Antes Que Seja Tarde escrita por Mi Freire


Capítulo 6
Primeiro conheça.


Notas iniciais do capítulo

Agora vocês poderão conhecem um pouquinho melhor a vida de Daniel.

Boa leitura.



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Como já havia dito anteriormente, estudo pertinho de casa, no colégio Quadrangular, um dos mais populares do município. Estudava lá desde a primeira série e não há um canto daquele colégio que não conheça de olhos fechados.

Desde a quinta séria ao terceiro colegial, estudo com os mesmo colegas de classe. Os anos se passavam, mas a única coisa que mudava era localização da turma. O resto era sempre a mesma coisa: o mesmo pessoal, a mesma bagunça, as mesmas dificuldades e as mesmas reclamações.

Eu nunca fui o melhor da turma, disso eu estava certo. Mas também nunca o pior. Sentava na última fileira, pertinho das janelas. Logo atrás, sentava Guilherme para encher meu saco durante as aulas. Para ele era sempre tudo muito fácil, não tinha tempo ruim. Chegamos a ser expulsos das aulas por conta de conversas inapropriadas. Confesso que sempre achei melhor ficar pelos corredores do colégio do que em algumas aulas.

Nunca fomos populares, mas eu conhecia boa parte de quem estudava ali, certamente, por causa do convívio de todos esses longos anos e devido às fofocas que rolavam quando algo acontecia.

Nunca fui com a cara de alguns alunos, mas tentava me relacionar bem com a maioria. Em alguns momentos, acreditava ser considerado pela maioria como o estranho. Coisa que não me incomodava. Eu sempre fui assim e gostava de ter o meu estilo próprio, andar com quem gostava de mim, não me meter em brigas, não me enturmar com pessoas desagradáveis ou ficar de fofoquinhas pelo colégio.

O relógio marcava doze horas e dez minutos quando meus pensamentos foram interrompidos por um tapa de Guilherme.  Levantei-me apressado louco para ligar para Maria Luíza, ouvir a sua voz e saber como as coisas estavam.

Liguei uma, duas, três vezes. Nada. Só dava caixa-postal. Talvez ela estivesse ocupada. Ou será que teria mais o que fazer em vez de me ouvir tagarelar em seu ouvido o quanto estava apaixonado por ela?

Caminhei até em casa observando as nuvens que se espalhavam pelo céu. Minha casa não era muito longe. Morava em um sobrado azul-escuro com a minha mãe, Renata Ferraz, de 39 anos, e meu irmão mais novo, Pedro Ferraz, de apenas sete anos. Não me pergunte sobre o meu pai, Ricardo, pois não sei o paradeiro dele desde que abandonou minha mãe quando soube que estava grávida pela segunda vez. Tudo que sei é que ele preferiu outra mulher. Preferiu outra família a nossa.

Foi muito difícil aceitar o sofrimento de minha mãe. Mesmo tentando disfarçar, percebia que chorava sozinha no quarto. Por isso, entendi que meu pai é um canalha e não faço questão de saber nada sobre ele, por mais que ela insista que eu deveria me preocupar. Ela é uma grande mulher e não deveria ter passado por isso.

Hoje, sei o quanto minha mãe significa para mim. Posso ver o quanto ela trabalhou para sustentar nossa família como enfermeira em um dos principais hospitais da cidade. Gostaria de vê-la cuidando de sua vida e não precisar se preocupar conosco. Realizar os sonhos que se atrasaram e, quem sabe, encontrar um homem digno de seu amor e sua companhia.

Meu irmão é outra preciosidade em minha vida. Era por ele que arrumava forças para ir em frente quando via minha mãe chorando. Sempre precisei de sua companhia. Em outros momentos, tive que cuidar dele para mamãe se dobrar em duas e poder pagar nossas despesas. Por isso, cuido dele como se fosse um pai. Ensinei-o a ler, escrever e, mesmo com a pouca idade, ser uma pessoa melhor a cada dia. Muitas vezes, repeti a ele que um homem de verdade não quer ver uma mulher sofrer ou chorar e acho que ele entendeu, já que cuida de minha mãe melhor do que ninguém.

Chego cansado em casa, jogo a mochila no chão de meu quarto e deito-me na cama pensando em Malu e onde ela está.

Meu quarto é escuro. Suas paradas foram pintadas de cinza por mim mesmo há uns dois anos. Os móveis são simples. Há uma cama grande perto de uma das janelas, um guarda-roupa no canto, uma televisão plana para meus jogos, algumas almofadas espalhadas, um criado-mudo, escrivaninha e um carpete.

Sem contar a bagunça, há também meus objetos pessoais. Uma boa quantidade de livros em uma prateleira, o skate embaixo da cama, meu tênis velho exposto em um canto e desenhos espalhados pelo carpete.

— Filho, já chegou? – perguntou mamãe do outro lado da porta que costumava ficar trancada. — Vem almoçar.

Pedro já comia e sorriu a me ver. Ele tinha um sorriso magnífico: dentes branquinhos e pequenos.  Beijei seus cabelos negros e lisos. Peguei um prato e me servi sentando ao seu lado.  Mamãe lavava a louça suja e falava algo a Pedro que não parecia interessado.

Olhando para os dois, via o quanto se pareciam. Mamãe também tinha os cabelos lisos bem negros, a pele branquinha, corpo magro e alto. Uma mulher linda, sem dúvidas. Chamava a atenção quando andava na rua, mas, desde que meu pai partiu nunca mais se envolveu com outro homem.

— Daniel, me leva para andar de skate? – Pedro pediu meigo. — Veja, eu comi tudinho.

— Certo – soltei um riso. — Andar de skate hoje não, mas podemos dar uma voltar com Ben, que tal?

Ben, nosso cão Golden Retriever, era extremamente carinhoso e amigável. Pedro o ganhou de mamãe em seu aniversário de cinco aninhos.

— Eba! Legal! Vou buscá-lo. Aquele preguiçoso deve estar dormindo lá no quarto ainda – ele reclamou.

Mamãe e eu rimos. Esperei por Pedro e Ben na sala de estar enquanto via a televisão. Passava o jornal da tarde, coisa que não me interessava muito.

Após alguns minutos, estávamos caminhando pelas ruas com Ben preso a coleira debaixo de um sol escaldante.

Pedro costumava me fazer muitas perguntas, até demais. E a maioria delas me fazia rir antes de responder. As pessoas na rua diziam que ele parecia muito comigo quando pequeno, e observando algumas fotos em casa, eu encontrava muita semelhança. Eu adorava porque Pedro era uma criança que, além de linda, era muito inteligente e esperta para a pouca idade.

— Daniel, é verdade que agora você tem uma namorada?

— Bom – engoli em seco, pego de surpresa. — É verdade sim, mamãe lhe contou? – ele confirmou. — Em breve a conhecerá.

— Ela é legal? Espero que ela seja legal como você é.

Apenas sorri, sem saber o que dizer. Ele também não insistiu e continuamos a caminhar. Em meio ao silêncio, o celular tocou no fundo do meu jeans e, imediatamente, atendi a chamada.

— Daniel? Oi amor, você me ligou? – ela pausou sem esperar por uma resposta. — Eu vi milhares de chamadas perdidas suas. Desculpe-me. Fiquei até tarde no colégio conversando com as meninas. Elas queriam saber de tudo – ela soltou um riso. — Inclusive de você. Acabei contando a elas o quanto você era especial, maravilhoso, romântico, carinhoso. Enfim.

— Legal! Já está em casa?

— Sim, acabei de chegar – vi que já eram três da tarde. Pelo visto ela tinha conversado muito com as tais meninas. — E você, o que está fazendo agora?

— Dando um passeio com Pedrinho e Ben, nosso cachorro – confessei olhando para Pedro que sorria.

— É ela? – ele perguntou baixinho. Confirmei com um gesto. — Me deixa falar com ela? Só um pouquinho, por favor.

— Malu? Ele quer falar contigo, tudo bem? – soltei um riso, revirando os olhos e entregando o celular a ele.

— Oi Malu, aqui é o Pedro, irmão do Daniel – ele disse meigo. Esperou até que ela dissesse algo que não pude saber e continuou. — Quando é que vamos nos ver para passear com Ben? Ele e eu estamos ansiosos em te ver – outra vez ele esperou ela dizer. — Você parece legal. Agora preciso desligar. O Ben está inquieto por causa de outro cachorro. Tchau – entregou o celular para mim.

— Daniel, ele é uma graça – ela disse.

— Ele é – confirmei sorridente em perceber que ela sorria também. — Estou com saudades.

— Ah, meu amor, eu também sinto sua falta – ela disse carinhosa. — Podemos nos ver amanhã, o que acha?

— Claro. Posso ir ai te buscar? – ela concordou e desligamos.

Fui atrás de Pedro que andava com Ben sozinho à frente. Quando estive ao seu lado ele voltou a me fazer novas perguntas sobre Maria Luíza. Empolgado, eu lhe contei tudo o que precisava saber enquanto voltamos para casa.

— Daniel? Que surpresa em vê-lo – disse uma loura que parecia familiar. Cumprimentava meu irmão enquanto eu a observava tentando me lembrar dela. — Não deve se lembrar de mim, não é mesmo? Bom, posso refrescar sua memória. Campeonato na escola, uma aposta...

— Aninha? – perguntei surpreso. — Nossa! Quanto tempo.

Ana Caroline fora uma garota com quem fiquei no primeiro colegial. Eu jogava no campeonato da escola no time de futebol em uma das finais como atacante. Meus parceiros de time, após a nossa vitória, me desafiaram em uma aposta. Eu deveria ficar com uma das garotas que viviam atrás de nós. E uma delas era a famosa Aninha, como todos a chamavam. Era uma loura conhecida entre os garotos da escola por conta do seu corpo magnífico.

Acabei aceitando essa aposta e fiquei com ela atrás do ginásio. Beijamo-nos por horas. Depois disso, ficamos algumas outras vezes, mas pelo excesso de comentário no colégio, resolvi me afastar. Aninha foi uma das poucas garotas com quem me relacionei em toda a vida.

— Não te vejo desde que saiu do Quadrangular – comentei. A jovem, ainda mais loura, tinha os cabelos soltos e medianos. Usava um short jeans curto, uma regata branca e um tênis de cano-alto. Estava bem maquiada, como sempre. O corpo parecia ainda mais espetacular. Parecia ainda mais mulher.

— Pois é. Aquele colégio fez muita má fama de mim por um longo tempo. Por conta de alguns boatos, meus pais resolveram me afastar. Agora estou em outro colégio, também não muito longe daqui. Pelo visto você não mudou quase nada, hein Daniel?! Só está ainda mais lindo.

— Obrigado – agradeci timidamente. — Bom preciso ir. Meu irmãozinho deve estar cansado. Passeamos a tarde inteira.

— Que pena! Poderíamos tomar um sorvete juntos. Senti sua falta, você é um garoto especial – surpreendentemente ela puxou uma de minhas mãos, olhando fixamente para aliança. — Mas vejo que encontrou alguém que tomou conta de seu coração.

— Sim, encontrei – confirmei afastando minha mão. — Eu a amo e me sinto muito bem.

— Deve sentir mesmo. Pena que eu não posso dizer o mesmo. Afinal, nunca encontrei alguém que gostasse de mim de verdade.

— Mas não se preocupe – adiantei-me. — Logo menos encontrará alguém que possa cuidar do seu coração.

— Espero, Daniel, espero – ela voltou a sorrir, beijou meu rosto delicadamente e partiu rebolando.

— Ei, ela era sua namorada? – perguntou curioso Pedro.

— Não – falei seriamente. — Só foi mais uma garota na minha vida.

Em casa, Pedro contou à mamãe que havia falado com Malu ao telefone. Como todas as mães, ela lhe encheu de perguntas. Comendo a sobremesa, assistimos televisão juntos no sofá. Também contei a eles, como o prometido, alguns detalhes da viagem que marcara para sempre minha vida.

Antes de dormir, ajudei Pedro no dever de casa da escola. Coloquei-o para dormir e, assim que apaguei as luzes, beijei sua testa. Segui para meu quarto e me preparei para dormir.

Estava tão ansioso para encontrar Malu no dia seguinte, que resolvi ligar para ela. O telefone chamou poucas vezes antes que ela atendesse.

— Liguei somente para dar boa noite e dizer que a amo muito. – falei contente, encostado na janela do quarto.

— Daniel, desse jeito não vou conseguir aguentar até amanhã. Você é muito perfeito, sabia?  

— Você que é uma princesa. Estava pensando em amanhã e o quanto quero te ver.

— Também pensava em amanhã – ela garantiu. — Vamos dormir para o tempo passar logo. Boa noite, meu amor. Durma bem.

— Durma bem também, princesinha. Te amo muito.

— Também te amo, Daniel, com todo o meu coração – ela desligou.

Olhava para o céu com a mão no peito esquerdo. Meu coração batia muito forte. Será que ela também olhava para as estrelas aquela noite? Eu olharia para aquele céu por toda vida para agradecer por toda mudança que havia acontecido e o presente especial que me dera naquela viagem.

Voltei para a cama deixando o celular ao lado. Fechei os olhos, sorri sozinho e, finalmente, adormeci desejando encontrá-la em meus sonhos.


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