O Passado Nos Condena escrita por Fernanda Melo


Capítulo 5
Um Dia, Quando a Luz Estiver Brilhando




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                Era tarde de quinta feira, o sol estava sobreposto no alto do céu, aquecia Forks até mais que alguns dias atrás de vento gélido. A aula do colégio de Riley havia enfim terminado e a saída tumultuada era um motivo de preocupação. Aqueles dias estavam sendo normais para Riley ou quase, ela tentava ao máximo esconder as vezes que tinha que aplicar a insulina, ia ao banheiro e lá dentro trancada aplicava o líquido de uma seringa em sua veia. Levava tudo em uma nécessaire para fingir que ia lá para retocar a maquiagem e para disfarçar vez ou outra passava um gloss ou um lápis.

                Na saída ela se despediu de Helena e Marcos seus atuais companheiros, pois desde aquele dia no hospital Ben não olhou mais na cara de Riley nem ao menos para dizer um simples “oi”. Hoje enquanto caminhava até o outro lado da rua sozinha, para esperar Emmett que lhe prometera buscar na escola, Josh apressou-se a alcançá-la.

                - Hei Cullen... Espera um minuto.

                - O que foi Josh? – Ela não estava nem um pouco a fim de conversar com Josh, ele é um típico menino gamado em garotas nas quais ele leva um fora e não foi diferente com Riley, ele era louco para começar um relacionamento com ela e até conseguir outra coisa, mas Riley não tinha olhos para meninos safados e muito menos mais velhos que ela. Josh estava no terceiro ano, já com seus 17 anos, um corpo inteiramente másculo e bem definido, uma barriga começando a aparecer os gomos e um peitoral bem extenso, algo que tirava o fôlego de qualquer menina, menos a de Riley

                - Nossa não precisa ficar nervosa.

                - Olha não estou muito bem, muito menos para conversar com você.

                - Apenas queria perguntar algo... Percebi que você e o seu amiguinho não estão mais andando junto e ele resolveu ficar mais tempo com Molly.

                - Desenrola vai...

                - Bem soube também o que aconteceu com você, sinto por isso.

                - Isso o que?

                - A diabetes...

                - Quem foi que lhe disse isso?

                - Molly, olha se eu fosse você se preparava você sabe o que pode vir daquela mente genuína.

                - Aquele imbecil disse pra ela...

                - Quem? O Ben? Olha eu não sei ela apenas me disse isso.

                - Claro que foi ele, era o único que sabia.

                - Se você precisar de alguma coisa eu vou estar aqui está bem?

                - Porque confiaria em você? Você sempre conviveu com a Molly...

                - Olha eu não sou o que as pessoas pensam, apenas quero ser seu amigo.

                - Eu... Vou embora meu irmão chegou.

                Ela olhou no fundo dos olhos dele e por um segundo desviou o olhar para um belo novo casal de amigos que até então começava a dar náuseas em Riley, ela tentou passar direto por Josh, mas foi surpreendida quando ele segurou seu braço, não com muita força.

                - Tente confiar em mim, pelo menos tente...

                - Esquece... – Riley desviou do menino e foi a passos largos até o carro do irmão.

                Emmett havia notado a tristeza expressa no olhar de sua irmã, mas sentiu-se um pouco incomodo em perguntar o porquê.

                - Está tudo bem?

                - Normal...

                - Tudo bem... Desculpe pela demora, um casal não queria sair da imobiliária até fechar negócio.

                - Sem problemas.

                Então o assunto morreu ali, continuaram todo o trajeto até em casa em silêncio, Riley foi nem se preocupou inicialmente em ir até seu quarto e deixar a mochila lá, foi diretamente ao banheiro social do primeiro piso para fazer sua higienização antes do almoço. Quando chegou a cozinha foi rapidamente se servir, enquanto observava sua mãe picar alguns morangos em um pote pequeno.

                - Como foi à aula?

                - Chata... – A menina disse antes de colocar a primeira colherada na boca.

                - Chata? Já faz tempo que não vejo você reclamar de escola. – Esme estava notando as mudanças de comportamento da filha e aquilo era excessivamente preocupante para ela.

                - Estou cansada apenas isso.

                - Querida sei que deve ser um baque para você esta noticia, mas não deixe se abater.

                - Eu estou bem mãe, apenas cansada não se preocupe tanto, assim você acabará com um monte de cabelos brancos antes da hora.

                - Eu tenho 43 anos, logo a vida encaminhará isso para mim.

                - Mãe você ainda é nova não faça drama. – Por fim Emmett entrou no assunto aproximando-se da mesa para começar o seu almoço. – Olha 43 anos, rostinho de 33 anos no máximo, um filho de 25 anos e a mais nova 15anos. Um corpinho de dar inveja nas amigas de sua filha do meio, mesmo tendo três filhos.

                - Emm tem razão mãe...

                - Tudo bem. – Esme estava completamente sem jeito, de qualquer maneira ela não estava muito acostumada a receber elogios. Carlisle sempre era carinhoso com ela, lhe elogiava constantemente e lhe levava flores quando chegava do expediente. Mas os anos que passara com Jonathan a fizera levar para um lado que era a mulher mais horrível do mundo.

                Nunca recebera elogios dele após o casamento, não sabia o motivo pelo qual ele sempre lhe batia, mas castigava sempre a maldita bebida. Ele vivia nos bares, dia após dia após o trabalho pesado, ajudava em construções de casa e o salário não era lá grandes coisas, ainda mais quando ele gastava metade do dinheiro com bebidas e cigarro.

                Seu passado havia sido aterrorizante, não quizera que nada daquilo refletisse na vida dos seus filhos, mas não havia adiantado muito ter se jogado na frente quando Jonathan direcionava a mão aos pequenos. Emmett apesar de tudo era alegre e extrovertido, adorava fazer gracinhas, algo que antes seu verdadeiro pai lhe dizia que não era algo de homem fazer.

                “Os ensinamentos de Jonathan eram rígidos principalmente com o mais velho, seu único filho homem. Odiava lembrar que ironia do destino o futuro lhe reservou uma menina para sustentar, para ele mulher só servia pra lhe dar gastos e já lhe bastava Esme. Ele dizia ao garoto sempre com rispidez que era para aprender a ser a imagem e semelhança do pai. O menino tinha apenas quatro anos, queria se divertir como todos os outros.

                - Mamãe ficou bom meu desenho? – O menino pegou a folha com o desenho dele mesmo jogando bola. Algo que poderia parecer bobo aos olhos de desconhecidos, mas para Esme era uma obra de arte imensa.

                Mas Esme não teve o tempo suficiente para apreciar o desenho do filho antes que Jonathan pegasse rapidamente o papel e em seguida o rasgasse. O menino olhava para o pai assustado com o lábio inferior projetado para frente formando um pequeno beicinho e quase chorando.

                - Filho meu não faz estas coisas de menina, você tem que aprender a ser homem meu filho. – Jonathan segurou os braços de seu filho com força o sacolejando levemente. – Você tem que aprender a trabalhar pesado e me ajudar a trazer sustento para dentro desta casa. Está me ouvindo?

                O menino viu somente um único recurso de sair daquela bronca sem motivos apenas concordando com a fala do pai.

                - Jon pare, ele é apenas uma criança.

                - Não me chame à atenção quando tento concertar um erro que você cometeu Esme.

                - Por favor, fale baixo irá acordar Alice. – Esme olhou de relance para o quarto onde a menina estava deitada com a porta meio aberta.

                - Aquela é outra que apenas me serve para dar gastos como você... – O homem caminhou para mais próximo da mulher deixando o pequeno garotinho amedrontado de lado engolindo o choro com medo de que seu pai lhe xingasse por isso também. – Quando ela ficar um pouco mais velha tentarei fazer com que ela trabalhe na casa de alguma família...

                O homem olhou para a mesa e pegou em punhos uma faca que estava por lá fazendo um risco sobre a camada da mesa pequena e velha de madeira. Esme engoliu em seco e chamou pelo filho silenciosamente.

                - Meu bem porque não vai para o quarto dormir? Já está tarde.

                A mulher limpou carinhosamente as lágrimas que insistiam em descer pelas bochechas do garoto. Ele concordou e quando já ia caminhando o chamado de seu pai o fez voltar o olhar para ele.

                - Hei, nada disso, você não tem nada que obedecer a sua mãe... Homens mandam em mulheres, mulheres nunca poderão mandar em homem algum. Volte aqui garoto AGORA.

                Após o grito aterrorizante de Jonathan um choro de uma criança que havia acordado com o susto do grito fez que a raiva subisse a cabeça do homem, que sem largar a faca foi a passos brutos a caminho do quarto onde a menina se encontrava.

                Esme não seria capaz de deixá-lo fazer tal loucura com sua filha. Correu de encontro ao homem segurando-o pelo braço.

                - Por favor, Jon... Ela não tem culpa de nada vamos para o quarto.

                - Me deixa, vou fazer esta menina calar a boca.

                Jonathan tinha muito mais força que Esme e nessas desavenças normalmente quem saia ganhando era ele. Ele lhe empurrou forte e a mulher foi de encontro ao chão, mas levantando-se rapidamente, não suportaria vê-lo fazer alguma coisa estúpida com sua filha.

                Ela o puxou pelo braço e sua pequena ajuda foi que ele havia bebido hoje como todas às vezes após o expediente do trabalho. O homem perdeu um pouco o equilíbrio indo em direção ao de sua mulher. O garotinho estava vendo tudo aquilo e não conseguia mais conter o choro.

                Ambos acabaram caindo no chão e como o homem já estava com raiva o suficiente, desta vez da mulher, foi para cima dela com a faca em punha. Esme segurava a mão dele com toda força que conseguia e por um deslize, uma simples dor que ele sentiu em sua mão, soltou a faca, que ao fazer o som de metal batendo no peso Esme correu o olhar até onde a faca estava. Esticou o braço livre, mas Jonathan tentou impedi-la, era uma briga injusta, mas algo que Esme estava acostumada e agradecia por pelo menos nisso o álcool lhe ajudar.

                Quando enfim ela conseguiu pegar o instrumento apontou para a cara do marido que se desvencilhou no mesmo instante, saiu de cima da esposa rapidamente tentando acalmá-la. A mulher também levantou e notou um pequeno corte no braço de Jon e se perguntava inúmeras vezes se foi ela quem fez aquilo.

                - Emmett vai para o quarto... Vamos meu amor está tudo bem... – Ela tentava tranqüilizar o filho enquanto ainda mantinha seu olhar grudado em Jon caso ele fizesse qualquer ato suspeito o menino aproximou-se passando um pouco longe do pai e entrou no quarto, mas esperando sua mãe logo na porta.

                - Larga a faca Esme. – Ele dizia enquanto ela caminhava de costas até o quarto das crianças.

                - Você é louco Jonathan, louco...

                - Você irá me pagar por isso está me ouvindo?

                A mulher entrou no quarto trancou a porta com a chave e tratou de rapidamente arrastar a cômoda para trás da porta dando uma sustentação a mais caso o homem tentasse arrombá-la.

                - Você irá ver amanhã Esme, quando voltar do serviço irei bater em você até quando não conseguir respirar mais sua vadia.

                Ele socou a porta algumas vezes o que fez Esme tremer enquanto abraçava os filhos. Era difícil transmitir segurança para os filhos naquele momento tão delicado, mas eles eram suas vidas. Logo após tranqüilizar a pequenina e fazer seu garotinho dormir ela sentou ao lado da única cama dividida entre os filhos e adormeceu após muito tempo encostada à parede.”

                Esme sabia das diferenças de comportamento dos filhos, Emmett soube lhe dar com tudo aquilo, por um ponto tomou as dores da mãe e irmã, a quem seu pai fez mais mal. Transformou esses sentimentos e rancor e ódio, mas guardou no fundo de seu coração, somente quando dizia sobre seu pai é que em seu olhar deixava bem claro o quanto o odiava.

                Emmett jurava que se naquela época tivesse ao menos tamanho teria matado o pai. Odiava lembrar as várias vezes que viu a mãe chorando pelos cantos, preocupada com ele ou Alice, ou quando acordava e via os vários roxos e machucados pelo corpo da mãe, sem contar quando não a encontrava desmaiada em casa. Tudo isso por puro machismo do pai. Mas decidiu ser feliz quando começou a confiar em Carlisle. Por várias vezes testou a paciência do mesmo quando ia visitar sua mãe, chutando-lhe as canelas e sendo nada amigável. Apenas queria ter certeza que não seria outro Jonathan na vida de sua mãe e irmã.

                Alice não soube lhe dar muito bem com aquilo, as agressões do pai sempre estavam presentes em sua memória e por mais que ela não tivesse muita idade naquela época às pequenas cicatrizes espalhadas pelo seu corpo era um gatilho de memórias. Pequenas queimaduras de bituca de cigarro em seu braço, pequenos cortes em suas costas.

                Quando as memórias vinhas não era somente a dor psicológica que ela sentia, mas também as dores físicas era como se sentisse de novo as vezes que seu pai lhe batia com o cinto ou com a colher de madeira. Sentia as vezes que ele queria lhe torturar, fazendo covardias eminentes, como trancafiá-la no galinheiro que tinha no fundo de sua casa em tempo frio. Muita das vezes ele castigava a menina ou batia em Esme por motivos tolos, que ele achava que eram necessários, ele poderia apelar com um espirro, ou por alguém naquela casa estar andando apenas.

                Jonathan era extremamente maldoso com Alice e Esme, poucamente com Emmett, isso porque ele era machista, achava que seu filho seria igualmente a si, que faria as mesmas coisas quando ele crescesse e casasse. Mas por sorte o futuro reservou algo melhor que os maus tratos de Jon e seus castigos sem razão.

                ***

                Mais à tarde quando todos estavam presentes em casa, menos Emmett que foi ajeitar algumas coisas em sua mais nova casa, Riley assistia TV ao lado do pai. Carlisle afagava os cabelos dourados da filha enquanto pensava o quanto ela estava manhosa nos últimos dias. Esme sentou-se ao lado de Alice que nem ao menos prestava atenção na TV e sim na pesquisa em seu notebook.

                - Alice... Vamos conversar? – Riley olhou para a irmã com enormes olhos pidões. Alice adorava aquele jeitinho de Riley de quando queria alguma coisa. Ela olhou e sorriu para a irmã abaixando a tela de seu notebook.

                - Noite de garotas? – A menina deu uma curta gargalhada enquanto afastava-se do pai, e olhava com uma expressão sapeca o que fizera de imediato Esme rir.

                - No seu quarto ou no meu?

                - Estou me mudando. – Alice disse ao se levantar e se encaminhar para a escada. – Boa noite para vocês. – Alice mandou um beijo no ar para a mãe antes de subir e esperou pela resposta de ambos, enquanto isso Riley teve a paciência para dar um beijo na bochecha de cada um e desejar uma boa noite e somente em seguida foi se arrumar.

                Eram apenas 20horas e 30minutos quando ambos já estavam deitadas na cama com os despertadores já programados, cada uma enrolada em seu cobertor. Alice olhou para Riley que olhava fixamente para o nada. Sabia o assunto principal que Riley tocaria e visto que ela estava extremamente indecisa sobre como começar o assunto antecipou com uma simples pergunta.

                - E como está o convívio entre você e Ben?

                Alice voltou o olhar para Riley virando sua cabeça para o lado esquerdo, a menina demorou um pouco até, por fim, ter a mesma reação.

                - Não nos falamos desde segunda...

                - Isso será apenas uma fase e por mais que pareça que irá demorar logo vocês voltarão a ser amigos.

                - Ele nem olha mais para mim... E o pior de tudo que eu passei por cima do meu orgulho e lhe pedi desculpas e mesmo assim ele nem quis saber.

 A menina suspirou pesadamente, fechou os olhos quando sentiu seus olhos queimarem com o aparecimento de lágrimas. Em seguida voltou abri-los, e olhou para a irmã e com a voz trêmula começou a dizer.

- Ele tem uma nova melhor amiga, e quem sabe até futura namorada... Ben deve me odiar... Eu devo ter sido uma péssima amiga para ele. – A menina mal percebeu quando deixou duas lágrimas escaparem. Alice inclinou um pouco na cama, deitando-se um pouco de lado e apoiando sua cabeça no braço esquerdo, enquanto com o outro enxugava as lágrimas da irmã.

- Ele era meu único amigo verdadeiro, sei que todos os outros andam comigo por interesse ou por falta de terem com quem andar... Ninguém nunca será meu amigo como Ben. E eu sinto tanto por ter dito aquelas coisas para ele...

- Você não é e nunca será uma péssima amiga, acho que Ben estava de cabeça quente, soube pelo papai que Eleazar passou mal por causa de pressão naquele dia e ainda por cima ficou preocupado com você... As coisas que você disse a ele não estão erradas, ele apenas não soube aceitar tantas informações ao mesmo tempo.

- Eu não devia ter feito aquilo...

- Você é amiga dele de verdade, se não fosse não tentaria abrir os olhos e avisá-lo sobre Molly. Ele apenas não quis aceitar, não sei o motivo, mas você agiu certo. Eu faria o mesmo se estivesse em seu lugar.

- Será que um dia ele irá conversar comigo? Ele está sendo tão duro comigo...

- Dê tempo ao tempo, se ele for seu amigo de verdade ele voltará para você.

A menina nada disse, perdurou com o olhar fixo em Alice por três segundos até virar a cabeça de um jeito que ficasse confortável no travesseiro enquanto olhava para o teto e via alguns pontos brilhantes. Os mesmos que obrigara seu pai colocá-los quando tinha apenas oito anos e sonhava em ser astrônoma. Sempre ia ao quarto e desligava a luz e como passe de mágica as pequenas estrelas fixadas no teto brilhavam.

Ela adorava ficar olhando para aquelas estrelas e foi à única coisa que não deixou ser modificado em seu quarto quando foram retiradas suas coisas de crianças dali. Aquilo lhe tranquilizava e fazia-lhe lembrar como era tão bom ser criança, sentia falta de não ter que se preocupar com muita coisa.

- Alice posso lhe perguntar algo?

- Claro.

- É algo que lhe incomoda... – A menina ficou até meio sem jeito de lhe dizer ao certo sobre o que é... Alice ficou curiosa e de imediato pensou sobre as questões que lhe incomodavam e uma chamava-lhe mais a atenção, se era algo que lhe incomodava e sua irmã ficou com receio de lhe perguntar diretamente sem rodeios poderia ser somente uma coisa. Seu passado.

Alice enfrentava aquilo como um enorme dilema, o seu pior pesadelo de todos os tempos. Aquele assunto lhe irritava quando alguém por fora queria saber sobre o mesmo, mas estava falando com sua irmã, sabia que ela não fazia por mal e que ela era apenas curiosa.

- Se você quiser podemos dormir agora mesmo.

- Não, pode perguntar não há problema algum.

- Tem certeza?

- Absoluta pirralha, não me faça desistir...

- Sei que Emm não gosta de falar sobre esse assunto e tenho medo de magoar a mamãe, você é a única paciente aqui nesta casa e que sempre pensa antes de fazer algo...

A menina fez uma pausa necessária, respirou fundo mais uma vez tentando reformular a pergunta para que ela não saísse errada.

- Porque você é tão atormentada com o seu... Você sabe. – A menina não sabia se deveria ou não dizer a palavra pai, via sempre Alice feliz ao lado de Carlisle, sempre o chamando de “nosso pai” ou de “papai”, às vezes até brigavam por disputa de atenção do mesmo e sabia o quanto o pai biológico de Alice a havia feito sofrer, não somente ela, mas como sua mãe e seu irmão.

- Querendo ou não ele infelizmente é meu pai, não consigo odiá-lo o bastante e nem perdoá-lo por completo, mas o medo dentro de mim é grande... Tem certas coisas que as pessoas fazem sem pensar nas pessoas que ama e Jonathan era um deles. – Alice olhava no fundo dos olhos de sua irmã, aqueles profundos olhos azuis que lhe davam confiança. – Ele maltratava a mamãe, xingava sem motivos o Emm e batia em mim. Não tivemos uma vida na qual imaginávamos. Emmett sentia a falta de uma imagem paterna e mamãe sentia falta de um marido prestativo.

- Mas e você mingauzinho?

- Eu... Não sei por que ele me atormenta tanto ainda, tantos anos se passaram e eu aqui, ainda presa ao passado.

- Você deveria se abrir um pouco mais, talvez isso lhe ajudasse... E se você voltasse a fazer terapia?

- Acho uma grande perca de tempo... Pelo menos no meu caso, eu já fiz isso uma vez e não deu muito certo.

- Você tinha treze anos, começando a adolescência e ainda por cima sei como é essa faze encapetada dessas pestes.

Alice suspirou voltando seu olhar para a parede em sua frente e pensou em como tinha seus momentos ruins organizados como se fosse uma lista negra, seus momentos mais odiados e esse era um deles. Lembrava-se perfeitamente daquele dia no colégio, aquele dia parecia que seria apenas mais um dos chatos e normais, mas tinha pessoas que infelizmente não gostavam dela por ali...

“ Carlisle deixou as crianças no colégio antes de voltar novamente para o trabalho, Emmett andava alegre pelo gramado antes de chegar no estacionamento, exclusivo para alguns estudantes, ele sonhava o dia que tiraria sua carta e logo viria para escola sozinho. Alice estava em seu lado, a menina miúda e encolhida esperando passar despercebida por todos ali presentes, mas parecia que aos olhos de Jéssica, Mike e sua pequena gangue de marginais do colégio ela seria sempre visível.

Alice andou ao lado do irmão buscando algum meio de proteção, principalmente quando iria passar ao lado daquele grupinho de encrenqueiros. Ela quase se agarrou no braço do irmão, somente quando estava ao seu lado eles não mexiam com ela, mas infelizmente seu irmão era dois anos mais velho, conseqüentemente ele não estudava em sua sala, conseqüentemente se formaria dois anos antes que ela... E então ela voltava ao desespero em meio seus pensamentos, como conseguiria agüentar dois anos sem Emmett ao seu lado estudando naquele colégio onde ninguém gostava dela?

Quando o sinal tocara anunciando que as aulas começariam Alice já se encontrava na sala de aula sentada no seu lugar habitual no fundo. Ela sentiu seu corpo estremecer quando viu Jéssica e Mike entrarem, alguém ali ao seu lado percebeu o seu medo em sua reação. Jasper olhou para o lado dizendo algo rapidamente para a irmã e um pouco antes de Jéssica sentar-se ao lado de Alice, Jasper empurrou a cadeira sentando-se nela.

- Me desculpe já estava aqui. – O menino de cabelos compridos causou uma raiva imensa na garota que a fulminava indiscretamente. A menina sem render muito procurou por Mike sentando-se ao seu lado. Alice permaneceu inerte em seu lugar, Jasper voltou seu olhar para a menina, aquela sua amiga desde seus oito anos, ele não gostava do jeito que todos a tratavam ali, achava que eram pessoas invejosas. Ele olhou os traços de boneca de Alice, seus cabelos escuros quase negros compridos amarrados em um rabo de cavalo alto, seus olhos verdes escuros inconfundíveis e seu rostinho de boneca, tudo aquilo era incrivelmente proporcional ao seu corpo magro e pequeno.

Ela ao sair daquele transe olhou para o amigo e sorriu singelamente.

                Mais tarde, no momento do intervalo, Alice caminhava a procura de seu irmão por entre as mesas. Eles sempre ficavam juntos nesta hora e por vez ou outra Jasper e Rose. Não percebera quem havia trombado de frente a ela e quando se deu conta estava de encontro ao chão, olhou para cima e viu Jéssica e sentindo novamente seu medo lhe tomar não conseguiu olhar para os lados, mas sentia olhares lhe queimando a pele.

                - Não vê por onde anda sua louca?!

                Alice nada disse e algum lugar por ali. Ao perceber o aglomerado de pessoas se formarem ao redor de certas pessoas, Emmett levantou-se deixando os irmãos um pouco de lado, procurou por sua irmã, sentindo algo estranho em seu peito. Entrou em meio a multidão empurrando as meninas e meninos, tentando amenizar aquele sentimento estranho em seu peito.

                Quando conseguiu ver invadiu aquele pequeno circulo livre onde se encontravam presentes Jéssica, Mike e mais três acompanhantes. Ele foi rapidamente ajudar a irmã a se levantar e quando assim o fez encarou ferozmente Mike, que tinha sua mesma idade porém que não tomava vergonha na cara e já era repetente pela segunda vez do 8º ano do fundamental.

                - Porque você não meche com alguém do seu tamanho otário?! – Emmett chegou encarando Mike, peito estufado, quase colados próximos para partirem para uma briga.

                - Você devia falar para sua mamãe que sua irmãzinha não deveria ficar aqui e sim em um manicômio, ela encontrará mais amiguinhos por lá. – Mike cruzou os braços, seu porte atlético era quase o mesmo de Emmett, que começara a ganhar corpo rapidamente. Mas mesmo assim Emmett ganhava um pouco no requisito altura, sendo cinco centímetros maior. – Você acha que não sabemos que sua irmã vai ao psiquiatra? Cara ela é muito esquisita.

                - Você não deveria ter feito isso. – Emmett riu na cara do garoto tentando não demonstrar muito sua raiva, olhou para ele e fazendo sinal positivo com a cabeça surpreendeu-o com um soco no estômago que o derrubou. – Isso é pra você aprender a não mexer com minha irmã.

                No momento que ele olhou para trás onde havia deixado Alice surpreendeu-se por não vê-la por ali. Foi até a mesa e perguntou caso Jasper tivesse a visto, mas nada.

                Naquele dia Alice se escondeu em meio ao meio muro da escola que dava para os fundos em um terreno abandonado, saiu de lá um bom tempo antes de bater o sinal, caminhou até seu armário e pegou alguns pertences dos quais precisaria e caminhou até o hospital de seu pai. Não queria estar ali, não queria mais ficar visível aos olhos destas pessoas, até mesmo parecia que todos lhe encaravam e que tinham pena de você.

                Enquanto esperou pela a chegada do pai na recepção, ela chorou. Sentia medo das pessoas, não gostava de modo algum ter que conviver com elas. Quando Carlisle chegou à recepção meio sem entender o que a filha fazia ali naquela hora, agachou-se em frente a ela e quando a menina levantou seu rosto ele pode ver seu rosto tomado em lágrimas, ela sem muito pensar impulsionou seu corpo para frente agarrando-se no pescoço do pai.

                Depois daquela tarde, no dia seguinte a família Cullen compareceu no colégio. Esme e Carlisle tiveram uma conversa séria com o diretor e Alice ouvia tudo aquilo ainda permanecendo seu olhar baixo. Seu irmão tentava argumentar e se defender quando o diretor lhe chamou a atenção pela agressão ao amigo e ele mais uma vez detestou ser chamado de amigo de alguém que sentia raiva. Disse que se fosse para defender a irmã que faria tudo aquilo de novo.

                Carlisle exigiu que aquilo mudasse não iria aceitar ver sua filha mais uma vez chegando em casa chorando, dizendo que ela não era igual as outras pessoas ou que não quisesse mais se socializar. Ele sentia as mudanças no comportamento da menina assim como Esme. Depois daquele dia, depois de mais outros dias que não foram diferentes a estes e que perduraram até a saída de Alice daquele colégio, ela nunca mais voltou a ser a mesma garotinha, meiga e sempre com um sorriso no rosto, começou a distanciar-se da família e ficar mais tímida, não conversava muito nem mesmo com sua mãe, eles perceberam que ela não era mais a mesma, a menina que sempre era feliz com a família assim como seu irmão é até hoje.”

- Você deveria pelo menos tentar Alice. – A voz de Riley ia sumindo em meio a um bocejo e outro enquanto Alice acariciava seus cabelos.

- Talvez... Quem sabe um dia, quando a luz estiver brilhando mais forte no fim do túnel. – Ela respondeu sabendo que era somente para si, observando sua irmã dormindo ao seu lado, pensando que deveria enfim colocar um rumo em sua vida, deixar de tarjar de vítima e colocar a Alice que sempre quisera ser em ação. Finalmente ser corajosa e descobrir o valor de sua vida, já havia feito certo até a metade do caminho, levando a sério os estudos e conseguindo um trabalho do seu gosto, agora apenas precisava se desprender de seu passado, cuidar de seu lado pessoal, saber aproveitar o tempo que perdera, mas que lhe serviram de aprendizagem durante este tempo de escuridão.


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Notas finais do capítulo

E aí o que acharam do capítulo? Gostaram? Então deixem reviews para a alegria de um mero autor... Bjos!



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