A Riddle escrita por petit_desir


Capítulo 2
Reptilia ;;




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Idade física: 18 anos;;

Idade mental: 10 anos;;

2008; dezembro.

 

 

Dia 24,

 

O que pessoas normais fazem nesse feriado? Vão para suas casas, comem seus perus gordos recheados de farofa, riem de piadas idiotas, de arrotos nojentos de seus bebês e mentem para seus filhotes de bicho do mato? Não dá para entender por que o Natal se tornou tão importante. Não é pela religião, mas, sei lá. Até um apelo comercial para que pessoas juntem dinheiro cinco meses antes dessa data idiota, apenas para gastar uma pequena fortuna em presentes que jamais se lembrarão depois, é meio ridículo para mim.

Okei, provavelmente, naquela noite eu deveria ter sido um dos únicos seres humanos – ninguém precisa saber que eu sou um mutante, certo? – no mundo que estava sozinho, atrás de um bar para beber. Para minha grande sorte, eu morava no melhor lugar do mundo. New York.

 

Sentia o vento gelado em meu rosto, lembro-me que nevaria, segundo os noticiários. Lembro que o cachecol não era tão bom, quanto deveria ser. Tudo que me salvava naquela noite eram minhas botinas de combate, essas sim costumavam ser quentes. Boas para andar.

 

A cidade parecia um pouco vazia, pelo menos nas ruas. Entretanto, quando se olhava boa parte dos prédios, podia-se ver janelas iluminadas; nos andares mais baixos, risos e canções bregas natalinas. Lá longe alguém vomitava na sarjeta. Bebe filho-da-puta. Enfim, uma noite bem comum de Natal. Lembro-me de como eu andava devagar, não tinha pressa nenhuma de chegar a nenhum lugar. Algum bar seria bem legal, eu tinha pensando. Aliás, qualquer bar a qualquer momento seria bem legal. Um lugar onde tem Jack Danniel’s, cerveja e qualquer outra droga ilícita é bem divertido. Enfim, lembro-me de ter entrado no primeiro que eu avistei. Eu tinha grana sobrando mesmo, nos dias natalinos as pessoas costumam ser bem generosas – para minha sorte. Podia gastar uma pequena fortuna hoje enchendo a cara, quem sabe eu conseguisse uma maconha depois. Enfim, a noite não seria das piores.

 

 

Quando estava lá dentro, na ante-sala, vi alguns cartazes falando sobre uma “banda surpresa” que tocaria hoje. Tanto fazia para mim, desde que o som fosse agradável. Não precisava ser um Franz Ferdinand ou um The Killers, sendo bom, estava perfeito. O bar aquele ar antigo, meio de época. Na verdade, tinha até cara de ter sido abandonado, o que também dava um quê underground. Sabe, as pessoas daqui eram todos aqueles que tiveram uma porra de dia e precisam apenas ter um lugar para onde ir e ouvir música. Apenas pra desestressar. Desde que me formei na escola, não tenho mais esse tipo de problema. Minha vida por si só é desestressante. Faço o que quero, na hora que quero e com eu quero. Fácil assim. E continuará desse jeito, por que é assim que eu gosto. Meu jogo de ilusões está cada vez melhor. Cada dia que passo ganho mais dinheiro, também. Isso facilita muito minha vida... Ganhar mais do que o dia anterior, apesar de eu não ter tantos luxos assim. Um copo de bebida, uma comida razoável e um colchão dentro de casa são tudo que eu preciso... e ah! Ah sim, um rádio, talvez um toca-discos. Essas coisas também. Sabe, ninguém vive no completo silêncio. Ele é vazio demais.

 

Enfim, eu entrei nesse bar. Fui até o balcão e olhei para o barman. Ele era um amigo meu já. Altos porres com ele, sabe como é. Ele me serviu uma Brahma e eu ri. Achava engraçado servirem cervejas brasileiras por aqui. Bem, era legal para começar. Logo eu tomaria uma Heineken e tudo ficava bom. Brahma não era ruim, mas nem era tão amarga quanto Heineken e eu estava acostumado com essa. Veadagem, pura veadagem.

 

Uma banda de abertura começou a tocar no palco, onde tudo parecia mal iluminado. Eu não havia me virado para assistir a tal banda, eu estava chateado demais com alguma coisa que eu não tive muito animo. Eu olhava meu copo de cerveja diante de mim e brincava de fazer pequenos peixinhos dentro dele. Peixinhos dourados, como aqueles que criancinhas costumam ter nos aquários que esqueceram de limpar. Os peixinhos eram mais pequeninos do que o normal. Ray – o barman – apareceu diante de mim e riu, lembro-me bem daquela risada sonora e rouca que ele dava.

 

- Cuidado... – E eu ri.

- Se perceberem, alego que estão bêbados. – e ele riu.

 

Depois disso, depois de mais algumas cervejas e mais algumas músicas, decidi me levantar. Ainda nem eram 23 horas e eu já estava quase bêbado. Ray não queria me contar de jeito maneira quem iria se apresentar, nem mesmo quando eu ameacei queimar seu black power – ele não sabia até onde iam meus poderes, hoho. Eu já estava meio torto também, não ia arrumar briga com Ray, afinal, logo eu descobriria. Bocejei e meti o pé errado no chão. Quase cai, e aliás, minha cerveja caiu. Porra. Bêbado é uma merda mesmo. Eu já coçava os olhos e minha boca fazia aqueles barulhos estranhos de nach, nach. Sabe, quando a língua gruda no céu da boca e reproduz o nach, nach. Enfim, como eu disse, bêbado é uma merda. Eu tive que me segurar em algum dos postes para não cair. Ria a toa além do nach, nach, meu companheiro.

 

Pedi outra cerveja para o garçom, dessa vez a Heineken. O amargo talvez fizesse eu acordar. É, com certeza faria. Talvez eu devesse beber água... Não. Quem eu estou tentando enganar? Eu amo ficar de porre. Todos deveriam amar. Deus nos deu a possibilidade de ficar de porre então, fiquemos de porre! Hahaha. Palavras de um vagabundo. É Bukowski, eu cheguei para ocupar o seu lugar, mesmo que não seja em L.A. Bem, NY é um bom lugar, too. Deve ser considerada com tal mérito. Seu lugar como o maior vagabundo de todos os tempos está indo império abaixo.

 

Dei um belo de um gole naquela long neck. Puta que pariu. Isso é capaz de despertar tesão em qualquer ser humano. É de ficar de pau duro, completamente. É, Alex, só falta uma bela fodida nessa adorável noite natalina... Natal! Porra, tinha esquecido que era Natal. Belo presente, velho gorducho, uma foda seria de bom gosto. Dê o doce para a criança, por que eu me comportei muito bem esse ano.

 

Baixei a cabeça com um pouco de enjôo. Sabe como é... O meu mundo girava por você, amor. Dei uma risadinha e voltei-me para o palco. Seria anunciada a banda... e era... THE STROKES. Caralho, quando uma merda dessas ia acontecer? Dei uma boa olhada e era mesmo o Casablancas. Orgasmos e mais orgasmos. Quem diria. Sabe sobre aquela foda, pode tirar da listinha. Isso daqui era bem melhor.    

 

Now every time that I look at myself
"I thought I told you
this world is not for you!"

 

Julian arrebentava sua garganta nos vocais dessa música, enquanto seu corpo apenas se movia conforme ele tinha que cantar. Seu jeans branco estava sujo, sua camisa amassada e ele também tava com cara de quem tinha tomado um porre. Puta que pariu. Strokes, that’s all.

 

Meu, meus olhos vidrados naqueles caras, em todos eles. Não sou gay, mas, sim, eu havia me apaixonado naquele instante. Reptilia era frenética. Me deixava louco. E cada música depois, me deixou eletrizado. Completamente, endoidecido. Ah sim, eu parei de beber depois da primeira. Eu precisava ficar sóbrio, viver esse momento. Jamais esquece-lo. Fabrizio detonava, como eu jamais havia visto naqueles shows televisionados que assistia, tempos atrás.

 

Então, era Natal. O tempo havia voado e eu recebido meu presente, junto com uma conta de quase 150 dólares. Tinha valido a pena. Com certeza.


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