amo a Mariana. Quando ela foi embora, foi estava aqui. Você viu que eu sofri com a partida dela, por que está falando essas coisas?

– Nunca me senti tão bem ao lado dela. Tenho certeza que ela é a garota que eu sempre esperei. Nem mesmo essa distância vai tirar ela de mim. Agora, saía daqui Sophie, vamos. – Falei com a voz mais controlada possível .

Me dirigi até a porta e abri ela, fiquei esperando ao lado da porta até que por fim, ela saiu da minha casa sem dizer um única palavra. Assim que ela saiu, voltei para o meu quarto, apaguei as luzes e me deitei na cama...pensando.

(...)

Já estava dentro do avião partindo para Santa Catarina. Com meu livro e uma foto nossa. O resto estava tudo dentro da minha mala. Sempre quis conhecer outros lugares, só não imaginaria que justo quando eu não quero sair de onde estou, é quando eu vou sair. Mas eu vou esperar por ele, assim como ele vai esperar por mim.