—Quem é?—estava até com medo da resposta.

—Caius, Caius Teláqua — por que ele falou o sobrenome?É claro que eu sabia quem era!

—Já vou—falei meio sem ânimo.Ou melhor,eu estava completamente sem ânimo.

Abri a porta esperando um soco ou algo do tipo, mas ele foi até normal comigo.

—Oi —falou de um jeito manso,sendo quem era...

—Oi... —respondi muito desconfiada

—Eu queria te pedir desculpas por ter rido e ter falado daquele jeito com você .Prometi ao Meridan que ia ser legal com você... Tenho falhado pra caramba.—ele olhava rapidamente nos meus olhos e depois olhava pros chinelos que calçava.

Não tinha como continuar brava depois de ouvir uma coisa como essa.Meridan conhecia o irmão e sabia que eu ia sofrer com sua atitude,daí a tal promessa...OBRIGADA MERIDAN,sinto sua falta.

—Certo,desculpas aceitas.E por favor me desculpe por te chamar de palhaço,brutamontes e imbecil.—desabafei.

—Você não me chamou de brutamontes,nem de imbecil.—disse ele sorrindo,o que era algo completamente novo pra mim.

—Ah,bem,eu te chamei assim mentalmente e estou pedindo desculpas.—ele tinha um sorriso cativante e convidativo,como o do irmão.

—Sabe o que eu reparei agora?—parecia até outro ser humano que estava na minha frente.—Nunca fomos apresentados oficialmente —disse e estendeu a mão— Oi, eu sou Caius Teláqua .

—Pátara Banks — apertei sua mão e me esforcei pra retribuir o sorriso.—Não quer entrar e a gente pede chocolate quente?—uma nova amizade nos jogos era prejuízo, mas naquela hora eu prometi ser legal também.

—Na verdade,tô muito cheio,eu estava indo na cozinha ver se eles tem um chá que não tem no cardápio.—respondeu sério

—Posso ir também? Meu estômago está doendo,comi demais hoje —falei rindo um pouco.

—Tá bem —respondeu.

O resto do tempo ficamos calados.Tínhamos combinado de sermos gentis um com o outro,não significava necessariamente que íamos nos entender perfeitamente logo de cara.Pedimos o chá e bebemos tudo em silêncio,estava delicioso e passou minha dor no estômago bem rápido,quando eu estava relaxando e começando a me sentir sonolenta ,Caius fala:

—Vamos assistir TV? Aiko e Hadassa nos mandaram de volta pro quarto e nem vimos as outras colheitas.

—Claro,eu vou pegar papel e caneta pra gente anotar o que quiser.—falei me levantando e indo numa mesinha embaixo da TV onde realmente tinha papel e canetas.

Caius ligou a TV .Nós sabíamos que ia passar a reprise das colheitas porque a Capital repete várias e várias e várias vezes até o desfile dos tributos.Assistimos calados e prestamos muita atenção em tudo. Eu comecei a fazer anotações do tipo:

Distrito 1- Garoto assustador,Garota mortífera, os dois foram voluntários.

Distrito 2-Garoto voluntário,Garota escolhida,porém muito perigosa.

Distrito 3- Garoto deve ter 14,Garota chorou muito,16 anos.

Distrito 4-Garoto deve ter 13,Garota 17,nenhum voluntário (totalmente incomum)

E assim foi com os outros distritos até que chegou à Colheita do Distrito 10.Eu parei de anotar tudo e fiquei observando como nosso distrito era pela televisão.Sem plantações,apenas grama e muito capim,com uma cerca enorme eletrificada que nos privava do mundo exterior.

Chegou o momento que fui sorteada,e na verdade eu parecia muito entediada e nada surpresa, apenas uma pessoa acordada de seus nunca pensamentos,até porque nunca fui muito de chorar,por isso soube conter bem as lágrimas.

Quando Caius foi chamado sua expressão mudou completamente.Antes ele parecia apreensivo,depois seu rosto ficou feroz e mortífero.No momento que Meridan tenta ser voluntariar e eu grito NÃO,os comentaristas disseram que eu finalmente estava prestando atenção em tudo que estava acontecendo.E quando dei um tapa no braço de Caius,todos disseram que devia haver uma rivalidade antiga entre nós,o que não era totalmente equivocado.

Parei um minuto pra olhar pra Caius,e ele estava com o rosto enterrado na almofada e seus ombros muito rígidos,ficou claro que é mais doloroso lembrar a colheita pra ele do que pra mim.

—Talvez seja a hora de irmos dormir—falei tocando no seu ombro com um pouco de receio.

—Não— respondeu com o jeito bruto costumeiro —Vamos terminar de assistir primeiro.

Não me importei,mas quando minha atenção se voltou para a televisão eles já estavam no garoto do Distrito 11,que era pequeno,devia ter 13 anos,ele chorava e uma mulher gritava desesperadamente seu nome.

O Distrito 12 teve duas crianças com cara de muitas tésseras.O garoto era magro e bem alto,talvez 17 anos.A menina era bem magra e tinha devia ter minha altura,talvez 16 anos.

O selo da Capital apareceu,o hino tocou e eu desliguei a televisão.Caius continuou ali parado,me encarando com uma expressão meio assustadora,como se fosse partir pra cima de mim a qualquer momento.

—O que foi que eu fiz pra você me odiar?—perguntei sem rodeios

—Eu odeio quase todo mundo— respondeu friamente

—Mas me odeia mais— completei

—Não,só não entendo—replicou

—Não entende o quê ?—falei quase gritando

—Porque Meridan gosta tanto de você.—disse se levantando e me dando as costas,me deixando de boca aberta.

Que mania infeliz de falar as coisas pela metade tem essa família Teláqua! Largam uma bomba e vão embora ignorando o que eu tenho a dizer!

Cheguei irada no meu quarto com minha cabeça latejando e achei que nunca ia pegar no sono,mas quando me dei conta estava tendo um sonho terrível.