O Passado Nos Condena escrita por Fernanda Melo


Capítulo 23
Nenhum Herói Deveria Morrer




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/368465/chapter/23

Naquela noite todos se mantiveram alertas, Alice em particular grudada em seu telefone, ela queria apenas tomar o lugar de sua irmã, não conseguia se manter perto de sua mãe e vê-la sofrer daquela maneira e quando Carlisle enfim conseguiu levá-la para o quarto Alice continuou ali para olhando para a tela de seu celular a espera apenas de uma ligação que fosse de James.

– Você deveria comer algo Alice. – Emmett disse trazendo um copo de água e entregando para irmã que nem sequer bebeu, apenas segurou o copo.

– Eu não tenho estômago pra isso.

– Eu entendo. – Ele disse cansado passando as mãos sobre as pálpebras na tentativa falha de afastar o cansaço.

– Se ele me quer porque simplesmente não veio atrás de mim? Porque ele tinha que mexer justamente com Riley?

– Alice...

– Riley é apenas uma garota, não tem nada haver com as minhas escolhas erradas. Ela deveria estar aqui agora, descansando ou assistindo o novo episódio estúpido daquela série que eu nunca quis ver com ela. Se alguém tinha que estar lá era eu e não ela. Ela tem toda uma vida pela frente.

– Alice não pense que se fosse você lá as coisas seriam diferentes. Mamãe estaria sofrendo da mesma maneira e eu estaria me culpando no seu lugar por não ter afastado James antes disso tudo acontecer. E como você pensa que Riley estaria? Eu sou irmão dela e ela me ama, mas é com você que ela tem intimidades, é a você que ela recorre quando encontra problemas. Ela te idolatra Alice e nenhum super herói de uma criança deve morrer, porque se não a vida delas não farão mais sentido.

– Mas o nosso sofrimento é ainda maior porque ela é a nossa garotinha Emm, ela que me chamava por aquele apelido estúpido quando eu estava com raiva e ainda sim me fazia rir, ela não merecia passar por isso.

– Nenhum de nós merecíamos. A única coisa em que você é culpada Alice é de tentar viver e ser feliz, mas o mundo não conspirou ao seu favor. O único culpado aqui é James e não você.

Dois investigadores permaneciam na casa dos Cullen a espera de uma ligação ou chegada de o que quer que fosse para ter os primeiros resquícios do caso, suas primeiras pistas. Tinham que estarem atentos e serem rápidos, eles sabiam como estes tipos de psicopatas trabalhavam e James não tinha cara de quem perdoasse ninguém.

***

Quando o dia amanheceu Riley não havia conseguido dormir, era como se sentia quando tinha 3 anos e passou a noite em claro com medo de que o bicho papão saísse de seu armário a noite, mas as grandes diferenças era que esse bicho papão era real e ela não tinha seus pais ali para defendê-la.

Seu corpo já se queixava de cansaço, ela queria apenas dormir deixar seus olhos se fecharem e descansar se perder no mundo dos sonhos e quando enfim estava tentando fazer isso o barulho estridente da porta se chocando contra a parede lhe fez saltar sobre o fino colchão velho que estava exposto ao chão.

– Sinto muito se te acordei, querida. Está tudo bem? Parece um pouco pálida.

– Vá se ferrar James. – Ela tentou forçar a voz para sair com o seu tom natural de raiva, mas tudo o que conseguiu foi expressar o seu medo referente a ele e aquilo o fez sorrir, sorrir como um fatídico vitorioso.

– Precisa de sua insulina não é mesmo? Estive mexendo em sua mochila e encontrei isso por lá. – Ele disse mostrando o frasco de insulina, o frasco extra no qual Riley sempre fazia questão de andar com ele por precaução, mas sabia que James não seria gentil em lhe dar aquilo e no mínimo ele deveria ter sabotado aquilo.

– O que você colocou ai dentro? Água com açúcar?

– É bom saber que você não alimenta mesmo esperanças garota, porque eu nunca lhe deixaria viver. – Ele disse apertando com suas mãos as bochechas de Riley. – Você não vai sair viva daqui.

Em seguida ele jogou o frasco de insulina contra a parede e Riley viu seu meio de vida escorrer. Ela estava suando frio, com palpitações, até mesmo o simples fato de tentar respirar fazia seu corpo se sentir cansado. Já fazia muito tempo que deveria ter aplicado uma doze de insulina, deveria ter sido durante a noite e logo chegaria ao horário de mais uma durante a manhã. Ela nem ao menos comeu alguma coisa.

– Se você quer me matar então faça isso logo.

– Eu não quero ser rápido. – Ele sorriu. – Quero ver você definhar bem aqui na minha frente aos poucos, ver seu sofrimento ser a minha curta felicidade no momento. Mas eu ainda não acabei... – Ele disse se virando e pegando algo que havia deixado sobre a cadeira quando entrou. – Aqui está seu café da manhã, tenha um bom apetite.

Riley olhou para aquele prato até que ele saiu do quarto, só poderia ser brincadeira aquilo que ele estava fazendo. O prato estava repleto de coisas que ela deveria manter distância naquele momento, ou talvez não, ela havia pensado. Ela estava a muito tem sem comer, sua taxa de glicose havia diminuído e os sintomas eram claros, hipoglicemia. Ela olhou para o pedaço de bolo com cobertura e até mesmo para o chocolate que havia ali e agradeceu James por ele ser tão babaca quanto ela esperava.

– Vamos lá, vou matar a saudade de vocês dois, mas só um pouquinho porque se não a coisa pode ficar pior.

Depois de algum tempo ela pôde sentir seu corpo reagir melhor, agradecia naquele momento de ter ouvido seu pai corretamente durante seus vários sermões e aprendizados sobre a diabetes.

A garota esperou que ele voltasse, mas ele não voltou, então ela deixou que seu cansaço tomasse conta de seu corpo, se deixou adormecer.

***

Esme se mantinha quieta acolhida pelos braços firmes de Carlisle. Suas lágrimas haviam parado de descer por aquela manhã, pareciam que haviam apenas secado.

– A nossa garotinha deveria estar aqui.

– Logo ela voltará para nós. – Carlisle reconfortava a mulher mesmo sentindo um pouco de desesperança dentro de si, Riley provavelmente não estaria tomando sua insulina e sabia o que o corpo dela exigiria de si, ficar tempo demais sem comer causaria uma hipoglicemia e ela poderia perder os sentidos ou até mesmo entrar em coma, ele queria sua garotinha de volta, abraçá-la tão forte e nunca mais a deixar sozinha, mas estava com tanto medo de perdê-la, sabia dos riscos e nesse momento odiava ser um médico para saber de certas coisas.

O dia inteiro foi se arrastando e nenhuma notícia parecia mesmo que James queria fazer tudo àquilo à surdina apenas matar Riley e apresentar o corpo dela como troféu logo em seguida.

Mas somente antes que o por do sol começasse a dar seus primeiros sinais uma encomenda chegou na casa dos Cullen. O endereço do remetente não deixava dúvidas, eram a rua e o número da antiga casa de James e antes que qualquer pessoa pudesse tocar os investigadores pegaram a mercadoria e fizeram testes. Nada de impressão digital, nada de resquícios que lhes dessem uma dica de onde ele estaria.

No embrulho havia um DVD e os investigadores perguntaram se os membros da família queriam mesmo assistir aquilo.

– Pode haver alguma coisa que nenhum de vocês irão gostar.

– Esme, não seria melhor nós...

– Eu vou ficar Carl. – Esme disse firme apenas esperando que eles ligassem logo aquilo. Todos estavam ali no sofá ansiosos, apreensivos e aflitos.

Quando o vídeo começou estava focado em Riley dava para vê-la sentada encolhida em um canto de um quarto sob um colchão, sua pele pálida e o suor escorrendo pelo seu rosto reafirmou o medo de Carlisle e ele apenas fechou os olhos por meros segundos.

“- Alice querida, eu realmente espero que você e sua família esteja vendo isso, sua irmãzinha está bem, por enquanto. – Ele riu debochadamente. – Sabe Carlisle eu não sou nenhum médico ou especialista em saber o que acontece com uma pessoa diabética se ela não comer por um tempo, mas graças a internet sei bem que logo, logo sua queridinha filha irá ficar paranóica.”

Houve uma pausa e eles prestaram atenção em como Riley manteve seu rosto sempre virado evitando olhar para a câmera.

“- Logo de manhã ainda a ajudei lhe oferecendo um prato de doces e acabei sem querer a fazendo ficar um pouco melhor. Isso não seria do meu feitio é claro. Eu quebrei o único frasco de insulina que ela tinha e ela já pulou duas aplicações, então mais quantas serão necessárias para que ela enfim... Pare de respirar?”

Riley olhou para um ângulo um pouco mais acima da lente da câmera, olhando nos olhos de James enquanto sua mente tentava mantê-la alerta.

“- Diga para sua irmã como você se sente Riley. Diga que por culpa dela de não ter me obedecido você está aqui agora sofrendo, morrendo aos poucos, diga para sua irmã o adeus que não poderá dizer a ninguém, pois sua única companhia durante sua morte será a minha. Diga.”

Alice encarava a TV de forma fria, se remoendo e se culpando imensamente por tudo aquilo estar acontecendo, as poucas lágrimas que caíram foram às únicas que restaram daquela noite.

“- A minha irmã não tem culpa de nada, o destino foi tão ruim que colocou você no caminho dela, esse foi o único erro no qual ela esteve envolvida, dar amor para quem não merecia. O único culpado aqui é você James, é você que está acabando com a minha família.”

A menina abaixou o olhar e puxou o ar pesadamente para dentro de seus pulmões, os segundos de silêncio que se passaram foram arrematadores e dolorosos, o balançar da imagem dizia que ele estava movimentando e quando enfim ele apareceu na imagem foi apenas para ferir os corações ainda mais de quem assistia. O modo violento como ele segurou no pescoço de Riley assustou todo mundo e o modo como a garota reagiu também, o modo como ela ficou quieta apenas olhando nos olhos dele.

“- Você foi a grande culpada por eu estar fazendo isso, se não tivesse estragado o meu casamento com sua irmã nada disse precisava estar acontecendo, mas não, você e seu jeito irritante de ser tinha que me afastar de Alice, ela era ‘minha’.” – Ele gritou.

“- Ela é ‘minha’ irmã, ela ‘é’ filha da nossa mãe, ela nunca foi e nunca será nada seu James e mesmo se ela tivesse casado contigo continuaria na mesma, você seria um nada.”

A fúria já era demonstrada por James o modo como ele estava apertando ainda mais o pescoço de Riley, o modo como seus lábios tremeluziam de ódio e o urro que ele soltou antes de empurrar a garota contra a parede.

“- Continue assim e você irá morrer antes mesmo do que você imagina.”

“- É isso mesmo que eu quero. Acaba logo com isso, se é o que você quer mate-me, mas saiba que Alice nunca irá voltar para você. Nunca.” – Ela disse enquanto via ele colocar a mão sobre o revolver preso em sua calça. “- Vamos James acaba com isso. Ela não vai mais voltar pra você. Eu não agüento mais isso, não agüento mais!” – A menina caiu em lágrima e quando sentiu o cano frio do revolver encostar-se a sua testa ela manteve seus olhos fechados e agora sim ela queria aquilo, sua mente já estava lhe perturbando, já pedia por coisas tão insanas que ela mesma já estava lhe julgando insana.

Alice saiu da sala no mesmo momento não conseguia mais ver aquilo, ver sua irmã pedindo para morrer, Riley era tão forte, sempre foi mais forte, fez coisas absurdas e ao mesmo tinha um bom coração e não conseguia acreditar, não conseguia aceitar ver sua irmã pedindo para morrer.

Quando Emmett chegou de surpresa para saber como ela estava Alice se sobressaltou se assustando com a presença do mesmo ao seu lado.

– Você tem razão Emmett, ninguém deveria ver seu super herói morrer. – Alice disse com a voz embargada e enfim admitiu o que todos ali sabiam, em meio do caos que havia acontecido com aquela família e todas as lembranças ruins nasceu Riley, ela era a esperança e a felicidade de todos e quando ela estava mal, todos ficavam mal porque ela era a essência daquela casa, da nova vida que se iniciou anos atrás, ela foi o marco do novo recomeço.

Quando todos voltaram para a sala Esme levantou e abraçou a filha, queria tomar as dores de Alice para si, via no olhar de sua menina a culpa que reinava em seu coração, as cobranças iminentes. O olhar de Alice que a poucos dias estava cheio de vida para uma nova fase de sua vida agora estava sem rumo, um puro vazio.

– Me desculpa. – Ela pediu entre choros, o pedido de desculpas que ela não deveria fazer, mas que saiu mesmo ela não querendo. – Me perdoa mãe.

– Não peça perdão por algo que você não fez minha doce Alice. – Esme dizia com lágrimas nos olhos. – Eu te amo querida, iremos passar por isso juntos.

Naquela noite Riley chorou, sentiu a dor do que era não estar ao lado de quem à ama. Queria sentir o calor dos braços da mãe e nunca mais xingar quando seu pai lhe chamasse de ‘minha pequena criança’ mesmo ela tendo agora seus 16 anos completos.

Ela chorou enquanto suas forças lhe permitiram, enquanto ainda conseguia manter-se acordada. Sua roupa estava ensopada de suor, o vento frio que entrava pelo teto mal feito daquela casa lhe fazia tremer, o modo como o teto girava a fez fechar os olhos e então aquele dia entraria em esquecimento quando o sono chegasse.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O Passado Nos Condena" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.