– Morty, o que houve?

– Não quero conversar agora – Disse Mortimer, num tom choroso, com a cabeça abaixada sob sua carteira. Assim ele estivera durante boa parte daquela manhã... Chegara na classe com os olhos vermelhos, muitas vezes fora perguntado se estava bem, mas preferira o silêncio, sempre se segurando para não desabar em lágrimas!

– Ah não Morty, você sabe que sempre pode contar comigo! Vem, me conta o que houve, quero te ajudar! – Bella, por conhecer Morty muito bem, esperou o intervalo do recreio para vir falar com ele, sabia que o amigo iria querer privacidade para desabafar o que lhe afligia.

Mortimer apenas levantou a cabeça e olhou para Bella. Ele então respirou fundo, os olhos cheios d’água.

–Morty!! Meu Deus!! Você quer que eu pegue um copo d’água?! Quer ir lá para fora, tomar um pouco ar?! Meu deus, meu deus, você está pálido!

Mortimer enxugou os olhos, e então se pôs de pé. Bella o seguiu até a parte de trás do colégio, e então entrou com ele no meio de alguns arbustos... Assim eles acharam um cantinho bem longe da agitação do recreio.

–Morty?!

Mortimer se virou e ficou de frente para amiga. Foi então quando ele desabou em lágrimas e soluços, e digo “desabar” literalmente, pois ele caiu de joelhos no chão! Ele soltou, naquele momento, tudo o que prendia em si naquela manhã, todo o choro que estava nele contido!

–Oh, Morty... – Bella se ajoelhou e abraçou o amigo. – Tá tudo bem, vamos, me conte o que houve!

–O inferno, Bella...

–Como assim?

– Meus pais...- ele não conseguiu completar a frase, estava se afogando em lágrimas!

– Respira... – Bella colocou Morty encostado na parede e sentou-se abraçada com ele. Esperou um tempo até ele se recompor.

– Meus pais vão se separar... – foi o que disse quando finalmente conseguiu ar suficiente para falar – ... eles brigaram feio hoje, mais feio do que todas as outras vezes, e sempre tive medo que isso fosse acontecer...

– Estranho, eles não pareciam... Sei lá, eles pareciam se dar bem! – disse Bella, parecendo verdadeiramente surpresa.

– Como assim? Você só os viu uma vez, não viu?! – perguntou Mortimer, intrigado.

– Não sei, pelo pouco que vi, achei eles combinavam... Sabe, formavam um casal bonito! As aparências enganam... – Bella percebeu que aquele comentário não era de muita utilidade para alegrar o Morty – Desculpa, mas sabe... Às vezes eles estão infelizes, por isso acaba sendo para um bem maior, aposto que você ia querer que eles fossem felizes... Tente ver por este lado bom! Sei que não tenho muita experiência no assunto pois meus pais ainda estão juntos, mas realmente acho que você deveria pensar assim!

Mortimer olhava fixamente para os olhos grandes e amarelo-esverdeados de Bella... Por que ela era tão bonita?! E não só pelo exterior, como também pelo seu interior... Uma menina bondosa, inteligente, bem vestida e amiga!

–Não consigo viver longe deles...

–Bem, eles não vão deixar de ser seus pais, eles só vão deixar de serem casados! Ei, acho que você não está muito bem para continuar a assistir aula hoje, você podia... – Bella ia sugerir que Mortimer voltasse para casa, mas foi então que ela percebeu que em casa Mortimer teria que lidar com o clima ruim dos pais brigados, e ela mudou o que ia dizer – ... Você pode ir lá para minha casa! Ficar um tempo lá até que tudo melhore! Tenho certeza que meus pais vão entender e te acolher de braços abertos! Eu depois passo na sua casa com o Michael e pego suas roupas e sua escova de dente, e você pode usar minhas toalhas! Ah, eu tenho um saco de dormir! – Bella sorriu.

Morty era “nerd” demais para perder um dia que tinha aula de ciências, que pra ele era uma das poucas coisas boas da escola (juntamente com Bella!) e claro, por ser um bom filho e não querer causar mais problemas aos seus pais, preferiu não fazer nenhuma maluquice, apesar de que passou por sua cabeça fugir de casa... Agora, ao olhar para os belos olhos de sua amiga Bella, ele teve certeza de que ir para a escola, mesmo com a cena dos pais brigando repetindo em sua cabeça, foi o certo a se fazer! Naquela hora, quase que ele começou a chorar de novo, só que de emoção... Nunca alguém de sua idade (e muito menos uma menina!) tinha sido antes tão gentil quanto Bella estava sendo com ele!

–Hã? – disse Bella, surpresa ao ver o sorriso radiante que surgiu na cara do menino.

“Você é incrível” era o que estava escrito no olhar do garoto, que logo em seguida, abraçou bem forte sua amiga.

–Awwn, Morty! – Bella retribuo o abraço – Eu... amo você!

Mortimer soltou-se do abraço, encarou a menina por meio segundo. Bella achou, nesse rápido momento, que falara algo estranho...

–Eu também amo você! – disse, abraçando-a novamente, só que mais forte... Mais forte do que jamais a abraçara antes!

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–Desde o começo era um erro... Já começou errado... – disse Cornélia.

–Não é verdade... É normal, às vezes as pessoas são amigas, tão amigas que acabam se casando! – respondeu Agnes – Já li que muitos homens e mulheres heterossexuais acham complicado manter uma relação só de amizade entre si, tanto que são muitos os que já tiveram, ainda que apenas em algum momento, experiências amorosas e/ou sexuais! Creio que o mesmo deve valer para homens e mulheres homossexuais que são amigos de semelhantes também homossexuais!

– Você, como sempre, lendo muito...Não sei, pra mim foi uma pena estragar uma amizade como a que eu tinha com o Gunther!

– Mas fala a verdade, você realmente acha que estragou?! Você parecia bem feliz quando se casou com ele, digo, o tipo de felicidade que sentimos quando sabemos que estamos aonde deveríamos estar!

– Você lê romances demais – disse Cornélia, com desdém, enquanto tomava mais um gole de whisky – “O tipo de felicidade que sentimos quando sabemos que estamos aonde deveríamos estar!”, nem sei se isso realmente existe!

– Às vezes eu não sei se eu sou romântica demais, ou se você é romântica de menos – disse Agnes

– Eu sempre fui mais racional que sentimental.

–Mas com o Gunther, combinemos, nunca te vi antes ser tão não racional – Disse Agnes, quase entornando whisky em seu sofá. As duas estavam levemente embriagadas – Não sei porque você não admite logo.

– Por que eu vim para sua casa mesmo?! Para te ouvir falar que o Gunther é minha metade da laranja é que não foi...

– Mas ele é sua metade da laranja!

– Ele era meu melhor amigo...

– Ele era tão seu melhor amigo que você dormiu com ele... E pior, você fugiu na manhã seguinte, passou nem um dia e você, no meio da chuva, foi lá na casa dele pedir desculpas, e então só fui te ver de novo quase duas semanas depois! – Agnes tomou mais um gole – Interessante essa amizade...

– Droga, você tinha que lembrar disso! Foi um acidente, já disse!

– Um acidente que resultou no Mortimer, e que você deixou acontecer... E digo mais, você estava sóbria quando foi na casa dele no meio da chuva!

–Bom, pra mim já deu, eu vou me deitar, boa noite irmã! – disse Cornélia, enquanto se levantava e seguia rumo ao quarto de Agnes (elas iam dormir na mesma cama). Nisso, quase que ela deixou o copo com o whisky cair, de tanta violência que o jogou sob a mesinha da sala, mas sua irmã o segurou a tempo.

“Ela não admite que o ama, e também não admite que se rasga de ciúmes da tal mocinha Lolita...” Pensava Agnes consigo mesma.

“Ah, o amor... Se fosse fácil, viria potes no supermercado!”