- Eu não vou embora! Você sabe que a gente tem uma ligação!

- É, porque você criou isso e fez ela acreditar! Garoto, você não faz ideia com que está lidando! Imagina quando a mãe dela descobrir!

- Ela vai brigar com você apenas!

Mary estava deitada com os olhos fechados. Um garoto e uma mulher, que ela não reconhecia, estavam brigando. Sabia que conhecia os dois, mas não se lembrava direito. Seu olfato lhe dizia que estava em um hospital. Esperou ouvir barulho de passos para ter certeza de que estava sozinha no quarto e abriu os olhos.

Estava sozinha. Não se lembrava de como havia ido parar lá. Era a segunda vez que acordava em um hospital sem se lembrar de nada. Era o mesmo hospital que da última vez. Ficou tentando forçar sua memória a funcionar, fechando os olhos.

Um garoto entrou no quarto. Ela abriu os olhos lentamente e ficou olhando para ele, que sentou-se ao seu lado em silêncio.  Ficaram se encarando por alguns segundos, até que ele quebrou o silêncio.

- Você está bem? Fiquei tão preocupado quando soube o que havia acontecido e vim o mais rápido possível, mas só cheguei hoje.

- Quanto tempo faz que estou aqui?

- Desde ontem de tarde. Eu não entendi muito bem o que aconteceu, posso, por favor, ouvir sua versão dos fatos?

- Ah, era você que estava discutindo com uma mulher aqui mais cedo. Quem era ela?

- Você não se lembra? A sua enfermeira, Lira. Agora, anjinha linda, você pode me contar o que te trouxe aqui, o que aconteceu?

- É... – ela sentiu uma pontada forte na cabeça, mas não demonstrou. Algo lhe dizia que sabia quem era o garoto e que precisava se lembrar de tudo, mas não conseguia. – Não me lembro direito... Conte a sua versão primeiro.

- Você estava na casa da Luna falando comigo no telefone e do nada a ligação caiu. Ela me contou que você começou a gritar e a tremer até ficar inconsciente. O que você lembra de ter acontecido?

- Você é o Ray, certo? – ouvir aquilo despertou algumas vagas lembranças do acontecido. Ele concordou com a cabeça e ela continuou. – Eu não lembro sobre o que estávamos conversando, só lembro que de repente senti uma dor muito forte na minha cabeça. Fechei os olhos para ver se passava. E do nada ouvi um barulho muito alto, mas dentro da minha cabeça. Não recordo de ter começado a gritar. E só isso.

- Você não lembra o que a gente estava falando? Nada mesmo?

- Só que eu tinha te ligado para saber porquê você tinha sumido. E... Ai! – mais uma pontada, dessa vez mais forte e ela levou a mão à cabeça. Ele a olhava, preocupado, se dizer nada. – Desculpa. Eu devo estar ficando louca. Mas o que a gente estava falando no telefone?

- Eu não posso dizer. Você vai ter que se lembrar. Anjo, eu tenho que ir embora. Qualquer coisa pode me ligar. Se cuida!

- Espere! Só mais uma coisa. Por que algumas pessoas de quem eu não tenho lembranças de antes do acidente me chamam de anjo?

- Eu sempre te chamei assim... Não tem um motivo.

- Mas as pessoas de quem eu lembro tudo não me chamam assim. Nenhuma delas. Sabe o motivo?

- Não sei... Eu tenho que ir. – ele lhe deu um beijo na testa e mais uma vez um arrepio percorreu seu corpo. Agora, mais do que nunca, ela precisava recuperar suas lembranças.