Eu preferia não lembrar e até mesmo não comentar o quanto foi difícil o dia seguinte. Tomei um banho de um perfume estranho que me causou espirros durante meia hora depois que utilizei. Quando consegui respirar sem espirrar, abri a porta e saí andando, confiante que nem mesmo Natsu ou Gajeel reconheceriam meu cheiro habitual. No fundo eu ainda sentia um pouco de medo, mas senti um frio correr na espinha quando abri as portas da guilda.

Havia um grande tumulto lá dentro, para variar. Não teria estranhado aquilo, afinal toda reunião dos membros da Fairy tail termina em quebradeiras e não me orgulho de dizer que cheguei a participar de algumas delas. A questão é o cenário a qual me deparei.

Laxus estava sentado em uma cadeira e apoiava o rosto com a mão esquerda aberta, tapando boa parte de seu rosto. Ele parecia nervoso, preocupado, não soube definir no momento. Cheguei a ficar confuso ao ver tudo aquilo, mas senti meus músculos travarem quando Bickslow tossiu, antes de ler um trecho da carta a qual eu havia escrito e que estava em suas mãos.

- “Seus olhos impiedosos abrem o caminho no meio da escuridão.. – ele gargalhou alto, jogando aquela língua nojenta para fora antes de continuar. - .. “me guiando, sendo minha luz no túnel vazio e escuro da minha vida” ...

Ele lia as palavras em voz alta e a maior parte das pessoas que estavam ali gargalhavam. Evergreen, Gajeel, Natsu, Gray ... vários que chegaram a se perder da risada em meio a chutes e socos. Mirajane, Lisanna, Lucy, Juvia, Levy e para minha surpresa, até mesmo Erza pareciam ter gostado e diziam que aquela carta era uma demonstração de sentimentos puros de uma pessoa apaixonada.

Ainda na porta, cheguei a me sentir consolado quando a ruiva separou Natsu e Gray que já gritavam que a risada de ambos era escandalosa e já começavam a se socar. Lentamente fechei a porta e entrei pé ante pé, me aproximando do círculo que havia se formado ao redor de Laxus.

- São sentimentos puros .... – eu agradeci à Erza em pensamento quando ela sojigou Natsu e jogou Gray para um lado, fazendo uma pose teatral para continuar a falar. - ... de uma garota apaixonada.

Tenho certeza que ela disse mais algumas coisas, mas travei, sentindo vontade de sair dali, voltar para minha casa e ficar em um canto escuro. Fiquei ali parado, completamente congelado no lugar, vendo-a socar o Natsu por rir de suas palavras. Se eu fosse capaz de congelar e me quebrar com certeza teria feito aquilo no momento.

- Espera, ainda tem mais! – Bickslow gritou e tentou continuar a ler, mas acabou engasgando em meio a suas risadas.  Logo Gray pegou a carta e mesmo estando com um baita galo na cabeça ele continuava a gargalhar.

- “Se necessário, subirei até a montanha mais alta do mundo, só para lhe ver e de lá gritarei para o mundo todo o sentimento que vive guardado dentro de mim!” – uma multidão gargalhava em volta e ele continuava a ler.

Na época, eu não imaginava, mas a graça de toda história era o fato de Laxus ter recebido uma carta daquelas e Evergreen me explicou que só de imaginar alguém fazendo aquele tipo de coisas com um homem bruto como Laxus já era suficiente para fazer qualquer ser humano se partir em risos. Eu como não fazia ideia deste tipo de coisa, me senti mal, como se tivesse virado motivo de piada em meio a todos.

Cheguei a dar as costas para eles e tentar sair dali para chorar em algum canto da minha casa, mas ao me virar dei de cara com Gajeel que deu um espirro muito alto e chamou a atenção de todos para ele e para minha presença ali.

- Que diabos de cheiro é esse???  - ele praticamente gritou e todos, sem exceção olharam para mim. Cheguei a sentir meu sangue gelar dentro do meu corpo ao ver Laxus me olhar com o canto do olho e naquele momento percebi que ele realmente estava nervoso.

- É-é .. um perfume que eu ganhei!! – respondi no impulso e Gajeel espirrou mais uma vez, sendo seguido por Natsu que ainda estava nas mãos da Erza. Eu respirei fundo e também senti minhas narinas arderem, mas tinha de lutar contra as lágrimas de frustação que tentavam escapar dos meus olhos.

- Laxus recebeu uma declaração Freed! – Evergreen se levantou e tomou a carta das mãos de Gray para trazê-la até mim. Reconheci de imediato as marcas de tinta que ali ficaram e por muito pouco não estendi as mãos para pegá-la. – Devia ver quanta coisa linda – ela deu um grande enfoque no “linda”. – está escrita aqui.

Fiquei encarando aquela carta por alguns segundos, me arrependendo amargamente por tê-la escrito. Escutava comentários maldosos de pessoas que chegavam a simular uma declaração de joelhos na frente de Laxus. Tive de controlar minha súbita vontade de pegar aquela carta e sair correndo, mas sabia que isso implicaria em minha entrega.

- Onde você estava? – Laxus perguntou, me lançando um olhar impaciente. Mais uma vez senti meu sangue congelar e cheguei a abrir a boca para falar algo, mas senti que não conseguiria quando vi aqueles olhos cinzentos se estreitarem ainda mais.

- Nem tente escapar Laxus! – Natsu já estava livre e tinha lágrimas de tanto rir escorrendo dos olhos.

- Temos de ler essas lindas palavras de amor para você! - me surpreendi ao ver que até mesmo Happy estava ali e chorava de tanto rir em meio aquela bagunça.

Até que surgiu algo para encerrar aquele assunto.

Natsu tomou a carta de Evergreen e continuou a ler, recebendo como resposta um olhar que beirava à explosão de Laxus. Gray tentou pegar a carta de suas mãos, mas ambos começaram a brigar como crianças, em uma brincadeira onde um puxa uma parte e outro puxa a outra. Até tentaram impedi-los, mas a carta se rasgou em pedaços de tanto ser puxada.

Silêncio.

Houve alguns segundos de silêncio, antes que eu pudesse ver uma Erza furiosa, acompanhada de uma Mirajane transformada. Cada uma pegou um pelo pescoço e começou a espancá-los sem piedade alguma. Aproveitando que todos haviam se dispersado pela confusão, Laxus ficou de pé e caminhou impaciente para fora, espirrando ao passar do meu lado.

Logo Bickslow e Evergreen o seguiram, ainda gargalhando do que haviam lido. Eu andei atrás deles e me aproximei de Laxus que espirrou novamente e lançou um olhar irritado para mim.  Pensei seriamente que ele iria me xingar, dizer que eu não enganava ninguém, mas ele apenas disse que tínhamos uma missão e que eu para eu voltar para casa e me livrar daquele maldito cheiro.

Assenti sem nem mesmo perceber.

- Você chegou a ler a cata toda? – Evergreen perguntou, me fazendo parar, afinal eu já estava virando as costas para voltar para casa.

- Sim eu li. – Laxus deixou de ser rabugento e respirou fundo, para espirrar outra vez e me mandar um olhar irritado.

- E o que achou da carta? Parece que essa pessoa realmente gosta de você. – minha parceira de equipe questionou e eu senti o coração começar a acelerar no peito.

- Foram palavras bonitas. – ele respondeu e eu respirava fundo, lutando contra a vontade de espirrar também.

- Só isso? – ela se aproximou de mim e esbarrou o ombro no meu.

Laxus estava de costas o tempo todo para nós e nada mais disse. Apenas continuou a caminhar e disse em seu tom irritado que esperaria por nós na saída da cidade. Bickslow já havia sumido sem que notássemos e assim que Laxus tomou distância Evergreen passou à minha frente e fez um sinal com o polegar. Senti meu rosto esquentar pela vergonha e vi seus lábios se mexerem, lendo a palavra “gracinha” que saiu sem som de sua boca. Ela me deu as costas também e caminhou atrás de Laxus. Vendo os dois se afastarem eu respirei fundo mais uma vez, antes de voltar a espirrar sem parar.

Aquele perfume realmente era horrível.

Pensei até mesmo durante meu trajeto de volta que havia me saído bem, mas me vi na beira do desespero quando retornei e Laxus questionou porque eu tinha manchas de tinta nas mãos.

Fase 01 da missão: vergonhosamente ... não concluída.