Aquele Professor É Um Lobisomem escrita por Lady Pompom


Capítulo 12
Capítulo 11: Carta




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Ah... O aniversário do Sil passou em branco... Ele pareceu tão desanimado... A Alícia mal aparece para falar conosco, está sempre na sala do clube, pesquisando sobre coisas que não entendo. A noiva do Sr. Graham vem todos os dias, mas não sei se ele se agrada muito disso... Quanto ao nosso professor, pareceu-me preocupado, de alguma forma... Embora ele esteja sempre com uma máscara impecável...

            Desde que sei sobre o segredo do professor Graham fiquei um pouco mais atenta a esses assuntos de vampiros e lobisomens, apesar de que eu não acreditava no início, não posso negar a existência deles depois de todas as provas que tive...

            Tem algo me incomodando... Algo que está acontecendo na cidade... Estamos no dia 23 de março, e durante as semanas depois do aniversário do Silas, alguns fatos amedrontadores começaram a acontecer... Pessoas estão sendo atacadas pelos bairros, e o número de desaparecidos aumentou também... Essa parte dos ataques, particularmente, me preocupa... Sempre as vítimas dos ataques aparecem com perda de sangue... Antes eu provavelmente acharia que algum tipo de bandido as atacou e feriu, mas agora, vendo esse novo mundo que o professor vive... Tenho minhas suspeitas de que não seja algo tão ingênuo quanto bandidos comuns...

            Será que a Alícia está investigando isso? Soube que o pai dela é da polícia ou algo assim... Ela tem sumido muito esses dias, espero que não esteja se envolvendo em nada perigoso e escondendo de nós...

— Karen! –Silas me chamou- Vamos voltar juntos... Com todos esses ataques acontecendo na cidade é perigoso ficar sozinha...

            Ele não é fofo? Se preocupando assim...

— Tá! –respondi alegre-

            Silas é mesmo o único que consegue me fazer sorrir de verdade. Mas não acho que nós dois escaparíamos se algum vampiro ou seja lá que outra criatura  tentasse nos atacar. Somos apenas dois adolescentes afinal...

            Enquanto andávamos, conversando, distraídos, uma mão tocou em nossos ombros. Me assustei, será que...?

— Olá!!! –era Ária-

— Srtª, Ária?! –Silas virou-se para trás, assustado- O que está fazendo aqui?

— Ora, vim acompanhá-los até suas casas!

            Mesmo ela estando com um sorriso, eu sei bem porque ela iria nos acompanhar... É porque estamos correndo perigo. Óbvio, com todos os acontecimentos tremendamente suspeitos, e os seres que começaram a invadir a cidade...  Isso me deixa um pouco apreensiva.

— O professor lhe pediu?-perguntei-

— Não, não, ele não tem nada a ver com isso! Vim porque quis!

— Mas... Não é perigoso para o professor Leonhard ficar andando sozinho com aquele caçador à solta? –Sil perguntou também preocupado-

— Ele sabe se cuidar... –ela respondeu com um sorriso- Além disso, é quase lua cheia, ele tem força o suficiente para fazer uma boa transformação!

— Transformação...? –Sil ficou perplexo, eu também- Mas ele não só se transforma na lua cheia? Hoje não é lua cheia...

—Hum? –ela nos encarou por alguns segundos, depois sorriu e respondeu- É mesmo?

            Não entendo. Ela acabou de mencionar a transformação, tenho certeza. Mas... Todas as vezes que Silas contou sobre a “transformação” era lua cheia... Supostamente um lobisomem só deveria conseguir se transformar na lua cheia, certo...? Ou será que mais uma vez estou enganada...?

            Ela não falou mais no assunto, simplesmente mudamos de foco e ela realmente nos acompanhou até nossas casas, se despedindo com seu típico sorriso alegre.

. . .

Um tempo depois,

. . .

            A mulher de cabelos negros e olhos castanho-avermelhados fechou a porta da casa luxuosa com o maior cuidado possível, e tirou os sapatos antes de passar do tapete para o piso branco e brilhoso de porcelanato. Andou na ponta dos pés, para não fazer barulho, mas congelou ao ver o homem que já a esperava, de braços cruzados.

— Ária... –disse em seu tom sério de sempre-

— Isshvan... –ela sorriu sem graça-

— O que pensa que estava fazendo?

— Levando em segurança algumas crianças...

— Qual parte do “seja discreta” você não entendeu? Eu disse que se quisesse fazer isso, fizesse de longe! –expirou sem muita paciência-

— Mas está tudo certo, eles ficarão bem! 

— Não, não está! –suspirou impaciente- Você os está preocupando! Eles podem ser crianças, mas não são burros, devem ter percebido porque você os estava acompanhando. Com todos esses ataques acontecendo e os desaparecimentos, achou que não notariam? –gesticulava-

— Ah... Bem... – a mulher abaixou a cabeça-

— Além disso, como pôde falar para eles sobre minha transformação? Pensei que tivesse sido claro quando lhe pedi para que mantivesse segredo sobre isso... –franziu o cenho-

— Desculpe, eu pensei que eles ao menos sabiam sobre aquilo... Mas pelo jeito eles só viram a animalia, não a transformação de verdade, não foi...? –ela olhou de soslaio-

— E não precisam saber de nada disso. Fique quieta, não os deixe ainda mais cientes sobre esses assuntos... Você deveria saber Ária, esse é um mundo que quanto mais se aprofunda, mais escuro e impossível de sair se torna... –a expressão do homem tornou-se sombria ao dizer isso-

— Sim...

            Ela abaixou o olhar decepcionada consigo mesma e tristonha por levar uma bronca.

. . .

Em algum lugar da cidade,

2:00h da madrugada

. . .

Na escuridão dos acontecimentos que se tornavam constantes, as mesmas criaturas das quais Ária tentava proteger aqueles jovens, as mesmas que estavam fazendo súbitos ataques aos pacatos cidadãos, tramavam e se deliciavam com os frutos de seu trabalho.

Um homem alto, bonito, com um ar de elegância e um rosto sério, andava suavemente perto de um prédio que era um hospital da cidade. Os cabelos dele eram um castanho bem claro, ondulado, que iam até a nuca, os olhos dele, distintamente vermelhos, e um sorriso sedutor.  

Ele parou do outro lado da rua, numa calçada em frente ao prédio, e ficou ali, observando a movimentação. Obviamente as ruas estavam vazias, as luzes do hospital todas apagadas. Ele encostou-se à parede, perto de um poste de luz, e calmamente observou.

O que ele olhava e esperava tão pacientemente em frente aquele prédio? Os frutos de seu trabalho de noites anteriores. Sim. Algumas boas ferramentas úteis para os planos que ele e outro vampiro tinham para aquela cidade.

Bem ali, naquele hospital, dormiam algumas das vítimas dos ataques recentes que tomaram lugar na cidade, e agora deviam estar se contorcendo de dor enquanto se transformavam lentamente no que chamamos de “vampiros”.

Um exército deles. Como? Por que uma vez que apenas uma pessoa comum virasse um vampiro, morderia outra, e se esta sobrevivesse, se tornaria um vampiro, e assim seguiria o desastre cíclico.  Imparável.

Bastava esperar aqueles novos seres “despertarem”, e ensiná-los como se alimentar, mantê-los sob controle e sob vigia enquanto podia-se muito bem usá-los para se alcançar os objetivos.

Humanos não eram bem vindos nunca. Não para este puro-sangue. Era uma dádiva que nasceu diferente, seus pensamentos e crenças tornaram-se distorcidos ao longo dos anos, tanto por o que lhe foi passado das tradições de sua família quanto por as desagradáveis experiências que havia tido com humanos até então. A única serventia dos humanos era tornarem-se servos dos mais fortes, dos puros-sangues.

O ódio que este vampiro nutria por humanos era explícito. Ele havia se unido com o outro puro sangue por este motivo, por este sentimento perverso que ambos tinham pela raça humana, e ele sabia que o outro faria de tudo para alcançar seus objetivos, bem como ele.

Uma brisa noturna passou por ali, tão logo a brisa passou, o homem da calçada sumiu, sem deixar rastro. 

. . .

            Dentro do escuro quarto de hospital, iluminado apenas pela luz da lua que entrava pela janela de cortinas semiabertas. O branco das paredes e do chão refletia a luz nos lençóis azuis, deixando um fraco branco-azulado como iluminação do local.  

            O homem deitado no leito parecia ter pesadelos e suava frio. Ainda era possível ver os hematomas na pele, alguns no braço e no rosto.

            Uma sombra apareceu no quarto, com os olhos vermelhos cintilando na escuridão, assistia enquanto o homem se revirava na cama.

— Urgh... –o sujeito deitado no leito abriu os olhos, assustado- ... Ah... –sentou-se com dificuldade-

            Tocou na cabeça que latejava e demorou alguns segundos para que ele notasse que não era o único naquele quarto. Assustado, resolveu olhar para o lado, na direção da janela lentamente, felizmente não havia nenhuma sombra lá, mas ele podia jurar que havia visto um brilho vermelho e que havia uma silhueta sombria ali agora há pouco. Coçou os olhos, e assustado, voltou a dormir.

Fora dali, novamente na calçada o homem apareceu, e um sorriso maléfico se formou nos lábios do puro-sangue de cabelos ondulados:

— Ainda não está completo... Mas em alguns dias...  

. . .

            Alguns dias depois os noticiários passaram uma notícia assombrosa: misteriosamente um homem que estava naquele hospital sumiu, sem deixar pistas, ninguém entrou e ninguém saiu do quarto além dos enfermeiros e médicos que foram os primeiros a notar o sumiço, e era impossível pular, pois o leito ficava no quarto andar do prédio.

            Surgiu então entre os trabalhadores daquele hospital um pânico e a lenda sobre o “paciente fantasma” que sumiu sem deixar vestígios.  

            No dia 30 de março, uma semana após a visita noturna, mais uma vítima de um dos ataques que estava em um hospital, sumiu. Desta vez, uma mulher jovem. Os casos de sumiço de pacientes não se limitaram a estes dois, dias antes dois outros pacientes haviam sumido além do homem que foi visitado.

            Os sumiços não foram conectados, a mídia não divulgou todos eles, é verdade que todas as vítimas que sumiram haviam sido atacadas da mesma forma, mas nem todas sumiram, algumas morreram, a polícia não conseguiu chegar a uma conclusão. Porém, uma pessoa ainda não havia desistido da investigação sobre os casos, movida pela curiosidade e sede sobre o oculto, a detetive do ensino médio com uma imaginação fértil e personalidade peculiar: Alícia Aven.

. . .

23h do dia 31 de março

. . .

            Aqui estou eu de novo. Não há como não ter escutado sobre os recentes ataques que aconteceram na cidade. A polícia acredita num maníaco, eu acredito em outra história.

            Bem, o conto não acaba por aí, não foram só ataques, mais do que isso, as vítimas perderam uma enorme quantidade de sangue, e ao serem hospitalizadas, bastou alguns dias para que sumissem do hospital. O que acham disso? Estranho para pessoas doentes sumirem do quarto do hospital sem deixar traços, ainda mais de um quarto em algum andar alto, não? O que acha que acontece quando alguém que é atacado por um vampiro, sobrevive?

            Os policiais podem não ter mais um rumo para investigar. Ao contrário deles minhas investigações começam aqui.

            Descobrir quem realizou os ataques, qual o objetivo por trás disso e principalmente, impedir que mais pessoas se machuquem. Foi para isso que criei o clube, encontrar estas criaturas das quais só ouvimos falar nas lendas, conhece-las, e impedir os malvados destas raças de machucar as pessoas bem como impedir que as pessoas machuquem os seres pacíficos destas espécies, esse é meu orgulho como líder do clube!

            Primeiro vamos refazer os passos de quando os ataques começaram. Eu marquei no mapa da cidade em quais bairros aconteceram e fiz questão de anotar na minha caderneta um breve perfil das vítimas e hora a qual foram atacadas.

            Foram sete vítimas ao total, três faleceram após alguns dias e quatro sumiram misteriosamente de seus quartos durante a madrugada. Hum... A primeira questão é: como estas pessoas sumiram? Conseguiram sozinhas ou alguém mais as ajudou...? Porque por agora elas já devem ter se tornado um deles...

            A segunda questão: Onde estão estas pessoas agora? Pelo que ouvi, após o sumiço delas, houve mais três ataques com vítimas de perda de sangue, elas estão desde a semana passada no hospital.  Vou ficar de olho nas novas vítimas.

            Hoje eu vou me concentrar naqueles que já sumiram, eles que são os mais perigosos, e mais perigoso ainda pode ser aquele que vi outro dia. Novamente, prefiro deixar o garoto Silas e a novata fora disso. Ele pode ser o vice-presidente, mas ainda não está preparado para assumir grandes responsabilidades, e a menina Karen menos ainda. Os dois são muito ingênuos para estes assuntos sobrenaturais, mas eles têm potencial, então irei prepará-los mais um pouco antes de passar meu cargo...

            Bem, esta investigação dentre todas, será a mais perigosa, isto porque não sei onde estão meus inimigos e o número deles cresceu agora. Não é aconselhável ir sozinha, mas isso é pelo bem dos humanos da cidade, e do professor também. Caso algo aconteça... Eu tenho tudo preparado no meu celular...

            Não importa... Agora que comecei, é algo que devo terminar! Me preparei bastante, tenho suprimentos na pesada mochila em minhas costas, o peso do preparo e anos de buscas por estas criaturas, e também o peso da responsabilidade de guiar e proteger os mais jovens no assunto!

            Trouxe tudo: binóculo de visão noturna, lanterna, alho, estacas, cruzes, água benta (peguei hoje cedo com um padre amigo da minha mãe), tenho algumas porcarias pra enganar barriga, roupas (caso precise me disfarçar ou me livrar de roupas sujas de sangue), celular, caderno, caneta, bem... Já percebi que não esqueci nada em casa mesmo. Um investigador tem que sempre andar preparado para todos os tipos de situações afinal.

            Meus pais também não sabem que eu saí de casa essa hora, meu pai viajou com minha mãe, foi a oportunidade perfeita para que eu investigasse. Mas, antes de começar, enviarei um sms para o garoto Silas e para menina Karen:

Boa noite~

Sr. Vice-presidente e menina Karen, apresentem-se no clube amanhã,

Teremos muito o que conversar!”

            Agora vamos lá!

            E fervendo de curiosidade por dentro, a garota inspirou determinação e foi em direção a um futuro sem volta...

. . .

Casa dos Belmont,

. . .

— Humn...? –o garoto deitado na cama coçou o olho- Mensagem da Alícia essa hora...? –bocejou e mexeu no celular- Hã? Será que ela não tem nada mais interessante pra fazer além de falar sobre o clube...? –suspiro- Bem, ela é a presidente suponho que realmente ame essas coisas... –bocejo- Deve estar tramando algo maluco de novo...

            E aconchegando-se na cama, o garoto dormiu puramente, sem saber do que estava para acontecer e que mais tarde, talvez, se arrependeria de não ter dado atenção àquela mensagem...  

. . .

Nos Galpões perto do porto,

1h da manhã,

. . .

            Uma noite com o brilho cintilante das estrelas que apareciam por entre os algodões cinzentos que se destacava da lua, que era, em parte, oculta pelas nuvens.

“Ah! Os ventos mudaram, é primeiro de abril...”

            A garota sorriu quando o vento elevou seus cabelos. Estava entre os infames galpões. Ela voltou lá pelo simples fato de que todas as vezes que fora ao local havia algo interessante acontecendo e aquelas criaturas estavam sempre lá.

            Conseguia ouvir o som das ondas do mar ao longe e ouviu também o som de um navio sinalizando a chegada ao porto. Mas concentrou-se ali, onde estava porque se esgueirava entre um galpão e outro, furtiva e cautelosa para não ser descoberta.

            Era bem possível que todos os “desaparecidos” estivessem ali, reunidos com o “chefe”, já que aquele parecia ser o ponto principal de encontro.

“Se eu conseguisse tirar uma foto ao menos daquele chefe... Isto é, se ele estiver mesmo por aqui...”

            Seus devaneios foram irrompidos por um som de um galão de gasolina vazio caindo no chão. A menina, assustada olhou para trás, era um breu. Naquele espaço entre um galpão e outro, bem no fundo, a luz não iluminava, o barulho tinha vindo de lá. Aparentemente, não havia nada ali além do galão caído e um monte de entulhos, podia ser só o vento. Voltou a se concentrar à frente. Iria conferir de galpão em galpão se as criaturas estavam no local.

“Provavelmente aquele vampiro não vai estar lá de novo... Tenho certeza de que ele me notou naquele dia, então... Ele não seria burro de ir ao mesmo galpão, talvez nem esteja neste mesmo lugar, embora meus instintos de detetive estejam tinindo... Acredito que algo muito suspeito vai acontecer aqui...”

            Repentinamente, a porta de um dos galpões se abriu rangendo. Alícia ficou estática. Subitamente, ouviu um barulho vindo de trás dela, distante. Um pedaço de madeira rolou e caiu de um monte de entulho, perto de um galpão mais atrás.

            Encarou por alguns segundos aquele monte, de olhos arregalados, até que ouviu a porta do galpão que estava aberta, se fechando, bruscamente. Engoliu seco e começou a suar frio. Abriu um sorriso no rosto, com certo receio.

“Parece que alguém está brincando comigo... Uh... Tenho certeza de que se estarei caindo numa armadilha se for lá olhar... Mas... Se eu recuar agora é bem possível que já tenha preparado uma armadilha pra essa situação também... Que enrasco!”

            Sorriu sem um pingo de graça. Aquilo era mais um desafio e querendo ou não, ela teria de ir em frente agora, seja lá qual fosse o resultado de sua imprudência de perseguir vampiros, sozinha, no meio da noite.

            Respirou fundo e entendeu que se esconder não adiantaria, seja lá quem fosse já havia notado a presença dela ali,

“Se é pra ser assim, então...”

            Ergueu o rosto e o olhar e saiu de seu esconderijo, andando na larga estrada cimentada.  Com duas fileiras de imensos galpões dos lados. Foi em direção ao galpão cuja porta acabara de se fechar.

“Uh... estou sentindo um friozinho no estômago... Isso me lembra da primeira vez que eu comecei a pesquisar sobre essas coisas... No fundamental... Naquela época ainda estava florescendo para o sobrenatural... Ah! Bons tempos!”

            Enquanto pensava um tanto nervosa, suspirou e seguiu em frente, primeiro verificou se não havia ninguém por ali. Nem sombra. Nada. Aproximou-se de alguns galões e entulho perto da parede do galpão. Procurou algum buraco para tentar espiar o que estivesse lá dentro, mas não achou.

“Entendo... Foi por isso que escolheu este daqui... Assim eu vou precisar entrar e uma vez que esteja lá dentro, não haverá escapatória...? Esperto, muito esperto... Mas truques como estes não são o suficiente para enganar a mim, Alícia. Se não temos uma abertura, basta fazer uma...”

            Ela remexeu na mochila de costas que carregava, e tirou uma ferramenta de lá, um martelo.

“Há... Eu trouxe esse aqui pra enfiar estacar, caso precisasse, mas parece que vai ser útil pra outra coisa...”

            Com toda a vontade e com um sorriso revestido de ânimo, martelou a parede. Uma, duas, três vezes até parar ao ouvir um barulho.  Aquele barulho irritante e agourento. Ela já havia ouvido antes...

Koo, koo, koo...

“Ei, essa coruja é...”

            Olhou em volta, a coruja estava pousada na beira do telhado do galpão, olhando para baixo, para Alícia.

— Olha só quem temos aqui... Minha amiguinha noturna... –sorriu- Não desta vez, você não vai me impedir desta vez, corujinha—disse com determinação-

Koo

            Ela focou na parede do galpão, e quando iria martelar mais uma vez, a coruja desceu do telhado dando um rasante sobre a cabeça dela,

— Kyah! –pôs os braços para proteger a cabeça-

            Infelizmente, as garras afiadas da coruja arranharam o braço dela.

— Ai! –largou o martelo no chão, pela dor nos braços-Droga! Coruja idiota! –olhou para a direção do animal, irritada-

— Ora, ora... –uma voz masculina soou da direção que a coruja voou-

            No meio da estrada à meia-luz da lua, a figura de um homem foi surgindo. Cabelos castanhos ondulados, elegante, com olhos sedutoramente numa coloração vermelha. Ele posicionou um braço para a coruja pousar. O animal se empoleirou no braço dele, e ele acariciou a cabeça da coruja com a mão livre.

— Assustou-se com ela? –ele sorriu com uma gentileza cínica-

Alícia virou-se completamente, franzindo o cenho, preocupada, aquele ali era um dos perigosos.

— Olha só, está sangrando... –disse o homem com um leve sorriso no rosto- Devia tomar cuidado... Ela geralmente não é agressiva, mas vendo alguém aqui tão tarde da noite... A coruja deve ter pensado que era um inimigo... –a falsidade na voz do dele aumentou-

—... –a menina sorriu como se estivesse sendo desafiada- Eu também deveria estar estranhando, Senhor... Alguém por aqui, tão tarde da noite... –disse fria- Deve ter sido você que atacou aquelas pessoas, e também deve saber onde estão agora...

—...

— Muitas pessoas desta cidade estão desavisadas, não sabem sobre nada desse mundo, nem sonham com nada disso, mas eu sei Senhor vampiro, sei muito bem o que esteve fazendo por aqui... Seus olhos, sua aparência, nada disto me confunde –disse enquanto sentia a ardência dos arranhões- Mas permita-me dar-lhe um aviso: Melhor não brincar com as pessoas desta cidade.

— Perspicaz para uma garotinha, devo dizer... –ele riu- Tem muita confiança, e foi muito bravo de sua parte vir aqui sozinha, mas não foi a melhor alternativa...

Alícia franziu o cenho ainda mais quando o astuto dono da noite continuou enquanto acariciava suavemente a coruja:

— Se tivesse sumido quando Silver te ajudou daquela vez e não tivesse voltado aqui, eu não me importaria, mas agora que veio... Temo que eu não possa mais ignorar já que tem tanta vontade se envolver com o que não deve.

— Vai sugar meu sangue até eu morrer ou vai tentar me transformar como fez com aquelas pessoas? –sorrateiramente mexeu no bolso e pegou o celular-

— Eu? –ele sorriu gesticulando- Não, não... Eu não farei nada, não gosto de sujar minhas mãos... Mas... Sabe, têm alguns colegas meus aqui que estão bem agitados desde que te viram... E eles não parecem satisfeitos em apenas observá-la... Talvez eles queiram te conhecer melhor...

—...!

            Adrenalina começou a correr pelas veias da menina quando ela o ouviu pronunciar aquelas palavras. Era como se um sensor gritasse que havia perigo iminente. Ela precisava correr, fugir dali o mais rápido possível, era o que seus instintos vociferavam, porém, sua razão insistia em ficar, aquilo era emocionante.

            Pela primeira vez em toda sua vida Alícia Aven se encontrava cara a cara e conversava com uma daquelas criaturas, já havia falado com o professor lobo antes, mas este... Este era definitivamente diferente, um vampiro e dos maus! Não perderia uma oportunidade destas por nada na vida! Foi o que ansiou grande parte de sua existência. Apesar de Silas e Karen terem entrado nesse mundo depois dela, eles já haviam passado por muitas situações como essa, e ela, só agora vivenciava isto. Sabia que não era aconselhável permanecer, mas não podia evitar o sentimento de satisfação que corrompia seu instinto de fuga. Um sorriso se apoderou do rosto de Alícia.

            Uma fraca chuva e algumas trovoadas começaram para intensificar a tensão da situação.

“Trovões nem abril? Isso é insano... O clima está ficando mesmo denso por aqui... Há... Não consigo parar de sorrir... Parece um daqueles filmes de suspense...”

            Vários pares de olhos vermelhos surgiram das sombras, espalhados pelos espaços escuros entre os galpões. Olhos sedentos por sangue visavam-na.

“Huh... Uma situação pior do que eu pensava... Acho que agora é hora de uma fuga brilhante...”

— Não encostarei um só dedo em você, no entanto, não posso responder por eles... – um sorriso maligno surgiu nos lábios do vampiro- Boa sorte, garotinha.

            Alícia ergueu o celular, um flash apareceu, incomodando os olhos nocivos que a observavam, e no instante seguinte, a garota estava correndo em direção ao porto.

“Ah~ Eu não podia perder essa chance de tirar uma foto! Tenho certeza de que eles são rápidos, mas o porto deve estar movimentado por causa daquele navio que chegou agora há pouco, ainda deve ter gente, eles não seriam descuidados a ponto de atacar na frente de civis...”

            Ela ainda não podia entender... Toda a adrenalina, o medo, a felicidade, uma mistura de emoções tomava conta dela, mas não importava o quê, ela não podia parar de sorrir, não de felicidade, era mais um sentimento de satisfação, após tantos anos ela finalmente se encontrava numa situação que fez seu coração acelerar.

            Alícia Aven, definitivamente não era uma pessoa comum. Sua paixão por aquele mundo oculto superava, de longe, a de alguém completamente anormal. 

            No momento que olhou para trás, não estava sendo seguida, mas assim que direcionou o olhar para frente, já havia dois pares de olhos a observando.

— Kuh! Tão rápido... –suava-

“Nesse caso...”

            Ela remexeu na mochila e pegou algo, em seguida correu indo de encontro com as duas criaturas de olhos carmesim, e jogou sobre elas o que parecia ser alguns pedaços de algum tipo de alimento.

            Foi por um ínfimo segundo, apenas o tempo das criaturas se desviarem por reflexo e foi o suficiente para passar por elas, mas a garota ficou um tanto decepcionada quando não viu mais reações advindas das criaturas, que sumiram de sua vista.

— O quê?! –indignou-se- Alho não funciona? Então as lendas eram mentira?  Tenho que anotar isso em algum lugar... Gah! Não tenho tempo para isso agora, por hora ficará gravado em minha mente.

            De algum prédio abandonado, no caminho dos galpões até o porto, o homem vampiro de cabelos castanhos observava a perseguição à humana com um sorriso maldoso no rosto.

— Isso... Aproveitem a caçada, novatos... A caça tem sempre um sabor melhor ao fim de uma longa perseguição... –alargou o sorriso-

. . .

            Alícia começava a demonstrar sinais de cansaço. Sua estamina estava diminuindo e os seus perseguidores, ao contrário dela, ainda não apreciam afetados pela longa corrida.

“Ah, essa mochila está atrapalhando, mas eu a mantive porque pensei que algo fosse útil... Eu perdi o martelo, então a estaca que tenho aqui só funcionaria se algum deles se aproximasse... Droga! Hahahaah”

            Ela remexeu na mochila enquanto corria e pegou a estaca de madeira de dentro, pegou também o crucifixo num cordão e pôs no pescoço, um homem apareceu em frente a ela, sem hesitação, ela lançou com força a mochila na direção dele, derrubando-o e tentou acelerar o passo.

“Sabia que correr todos os dias de manhãzinha não era uma má ideia... Mas minha estamina está...”

            O chão de pedra estava completamente molhado e torrentes de chuva caiam dos telhados das construções abandonadas, formando lama com a poeira do local.

            Alícia escorregou, na verdade, suas pernas não estavam mais tão firmes, ainda mais na chuva. Se apoiou com as mãos para não bater o rosto no chão de pedra.

— Preciso-

            Sua expressão congelou ao sentir mãos agarrando suas pernas e a arrastando. E gritou alterada ao ser arrastada. Ela virou o tronco para vera criatura que a prendia.

            A adolescente não pensou duas vezes, pegou a estaca que guardara mais cedo e enfiou numa das mãos que prendia sua perna, o resultado foi imediato, com sangue saindo da mão que ela atingiu, o inimigo retirou suas garras dela.

            Rapidamente ela se levantou, sem a estaca em mãos, e correu. Uma dor aguda atingiu sua perna esquerda, estava arranhada, porém, ela precisava continuar fugindo.

“Ainda bem que não é um lobisomem... Se não, com essa ferida eu...”

            Correndo um pouco desengonçada, ela conseguiu chegar à parte do porto onde ficavam muitos containers. Havia fileiras e fileiras deles, empilhados. Ela correu e se ocultou num espaço escuro entre uma fileira containers e outra. 

            Respirava cansada, seu fôlego estava acabado e aqueles arranhões incomodavam. A chuva também não estava ajudando, o clima estava frio, apesar de que seu corpo não estava processando os efeitos já que a adrenalina ainda corria pelo sangue, fazendo-o borbulhar.

— Vão me achar logo... Eu preciso... –ela pegou e celular e começou a mexer rapidamente nas teclas-

“Huh... Chegar a esse ponto... Ao menos eu deixei aquele rascunho preparado...”

. . .

De cima de um container perto de Alícia, o homem de cabelos castanhos a observava.

— Não adianta se esconder... É possível sentir o cheiro do seu sangue de longe, mesmo com a chuva... –sussurrou com um olhar vazio de compaixão-

            Ele assistiu com sua expressão fria a garota que tentava futilmente esconder-se. Seus olhos vermelhos cintilavam na escuridão ainda mais quando ele seguiu com o olhar os passos das criaturas que se aproximavam da localidade da garota.

— Está acabado, humana... –um sorriso nasceu em seus lábios-

. . .

            O celular de Silas vibrou abafado pelos lençóis e colchão. Ele abriu os olhos devagar, sonolento, e tateou a cama até sentir o aparelho de comunicação em mãos.

            Olhou para a tela, estreitando os olhos pelo brilho forte que produzia em meio ao quarto escuro.

— Mensagem da Alícia...? –estranhou- Ela sabe que horas são...? Ah... –colocou o aparelho com a tela virada para baixo e fechou os olhos-

. . .

            A chuva estava piorando, as gotas estalavam ao bater no chão. A líder do clube de ocultismo começava a sentir frio, já estava parada ali há alguns minutos, o clima estava ainda mais tenso. Os cabelos grudavam no rosto dela e as roupas ensopadas contribuíam para que o corpo da menina ficasse ainda mais gelado.

            Aquelas criaturas não haviam mais dado sinal, mas ela tinha certeza de que estavam por perto. Tocou nos cortes na perna, estavam doendo um pouco, nada que a impedisse de correr novamente.

“Hah... Ainda bem que enviei aquele e-mail antes de sair, só por segurança, agora só é esperar ele vê-lo... Quanto aos meus pais... Ah, sim... Foi bom eu ter colocado aquela carta adereçada a mim no correio hoje de manhã... Quando eles voltarem de viagem e souberem do meu sumiço, possivelmente lerão a carta que tiver a mim como remetente...”

“Quero dizer, esses vampiros não parecem muito espertos, mas aquele de cabelo de ondinhas era bem inteligente... Ele deve se livrar do meu corpo, afinal, esteve fazendo vítimas de um modo que as pessoas normais pensassem ser apenas um criminoso comum...”       

            Ela se levantou, com um sorriso amargo no rosto e voltou a correr.  Não demorou muito para uma das tão faladas “vítimas” dos ataques aparecerem em frente à garota, que imediatamente deu a meia volta e correu no sentido contrário, mas outro apareceu naquela direção também, então ela correu para o lado, saindo das fileiras de containers e correndo num espaço aberto.

            O chão de pedras bem encaixadas estava molhado, cheio de poças d’água. Ela corria agora em um espaço aberto, não muito grande, do tamanho de uma pista de mão única, do lado esquerdo, as fileiras de containers, do outro o mar.

“Guh... Espero que o professor lobo e sua noiva vampira fiquem bem... Isso está tomando proporções enormes... Mas tenho certeza de que como futuro presidente do clube, o garoto Silas se encarregará disso... Ele sempre foi o mais próximo do professor, afinal...”

Ela digitou algo no celular enquanto corria, e quando se deu conta duas das criaturas apareceram no caminho à frente, a garota estancou o passo. Pôs um pé para trás, mas assim que ouviu um barulho perturbador vindo da direção, olhou para trás, e lá estavam mais duas das criaturas, esperando para terminar a caça.

            Agora era possível vê-los mais claramente, banhados à luz da lua, sem nenhuma sombra para esconder sua aparência real: a pele pálida, os olhos insanos e vermelhos, as mãos com unhas grandes e afiadas, os grunhidos aterrorizantes e famintos, os caninos protuberantes. Uma sede imensurável de sangue e uma presa bem à frente, ao alcance das mãos.

“Haa... Não podia ficar pior...”

. . .

            Novamente o celular do garoto o interrompeu seu sono. Ele tateou irritado, sem vontade de ver o que se passava. Sabia que devia ser mais alguma mensagem da líder de clube. Mas o quê de tão importante ela fazia para incomodá-lo tão tarde?

            Tinha razão, era mais uma mensagem da líder do clube de ocultismo. Ele resolveu olhar, se não fosse algo que valia a pena, desligaria o celular e esqueceria isso de uma vez por todas.

— Hum...?

L   a  o ma il

— Hein? A Alícia resolveu inventar um tipo de código ou algo assim? –arqueou o cenho, confuso- Vamos ver a outra mensagem... –cutucou no celular-

Não conte nada aos meus pais, eu já cuidei de tudo...”

— Ei, ei, isso soa mal, o que ela estava fazendo quando enviou isso? –o garoto pulou da cama, um tanto assustado-

“Espera... a outra mensagem era...”

            O garoto retornou para a última mensagem enviada...

“Mail... mail... Ah! Um e-mail! Será que ela enviou um e-mail explicando tudo?!”

            Alegrou-se, ainda de pijamas correu para o computador em seu quarto, iria demorar um pouco mais se fosse olhar pela internet do celular. Esperou ansioso, tinha o pressentimento de que sua líder estava metida em algo que não deveria de novo.

— Ah –suspirou- Só a líder pra me fazer levantar uma hora dessas...

            Batia o dedo indicador na mesa do computador, impaciente. Logo que abriu o e-mail, fez uma expressão mais confusa ainda.

— Hã? Carta? Quem enviaria um e-mail com esse nome...?

            Havia um único arquivo anexado ao e-mail. Uma foto de um documento escrito, intitulado “O Epílogo de Alícia Aven”.

— Não gosto como isso soa... Por que ela enviaria um e-mail desses no meio da noite afinal...?

            Sem delongas, ele abriu o arquivo e começou a ler:

[Olá, Garoto Silas,

            Esta é uma carta muito importante adereçada a você, pode mostrar à garota Karen ou contar para ela o que eu escrevi depois, mas é importante que leia tudo isto sozinho primeiro...]

            O garoto engoliu em seco. De repente uma sensação ruim começou a surgir em seu peito, O que era aquilo, por que Alícia estaria enviando uma carta no meio da noite, assim do nada?

[Em primeiro lugar, eu gostaria de agradecer sua participação e da garota Karen no clube... Eu sempre gostei muito de pesquisar sobre o ocultismo, mas vê, não são muitos que compartilham desta paixão...]

[Quando você apareceu, eu fiquei muito feliz, ainda mais quando garota Karen veio também, não apenas uma, mas duas pessoas estavam interessadas!]

[É claro, ser líder de clube não é um trabalho fácil, e devo dizer que o que nós pesquisamos no clube não é qualquer assunto, dependendo de como conduzimos nossas pesquisas, se torna extremamente perigoso...]

            À medida que ia escaneando as linhas com os olhos, um desespero começava tomava conta de seus pensamentos.

. . .

            Enquanto isso, Alícia estava impedida de fugir por quatro criaturas, duas à frente e duas atrás, ela novamente optou por um dos lados, e correu por ali, não que adiantasse muito...

. . .

[Garoto Silas, você tem muita capacidade. Por isso fiz de você o vice-presidente. Pode não notar, mas também tem um sentido aguçado para o oculto, tenho grandes expectativas sobre você. Tenho certeza de que adquirirá grandes habilidades algum dia, contudo... Ainda era cedo, tanto para você quanto para Karen... Após analisar as reações que tiveram quando descobriram sobre o professor lobo, decidi que ainda não estavam maduros o suficiente. Por isso, estive fazendo algumas investigações longes de seus olhares...]

[Era um campo perigoso, não tive escolha, envolver novatos só faria tudo ser mais complicado, sem mencionar o risco que suas vidas correriam se viessem comigo...]

— Investigações...? O que ela esteve fazendo...? –perguntava a si mesmo com a voz embargada- Era por isso que ela estava estranha por esses dias?

[Eu descobri algumas coisas... Como eu suspeitava há vampiros nesta cidade, mas não entrarei em detalhes aqui nesta carta, não a escrevi para isso, poderá ler sobre minha pesquisa num documento que escrevi, está na sala do clube, a chave está no clube também, deixei lá para este caso...]

. . .      

Uma das criaturas puxou os pés de Alícia, fazendo-a cair. Ela bateu a cabeça no chão duro e gelado de pedra, cortando a testa.

— Ai! –puxava as pernas para se livrar do aperto da criatura-

. . .

[Se estiver lendo isso, quero que preste bem atenção ao que vou lhe dizer agora...]

—‘Se’ estiver lendo? A Alícia tá de brincadeira? –Silas forçou um sorriso fraco tentando disfarçar o nervosismo e temor que sentia em seu íntimo-

[Como líder do clube de ocultismo eu tive muito orgulho, fiz meu dever e tive pessoas que me apoiaram. Eu pude realizar meu sonho de conhecer algumas criaturas que há muito tempo eu acreditava que existiam, e pude conhecer vocês... Poderia morrer muito feliz agora...]

[Há seres de alta periculosidade na cidade, eu tentei ao máximo deixar você e garota Karen longe disso, mas não há escolha, uma hora ou outra, vocês descobririam sozinhos, não é?]

[Eu ainda tinha muito para lhes ensinar, queria ficar e guiá-los mais um pouco, é triste saber que não poderei mais ajudá-los...]

— H-hã?

O garoto não sabia mais como se expressar, seus olhos já começavam a arder.

[Ser líder do clube não é uma tarefa fácil... Muitos irão rir de você, criticá-lo, mas sei que não permitirá que isso o afete. Você é forte Silas!]

[Muitas vezes vai precisar se envolver com coisas e pessoas perigosas, vai passar por situações que não gostaria, e a segurança não será um prioridade durante seu trabalho, é esse tipo de dificuldade que tem em ser líder do clube de ocultismo...]

[Por isso eu lhe direi algo mais: você pode escolher. Eu gostava muito do meu trabalho e amo o oculto, mas garoto Silas, você pode decidir... Pode assumir minhas responsabilidades e tornar-se o líder, continuar o que fazíamos ou pode desistir, fechar o clube e ter uma vida normal.]

[Se optar por segurança, não acredito que o professor Leonhard lhe fará mal, ele também preza por nossa segurança... Se assumir o cargo, passará por um caminho árduo...]

[Escolha o caminho que acreditar ser o melhor e não se arrependa não importa qual escolha fizer...]

[Ah! Cuide bem da garota Karen, ela é ainda mais inexperiente que você, trate de cuidar para que ela fique segura, não a deixe se envolver com assuntos perigosos como eu. Não permita que ela seja tão imprudente...]

. . .

            Alícia conseguiu se soltar do aperto da criatura, e tentou se levantar, deu alguns passos e caiu, cansada. O celular que segurava nas mãos caiu um pouco longe, ele tentou alcançá-lo esticando a mão, mas não conseguiu. A chuva fazia seu corpo tremer de frio. E tornava o ar gelado, difícil de respirar.

            Ela olhou para trás enquanto os monstros se aproximavam dela, cercando-a, com os olhos sedentos de sangue, uma fome incontrolável que não podia mais ser adiada.

. . .

[Me dói saber que não poderei mais continuar no clube... E dói ainda mais saber que terei de deixar uma responsabilidade tão grande em suas mãos quando não tive tempo o suficiente para prepará-lo...

Sinto muito, garoto Silas...

Lhe desejo boa sorte e coragem...]

. . .

            Alícia Aven estava agora sentada, com um sorriso azedo no rosto, olhando para as criaturas que a cercavam lentamente.

“Vamos lá, Alícia... Se vai acabar assim, tem que ser com estilo... Não demonstre medo, não chore, não há nada para temer... Você realizou seu sonho, fique feliz.”

            E com as palavras que sussurrava para si mesma em seu ínfimo, inspirou coragem, sem relutância, com o olhar firme para o destino traiçoeiro que a aguardava.

“Pessoas corajosas morrem sempre com um sorriso no rosto...”

Alícia ergueu o olhar e, com um sorriso que ela sempre carregava no rosto, aceitou o destino inevitável.

. . .

[... Por último, meu único arrependimento é que não pude passar mais tempo com todos vocês... Porém, agora é tarde para dizer isso...]

[Dê lembranças minhas a menina Karen, ao professor lobo e à noiva dele por mim,

Este é o Adeus, garoto Silas.]

. . .

            As criaturas avançaram em direção a garota caída no chão, que já não possuía forças para se levantar. O homem de cabelos castanhos deu um sorriso malévolo e deu as costas para cena, satisfeito com o desfecho que aconteceria.

            Naquela noite no porto, a única testemunha do que aconteceu foi a chuva, ninguém mais viu o ouviu o que se passou. Ninguém precisou assistir o destino cruel que acometia à ex—líder do clube de ocultismo...

. . .

— Alícia... –disse Silas, com uma entonação que beirava o desespero-

            Um aperto pontava o coração do jovem. O medo, a angústia, era inaceitável. As palavras que lia na carta não faziam sentido, ele gritava internamente para si mesmo que só podia ser uma brincadeira de mau gosto. Alícia estava na escola mais cedo, como no mesmo dia ela...?

            Ele negou o fato para si mesmo e desejou com todas suas forças que aquilo fosse apenas mais um dos delírios de sua líder. Não conseguiu pregar os olhos e seus pensamentos o atormentaram por toda a noite, deixando um sentimento ácido em seu coração.


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